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An. 3. Enc. Energ. Meio Rural 2003
Inspeção de cooperativas de eletrificação rural em São Paulo - um passo para sua regularização
Luiz Henrique Alves PazziniI; Luiz Fernando KurahassiI; Fernando Selles RibeiroI; Guilherme Eugênio Filippo Fernandes FilhoII
IGEPEA-USP, Grupo de Energia do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétricas, Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Avenida Prof. Luciano Gualberto, travessa 3, 158, Sala A2, 35, CEP: 05508-900, São Paulo, SP, Brasil, Tel: (55)(11)3818-5279, Fax: (55)(11)210-3595
IIDepartamento de Energia da Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Avenida Ariberto Pereira Cunha, 333, CEP: 12.500-000, Guaratinguetá, SP, Brasil, Tel: (55)(12)525-1474
RESUMO
O estado de São Paulo conta, atualmente, com dezessete cooperativas de eletrificação rural que atendem diversas regiões do estado. Esses agentes do setor elétrico estão, em todo o Brasil, passando por um processo de regularização coordenado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Em São Paulo esse processo está sendo conduzido pela Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE). Uma das etapas desse processo foi o de inspeção das cooperativas, realizado durante o ano de 1999 por cinco equipes ligadas a Universidade Estadual Paulista e a Universidade de São Paulo. Este trabalho descreve a metodologia utilizada nessas inspeções e apresenta os principais dados colhidos. Conclui que o serviço prestado pelas cooperativas é de boa qualidade, sendo que, quanto menor a cooperativa, mais personalizado é o atendimento. Também destaca a necessidade de aprimoramento tecnológico que as cooperativas terão de realizar se quiserem inserir-se em um ambiente competitivo e fortemente fiscalizado pelos agentes reguladores.
Palavras-chave: Eletrificação rural, cooperativas, distribuiçào de energia.
ABSTRACT
The state of São Paulo counts, now, with seventeen cooperatives of rural electrification that assist several areas of the state. Those agents of the electric sector are, in Brazil, going by a regularization process coordinated by the Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). In São Paulo that process is being driven by the Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE). One of the stages of that process was it of inspection of the cooperatives, accomplished during the year of 1999 by five teams from UNESP and from USP. This paper describes the methodology used in those inspections and presents the main data. It concludes that the service rendered by the cooperatives is of good quality, and, than smaller is the cooperative, better is the attendance. It also the need of technological advancements that the cooperatives will have to accomplish if they want to participle in a competitive and regularity market.
COOPERATIVAS E A ELETRIFICAÇÃO RURAL NO BRASIL
A eletrificação chegou ao meio rural brasileiro, atendendo a uma demanda do imigrante europeu, na década de 20. As comunidades étnicas do interior do sul do país tentaram organizar as primeiras cooperativas de eletrificação rural. Possivelmente proprietários agrícolas do estado de São Paulo tenham sido os primeiros atendidos, buscando infra-estrutura, água potável, luz, escolas e mecanização da atividade agrícola.
A primeira cooperativa só foi fundada vinte anos depois, em 1941. Foi em Quatro Irmãos, Rio Grande do Sul, estado onde essa prática se expandiu e é estável até hoje. TENDRIH (1990) relata o surgimento de pequenas usinas hidroelétricas e redes de distribuição, com o apoio do poder público municipal e estadual. Já em 1947, a então Comissão Estadual de Energia Elétrica dá início à construção de linhas e redes na zona rural gaúcha. Hoje no Rio Grande do Sul existem dezessete cooperativas que, juntamente com as concessionárias, são responsáveis pelo abastecimento de eletricidade da zona rural.
A discussão sobre o assunto intensificou-se em uma época que, também, se intensificou a discussão sobre energia. O petróleo era muito barato, a termoelétrica uma tecnologia bastante conhecida, e o governo de São Paulo insistia na expansão da geração hidroelétrica, com o aproveitamento dos grande e médios rios. Nesse cenário, em 1957, realizou-se o Seminário Internacional de Eletrificação Rural, patrocinado pela Organização dos Estados Americanos e surgiu o Serviço Especial de Eletrificação Rural que se propunha a investir fundos da Caixa Econômica Estadual para construir linhas trifásicas com disposição vertical, dispensando a cruzeta.
O modelo de desenvolvimento da eletrificação rural norte-americano influenciou a criação da Eletrificação Rural de Minas Gerais (ERMIG), subsidiária da CEMIG, concessionária local. Também havia preocupação de reduzir custos e organizar os consumidores. Os organismos internacionais forçavam a criação de cooperativas para liberar recursos para a construção, já que assim fora feito nos Estados Unidos e em outros países.
Com a aprovação do Estatuto da Terra e com a forte influência das agências estrangeiras, no final de 1964 foi estabelecida a estrutura cooperativista como forma de promover a eletrificação rural. Foram concedidos subsídios e privilégios às cooperativas de eletrificação.
A transposição do modelo bem sucedido no primeiro mundo não foi experiência duradoura. Criadas realmente para permitir a tomada de recursos externos, as cooperativas de eletrificação rural deixaram de cumprir com aquilo que fora estabelecido como sua função continuada: a operação e a manutenção das linhas. Posteriormente foram sendo, uma a uma, absorvidas. A partir de 1967 foram se transformando em prestadoras de serviços à concessionária, ou desapareceram.
TEIXEIRA (1988) mostra que o Decreto número 62.724 definiu a eletrificação rural como sendo a prestação de serviços de energia elétrica aos consumidores rurais individualizados ou integrantes de cooperativas de eletrificação rural, assim caracterizados:
localizarem-se em área rural, ou seja, fora do perímetro urbano e suburbano das redes municipais e dos aglomerados populacionais com mais de 2.500 habitantes;
dedicarem-se às atividades ligadas diretamente à exploração agropecuária, ou seja, o cultivo do solo, criação de pequenos animais, engorda de gado, silvicultura, piscicultura, reflorestamento e extração de produtos vegetais; e
dedicarem-se a qualquer outra atividade na zona rural, desde que a potência posta à sua disposição não ultrapasse a 45 kVA.
Em uma época de forte afluxo de capitais externos, surgiu em 1970 o Grupo Executivo de Eletrificação Rural (GEER) para movimentar fundos do I Programa Nacional de Eletrificação Rural (I PNER), suprido com recursos do Fundo de Eletrificação Rural (FUER), este constituído metade por empréstimos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a outra metade dividida entre fundos da União (30%) e das cooperativas de eletrificação rural (20%).
Era exigência do BID que o tomador fosse uma cooperativa de eletrificação rural. O Brasil viveu uma temporada de criação de entidades destinadas a cumprir a exigência do cedente. Segundo RIBEIRO (1993), esse artifício trouxe muitos problemas institucionais e políticos, pois nos Estados Unidos, a relação entre a cooperativa e a concessionária é um jogo de interesses de empresas privadas. A concessionária no Brasil, na época, era estatal: o jogo facilmente podia ficar viciado. A cooperativa é fraca e facilmente manipulável.
As cooperativas foram penalizadas pelo conceito de que a eletrificação rural é apenas eletrificação agrícola. É comum que as redes atendam uma região em que as propriedades têm os mesmos hábitos de produção, com as mesmas sazonalidades e com picos coincidentes. O fator de carga é proibitivamente baixo, inviabilizando a atividade da cooperativa, a qual só cobra pelo consumo, contudo paga pelo consumo e pela demanda máxima, deixando ainda ocioso um grande percentual de estoque de capital. A fraqueza da cooperativa, além de ser constitucional, é também operacional.
O I PNER encerrou-se em 1977, tendo atendido dez estados através de 94 cooperativas.
Em 1978 foi firmado outro contrato com o BID que viabilizou a injeção de dinheiro novo. Envolvia, também, o Ministério da Agricultura, governos estaduais e cooperados.
Entre 1976 e 1980, a Eletrobrás desenvolveu um programa de eletrificação rural envolvendo 16 estados, um território e o Distrito Federal, aplicando recursos da Eletrobrás, de concessionárias e de usuários.
Havia, pois, a política de eletrificação rural do Ministério de Minas e Energia, imposta pela Eletrobrás ao setor elétrico, movimentando recursos do próprio e poderoso setor.
Havia, também, a política de eletrificação rural do Ministério da Agricultura, imposta pelo GEER, através do II PNER, aplicando recursos captados junto ao BID.
A primeira, das concessionárias. A segunda, das cooperativas.
A eletrificação rural no Brasil tornou-se uma grande confusão institucional. Estabeleceu-se uma dualidade de competências e programas. Como as concessionárias estaduais acabavam manipulando o poder concedente de maneira peculiar a circunstâncias próprias, a distribuição rural tornou-se palco de conflitos, divergências e lutas pelo poder entre as diferentes concessionárias e as cooperativas de eletrificação rural.
A existência de volumosos aportes financeiros externos, e a perspectiva de obter mais, davam sustentação e poder ao GERR e às cooperativas, no âmbito do Ministério da Agricultura. Eram promulgados por instituições as normas e diretrizes necessárias para execução do programa e gestão dos recursos financeiros vindos do exterior. Inclusive sobre questões da engenharia de distribuição de energia elétrica, operadora final da maior parte dos recursos e executora do programa.
De sua parte, as concessionárias atendiam aos dispositivos da Eletrobrás, cujo programa de eletrificação rural visava basicamente a ampliação da cobertura das áreas de atuação das concessionárias. As normas, determinações e prioridades eram emanadas do Ministério das Minas e Energia, por intermédio dos organismos gestores da política energética brasileira.
O Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), um dos órgãos daquele ministério, manifestou em documento, em 1985, alguns dos conflitos existentes. O problema principal é a definição da área da atuação das cooperativas. Segundo as concessionárias, elas devem atender apenas as propriedades agropecuárias. A confusão entre o "agrícola" e o "rural" condena a cooperativa à pena do baixo fator de carga, tornando inviáveis o programa, a empresa e o capital.
Também o preço do fornecimento é grande problema. A cooperativa tem que receber do consumidor a paga pelas suas despesas em atendê-lo. A concessionária cobra uma tarifa cuja composição não é estipulada por ela, a qual embute subsídios, vantagens e acertos de contas a nível nacional. O resultado é o consumidor cooperado pagar mais por um serviço de pior qualidade que o seu vizinho de cerca, se este estiver ligado à rede da concessionária. É o conflito levado para a ponta do sistema. Muitas vezes, a concessionária é capaz de fazer a instalação a custo mais barato que a cooperativa. Acresça-se o fato de que o consumidor da concessionária tem uma participação média de apenas 50% do custo da implantação da rede e está formado um quadro de rejeição ao sistema de cooperativas, responsável pela cobertura de toda a área rural norte-americana, por exemplo. Surgiram outros problemas institucionais, como por exemplo, a geração própria e a repartição dos fundos estaduais para investimento em energia elétrica e eletrificação rural.
As cooperativas de eletrificação rural do Brasil, representadas pela Confederação Brasileira de Cooperativas de Eletrificação Rural (CONBRACER) responderam ao citado documento do DNAEE, responsabilizando órgãos estatais como o próprio DNAEE, a Eletrobrás e o conjunto de concessionárias e suas representações (o chamado setor elétrico brasileiro) por atitudes que impedem o desenvolvimento e a própria existência do sistema cooperativista de eletrificação rural.
O peso político das cooperativas é frágil no contexto regional e nacional. No final da década de 80, o Ministério da Agricultura, por iniciativa da então Secretaria Nacional das Cooperativas (SENACOOP) tentou impulsionar o sistema, procurando, inclusive, fortalecer o setor de autogeração. O SENACOOP foi extinto.
Havia um clima de desconfiança mútua entre diferentes federações estaduais de cooperativas de eletrificação rural. As experiências de gestão dos recursos em grande monta por parte das diretorias das cooperativas deixaram resultados que, em alguns casos, foram pouco recomendáveis. Dirigentes de cooperativas da região sul denunciaram o uso do dinheiro, diretamente ao Presidente da República, o que gerou uma devassa nas cooperativas que aplicaram em outros fins os recursos do II PNER, no final dos anos 70, começo dos anos 80. Algumas entidades ainda estão a pagar penitência por maus atos praticados com dinheiro coletivo. Criou-se uma polarização entre cooperativas do sul (algumas com dezenas de milhares de consumidores) e as do nordeste. Paulistas, gaúchos, catarinenses e mato-grossenses do sul desconfiavam de mordomias cuja prática atribuíam a confederados do nordeste e declararam-se dissidentes do movimento nacional, fundando em março de 1991 a Confederação Nacional de Cooperativas de Eletrificação Rural (INFRACOOP).
Atualmente, segundo ANDRADE et all (1999), as cooperativas de eletrificação rural brasileiras podem ser enquadradas em quatro grupos:
cooperativas classificadas como quase concessionárias grande porte, clientes diversificados;
típicas grande porte, mercado eminentemente rural;
emergentes predominância de consumidores rurais, mas sem porte e escala de uma cooperativa típica;
híbridas significativo mercado rural, pequeno porte.
Na década de 90 o setor elétrico brasileiro passou por importantes alterações em seu arcabouço institucional: as distribuidoras de eletricidade foram privatizadas e surgiu a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) com o objetivo de regular e fiscalizar o desempenho das indústrias de energia elétrica que operam em solo brasileiro. Isso afetou também as cooperativas. Está em curso, desde 1999, um processo coordenado pela ANEEL em parceria com agências estaduais para regularizar as cooperativas.
O PROCESSO DE REGULARIZAÇÃO
O processo de regularização das cooperativas de eletrificação rural brasileiras tem por principal objetivo eliminar os conflitos existentes entre cooperativas e concessionárias, bem como enquadrá-las de forma definitiva perante a legislação elétrica brasileira. Segundo ANDRADE et all (1999), algumas questões que potencializam esse clima de conflito são:
venda, por parte da cooperativa, de energia elétrica para público indistinto: cooperados que não constam do ato originário de permissão e consumidores não cooperados;
atuação fora da zona rural, em atendimento de mercado urbano;
competição, tanto em mercado urbano como em rural, com a concessionária, gerando duplicação de redes.
Ao final deste processo, dois aspectos deverão estar concretizados:
1. uma definição de quais cooperativas serão autorizadas e quais serão permissionárias;
2. delimitação das áreas de atendimento das cooperativas e das concessionárias. Isso elimina os conflitos e extingue a existência de linhas paralelas.
A Resolução n° 333 da ANEEL de 2 de dezembro de 1999 conceitua autorizadas e permissionárias como:
autorizada: toda pessoa física ou jurídica, individualmente ou associada, que implanta instalação elétrica para uso privativo. As cooperativas que possuam somente associados cujas cargas instaladas se destinam ao desenvolvimento exclusivamente rural se enquadram nessa modalidade. Uma autorizada pode efetuar expansão das instalações elétricas dentro da área de atuação estabelecida pela ANEEL, mas, caso queira executar projetos fora de sua área de atuação, deve solicitar nova autorização da ANEEL;
permissionária: compreende a distribuição e comercialização de energia, de forma ampla e não discriminatória, das diversas classes e subclasses de consumidores estabelecidos pela legislação. As cooperativas de eletrificação rural para se tornarem permissionárias, então, devem atender público indistinto, bem como cumprir os seguintes requisitos impostos pela ANEEL:
observar condições de qualidade exigidas;
praticar tarifas homologadas pela ANEEL;
manter registro contábil;
celebrar contrato de uso e de conexão aos sistemas de transmissão e distribuição;
manter contratos de compra e venda de energia elétrica que assegurem o atendimento do seu mercado; e
garantir o livre acesso ao seu sistema elétrico.
O processo de regularização das cooperativas possui algumas etapas que devem ser rigorosamente cumpridas. De forma resumida, tem-se:
solicitação de abertura do processo por parte da cooperativa;
fornecer à ANEEL uma série de informações de caráter técnico, econômico, financeiro e jurídico. Essas informações constituem a base para efetuar-se o enquadramento da cooperativa como autorizada ou permissionária;
diligências da ANEEL com o intuito de comprovar a veracidade das informações prestadas;
traçar as poligonais (áreas de atuação) das cooperativas e concessionárias. Esta etapa é de negociação das partes envolvidas, sendo de responsabilidade da ANEEL a resolução de pontos polêmicos.
No estado de São Paulo este processo de regularização das cooperativas foi outorgado, pela ANEEL, à Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE), que iniciou seus procedimentos antes da Resolução ter sido aprovada, com o intuito de agilizar os trabalhos e reduzir ansiedades que existiam entre as cooperativas. A seguir será apresentada a forma como foi realizada a etapa de inspeção das cooperativas paulistas, analisando os procedimentos e comentando os resultados obtidos.
INSPEÇÃO DAS COOPERATIVAS EM SÃO PAULO
São Paulo conta, atualmente, com dezessete cooperativas de eletrificação rural atuando em diferentes áreas do estado. Este número já foi bem maior mas, em função de falta de incentivos e dificuldades financeiras, muitas foram absorvidas pelas concessionárias que atuam no estado. A Tabela 1 mostra quais são as cooperativas remanescentes.
A CSPE iniciou o processo de regularização dessas cooperativas em meados de 1999. Como primeiro passo, foram enviadas, pelas cooperativas, as informações necessárias para uma análise prévia da situação de cada uma. Após essa etapa, iniciou-se o processo de inspeção, com o objetivo de coletar mais dados e checar as informações prestadas.
Para essa etapa, a CSPE contratou os serviços da Fundação Para o Desenvolvimento da UNESP (FUNDUNESP). Trata-se de uma entidade sem fins lucrativos vinculada à Universidade Estadual Paulista (UNESP). A FUNDUNESP, por sua vez, selecionou profissionais de alto nível junto à própria UNESP e a Universidade de São Paulo (USP). Os profissionais que atuaram nessas atividades tinham experiências anteriores em diagnósticos energéticos e em programas de eletrificação rural, sendo, portanto, plenamente capazes de levar a termo as incumbências que lhes foram determinadas.
As inspeções técnico-comerciais se constituíam, basicamente, em coletar informações, através de um relatório padrão, sobre os aspectos mais relevantes das cooperativas. Também eram realizadas inspeções visuais em parte das redes elétricas das cooperativas. A escolha das linhas inspecionadas foi totalmente aleatória, variando de inspeção para inspeção. Foram entrevistados consumidores para verificar as condições de atendimento, qualidade dos serviços e registrar possíveis queixas existentes.
Assim, foram averiguados os seguintes tópicos durante as inspeções:
faturamento e arrecadação: nessa parte buscou-se inteirar, basicamente, dos meios utilizados pela cooperativa para informar seus consumidores de suas contas, como os clientes pagavam seus débitos, quais taxas eram cobradas e se havia devolução de dinheiro em caso de pagamentos equivocados;
suspensão e religação: esse ponto teve por meta levantar às práticas de corte e religamento efetuadas pelas cooperativas, buscando levantar o tempo médio para efetuar essas atividades e quais taxas são cobradas para efetuar a religação;
atendimento comercial: o objetivo dessa etapa era conhecer o funcionamento dos postos de atendimento das cooperativas, principalmente no aspecto de reclamações dos clientes, bem como levantar a existência de fraude, programas de eficiência energética e prática de ressarcimentos por danos;
cadastro: procurou-se conhecer como era o banco de dados dos clientes das cooperativas. O objetivo dessa etapa era verificar se ela possuía controle de seu mercado e conhecia seu potencial de crescimento;
atendimento de novas ligações: esse tópico teve por objetivo levantar os procedimentos necessários para efetuar-se uma nova ligação. Entre outros dados, buscou-se estabelecer:
o custo médio de uma nova ligação;
documentos necessários para se filiar à cooperativa;
tempo médio para se executar a nova instalação;
existência de participação financeira da cooperativa na nova ligação;
existência de cobrança de "jóia" para se tornar um cooperado. "Jóia" seria um valor mínimo que cada novo cooperado teria de pagar para contar com o atendimento da cooperativa;
aspectos operacionais de distribuição: a meta dessa etapa era levantar a estrutura da cooperativa para efetuar o adequado atendimento elétrico de seus clientes. Assim, verificou-se a existência ou não de centro de operação de distribuição (COD), como eram efetuados os serviços de operação da rede elétrica, o número de funcionários disponíveis para operação, existência de programas de treinamento de pessoal, disponibilidade de softwares para gerenciamento de rede, estado de conservação da frota de veículos, o tempo médio de atendimento de ocorrências e como os clientes avisavam sobre defeitos. Também foi averiguado se as cooperativas realizavam apurações de índices de qualidade, tais como Duração Equivalente por Consumidor (DEC) e Freqüência Equivalente por Consumidor (FEC);
aspectos relativos à manutenção preventiva: nesse ponto foram levantados os procedimentos adotados pela cooperativa na manutenção preventiva de seus equipamentos. Assim, foram coletadas informações sobre programação anual de manutenção, número de funcionários envolvidos, periodicidade de inspeção das linhas elétricas e inspecionados os almoxarifados da cooperativa para verificar a quantidade e qualidade dos materiais disponíveis;
aspectos de engenharia: basicamente foi uma etapa de coleta de dados técnicos, como o tipo de sistemas elétricos (MRT, trifásico, bifásico, etc) e materiais utilizados (postes, transformadores, condutores, etc), critérios de planejamento observados, existência de "circuitos de socorro", potência padrão dos transformadores, etc. Também foi verificado se a cooperativa estava adotando alguma inovação tecnológica em seus sistemas elétricos;
inspeção visual da rede elétrica: foram escolhidos, aleatoriamente, trechos de alimentadores e ramais para serem inspecionados. Foram observadas as condições gerais dos postes, transformadores, condutores, isoladores e pontos de tomada de energia (interligação com à concessionária). Teve por meta verificar o estado geral do sistema elétrico das cooperativas;
entrevistas com consumidores: nesta etapa foram escolhidos, também de forma aleatória, consumidores para serem entrevistados. O objetivo das entrevistas foi levantar informações gerais sobre aspectos da qualidade do produto, qualidade dos atendimentos e qualidade comercial. Assim, as perguntas versaram sobre forma de pagamento de contas, ocorrência de cobranças indevidas, adequado esclarecimento sobre os valores cobrados, ocorrência de queima de aparelhos, freqüência de falta de energia elétrica, tempo para retorno da luz após o defeito e se o preço da conta de energia era justo.
COMENTÁRIOS
O formato da inspeção foi estimulante e auxiliou bastante o desenvolvimento dos trabalhos. Verificou-se que as cooperativas possuem sistemas elétricos atendendo as exigências das normas técnicas e que as redes se encontram em bom estado de conservação. Os sistemas elétricos são na maioria trifásicos, com ramais bifásico e alguns monofásicos. Exceção é a Cooperativa de Itariri que possui uma grande volume de ramais MRT e continua a aplicar esse sistema no atendimento de novos clientes.
Em aspectos de engenharia, notou-se que, na maioria dos casos, as cooperativas precisam adquirir equipamentos de gerenciamento de rede e passar a apurar os índices de qualidade, fatores que trariam grandes ganhos em seu desempenho.
Os planos de manutenção são adequados para atender as necessidades existentes. Em caso de contingências mais graves, notou-se que existe a possibilidade de solicitar auxílio às concessionárias
Em termos de satisfação dos clientes percebeu-se que o atendimento é plenamente satisfatório. Notou-se, também, que quanto menor a cooperativa, melhor o atendimento. Foi constatado um caso na cooperativa de Osvaldo Cruz em que o próprio eletricista da cooperativa realizava pequenos serviços na instalação dos clientes, como trocar resistência de chuveiro ou instalar motores.
Inovações tecnológicas são raras. Algumas estão utilizando, com grande sucesso, chaves repetidoras. Estas chaves são constituídas por três elos fusíveis. Assim, na ocorrência de um defeito transitório, um elo fusível se rompe e outro assume a função. Caso o defeito permaneça, o procedimento se repete por mais duas vezes até a interrupção final do circuito, o que caracteriza uma falta permanente (por exemplo, o rompimento de um condutor) que deve ser sanada. Essa chave pode perfeitamente substituir o religador em ramais rurais, garantindo a confiabilidade dos sistemas e reduzindo os custos das novas ligações.
Algumas cooperativas apresentam grandes pontos de conflito com as concessionárias. Isso é mais evidente nas cooperativas mais estruturadas, que atendem um público maior. Na maioria dos casos verificou-se a existência de duplicação de circuitos, com linhas da cooperativas correndo em paralelo com as da concessionária. A Figura 1 retrata um caso de paralelismo de linhas.
CONCLUSÕES
Este trabalho fez uma análise do histórico das cooperativas no Brasil e do seu processo de regularização que está em andamento no país.
Centrando o foco na etapa de inspeção das cooperativas em São Paulo, percebeu-se que essas instituições desempenham um bom trabalho, atendendo perfeitamente às necessidades dos usuários.
Entretanto, nota-se que novos investimentos, por parte das cooperativas, em equipamentos, softwares e pessoal serão necessários para atender os índices de qualidade da ANEEL. Esses investimentos, muitas vezes, podem se tornar um encargo muito pesado para as cooperativas. Uma alternativa seria a união dessas empresas para adquirir equipamentos em forma conjunta, o que reduziria o peso das transações.
O sistema de cooperativas mostra, assim, que ainda é perfeitamente viável para o atendimento de regiões rurais no estado de São Paulo, desde que sejam feitos ajustes que permitam um aprimoramento ainda maior em seu desempenho.
REFERENCIAS
[1]TENDRIH, L. Experiências com sistemas de eletrificação rural de baixo custo: uma análise dos impactos sócio-econômicos. Tese apresentada à Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro para obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento Agrícola. Itaguaí, Rio de janeiro, junho de 1990.
[2]TEIXEIRA, N. Eletrificação rural simplificada - Sistema Monofilar com Retorno por Terra - MRT. Caderno Finsocial n° 8. Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Maio de 1988.
[3]RIBEIRO, F.S. Eletrificação rural de baixo custo. Tese apresentada à Escola Politécnica da USP para obtenção do título de Livre Docente. São Paulo, 1993.
[4]ANDRADE, C.S.; NETO, E.C.; GUERRA, H.N. Outorga de permissão de serviços públicos de energia elétrica às cooperativas de eletrificação rural. In VIII Congresso Brasileiro de Energia VIII CBE. Anais volume 3, p. 1470-1479. Rio de Janeiro, dezembro de 1999.
Endereço para correspondência
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Guilherme Eugênio Filippo Fernandes Filho
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