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An. 2. Congr. Bras. Hispanistas Out. 2002

 

Um dialogo com O labirinto da solidão e Post-Scriptum de Octavio Paz

 

 

Maria Alice Aguiar

UERJ/FFP

 

 

No Pós-Scriptum de O labirinto da solidão, Octavio Paz expressa-se assim:

O labirinto da solidão foi um exercício da imaginação crítica: uma visão e simultaneamente uma revisão. Uma coisa muito diferente de um ensaio de filosofia do mexicano ou da procura do nosso pretenso ser. O mexicano não é uma essência e sim uma história. Nem ontologia nem psicologia. O que me intrigava (e intriga ainda) era menos ''o caráter nacional'' que aquilo que este caráter esconde: o que está por trás da máscara.(PAZ, 1984, p. 165).

Um problema se impõe: não ser o mexicano uma essência e sim uma história e a afirmativa de que seu ensaio aponta para uma visão e revisão do mexicano, nem ontológica nem psicológica. Para estabelecer tal discussão, busquei dialogar com conceitos que remetem ao campo da Ontologia e da Psicologia; com os fundamentos da consciência mítica e da consciência histórica.

O labirinto remete ao mito do Minotauro. Podemos dizer, por sua vez, que o leitor é um Teseu: na sua luta com o Minotauro, necessita de um fio condutor que o ajude a atravessar o labirinto da obra sem se perder por seus desvios. Assim, para dialogar com a obra Octavio Paz, procurei encontrar o mítoV - em grego, aquilo que torna singular toda e qualquer obra poética e o míqoV, fio, neste caso, o fio que costura as palavras do poeta. E, na busca do mítoV e do míqoV, percebi que a montagem do caminho a ser percorrido até o Minotauro – Os filhos da Malinche – e a senda de retorno, pelo fio de Ariadne, até a antecâmara do labirinto – Nossos dias – é simétrica no que diz respeito à estrutura. Os capítulos são oito. Do primeiro ao quarto, percorre-se uma estrada que aponta para a interioridade, atingindo o cerne do mexicano, o Centro - Os filhos da Malinche. Do quinto ao oitavo, espacializa-se um caminho dialético: ao mesmo tempo em que avança na história, recua no labirinto, traçando a volta até a antecâmara. O Apêndice é um adendo ao estudo feito, subtitulado – A dialética da solidão.

No capítulo O pachuco e outros extremos, Paz estabelece uma relação entre Narciso e o povo mexicano. Narciso, o que se viu refletido na água, e, ao se ver, conhece outro que não a si mesmo. E a reflexão da imagem na água faz um deslizamento semântico para a reflexão do refletir; ao ser refletido, reflete: quem é este que está do outro lado de mim? É desta consciência interrogante do ser que nos vai falar Octavio Paz, apontando para o mexicano-narciso, esse adolescente que flutua no ar de Los Angeles – os pachucos.

Vestimenta, linguagem e conduta singularizam-nos. Bandos jovens geralmente de origem mexicana, os 'pachucos' se negam uma definição: nem desejam voltar à sua origem nem querem fundir-se à vida americana. Participam de um eterno estar entre. Mas, a forma como o fazem é dual: ao mesmo tempo em que se rebelam pela sua singularidade, louvam a sociedade que pretendem negar. Assinala Paz que 'o pachuco' perdeu toda a sua herança - língua, costumes, religião, crenças - constituindo-se como solidão e desafio. E que a história do México é a história do homem que busca a sua filiação, a sua inauguralidade:

No vale do México o homem se sente suspenso entre o céu e a terra e oscila entre poderes e forças contrárias, olhos petrificados, bocas que devoram. A realidade, isto é, o mundo que nos cerca, existe em si, tem vida própria e não foi inventado pelo homem como nos Estados Unidos. O mexicano se sente arrancado do seio desta realidade, ao mesmo tempo criadora e destruidora, mãe e túmulo. (PAZ, Op.cit., p. 18)

Afirmando e reafirmando ser o povo mexicano extremamente religioso, fez-me pensar na importância desta insistência em sua escritura. Religião, religare, re-ligar incide sobre o que é numinoso, efeito que constitui uma condição do sujeito mas que é independente de sua vontade. Logo, a religião a que se refere Octavio Paz não diz respeito a uma determinada profissão de fé religiosa e sim, a uma consideração cuidadosa de certos fatores dinâmicos concebidos como 'potências': espíritos, demônios, deuses, leis, idéias, ideais, ou qualquer outra denominação dada pelo homem a tais fatores. Dentro de seu mundo próprio, a experiência teria mostrado serem tais fatores suficientemente poderosos, perigosos ou úteis, para merecerem respeitosa consideração, ou suficientemente grandes, belos, racionais para serem piedosamente adorados e amados (AGUIAR, 1986, p. 303). Sinaliza o crítico, por conseguinte, para uma experiência religiosa primordial. Tendo perdido não a sua religião institucional, mas a sua religiosidade, o pachuco se viu ceifado de sua origem, de seu espaço primevo que não só o inaugura como também o constitui.

Em As máscaras mexicanas, a visão adolescente do mexicano muda-se para a do homem mexicano - o 'macho', o ser fechado voltado para dentro de si mesmo - e da mulher mexicana – imagem dos homens, apenas um reflexo da vontade e do amor masculinos.(PAZ, Op.cit., p.14). Surge dai sua análise da dissimulação como essência do caráter do mexicano. Dissimulação como negatividade de si, como 'nenhumação': nenhumamos, diz Octavio Paz. E a máscara a que ele se refere é esta nadificação que o povo mexicano engendra para si próprio. E de uma maneira tão lírica quanto amarga, diz o o poeta: E se todos somos Nenhum, não existe nenhum de nós. O círculo se fecha e a sombra de Nenhum se estende sobre o México [...] (PAZ, Op.cit., p.44).

Em Todos os santos e dia de finados, passa da análise das máscaras à observação das festas. A festa constitui um tempo consagrado ao divino. Celebrada no tempo e espaço do mito, assume a função de regenerar o mundo real, imprimindo a este tempo e a este espaço uma espécie de validade ontológica. A festa tem por função fortalecer o vigor ritual, recarregar o potencial sagrado, reinstalar na realidade humana a presença total do grande tempo e do grande espaço para que se reatualize e revigore o grande Cosmos. Assim, a festa, adensando o sentimento sagrado do mexicano – o sagrado, condição de vida e porta da morte (CAILLOIS, 1979, p.22) - Octavio Paz reaponta para o sentido de morte como iluminação de vida, mostrando como o mexicano encara a morte - de frente, como algo visível e risível – ao remeter-se aos mitos axiais de Huitzilopochtli – deus solar – e Quetzalcóatl – o deus pecador que abandonou seus devotos. E acrescenta que sem a traição dos deuses, a conquista do México seria absolutamente inexplicável.

A festa, então, é uma frincha pela qual o mexicano se revela: aquele que era fechado para o mundo abre-se para a festa, para a morte. Neste passo o crítico faz uma remetência à solidão do mexicano, trazendo à baila a problemática da ruptura – leio castração - posicionamento psicanalítico de Freud sobre a relação edípica e o sentimento de solidão do ser humano. Diferentemente do animal, que já traz em seu corpo todo o conhecimento necessário à sua vida, o homem, é um ser de programação biológica atrofiada. Ao nascer, sofre a violência e a violação da falta de possibilidade biológico-ontológica. Por ser contraditório o ato do seu nascimento brota para a vida como ser nadificante, para quem o mundo não devolve nada que signifique ou faça significar.

Ser é consistência, num sentido duplo: o estar em si mesmo – physis - e o perdurar constante do estar em si mesmo - ousia. Não ser, significa desistir, sair, expulsar-se dessa consistência que emana do ser: ''existastha'', que é o mesmo que existência. Existir, então, é não ser. Desta forma, o primeiro movimento do ser humano após o nascimento será refugar a realidade, lugar de angústia e rejeição. E, recuando, refugia-se no tempo de graça – o útero – e nega o novo tempo de (des)graça – o mundo. No entanto, para aceitar a realidade do mundo que o cerca, é necessário afastar-se deste mundo primeiro, criado no plano alucinatório – o útero -, ou seja, perdê-lo. E é de sua perda que consistirá a grande nostalgia humana. O grande não. Mas é preciso perdê-lo para ganhar a possibilidade de simbolizá-lo, pois só se consegue simbolizar aquilo que se perde. Isto clarifica o fato de que, no centro, somos vazio. Este vazio, que nos faz incompletos, condena-nos à vida e ao movimento do desejo – cerne da vida. A marca do desejo é a carência. E é desta fratura que nos fala Octavio Paz. Solidão que equivale à orfandade; separação da matriz; separação da terra natal; separação dos deuses; consciência aguda de sua nenhumação. Agora, estamos chegando bem perto do Minotauro. O monstro que devemos encontrar para que consigamos, de alguma forma, a nossa independência, a nossa liberdade. O monstro metade dominado metade dominador, metade conquistado metade conquistador. Este monstro, imagem da fecundidade e da morte é o ser que está no centro do labirinto, zona do sagrado por excelência: A Malinche e os filhos da Malinche.

Todo ato de criação efetuou-se a partir do centro: o umbigo do mundo, o umbigo da Malinche, o umbigo da Chingada. Lembra Paz que o mexicano grita, durante uma hora, na festa tradicional do dia da Independência: México, filhos de uma Chingada. Ser filho de uma Chingada é assumir ser filho de uma mãe mítica, seduzida pela força do Pai e assumir a humilhação da mãe–pátria, violada pelo conquistador. Neste ponto Paz constrói a mais bela associação de todo o seu percurso pelos corredores do seu labirinto: a conquista do México acontecendo no tempo do apogeu do culto de duas divindades masculinas: Cuauhtémoc e Huitzilopochtli. Este é o deus guerreiro que sacrifica, aquele é o deus que se sacrifica. A derrota desses deuses abre o caminho para a conquista, que significou, para o mundo índio, o fim de um ciclo cósmico e a instauração de um novo reinado divino.

Huitzilopochtli, guerreiro sul, concebido sem contato carnal, cujo mensageiro de sua concepção também é um pássaro, tem a sua imagem plenamente pronta a estabelecer -se, numa sobreimposição à imagem de Cristo – força mítica trazida pelo conquistador. Cuauhtémoc, é o jovem imperador asteca, destronado, torturado e morto por Cortés. Seu nome significa 'águia que cai'. Desta forma abre-se, igualmente, outra fenda de passagem para a assimilação, pelo mexicano, desse novo deus.

Se a queda destes dois heróis abre as portas para a adoração de divindades femininas, a mãe de Cristo vai ser a figura assimilante aos próximos cultos, construindo, o povo mexicano, uma perfeita simbiose: Virgem Maria e Virgem de Guadalupe. A virgem-mãe-universal será a mensageira entre o homem deserdado e o poder desconhecido: o estranho. Guadalupe - a mãe virgem - e a Chingada - a mãe violada - instituem-se como eixos sustentantes da alma do mexicano. Ambas passivas. Guadalupe é a passividade da consolação e a Chingada, a passividade abjeta de ter-se permitido violar. Dona Malinche, amante de Cortés, retrata as índias fascinadas pelos espanhóis e a Conquista que se instaurou como uma violação no sentido histórico. Assim, Malinche, Chingada, Conquista encarnam a traição do mexicano.

Ao xingar a Malinche – México, filhos de uma Chingada – o mexicano mata o Minotauro – a mãe, mas não consegue simbolizá-la. Exterminando a matriz, ele entra só, com a solidão universal do ser, conforme mostram os estudos psicanalíticos de Freud e com a solidão particular daquele que não consegue simbolizar o espaço edênico para o qual vive desejando retornar. E volta à pauta o conceito com o qual Octavio Paz inicia a sua crítica, observando os mexicanos 'de fora' – os pachucos – e costurando seu pensamento para os mexicanos 'de dentro' – do México em si, de suas origens:

A Reforma é uma grande ruptura com a Mãe. Esta separação era um ato fatal e necessário, porque toda a vida verdadeiramente autônoma se inicia como ruptura com a família e o passado. Mas ainda nos dói esta separação. Ainda respiramos pela ferida. Daí que o sentimento de orfandade seja o fundo constante de nossas tentativas políticas e de nossos conflitos íntimos. México está tão só como cada um de seus filhos. (PAZ, Op. cit, p.82.)

Após ter feito um percurso profundo até o âmago do mexicano como Ser – ontologia – através de um método que tem por objetivo auferir níveis de desordem mental e emocional – psicanálise – o nosso ensaísta inicia um percurso de volta do centro do labirinto, partir do quinto capítulo. Este percurso de volta vai ter, como fio ariádnico, a história.

Vimos que o que fez Octavio Paz até agora foi demonstrar que a lacuna que se inscreveu no ser do mexicano foi a perda do equilíbrio entre o homem e o seu meio sócio-político-cultural. A amostragem disto se fez através do estudo da ancoragem e desancoragem mítica do ser mexicano, num retorno aos tempos do homem pré-categorial. Agora é a história que pode mostrar, como bem diz Paz, como a desancoragem do ser mexicano se realizou. Usando no retorno a trilha já palmilhada quando da busca do Minotauro, infiltra, no terreno da história todo o material mítico, psicanalítico e ontológico filtrado nos quatro primeiros capítulos.

A Conquista do México – em Conquista e Colônia - vai representar, para Paz, o suicídio dos astecas: uma parte, fascinada, procura o invasor; a outra parte, traída, escolhe a morte. Montezuma, deslumbrado com os conquistadores experimenta, com sua chegada, uma 'vertigem sagrada'. Paralelo a isto, a igreja católica acolhe os índios, abraça-os, oferece a eles um lugar no novo Cosmos. O seu sentimento de orfandade pela perda dos deuses e pela morte dos chefes encontra um eco revelador de aconchego na religião dos espanhóis.

A próxima investida histórica descortina um período que vai da Independência à Revolução. O mexicano, encharcado do pensamento e atitudes políticas do espanhol, ajuda a classe dirigente a afirmar-se como herdeiras da velha ordem espanhola. Desta forma, a Independência que não se deu quando da 'morte do Minotauro' – a possível maturidade pela ruptura com a mãe – mostra, agora, o resultado de uma postura amalgamante: a não capacidade de o mexicano investir-se de si mesmo; de não reinstalar o seu ser mexicano, começando a dar voz a um verdadeiro México. A negação da origem impede o mexicano de se constituir como tal. Não há o que resgatar.

Desta forma o libertador veste, na sua constituição, a máscara do ditador hispano-americano. A revolução mexicana, no entanto, eclode na história como revelação do ser mexicano porque o movimento brotou de seu próprio solo, do seio do povo. A figura de Zapata vai-se juntar aos legendários heróis Morelos e Cuauhtémoc.

E, Paz, diferentemente do que ele diz desenvolver em seu ensaio, faz caminhar juntas, política, ontologia e psicanálise E revê a revolução como: imersão do México no seu próprio ser; reatamento com o passado rompido pela Reforma e Ditadura; visceralidade dos fundamentos do Novo Estado que são retirados 'das entranhas'; busca de si mesmo; e, finalmente, retorno à mãe. É a 'mater saeva cupidinum'. Esta 'mater saeva cupidinum' é o grande perigo de que nos fala Nietzsche – o isolamento dentro de si mesmo – ao dizer: A solidão me envolve e me circunda, sempre ameaçadora, estranguladora, cortante esta terrível deusa e mater saeva cupidinum (JUNG, 1986, p.305). É a selvagem mãe dos desejos que intimida o recém libertado e ameaça devorá-lo. É esta a grande solidão de que fala Octavio Paz. Mas a Revolução surge como um anelo com esta mãe, como uma re-ligação, como uma festa, um excesso, um gasto, um chegar aos extremos, um estouro de alegria e desamparo, um grito de júbilo, de suicídio e de vida, tudo misturado. Sendo retorno à mãe, a revolução reveste-se do conflito que se estabelece entre o medo de ser e a satisfação de poder ser. É quando, segundo Paz, (Op. cit, p. 134) O México se atreve a ser.

O veio do capítulo sete, A inteligência mexicana, é a Educação como programa de vida, como participação ativa. A inteligência mexicana defende o país. Da Conquista até a Revolução a história do México se desenhou como uma intrincada busca de si. A revolução faz acontecer a descoberta de si e a volta às origens. Faz o México sair de si e o coloca na história, mas termina sem resolver as contradições mexicanas e, segundo o crítico, o México vive como o resto do planeta, órfãos do passado e com um futuro a ser inventado (PAZ, Op.cit. p. 138.)

Ainda na antecâmara do labirinto, ou seja, na sua quase saída, desenvolve o capítulo oito, Nossos dias, falando da força e da feição nacionalista da revolução mexicana que consistiu em edificar, a curto prazo e com o mínimo de sacrifício humano, uma obra que a burguesia européia realizou em mais de cento e cinqüenta anos. Libertou o México do feudalismo, do caudilhismo militar e da Igreja. Não pretende dizer com isto que a Revolução tenha resolvido todos os problemas do México. Mas há uma situação nova e visceral: os são mexicanos.

E o Narciso que iniciou olhando para o espelho das águas sem reconhecer, na imagem refletida., o outro de si, começa a despertar para um auto-conhecimento. Sair do labirinto ou saber mover-se nele vai depender desta maturidade. Vai depender do desenvolvimento de si mesmo para, reconhecendo-se, o México faça o seu tempo e construa o seu espaço enraizando-se na terra-mãe.

No Apêndice – Dialética da solidão – o crítico despede-se de sua restrição geográfica – México – e acena para o universalismo. E o mito do labirinto vai ser lido como eixo das atitudes humanas. Narciso, Perseu, o Santo Graal, o rei Pecador, a Idade do Ouro, Teseu, Delfos, Orfeu e Dioniso, o mistério da Santa Missa, Cristo desfilam pelo seu pensamento e fluem na narrativa como os elementos míticos que sustentam e ancoram o homem em seu Ser.

Procurei andar pari passu com a escritura de Paz e com a proposta de provar que há em O labirinto de solidão, não só um exercício da imaginação crítica; uma visão simultaneamente, uma revisão, mas também um ensaio sobre filosofia do mexicano ou a procura de seu ser, fato negado por Octavio Paz . Que há, sim, todo um profundo estudo ontológico e psicológico. Que há sim, na marca da sua linguagem a marca da essência do mexicano. Para o mexicano ser história foi necessário, antes, mostrar o seu ser essência. Para o mexicano vir a ser história, foi necessário repescar o ser pré-categorial da idade do mito; foi necessário resgatar o tempo humano que, certamente, não é o tempo histórico. Por oposição a consciência mítica, a consciência histórica vai trazer consigo a afirmação da subjetividade pessoal e da universalidade objetiva como tais. 16

E foi exatamente esta a atitude do crítico ao paisagizar o ser mítico mexicano até o capítulo quatro, e, segundo suas próprias palavras, A história que não podia dizer nada sobre a natureza de nossos sentimentos e conflitos, pode mostrar-nos agora como se realizou a ruptura e quais foram as nossas tentativas para transcender a solidão (PAZ, Op.cit. p.188). Antes da história o mito se insta como justificação da existência: alicerça o temporal sobre o intemporal e constitui um princípio de compreensão plena pela prioridade ontológica que se dá a uma verdade antecedente em valor. E foi pela repescagem do mito como fundação, como verdade profunda em nível do Ser, como ontofania, que Octavio Paz alicerçou a sua crítica. Alicerçou-a no mito como local arquetípico gerenciador das ações humanas, gerador de sentimentos e emoções. Mito como nascente do rio da História do México.

 

BIBLIOGRAFIA

GUSDORF, G. Mito e metafísica. Tradução: Hugo di Primio Paz, São Paulo: Editora Convívio, 1979, p. 22.

PAZ, O. O labirinto da solidão e Post-scriptum. Trad: Eliane Zagury, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2ª Edição, 1984, p. 195.

---------------. O ogro filantrópico. Trad: Sônia Régis, Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1989, p. 29.