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An. 2. Congr. Bras. Hispanistas Oct. 2002
Terra e verso de Espanha em Murilo Mendes e João Cabral de Melo Neto
Ricardo Souza de Carvalho
Universidade de São Paulo
Em setembro de 1937, Graciliano Ramos, que há pouco tempo enfrentara trezentos dias de prisão, denunciou a tragédia da Guerra Civil Espanhola:
(...) triunfem os agressores ou sejam vencidos, não trará à Espanha nenhuma transformação. Ainda que ela ficasse reduzida a uma simples colônia, a sua desgraça não poderia ser longa. E acomodados nela os novos donos, tudo se constituiria em pouco tempo, voltariam as mesmas touradas que existem há milênios, as mesmas seguidilhas, o mesmo entusiasmo, que se aproxima do fanatismo, a mesma coragem que chega perto da loucura.
Naturalmente não pensamos em Franco e em Largo Caballero, figuras que facilmente se podem transformar em símbolos. Pensamos nas populações assassinadas, nas multidões que não entram na História e sofrem porque um político ambicioso, Aníbal ou qualquer um desses de hoje, deseja crescer. (RAMOS, 1994, p. 156)
O povo espanhol e, mais especificamente, o poeta Federico Garcia Lorca – assassinado no ano anterior por adeptos do regime franquista – passaram a representar a luta pela liberdade política para alguns intelectuais brasileiros, que viviam sob a ditadura do Estado Novo de Getulio Vargas. Nesse período, a imagem de uma Espanha revolucionária, anarquista, circulou com mais intensidade. Manuel Bandeira, por exemplo, lançou um vigoroso brado no poema ''No vosso e no meu coração''1, que a cada verso nega uma Espanha da opressão (''A Espanha de Franco, não!'') e afirma uma Espanha da liberdade, da criação (''Espanha atual de Picasso,/ De Casals, de Lorca, irmão/ Assassinado em Granada!'').
Aparte o caso de Lorca, pouco ou nada se conhecia da literatura espanhola contemporânea no Brasil, que ainda se nutria quase que exclusivamente dos modelos franceses. Mas em 1947, um jovem poeta diplomata chegou a Barcelona para ocupar o cargo de vice-cônsul, e guiado pelo poema de Bandeira, fez uma grande descoberta, compartilhada com o autor de Libertinagem em carta de 4 de setembro desse ano:
De Barcelona não preciso lhe dizer muito; está na Espanha e a Espanha de hoje é aquele seu estribilho, lembra-se? Eu o tenho sempre na cabeça e permanentemente estou examinando o que há de sim e de não nas coisas que vou encontrando. O que vale é que a percentagem de sins é bem grande. Há uma ''Espanha-sim'' realmente indestrutível. Nessa estou mergulhado desde que cheguei: Mio Cid, Fernán González, Berceo, Arcipreste de Hita, Góngora, Góngora, Góngora, etc. É claro que os poetas primeiro, como é claro também que a exploração não é tão cronologicamente sistemática como enumerei. Mas o é tanto quanto possível, isto é, quando o interesse pelos modernos me permite sistema. (SÜSSEKIND, 2001, p. 32)
A experiência intelectual de João Cabral de Melo Neto era inusitada para um escritor brasileiro: percorrer a história da literatura espanhola, das origens ao século XX, passando pelo Siglo de Oro. Através de cartas e do envio de livros, Cabral tornou-se o porta-voz da literatura espanhola daquele momento, como podemos observar nas cartas aos amigos Bandeira e Drummond. Mostrava que havia boa poesia na Espanha além de Lorca.
A estada em Barcelona, de 1947 a 1950, foi das mais férteis para Cabral na Espanha. Logo encontrou, embora vivendo sob repressão, um rico meio intelectual, como informou a Bandeira em carta de 20 de julho de 1948:
Entrei em contacto, aqui, com um grupo de jovens escritores catalães que publicam duas revistas. Clandestinas, esclareço, porque o catalão, desde 1939, é perseguido aqui. A princípio não podiam nem falar; a partir do desembarque dos americanos na África, passaram a tolerar a língua oral; a partir de 1945, fim da guerra, passaram a permitir os livros em catalão, se em pequenas tiragens fora do comércio; e, finalmente, de um ano para cá, permitem os livros – com restrições – mas não as revistas e os jornais. Como eu ia dizendo, acima, conheço esses jovens catalães, ávidos de intercâmbio e de que se conheça, fora da península, sua ''cultura ameaçada'' (SÜSSEKIND, 2001, p. 89)
A avidez de intercâmbio dos catalães foi em parte atendida através da publicação das traduções de ''Quinze poetas catalães'' por Cabral, na Revista Brasileira de Poesia, em fevereiro de 1949. Na apresentação, o poeta pernambucano destaca a situação do catalão como ''idioma ameaçado'', o que promoveria uma poesia ''de conscientes mais do que de inspirados''. A atitude de ''autodisciplina e lucidez'' chamou a atenção de Cabral, opinando inclusive que ''esta atual posição a que foram levados os escritores catalães – uma posição materialista diante da criação poética – talvez contenha uma sugestão digna de ser considerada por parte de poetas de outros idiomas não ameaçados'' (SÜSSEKIND, 2001, p. 278-279) O sutil recado aos poetas brasileiros revela que Cabral já se identificava com outra tradição lírica, a qual poderia ser um caminho para o romantismo discursivo da tradição lírica luso-brasileira.
Uma das revistas a que se referiu Cabral é Dau al Set (Dado de sete faces), da qual participava o poeta Joan Brossa, uma de suas grandes relações em Barcelona. Ambos discutiam poesia, como lembra o próprio Brossa:
Cabral sempre me dizia que a poesia e a arte deveriam ter algum comprometimento, mas que isso não poderia ofuscar a personalidade do artista. Na época a moda era o realismo socialista. E ele não concordava com os preceitos desse realismo, na medida em que inibiam a força individual. Para Cabral, a força individual, aquilo que é do artista, não poderia ser oprimido por nenhuma ideologia.
Sua idéia era que a poesia deveria indicar um caminho de crítica social, mas sem jamais se submeter a qualquer teoria. Era algo muito inteligente, algo que naquele momento, final dos anos 40, começo dos 50, não era discutido pelos artistas de Barcelona. Vivíamos muito limitados durante o franquismo e ele abriu novas perspectivas para nós com suas idéias. Cabral vivia a sua época e a gente não. (Cadernos de Literatura Brasileira, 1998, p. 16)
Cabral encontraria essa ''força individual'' para tratar de temas sociais na própria literatura espanhola. A leitura da poesia medieval, especialmente o Poema de Mio Cid, Gonzalo de Berceo e o Romancero, forneceu-lhe elementos para tratar de forma ''realista'' e ''popular'' a realidade do homem do Nordeste. Podemos identificar as marcas da primitiva poesia espanhola na obra do poeta publicada na primeira metade da década de 50: O cão sem plumas (1950), O rio (1954) e Morte e vida severina (1954-1955).
Mas Cabral não só freqüentou as palavras em sua frutífera temporada em Barcelona. Viu também cores e formas. Em carta a Bandeira de 17 de fevereiro de 1948, comentou o encontro com o pintor Joan Miro, que lhe vinha despertando grande interesse:
Atualmente, esse problema da possibilidade de expressão numa seleção me obceca. Ainda há pouco tempo, reconheci toda a pintura de Miro, ou melhor, seu mundo, num pequeno museu que ele tem em casa, e onde agrupa desde esculturas populares até pedras achadas ao acaso na praia, pedaços de ferro-velho com uma ferrugem especial etc. É impressionante como tudo aquilo é Miro. (SÜSSEKIND, 2001, p. 60)
Tal obsessão ganhou forma no ensaio sobre Miró2, não apenas crítica de arte plástica, mas também uma reflexão sobre a criação artística, que permeia a poesia de Cabral.
O poeta diplomata voltaria à Espanha em 1956 para fazer pesquisas históricas no Arquivo das Índias de Sevilha, em 1960, como primeiro-secretário da Embaixada de Madri, e em 1962, novamente em Sevilha. Nesses períodos, reencontrou um grande amigo, que conhecera no Rio de Janeiro em 1940. Os dois compartilhavam o amor pela Espanha.
Murilo Mendes teve seu visto negado em 1956 para ensinar Literatura Brasileira na Espanha devido a sua clara oposição à situação política, fixando-se na Itália no ano seguinte na mesma função. Mas retornou várias vezes como turista: ''Minha aversão ao regime franquista é menor do que o meu amor à Espanha, por isso visito-a sempre que posso.'' (MENDES, 1995, p. 1223)
A atração pela Espanha em Murilo vinha desde a juventude, inclusive pela língua espanhola:
Dei-me ao luxo até de, aos vinte anos, tomar um professor de espanhol. Uma vez, um escritor entrou no meu quarto e viu entre os meus livros de literatura uma gramática e um dicionário de espanhol. ''Por que você tem um dicionário de espanhol, se as nossas línguas são tão parecidas?'' Então respondi: ''pois eu não leio o Correio da Manhã sem ter ao meu lado um dicionário de português''. Justamente por se dizer que as nossas línguas são parecidas, o brasileiro durante muitos anos, séculos, não estudou o espanhol, como os espanhóis e os latino-americanos não estudaram o português. Por esse preconceito, deu-se uma grande lacuna nas relações culturais entre o Brasil e a Espanha, entre o Brasil e os países latino-americanos e vice-versa. Só no governo Juscelino começamos a ter o estudo de espanhol nos currículos escolares. Um preconceito, repito. Estudei o espanhol por minha conta, porque tinha uma atração enorme pela Espanha e tinha lido o livro de Maurice Barrès sobre El Greco, aos 17 anos. (ARAÚJO, 2000, p. 356).
Dessa maneira, Murilo já estava entrando em contato com a Espanha antes mesmo de sair do Brasil. Cabral, além de atualizar os amigos em relação à literatura espanhola através do envio de livros, frisava em entrevistas a importância do exemplo dela para novas direções na poesia brasileira, que vivia nessa época o predomínio de formas clássicas como o soneto: ''Hoje, acho que a nossa poesia deve se orientar para as baladas, para os romances. A técnica poética, quando não é aplicada a alguma coisa, põe o poeta em um beco sem saída.'' (MAMEDE, 1987, p. 131)3 E Murilo Mendes parece ter seguido os conselhos, voltando-se para sua terra através de longos poemas em Contemplação de Ouro Preto (1954). A Espanha católica já se faz presente nos versos de ''Procissão do enterro em Ouro Preto'': ''Ergue um Cristo na cruz todo em chagas aberto,/ Deus barroco espanhol, com enorme resplendor.'' (MENDES, 1995, p. 472).
Outra referência para Murilo Mendes na Espanha foi o conterrâneo mineiro Murilo Rubião, que chefiou o Escritório Comercial do Brasil na Espanha de 1956 a 1960. De Roma, o autor de Tempo e eternidade pedia para Rubião livros de Miguel Hernández, Antonio Machado e Pedro Salinas. (SOUZA, 1997: 83-84).4
Encontros, viagens e leituras sedimentaram poemas que foram publicados em Tempo espanhol (1959), ''museu de tudo'', onde convivem cidades, escritores, pintores, músicos, das origens ao século XX. Nessa ocasião, João Cabral envia uma carta a Murilo Mendes, não fugindo à comparação entre sua Espanha e a do amigo:
(...) só sou capaz de me interessar pela Espanha realista, a Espanha materialista, a Espanha das coisas. E quando uma manifestação, digamos assim, desse lado 'espiritual da Espanha que V. capta tão bem me interessa, repare que sempre o trato amesquinhando. Exemplo: as corridas de touro, coisa inadmissível a um Espanha-branca como eu: eu as diminuo às dimensões de uma lição de estética; o cante flamenco, idem. Etc. Etc. Quero dizer: sua posição intelectual é muito mais ampla e abarca as Espanhas branca e negra. Você não está dividido e pode exaltar tudo o que interessa à sua sensibilidade. Ao passo que eu, incapaz de me fechar, enquanto sensibilidade, às sugestões da Espanha espiritual, medieval, enfim, ao que um inglês atual chamaria o lado gótico da Espanha, sinto incapacidade em falar delas, incapacidade que entra, como ingrediente fortíssimo, minha aceitação racional dessas coisas. Assim, sua Espanha é muito mais total, completa, do que a minha. A Espanha do Caudillo só vê a Águia dos Áustrias; eu só vejo o galo de Morón de la Frontera (sin plumas y carareando). Ao passo que V. vê e trata dos dois. (MAMEDE, 1987, p. 128-129)
A análise precisa e lúcida de João Cabral pode ser complementada com o depoimento do próprio Murilo Mendes sobre sua relação com a Espanha:
Muitas vezes tenho me perguntado com qual país me sinto mais afim. Há alguns candidatos. Em grande parte sou de cultura francesa, mas, paralelamente, a Espanha é um país muito apropriado para um poeta. Ortega y Gasset escreveu que na Espanha a anormalidade é a norma. Ángel Ganivet escreveu que a lei da Espanha é o absurdo, sem o absurdo não se pode compreender a Espanha e seus contrastes magníficos. O toureiro, por exemplo, antes de tourear reza ajoelhado e com fé intensa. Talvez se deva a que em grande parte os árabes estiveram plantados oito séculos lá, com uma influência profunda. A Espanha me atrai porque eu gosto de tudo, menos da monotonia. Já disse uma vez a João Cabral de Mello Neto: a Itália é um país traduzido, a Espanha é um país por traduzir... (GUIMARÃES, 2001, p. 122).5
A tradução da Espanha empreendida por João Cabral e Murilo Mendes está intimamente relacionada a duas poéticas distintas. Os poemas sobre touradas – um dos grandes símbolos da Espanha e significativamente mencionadas nos dois depoimentos – podem ser um ponto de partida para a análise dessas diferenças.
As touradas chamaram a atenção do João Cabral recém-chegado à Espanha, a ponto de ele planejar uma antologia ''com poemas de autores espanhóis modernos que tenham como tema as 'corridas de touros''' (SÜSSEKIND, 2001, p. 33)6 Nesse momento, fazia apenas uma semana da morte de Manuel Rodriguez, o Manolete, cuja atuação impressionara Cabral: ''considerado o melhor toureiro que já aparecera até hoje – Seja dito de passagem que era um camarada fabuloso: vi-o algumas vezes aqui em Barcelona e imaginei que era Paul Valéry toureando...)'' (SÜSSEKIND, 2001, p.34). Nesse trecho de carta a Bandeira, já se evidencia uma associação insólita entre tourada e literatura, toureiro e escritor. Se por um lado, o projeto da antologia não vingou, por outro, Cabral transfigurou as corridas de touros em poemas como ''Alguns toureiros'', de Paisagens com figuras (1954-1955). Nas primeiras estrofes evoca os toureiros Manolo González, Pepe Luís, Julio Aparício, Miguel Baéz e Antonio Ordóñez, para os quais o tourear surge através da metáfora do ''cultivar uma flor'', nova colheita da flor de ''lânguida horticultura'' de Psicologia da composição (1947). E depois de ''alguns toureiros'' contrapõe ''o toureiro'':
(....)
Mas eu vi Manuel Rodríguez
Manolete, o mais deserto,
o toureiro mais agudo,
mais mineral e desperto,o de nervos de madeira,
de punhos secos de fibra,
o de figura de lenha,
lenha seca de caatinga,o que melhor calculava
o fluido aceiro da vida,
o que com mais precisão
roçava a morte em sua fímbria,o que à tragédia deu número,
à vertigem, geometria,
decimais à emoção
e ao susto, peso e medida,sim, eu vi Manuel Rodríguez,
Manolete, o mais asceta,
não só cultivar sua flor
mas demonstrar aos poetas:como domar a explosão
com mão serena e contida,
sem deixar que se derrame
a flor que traz escondida,e como, então, trabalhá-la
com mão certa, pouca e extrema:
sem perfurmar sua flor,
sem poetizar seu poema. (CABRAL, 1997, p. 131-132)
Da caracterização de Manolete, que funde Espanha e Nordeste através da imagem da ''lenha seca de caatinga'', revela-se a ''lição de estética'', ou melhor, a ''lição poética'', sentenciada no paralelismo dos versos finais: a correspondência entre ''perfumar'' e ''poetizar'' intensifica a falta de acessórios tanto do tourear, quanto do escrever poemas.
Quanto a Murilo, no poema ''O rito cruento'', não visualiza um toureiro singular, mas sintetiza um instante crucial:
Em Madrid numa praça de corridas
Vi o toureiro confrontar-se à morte,
Vida e morte se medindo, se ajustando
Na condensada lâmina que divide
O homem do animal:Neste rito de extrema precisão
Vida e morte afrontadas se equilibram
Ante o olho enxuto do toureiroE o gesto e palavra (cúmplices) do público.
Que a morte para o espanhol inda é hombridade. (MENDES, 2001, p. 97)
A palavra ''rito'' alude à dimensão simbólica e sagrada da tourada, que remonta ao ancestral confronto entre homem e animal, entre vida e morte. Ou ainda, ao ''lado espiritual'' da Espanha que Cabral não se sentia à vontade em tratar, merecendo apenas os versos ''o que com mais precisão/ roçava a morte em sua fímbria''. Enquanto em Cabral o tourear é ''demonstrar aos poetas'', em Murilo é a medida universal do homem espanhol.
As escolhas de ambos escritores na literatura espanhola também são indícios de diferentes interpretações da Espanha. João Cabral privilegiava ''aqueles momentos em que a literatura espanhola é realista e objetiva'', e revelava ''menos interesse pelos momentos em que ela tende para o universo e o subjetivo.'' Assim, preferia ''a épica primitiva, o 'romancero' a novela picaresca, etc.'', e se interessava menos pelo ''neo-classicismo, pela mística, pelo romantismo, etc.'' (MAMEDE, 1987, p. 132)7 Em relação aos contemporâneos, não gostava da ''poesia metafísica'', como confessou em carta de 4 de agosto de 1950 a Bandeira: ''A poesia espanhola pós-franquista é profundamente reacionária: é em Cristo, metafísica, enfim, profundamente subjetiva. Coisa que aliás confirma aquela coisa de Goethe, de que o subjetivismo é o próprio das épocas reacionárias.'' (SÜSSEKIND, 2001, p. 124-125)
O interesse de Murilo Mendes pelas várias dimensões da ''absurda'' Espanha fundamenta-se na postura universalista de sua poesia. A experiência religiosa, por exemplo, aproximou-o dos ''místicos'' San Juan de la Cruz e Santa Teresa, para os quais dedicou poemas em Tempo espanhol. E também apreciava o ''subjetivismo'' dos contemporâneos, como Vicente Aleixandre.
De qualquer modo, os dois poetas destacaram a dualidade da Espanha. João Cabral falou de uma ''Espanha branca'' e uma ''Espanha negra''. Murilo Mendes, sobre a Geração de 27, percebeu a coexistência da ''nota erudita e popular'', ''as duas grandes correntes da literatura espanhola'', ''a castelhana e a andaluza'', as quais ''representam as duas faces da Espanha, a mística e a terrena, ou por outra, a abstrata e a concreta.'' (MENDES, 1995, p. 1224). Murilo abarcou essas duas faces. Cabral, por sua vez, sob o signos do ''terreno'' e do ''concreto'', parte da experiência castelhana para entregar-se à andaluza.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, Laís Corrêa de. Murilo Mendes: ensaio crítico, antologia, correspondência. São Paulo: Perspectiva, 2000.
Cadernos de Literatura Brasileira. n. 1 - João Cabral de Melo Neto. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 1998.
FRIAS, Joana Matos. ''Um olhar nítido como um girassol'': João Cabral e Murilo Mendes. Colóquio/ Letras. Lisboa, n. 157-158, p. 63-80, jul.-dez. 2000.
GUIMARÃES, Julio Castañon. (org.). Murilo Mendes: 1901-2001. Juiz de Fora: CEMM/ UFJF, 2001.
MAMEDE, Zila. Civil geometria: bibliografia crítica, analítica e anotada de João Cabral de Melo Neto, 1942-1982. São Paulo, Nobel/ Edusp/ INL, Governo do Rio Grande do Norte, 1987.
MELO NETO, João Cabral de. Serial e antes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
MENDES, Murilo. Poesia completa e prosa. Edição de Luciana Stegagno Picchio. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1995.
_____ Tempo espanhol. Rio de Janeiro: Record, 2001.
RAMOS, Graciliano. Terra de Espanha In Linhas tortas. 16a edição. Rio de Janeiro, São Paulo: Record, 1994, p. 156-157.
SOUZA, Eneida Maria de. Vozes de Minas nos anos 40. In RIBEIRO, Gilvan Procópio Ferreira e NEVES, José Alberto Pinho. (orgs.). Murilo Mendes: o visionário. Juiz de Fora: EDUFJF, 1997, 71-87.
SÜSSEKIND, Flora. (org.). Correspondência de Cabral com Bandeira e Drummond. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Fundação Casa de Rui Barbosa, 2001.
TAPIA, Nicolas Extremera Tapia. João Cabral: de Brasil a España. Colóquio/ Letras. Lisboa, n. 157-158, p. 215-228, jul.-dez. 2000.
1 Coletânea Belo belo incluida na edição das Poesias completas (1948).
2 Joan Miro. Gravuras originais de Joan Miro. Barcelona, Editions de l'Oc, 1950.
3 Entrevista no Diário de Natal, Natal, 21 set. 1952.
4 A história da literatura espanhola mostra-se nos títulos dos livros da biblioteca de Murilo Mendes, que pode ser consultada no Centro de Estudos do escritor em Juiz de Fora: desde o Poema de Mío Cid até os poetas contemporâneos, passando por Gonzalo de Berceo, Jorge Manrique, San Juan de la Cruz, Garcilaso de la Vega, Góngora, Quevedo. Muitos dos exemplares apresentam trechos sublinhados, traços e anotações marginais, listagem na última folha de rosto dos temas mais importantes e suas respectivas páginas, constituindo um precioso material para o estudo de suas obras sobre a Espanha e de suas idéias sobre literatura e religião.
5 Entrevista a Leo Gilson Ribeiro, Veja, n. 209, São Paulo, 6 set. 1972.
6 Carta de 4 de setembro de 1947 a Manuel Bandeira. SÜSSEKIND, Flora, org. Op. cit., p. 33.
7 Entrevista ao Diário de Pernambuco em 1953.