An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002
Planta de cogeração num frigorífico de francos com cavaco de pinnus como fonte primária - 4º Encontro de Energia no Meio Rural
Sordi, AlexandreI; Souza, Samuel N.M.II; Galdino, Ana P.M.III; Oliva, Calos A.IV
IMestrando do curso de Engenharia Agrícola da Unioeste - asordi@unioeste.brIIProfessor adjunto do curso de Mestrado de Engenharia Agrícola da Unioeste
IIIMestrando do curso de Engenharia Agrícola da Unioeste
IVMestrando do curso de Engenharia Agrícola da Unioeste
RESUMO
No Estado do Paraná há uma grande disponibilidade de biomassa florestal (pinus e eucaliptus) a qual é utilizada pelas indústrias como fonte primária de energia na geração de vapor de processo. Essa biomassa poderia ser utilizada por algumas indústrias na geração própria de eletricidade e vapor de processo com a utilização de turbinas a vapor (cogeração). Neste trabalho foi feito um estudo de caso sobre geração distribuída de energia numa Agroindústria de Cascavel, indústria frigorífica que abate 180.000 frangos por dia. Foi proposto um ciclo a vapor de 3.000 kW utilizando como fonte primária resíduos da biomassa florestal de de pinnus. O custo de produção de energia elétrica foi comparado com o valor normativo estipulado pela ANEEL.
Palavras chave: Biomassa combustível, geração de energia, setor agro-industrial
ABSTRACT
In Paraná State there is a availability large of biomass fuels (pinus and eucaliptus wood) that is applied for industries as primary energy source for process steam generation. that biomass could is applied in industries for electric own generation and process steam with application of the steam turbine (cogeneration) The work purpose was made a case study of distributed generation energy in an Agrodustry of Cascavel city, a food industry that lowers 180.000 birds a day. A steam cycle was proposed to of 3.000 kW using as source primary residues of the woodship of pinnus. The cost of electric power production was compared with the normative value stipulated by ANEEL
Key words: Biomass fuel, energy generation, agro-industry sector.
INTRODUÇÃO
O Paraná continua plantando soja, feijão, milho, café,...plantou a partir de 1995 e continua plantando dezenas de milhões de árvores e, hoje, colhe indústrias. A floresta atrai indústrias. Indústrias que chegam e as que chegaram estão ampliando sua estrutura de produção, o seu perfil sócio-econômico, e, em especial o ambiental, recuperando as florestas nativas de proteção, principalmente as matas ciliares que protegem os rios e as reservas florestais para a biodiversidade, recomendadas pela legislação florestal brasileira. Até 1995, o Paraná cortava 200 árvores por minuto plantava apenas 80. Hoje, o Paraná reverteu a situação e, começa dar sinais de superávit entre plantio e o corte.
Na política de desenvolvimento florestal do estado destaca-se o SERFLOR (Sistema Estadual de Reposição Florestal Obrigatório) que em caráter permanente tem por objetivo principal garantir o equilíbrio entre a demanda e a oferta de matéria prima florestal, regulando o consumo e a reposição para garantir a auto sustentabilidade. O consumo de matéria prima no ano de 1999 foi de 20.998.309 m3 ou 28.120 ha equivalente de área plantada com pinnus e eucalipto. No mesmo ano teve-se um reposição de 23.363 ha [1].
Na região Oeste do Paraná existem cerca de 129 madeireiras cadastradas no órgão estadual. O volume cortado de matéria prima florestal no ano 2001 foi de 550.344 m3 de pinnus e eucalipto. Os resíduos gerados nas indústrias madeireiras são utilizados nas olarias, e nas indústrias para produção de vapor. As agroindústrias processadoras de carnes, que se enquadram no setor de alimentos, apresentam uma relação potência/calor adequada, de acordo com [2], para cogeração.
Baseado na informação de que o Paraná apresenta um bom potencial em biomassa florestal e que o setor agro-industrial apresenta características favoráveis para cogeração, o objetivo desse trabalho foi realizar um estudo de caso para uma central de cogeração em uma agroindústria abatedora de frangos na cidade de Cascavel.
A BIOMASSA
A biomassa é produzida pelas plantas utilizando-se a luz do sol no processo da fotossíntese. Ela pode ser considerada como matéria orgânica na qual a energia solar é armazenada sob a forma de cadeias químicas. Quando as ligações entre as moléculas do carbono adjacente, hidrogênio e oxigênio são quebradas por digestão, combustão, ou decomposição, essas substâncias liberam sua energia química armazenada [3]. Quanto a sua utilização e classificação a biomassa é usada em combustão direta industrial ou aplicações domésticas, na produção de vapor para geração de eletricidade ou para produção de combustíveis gasosos e líquidos. A queima direta é a aplicação dominante, mas a produção de eletricidade e de bio-combustíveis, atualmente estão ganhando considerável interesse entre as políticas de pesquisa. As fontes de biomassa são divididas em resíduos de madeira, gerados nas indústrias madeireiras; resíduos agrícolas gerados pelas culturas, agroindústrias e criação animal; e florestas energéticas e resíduos sólidos municipais [4]. A biomassa florestal, por exemplo, foi durante muito tempo considerada não prioritária como fonte alternativa de energia devido à oferta abundante de carvão mineral e de petróleo, a qual sustentou o desenvolvimento industrial nos últimos 150 anos [5].
As questões ambientais estão entre os fatores que sustentam o interesse crescente na biomassa energética igualmente nos países industrializados [6]. A biomassa energética é mais atrativa e tem ganhado mais atenção mundial por ser renovável e apresentar um balanço nulo de CO2. O uso moderno da biomassa vem crescendo, principalmente em países industrializados como Estados Unidos, Finlândia, Suécia, Áustria e Dinamarca. Nos EUA por exemplo até o ano 2000 existia cerca de 7.000 MW de potência instalada a base de biomassa [7]. Sendo que mais do que 70 % do potencial de biomassa é utilizado em sistemas de cogeração e os sistemas de queima de lenha quantificam 88% [8].
No Brasil no início da década de 40, a biomassa era responsável por cerca de 83% da oferta interna de energia do Brasil, dos quais 81% correspondiam a lenha e 2% a bagaço de cana. Com o uso crescente dos derivados de petróleo, logo acompanhados da grande expansão da hidreletricidade, a biomassa passou a diminuir sua participação década após década. No período de 1980-2000 a participação da biomassa, passou de 29,2% para 17,3%. A queda da biomassa, nos anos 90, é explicada, ao menos em parte, pelo fato de ter diminuído o uso da lenha e do carvão vegetal [9].
O Brasil tem feito uma significante transição para o uso moderno da biomassa, particularmente nos últimos 40 anos. Antes da segunda guerra mundial (1939-45), a biomassa era utilizada principalmente para fornecer energia no cozimento de alimentos nas casas. De 1983 a 1997 o calor de processo industrial tornou-se dominante e houve a emergência de formas secundárias de energia; por exemplo, o etanol para transporte, e a contribuição de eletricidade para a rede através de cogeração em indústrias do setor sucro-alcooleiro e do papel [10].
Segundo [11], o Brasil possui atualmente 154 usinas termelétricas em operação utilizando a biomassa como fonte primária. Com a grande maioria no setor sucroalcooleiro, sendo o bagaço da cana o combustível. A menor parcela se distribui entre usinas operando com licor negro, cavaco de madeira e casca de arroz. totalizando 1.514.759 kW instalados.
COGERAÇÃO
A cogeração consiste na geração conjunta de duas ou mais formas de energia final a partir de uma mesma fonte primária de energia. Dependendo do tipo de ciclo empregado, as eficiências se elevam dos usuais 34 - 38 % relativos à geração elétrica independente, para cerca de 55% a 85 %, com a recuperação do calor residual em geral rejeitado para o meio ambiente [12]. Esse processo diminui as emissões e otimiza o uso de combustível, melhorando o aspecto econômico e tornando possível a utilização de combustíveis não homogêneos como a biomassa, resíduos de madeira e outros refugos industriais [13].
O conceito de cogeração está inserido no contexto das práticas mais modernas de conservação de energia [2]. É um método efetivo de uso racional da fonte primária de energia, sob este aspecto, a cogeração pode ser executada sempre que for economicamente justificável [12]. Embora este fato seja geralmente aceito, existem consideráveis controvérsias sobre o potencial desta tecnologia. A economia de energia primária através da cogeração é determinada por uma variedade de parâmetros, os quais devem ser propriamente levados em consideração. Também a incerteza está associada com a contribuição proporcional da energia primária para a geração de eletricidade e calor, respectivamente [14].
A viabilidade técnico-econômica da cogeração em instalações industriais é favorecida na medida em que a carga térmica for mais significativa e constante. Tal condição é particularmente verdadeira em indústrias químicas, refinarias de petróleo, indústrias siderúrgicas e metalúrgicas de grande porte, indústrias de papel e celulose e grandes plantas de produção de alimentos [15]. Em uma análise de um sistema de cogeração em uma agroindústria feita em [16] reportou-se que para essa tecnologia ser tecnicamente praticável, bem como economicamente conveniente, quatro principais condições devem ser satisfeitas: (i) é a relação adequada entre o requerimento de energia térmica e elétrica; (ii) a demanda simultânea de calor e eletricidade; (iii) a baixa temperatura da demanda de calor e (iv) a proximidade dos usuários de calor e potência.
Somente em três países do mundo como a Dinamarca, Holanda e Finlândia existem sistemas de suprimento de energia regional que tem sido articulada em larga escala nacional utilizando a cogeração. A produção nacional de energia elétrica suprida por cogeração chega a 50% na Dinamarca, 40% na Holanda e 45% na Finlândia. Nessa concepção a energia residual proveniente da produção de potência é direcionada na produção de heat district para as residências próximas ou destinadas a suprir a demanda de vapor de processo industrial [13].
MATERIAIS E MÉTODOS
O presente trabalho foi desenvolvido para uma Agroindústria abatedora de frangos em Cascavel/ PR. Ela abate cerca de 180.000 cabeças de aves por dia. Apresenta uma demanda média máxima de eletricidade no horário fora de ponta de 1.700 KW, e a demanda no horário de ponta oscila em torno de 1.000 kW. Ambas se comportando de forma constante durante os períodos de atividade, tendo queda apenas nos finais de semana quando o abate de frangos diminui consideravelmente, conforme o levantamento realizado por [17] (Fìgura 2). A demanda por energia térmica é a seguinte:
Água quente - 3,05 MW - 14,58 kg/s - 50ºC
Vapor - 6,15 MW - 2,22 kg/s - 170ºC
Água gelada - 0,3 MW - 5,55 kg/s - 1-2ºC
Dada a demanda de energia elétrica (E) e a demanda de energia térmica (Q), estando nas mesmas unidades (kW), origina-se um índice conhecido como relação potência/calor do processo, dado por:
A equação acima também é utilizada para calcular a relação potência/calor de geração do ciclo de potência.
O combustível utilizado na análise foi o resíduo de madeira de pinnus proveniente das serrarias abundantes na região. O seu poder calorífico superior (PCS), obtido em bomba calorimétrica da Universidade Federal de Viçosa é de 19,82 MJ/kg. Para utilização nos cálculos foi considerado um poder calorífico inferior (PCI), para 35% de umidade, de 12,08 MJ/kg.
Levando-se em consideração o gráfico de demanda na Figura 1, fez-se um estudo para implementação de uma central de cogeração de 3.000 kW. A metodologia foi adotada de acordo com [12] , simplificadamente é como segue abaixo.
A quantidade de potência que pode ser produzida pela expansão do vapor, primeiro é limitada pela energia disponível (ED) da diferença entálpica da entrada e saída da turbina a vapor. O fluxo de vapor teórico requerido (FVT) para gerar 1 KWh em uma eficiência expansão de 100% é obtido pela razão da energia contida em 1KWh (3600 KJ/KWh) e a ED, como é mostrado abaixo:
Introduzindo-se a eficiência de expansão isoentrópica da turbina (ηT) e eficiência do gerador elétrico (ηG) convertemos FVT em fluxo real de vapor requerido FRT:
Valores típicos são 10.000 kg/h de vapor para produzir 1.000 KW de potência elétrica com uma pressão de 4 MPa.
ANÁLISE ECONÔMICA
A análise econômica foi feita visando a estimativa do custo da energia elétrica produzida para comparar com o valor normativo estipulado por [11]. O investimento total da instalação, a vida útil (n) de 30 anos e um fator de utilização de 0,9, foram utilizados de acordo com o recomendado em [18]. O fator de recuperação de capital (FRC) é dado pela equação 3 abaixo:
em que:
i = taxa anual de atratividade (10% aa);
n = tempo de amortização (30 anos)
O custo da energia elétrica produzida (Cel) foi calculado pela equação 4 como segue:
em que:
CRC = Custo com recuperação de capital;
COM = Custo de operação e manutenção;
CC = Custo anual com combustível;
Pel = Produção anual de energia elétrica
RESULTADOS E DISCUSSÕES
A relação potência/calor de processo da Agroindústria foi calculada, de acordo com a equação (1), em 0,18 que é um pouco superior ao limite máximo alcançado pelo setor alimentos/bebidas no Brasil entre 1970 e 1986 visto em [2].
O ciclo a vapor proposto apresentou uma relação potência/calor de geração de 0,15 e ficou dentro da faixa operacional de 0,1-0,30 para turbinas de contrapressão, reportado em [2].
Foi, então, proposto um ciclo a vapor (Figura 3) com turbina de contrapressão utilizando como fonte primária o cavaco de pinnus. As características do ciclo são mostrados na Tabela 1.
Os dados econômicos levantados no cálculo foram relacionados na Tabela 2 abaixo:
O custo de geração da energia elétrica, de acordo com a equação 4 foi calculado em 32 US$/MWh. Inferior ao valor normativo de 45,77 US$/MWh, para termelétrica a biomassa, estabelecido por [11], referente a Janeiro de 2001.
O balanço elétrico da agroindústria [17], demonstrou que 83% da energia elétrica adquirida da rede é direcionada para o sistema de refrigeração. O excedente de energia térmica (vapor) poderia ser direcionado para um sistema de refrigeração por absorção de vapor, aumentando o excedente de energia elétrica para venda.
CONCLUSÃO
A grande disponibilidade de biomassa florestal na região Oeste do Paraná, o baixo custo dessa fonte primária e a adequada relação potência/calor de processo do setor de agroindústria de processamento de carnes sinalizam a possibilidade da implantação de centrais de cogeração. O custo de geração de energia elétrica é inferior ao valor normativo estipulado pela ANEEL.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos às instituições que forneceram os dados para a realização desse trabalho. O IAP Instituto Ambiental do Paraná, e ao Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa.
E a Capes pela bolsa de mestrado concedida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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