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An. 1 Simp. Internacional do Adolescente Maio. 2005

 

"As possibilidades do engravidamento na adolescência: considerações sobre a construção da sexualidade feminina em contextos de periferia"

 

 

Maria Aparecida Loss; Clary M. Sapiro

Universidade Federal do Rio grande do Sul, Programa: PPG Psicologia Social e Institucional/RS

 

 


RESUMO

Esse estudo tem origem no trabalho com adolescentes em um serviço de saúde mental coletiva na cidade de Porto Alegre, RS. Nossa implicação relativa à temática da gravidez na adolescência surgiu a partir da experiência da primeira autora na realização de uma "oficina de Rap", em um grupo terapêutico para adolescentes, onde a produção escrita das adolescentes do sexo feminino deixou emergir um imaginário decorrente do exercício sexual incipiente e das possibilidades de engravidar. Neste artigo utilizamos a análise de conteúdo para investigar essa produção e adotamos o termo engravidamento para enfatizar um processo de cogitação quanto à condição de possibilidade de procriação, inaugurada na puberdade e instaurada pela atividade sexual. Optamos em revisar as contribuições da teoria psicanalítica sobre a adolescência desenvolvendo três tópicos: a descrição da atividade de grupo; a produção escrita das adolescentes, e a revisão de documentos sobre saúde sexual reprodutiva.


 

 

 

Introdução

A adolescência hoje tornou-se tema de pesquisas e projetos em diferentes campos do conhecimento. Sua complexidade nos desafia à formação de um novo paradigma, pois implica a construção de teorias que possam dar conta de uma engrenagem sutil e de uma articulação permanente entre o sujeito adolescente, seu tempo e sua cultura.

O que veremos neste artigo são experiências singulares deste processo e, considerando os contextos de periferia, podemos afirmar que as adolescências vividas pelos sujeitos deste estudo demonstraram a importância de fazermos foco sobre as cenas locais: começando pelas diferenças de gênero, passando pelas configurações familiares e geracionais, pelos valores culturais e pelas contingências sociais.

Nossa implicação relativa à temática da gravidez na adolescência surgiu a partir da experiência da primeira autora no atendimento de adolescentes em um Centro de Saúde situado numa comunidade pobre na cidade de Porto Alegre, RS. A modalidade de atendimento em grupo viabiliza os processos de simbolização e de construção de narrativas entre os sujeitos adolescentes que podem constituir novos sentidos para as experiências vividas. A realização de uma "oficina de Rap"1, em um grupo terapêutico no período de março a maio de 2004, neste local, teve como propósito instaurar entre os participantes um movimento de "contar sua história" ou "narrar uma experiência". A partir da construção destas histórias evidenciou-se no grupo uma marca relativa às diferenças de gênero. Dessas diferenças emerge um imaginário masculino, nas letras escritas individualmente pelos participantes do sexo masculino, e um imaginário feminino, nas letras escritas individualmente pelas adolescentes do sexo feminino.

O exercício que nos propusemos, para o presente estudo, inclui a análise de conteúdo das "letras de rap" escritas pelas adolescentes do sexo feminino, bem como de recortes de um documento relativo à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes. As categorias emergentes no primeiro estudo foram identificadas no próprio grupo (também pelos meninos) e apontaram para a consciência de ser mulher (tornar-se mulher); a capacidade de se cuidar; as possibilidades de engravidar e as formas de se apaixonar. Para o segundo estudo, trabalhamos com três categorias: a justificativa para prestação da assistência (relativa à saúde reprodutiva do adolescente); a relação entre partos e contaminação pelo HIV e a banalização da relação sexual.

 

Descrição da atividade em grupo ("oficina de Rap")

A abordagem terapêutica dos adolescentes no contexto da saúde mental coletiva deve priorizar o atendimento sistemático e continuado. Assim, os grupos terapêuticos com encontros semanais podem se constituir como uma alternativa eficaz para o tratamento, tanto quanto para a promoção da saúde mental e da saúde sexual reprodutiva, considerando a dimensão que a sexualidade ocupa no percurso da puberdade e da adolescência2. A partir da puberdade, o sujeito adolescente passa a habitar um corpo sexualmente maduro com relação à aptidão reprodutiva e é convocado pelo olhar de um semelhante do "outro sexo" a se apropriar de uma imagem do corpo transformada3.

As letras de Rap que analisamos mais adiante provieram de uma destas experiências terapêuticas de grupo. O grupo terapêutico era formado por quatro rapazes e quatro garotas, entre 14 e 16 anos e ocorria semanalmente no Centro de Saúde mencionado. No período de março a maio de 2004, montamos uma Oficina de Rap e o resultado nos surpreendeu, na medida em que a escrita das adolescentes do sexo feminino tematizou as formas singulares do seu envolvimento amoroso4, cotejando uma atividade sexual que poderia resultar em uma gravidez não esperada, enquanto a produção dos adolescentes do sexo masculino apresentou vivências relativas ao tráfico de drogas, uso de armas e violência na comunidade. A nossa sugestão foi de que cada um tentaria contar a sua história e transmitir a sua experiência seguindo o modelo das produções de Rap que conheciam.

Jerusalinsky (1997) afirma que o "trauma" da adolescência é não ter uma posição para falar, já que a posição infantil deve ser abandonada e a posição de adulto não lhe compete. Entre "o ato" e "o brincar", entre o "faz-de-conta" infantil e o "ter-que-dar-conta" adulto, a adolescência torna-se o momento crucial para a construção de outros recursos para a elaboração psíquica.

Enquanto a criança cria um espaço de ilusão e uma distância necessária da realidade, através do brincar, o(a) adolescente tem que se virar com uma nova condição: ele(a) está jogado na realidade da existência do sexo e do desejo, porque a partir da puberdade fica mais difícil ignorar estes desejos que sempre existiram5. A virada da puberdade é a assunção de um desejo, que é sexual e passa a recapitular as experiências infantis, traduzindo o enigma da atividade-passividade, na medida em que a passividade infantil seria a conseqüência do não engajamento de um desejo que o sujeito possa supor na cena (Corso 2004).

Para as adolescentes deste estudo, percebemos que este outro recurso de elaboração psíquica partiu de um eixo ficcional: escrever e narrar uma história a partir de uma experiência vivida. O tempo para escrever e o espaço para contar, produziu um efeito de implicação subjetiva, porque aconteceu dentro de um grupo, e refletiu um "contar-se" para os outros que busca encontrar significação para a diferença sexual, e também, produzir laços de sustentação entre a adolescente e seu lugar na feminilidade.

Retomando os objetivos deste artigo, queremos enfatizar a importância destes processos de "fabulação"6 e de simbolização entre as adolescentes, os quais justamente escapam e se furtam diante das nossas tentativas e preocupações em "informar" e estabelecer normas e cuidados para a saúde sexual reprodutiva. Para isso, precisamos escutar e deixar emergir a fala dessas jovens.

 

O que dizem as letras de Rap de três adolescentes

Na "oficina de Rap" realizada em um grupo terapêutico entre os meses de março e maio de 2004, as adolescentes Ane, Larissa e Vanessa7 apresentaram, neste espaço, as seguintes produções escritas, as quais optamos em reproduzir integralmente, antes de demonstrarmos os resultados da análise de conteúdo. Após cada letra procuramos situar três pontos de referência, os quais – ao nosso ver – amparam suas narrativas e também seu percurso no atendimento. Primeiro, seu contexto socio-familiar; segundo, o motivo de consulta e terceiro, os efeitos subjetivos do atendimento em grupo: experiência, identificação e transferência.

Começamos com Ane (16 anos completos):

"Eu vou falar/ agora eu vou falar/ Eu sou mulher e vim aqui para falar que o filho que eu fiz, eu fiz sem pensar/ Eu era tão novinha, não entendia nada/ Agora que eu vi, eu entrei numa roubada.
Mulheres da Vila8, estão aqui para falar: use camisinha, vamos se ligar/ Mulheres inteligentes precisam se cuidar. / É isso aí mulherada, vamos se unir! / Vamos mostrar para os manos que a inteligência tá aqui! Aqui na Vila, só falamos a verdade/ O que acontece aqui é a mais pura realidade. Preste atenção, porque eu não vou mentir/ Quem está falando agora é as manas MCs."

O contexto familiar de Ane inclui histórias e experiências vertiginosas de relacionamentos conturbados entre ela e sua mãe e também entre sua mãe e diferentes parceiros. Desamparo e abandono, coabitações e mudanças dramáticas de lugar, além da necessidade de elaborar o luto pela perda da avó, que precisamente teria sido a única figura com maior permanência na sua infância, constituem o pano de fundo das suas cenas de vida. Além disso, sua trajetória assemelha-se a de qualquer outro(a) jovem de periferia: a necessidade de aceitar diferentes "padrastos" e novas configurações familiares, com meio-irmãos, irmãos emprestados, irmãos de sangue, numa seqüência de interações entre fratrias que vai do espaço familiar ao espaço coletivo – irmãos de religião, irmãos de cor e de raça, irmãos da "vila", enfim "os manos" e "as manas", a propósito da filosofia e do estilo introduzido pelo rap.

O motivo que gerou seu encaminhamento ao serviço de acolhimento para adolescentes foi o fato de uma passagem ao ato, onde Ane agrediu fisicamente uma professora na escola, por esta ter-se referido à sua cor de forma pejorativa. A cena é deslocada do ambiente familiar, onde vive uma relação de hostilidade com a mãe e o padrasto, mas também dá a ver sua "atitude" como procedente deste estilo mencionado acima e que preconiza, através dos diferentes grupos de rap, o orgulho de ser "preto", o orgulho da raça e o fim da humildade (do sentimento de inferioridade). Dessa forma, "encarar" o desrespeito "burguês" e, se necessário, "revidar"9 pode ser importante.

Durante o atendimento e no momento desta produção escrita, Ane tinha provocado um aborto usando uma medicação (cytotec10), entretanto "fala" de um filho feito sem pensar e não de ter engravidado "sem querer". Esta passagem é importante porque o percurso que levou a paciente a este aborto provocado teve origem numa relação de espelhamento com sua prima. Exatamente neste período, Ane estava morando com uma tia materna e estudava na escola com uma de suas primas. O centro de sua identificação passou pela experiência da prima mais velha que engravidou e usou esta mesma medicação. A história contada pela paciente é trágica: sua prima introduziu os comprimidos no canal vaginal quando estava no terceiro mês de gestação. Houve um sangramento e ela pensou que tinha dado certo, mas enganou-se: após 3 meses, teve parto prematuro e o bebê estava morto. Junto a esta história, outras experiências vão sendo relatadas e percebo o quanto há um saber feminino que se transmite e que compõem os traços possíveis de filiação, fratria e pertencimento entre Ane e suas "primas": "as Manas". Não tardou para que ela revelasse sua própria experiência.

No texto Psicologia das Massas e Análise do Eu, Freud (1920/1981) apresenta a noção de "sintoma compartilhado", que fornece a base das identificações histéricas nas instituições para moças, no século XIX e início do século XX. Ele situa três fontes para constituir o processo de identificação: primeiro, o processo mais original e primitivo da identificação, ou seja, a identificação como "laço emocional"; segundo, como vinculação de objeto libidinal através da introjeção do objeto no ego e terceiro como percepção de uma "qualidade comum partilhada" com uma pessoa que não é objeto da pulsão sexual. Dessa forma, o tipo de laço existente entre os membros de um grupo, como no caso das moças em um internato, forneceria reforço narcísico para cada uma e para o grupo, assim como referenciais para as identificações imaginárias mútuas.

Identificações e ideais vinculam o sujeito ao grupo (amigos, familiares, colegas) inserindo-o na cena social. Este seria o desafio para o sujeito adolescente, o de criar e estabelecer vínculos e contatos. Tomando a perspectiva de Rassial (1997) para o conceito de reprodução sexual, é fundamental dar visibilidade ao contexto geracional e intergeracional, cultural e comunitário destas adolescentes, na medida em que convocam para uma relação de espelhamento, de identificações parciais e montagem de traços identitários compartilhados. É a partir da feminilidade e dos contextos de transmissão de um saber feminino, que uma adolescente irá implicar-se ou não na maternidade; irá suportar ou não uma gravidez na sua vida.

Apresentamos a seguir "a fala" de Larissa (14 anos incompletos):

"Eu tava na esquina beijando meu namorado. Foi quando eu olhei e vi que era errado. E ele disse que me amava e eu acreditei. Me chamaram de bobinha, mais um sonho que eu errei. O pensamento era longe. E era só nisso que eu pensava. E nada mais me importava. E a minha cabeça virava, meu coração amolentava e o desejo aumentava.
Não sei o que fazer meu irmão: me dê uma dica, me dê uma sugestão!
Não sei o que fazer. Não sei se vou morrer.
Não tenho muitos amigos e tenho medo de sofrer. Pra mim, naquele tempo era só amor que restava, nada mais importava.
Não sei o que fazer, sou uma menina ingênua: meus olhos dizem sim e minha boca diz não, como posso saber o que diz meu coração."

Para introduzimos o percurso clínico de Larissa, começaremos com uma história. Nosso objetivo é ilustrar as cenas familiares e destacar o lugar que ocupa um imperativo materno quando, a propósito da puberdade, surgem os "comentários" que acompanham as primeiras "regras", ou melhor, a menarca. Trata-se de um fragmento apresentado por Jean Bergès (2003) sobre um povoado na Martinica, ilha de colonização francesa na América Central, onde a mãe diz para sua filha púbere, quando esta quer sair de casa, a seguinte frase: "eu não quero que você traga uma criança para mim". O autor salienta que esta frase tem um duplo sentido na forma como é enunciada, devido ao dialeto local. O outro sentido seria: "eu não quero que você fale com um homem."

O autor mencionado refere que este enunciado denegatório da mãe funda a hipótese de uma demanda para a filha, porque afirma a existência ou a possibilidade de advir uma criança. Esta demanda suposta pela filha seria relativa a um desejo da sua mãe de que ela procriasse, intervindo imediatamente na relação entre mãe e filha, na medida em que esta última está iniciando o ciclo menstrual. Essa hipótese da filha implica um saber que está suposto na linhagem e que é desconhecido. Para Bergès (2003), a mãe passa a ocupar um outro lugar na linhagem: "ela não lhe fala como mãe, ela lhe fala como futura avó" (p.79). Assim, é importante destacar a diferença entre linhagem e filiação, porque uma é ascendente e a outra é descendente.

Bergès (2003) escreve:

"Se a linhagem é caracterizada pelo fato de sentir o corpo imaginário de seus ancestrais no seu próprio corpo (...), o desconhecimento desse saber nas articulações com o imaginário do corpo, e os efeitos que persistem da teoria sexual infantil, podem levar bem longe." (p. 86)

E, realmente, levam muitas adolescentes longe com relação às possibilidades, ensaios e experiências que irão fazer até se apropriarem do funcionamento reprodutivo do próprio corpo e verificarem alguma realidade sobre os mandatos e previsões feitos na família e no entorno.

O motivo do encaminhamento e da chegada de Larissa foi um desentendimento com sua tia que denunciou para sua mãe um namoro proibido. Larissa estava mantendo um relacionamento amoroso com um rapaz mais velho, longe dos olhos da mãe e dos familiares, entretanto fora surpreendida por esta tia delatante, que imediatamente constatou a possibilidade do exercício sexual, apesar da paciente dizer-se "ainda virgem".

Seu contexto familiar é complexo: separação dos pais e pouco contato com seu pai; história de quadros depressivos na linhagem materna: avô materno alcóolatra, tia materna com tentativa de suicídio e sua mãe que fazia uso de anti-depressivos. Esses traços familiares podem produzir identificações parciais e, considerando a passagem pela adolescência conjugada ao envolvimento amoroso, podem reativar a posição depressiva, na medida em que o objeto amoroso é sempre suscetível de ser perdido.

Kristeva (2002) vai salientar que o imaginário adolescente é essencialmente amoroso e, através da atividade de escrita, pode retomar o processo de simbolização e de elaboração fantasmática, permitindo um ajustamento das pulsões e dos signos através dos códigos imaginários disponíveis. O adolescente seria uma estrutura psíquica aberta ao recalcado, portanto precisaria repor suas identificações, suas capacidades de palavra e de simbolização, para elaborar um discurso e uma narrativa que possam integrar os eventos psíquicos. A escrita na adolescência faria esta função.

A experiência de Larissa, a qual não está aparente neste escrito que produziu, refere-se ao medo de engravidar. Quando começou a participar do grupo, contou – em sigilo – que não era mais virgem e que ninguém na sua família poderia saber. No decorrer do seu atendimento, houve episódios de atraso menstrual e de desespero quanto à possibilidade de uma gravidez, que a fizeram procurar procedimentos que lhe garantissem um "não-engravidamento", como a pílula do dia seguinte. Essas situações "embaraçosas" ocorriam, em geral, no fim-de-semana, quando ela não podia procurar ajuda no grupo ou no atendimento individual. Por isso, sua escrita aparece como um pedido incessante de ajuda, ao mesmo tempo em que, paradoxalmente, percebemos que a possibilidade do engravidamento ocorre sempre na impossibilidade de pedir ajuda, da mesma forma como sua atuação demonstra uma antecipação relativa a estar grávida e não uma atitude de prevenção para não engravidar.

Uma vez analisado o contexto de Larissa, nos reportamos à Vanessa (15 anos incompletos):

"Minha vida é complicada. Não posso fazer nada./ Sou muito rejeitada e já fui até saco de pancada./ Fazia tudo o que não podia e pensava que ia dar em alegria./ Mas percebi que era só ilusão.
No começo era só curtição: na hora ia tudo pra mente e todo mundo parecia diferente. Quando acabava parecia ser o fim./ O fim do mundo? Não, mas sim o meu fim.
Na escola não fazia nada./ Larguei meus amigos de mão, por causa de uma paixão, que não tinha razão./ Hoje podia estar grávida, mas Deus me iluminou e o exame disse não.
Pode crê, foi tudo ilusão. Olho meu passado e vejo os irmão atirado no chão e viciado nas drogas./ Mano, eu saí dessa vida torta."

Vanessa evidencia na sua escrita, o motivo de estar na psicóloga. Ela estava usando drogas. Entretanto, esta experiência demonstrou ser o menor entre os motivos.

Aos 12 anos teve um relacionamento precoce: sua mãe permitiu que seu namorado morasse na sua casa e, após 2 anos, quando se separaram, ela estava grávida. Este convívio entre eles, ambos usando drogas, resultou em fortes paixões: violência, brigas e agressões. Quando engravidou, parecia ter recuperado o vínculo perdido com a separação, mas ocorreu um aborto espontâneo, possivelmente devido ao uso de substâncias psicoativas.

Seu contexto familiar é o seguinte: mora com avó materna, uma irmã – filha de outro pai – e sua mãe. Um dado interessante, é que sua mãe tinha 15 anos quando engravidou pela primeira vez e nunca manteve um relacionamento conjugal, nem quando engravidou a segunda vez, ocasião do nascimento de Vanessa. Por isso, a paciente não conheceu o pai.

Sobre esta paciente, queremos salientar a sobreposição de duas problemáticas: a ausência de da figura masculina para a mãe e de um referencial paterno para a filha. Assim, a adolescência de Vanessa denota a impossibilidade da elaboração do lugar do pai.

Rassial (1997) constrói a noção de "passagem" na adolescência, que põe à prova a estruturação psíquica. Este processo tem a ver com a necessidade, para qualquer adolescente, de realizar - a posteriori - uma série de operações fundadoras do desenvolvimento emocional infantil constituindo, dessa forma, um trabalho psíquico. Por exemplo, o adolescente deve se ressituar imaginariamente no desejo do outro, apropriando-se do olhar e da voz como objetos parciais atribuídos à mãe. A aquisição de novos atributos corporais (aparecimento dos caracteres sexuais secundários) convoca o adolescente a se reapropriar de uma imagem do corpo transformada sob o olhar de um semelhante do "outro sexo".

Examinemos brevemente a posição freudiana11, a qual nos dará indícios de que os processos anteriores, vividos na infância, devem ser reordenados pela adolescência, dando ênfase à sexualidade e ao desligamento das figuras parentais. O destaque é dado às fantasias incestuosas que ressurgem, agora fortificadas pela energia somática e gerando um impasse que leva o jovem ao desligamento dos pais. Todavia é esta inclinação infantil até os pais, que renovada na puberdade, marcará o caminho para a eleição de objeto.

Assim estamos falando de três reedições: a reedição da fase do espelho, onde a constituição imaginária do eu ancora-se pela presença do outro; a reedição do édipo, enquanto caminho para a eleição de objeto e o impasse do desligamento dos pais com o desmoronamento da consistência parental imaginária do Outro. Assim, novamente com Rassial (1997), veremos que o Outro e o objeto adquirem um novo valor psíquico na adolescência: enquanto o Outro do lactente deve ser referido à mãe e o Outro do Édipo aos pais, o Outro do adolescente está imaginariamente ligado ao Outro sexo.

As categorias descritas a seguir emergiram dos conteúdos das letras escritas e foram sugestões dos participantes do grupo, constituindo, portanto, suas próprias falas:

1ª Categoria: "se apaixonar e perder a razão"

Paixão e excitação sexual. No momento da paixão todo pensamento racional, todo planejamento deixa de ter importância. Estar apaixonada é como entrar numa roubada, escolher acreditar em ilusões, em sonhos e em devaneios, ser levada pelo desejo (sexual) e, principalmente, perceber-se ativa na intenção de tornar-se desejável e de desejar, provocar o olhar do outro e, então deixar de enxergar o que é certo ou errado.

A: "Eu era tão novinha, não entendia nada. Agora que eu vi, eu entrei numa roubada."
L: "Eu tava na esquina beijando meu namorado. Foi quando eu olhei e vi que era errado. E ele disse que me amava e eu acreditei. Me chamaram de bobinha, mais um sonho que eu errei. O pensamento era longe. E era só nisso que eu pensava. E nada mais me importava. E a minha cabeça virava, meu coração amolentava e o desejo aumentava."
V: "Fazia tudo o que não podia e pensava que ia dar em alegria./ Mas percebi que era só ilusão. (...) Larguei meus amigos de mão, por causa de uma paixão, que não tinha razão."

2ª Categoria: "engravidar" e "não saber o que fazer"

A categoria faz emergir um impasse entre uma antecipação relativa a estar grávida e uma atitude de prevenção para não engravidar. Trata-se de um paradoxo que explicita um comportamento adolescente de não prevenção frente à possibilidade de engravidar e uma atuação relativa a ter que fazer algo a posteriori.

A: "Eu sou mulher e vim aqui para falar que o filho que eu fiz, eu fiz sem pensar. Eu era tão novinha, não entendia nada. Agora que eu vi, eu entrei numa roubada."
L: "Não sei o que fazer meu irmão: me dê uma dica, me dê uma sugestão! Não sei o que fazer. Não sei se vou morrer. Não tenho muitos amigos e tenho medo de sofrer."
V: "Hoje podia estar grávida, mas Deus me iluminou e o exame disse não."

3ª Categoria: "tornar-se mulher" e "saber se cuidar"

As adolescentes querem encontrar um lugar desde onde possam falar. Não se trata de qualquer lugar. Trata-se de um lugar de referência feminino, um lugar de "mulher", que possa – ao mesmo tempo – efetivar a passagem entre a infância e a fase adulta. Mas também um lugar que reconhece e se posiciona perante o passado. É como se recuperasse a razão e a inteligência, a capacidade de pensar, a capacidade de se cuidar e escolher seu destino, sem ilusões.

A: "Eu sou mulher e vim aqui para falar (...) Mulheres da Vila, estão aqui para falar: use camisinha, vamos se ligar/ Mulheres inteligentes precisam se cuidar. / É isso aí mulherada, vamos se unir! Vamos mostrar para os manos que a inteligência tá aqui! Aqui na Vila, só falamos a verdade/ O que acontece aqui é a mais pura realidade."
L: "Pra mim, naquele tempo era só amor que restava, nada mais importava."
V: "Pode crê foi tudo ilusão. Olho meu passado e vejo os irmão atirado no chão e viciado nas drogas./ Mano, eu saí dessa vida torta."

 

Uma Revisão de Documentos Sobre Saúde Sexual Reprodutiva

Na rede de atenção primária, as equipes de saúde utilizam materiais informativos e manuais estabelecidos pelo Ministério de Saúde. Selecionamos alguns trechos que nos pareceram mais relevantes para este estudo e trataremos de analisar a seguir.

Assim, citaremos as orientações quanto à saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes, que constam no material de distribuição exclusiva às Unidades de Saúde, com o título "Planejamento Familiar: Manual para o Gestor" e que trata, no seu capítulo 9, da "Anticoncepção na adolescência":

"O elevado número de partos entre as adolescentes, o início cada vez mais precoce das relações sexuais e o aumento das DST/AIDS nessa faixa etária justificam a prestação de uma assistência adequada às necessidades da população na faixa etária de 10 a 19 anos.(...)
A qualidade desta atenção pressupõe minimamente: boa comunicação; confidencialidade, privacidade, disponibilidade constante de insumos para a dupla proteção; (...) atenção especial as faixas etárias mais precoces (10 a 14 anos) quando na região se registra um aumento de gestação nessa faixa etária; a avaliação integral do(a) adolescente incluirá a avaliação psicossocial, além do exame físico; os/as adolescentes são o centro de interesse na entrevista e os pais e familiares só estarão presentes se ele ou ela permitir.
Recomenda-se trabalhar ações educativas de prevenção nas unidades de saúde, escola, centro de lazer, centro esportivo ou cultural entre outros.(...)
Os adolescentes podem utilizar qualquer método anticoncepcional desde que não apresentem alguma das condições clínicas que contra indiquem seu uso, conforme critérios de elegibilidade descritos para cada método."

Os procedimentos que adotamos para a análise de conteúdo deste documento incluem três passos: a leitura flutuante, a marcação de transições de significado e a interpretação através de categorias emergentes.

1ª Categoria: "Justificativa para a prestação da assistência".

Esta categoria pode se desdobrar em duas subcategorias: "o aumento" e a "precocidade". Com relação à primeira, parece evidenciar uma contradição entre a concepção do que seria "prevenção" e a necessidade de dar visibilidade ao tema através do "elevado número" ou do que seria o "aumento" do problema. Se o objetivo é prevenção, os programas e ações devem ser desenvolvidos independentemente do maior ou menor registro de casos.

O elevado número de partos entre as adolescentes, e o aumento das DST/AIDS (...) quando na região se registra um aumento de gestação nessa faixa etária (...)
Recomenda-se trabalhar ações educativas de prevenção nas unidades de saúde, escola, centro de lazer, centro esportivo ou cultural entre outros (...)

Com relação à segunda subcategoria, aparecem explicações que determinam o que seria considerado precoce e quando. Entre 10 e 14 anos as relações sexuais são precoces.

(...) o início cada vez mais precoce das relações sexuais (...) atenção especial as faixas etárias mais precoces (10 a 14 anos)

2ª Categoria:"A relação entre partos e contaminação pelo HIV".

O elevado número de partos entre as adolescentes,(...) e o aumento das DST/AIDS nessa faixa etária (...)

A produção atual de conhecimento sobre o "mal do século", sobre uma doença até pouco tempo dita incurável (AIDS) nos fez perceber o quanto o uso de preservativo (conhecido como "Camisa de Vênus") esteve por muito tempo associado à anticoncepção, ou seja, visto como mais um método anticonceptivo e, portanto, condenável aos olhos da Igreja, e servindo mais ao controle da natalidade do que ao essencial controle das doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Basta lembrar o quanto as pessoas se viram alarmadas em descobrir a necessidade do uso deste dispositivo também na prática do sexo oral, considerando a forma imperceptível do HIV comparado às DSTs.

Então, por um lado, constata-se a demora para a conscientização de que o uso de preservativos era plenamente eficaz para evitar a transmissão e o contágio de doenças sexuais, pois a lógica era mais ou menos como ouvi um adolescente dizer em um grupo: "se quero evitar filhos, transo com camisinha" e "se quero evitar doenças, não transo com doente". A mudança ocorreu dada às condições insidiosas do HIV, tais como: a dificuldade para identificar o portador ou para identificar-se como soropositivo; o longo período de incubação, sem manifestações sintomáticas; o período de janela imunológica; o acesso aos recursos para testagem e retestagem.

Por outro lado, vemos novamente surgir o mesmo equívoco, quando usamos o argumento da proteção contra as doenças e, na verdade, queremos evitar a gestação precoce. Assim, falamos em sexo protegido ou em sexo seguro, para salientar que o uso de preservativos impediu e impede a disseminação da AIDS, mas vemos o quanto este argumento serve para indiciarmos os jovens como os grandes culpados de estarem contraindo doenças e "gestações".

A atividade sexual que resulta em gravidez, supõe que os sujeitos envolvidos não cumpriram as determinações do tão aclamado "sexo seguro", então a estratégia para prestar assistência e disponibilizar informação é alarmista. Podemos explicitar a confusão entre o nascimento de uma criança e a possibilidade do contágio de uma doença letal.

Um programa de prevenção destinado aos adolescentes não deveria confundir as possibilidades de engravidar e de gerar um filho com a contaminação de um vírus. Tal orientação, tão importante, deveria tão somente, trabalhar a escuta a partir do enigma da procriação (das fantasias e ficções infantis que retornam na puberdade), as quais são esvaziadas por conteúdos nefastos como este relativo ao HIV.

3ª Categoria:"Banalização da relação sexual".

O documento dá a entender que se houver insumos para a dupla proteção, para que os adolescentes façam uso de qualquer método anticonceptivo, então os objetivos serão atingidos, na medida em que o mais importante é prevenir a contaminação pelas DST/AIDS e a gravidez.

(...) disponibilidade constante de insumos para a dupla proteção (...) Os adolescentes podem utilizar qualquer método anticoncepcional (...)

Precisamos estar atentos sobre o lugar contemporâneo do saber visto que, esse saber sobre a sexualidade constituiu um lugar "higienista". Na concepção de Rassial (2004), esse paradigma higienista na relação sexual produz um ideal de apaziguamento pela morte do outro, ou melhor, na relação ao outro sexo, esta pacificação que higieniza aparece como realização da pulsão de morte e, portanto, como lugar de gozo.

O que encontramos como patologia sexual na periferia e que se propaga numa banalização acentuada pela mídia? O autor irá responder que encontramos os estupros, as violações, os abusos e a violência sexual.

Rassial (2004) cita como exemplo a experiência do "tournante", na França: uma espécie de estupro coletivo, onde um jovem seduz uma moça e a partilha com seus parceiros. O autor refere que já é possível se estimar em 20%, o percentual de meninas que têm sua primeira relação sexual deste modo. A resposta dos jovens é a seguinte: "nós sempre usamos preservativos". Desta forma evidenciam-se duas operações contraditórias: por um lado a presença que testemunha a realização de um ato sexual, ou que compartilharia a impotência, e por outro "a negação do ato sexual", pois o preservativo pode proteger de tudo, até mesmo do amor. A impotência está na impossibilidade de uma realização coletiva do falo, entretanto o desinvestimento do caráter "sexual" do ato e a convocação de testemunhos supõem a possibilidade desta realização, efetivando a disjunção entre sexo, amor e intimidade.

 

Resultados e conclusões

Como resultado deste estudo gostaríamos de enfatizar dois pontos trabalhados até aqui: a noção de engravidamento e os processos singulares de elaboração psíquica na adolescência; o contexto intergeracional e a forma como nos comunicamos e informamos os(as) adolescentes sobre saúde sexual e reprodutiva.

Em primeiro lugar, as possibilidades do engravidar na adolescência, quando – em geral – a gravidez adolescente é suposta na nossa cultura como "precoce" e de "risco", vêm se articular com os modos singulares de viver esta passagem, ou seja, no nosso caso, com os processos subjetivos de construção e representação da feminilidade em contextos de periferia, considerando a iniciação sexual.

Engravidar não é a mesma coisa que "tornar-se" grávida. O termo engravidamento, foi adotado neste trabalho para enfatizar o processo de implicação subjetiva de uma adolescente diante da possibilidade de tornar-se grávida. Exploramos a contingência desta situação da seguinte forma: inicia com a suposição de estar grávida (suposição que revela uma expectativa de dar conta de um corpo sexuado feminino), persiste enquanto possibilidade ou dúvida e aguarda/espera sua confirmação ou certeza. Ou melhor, há uma passagem de tempo entre as mudanças provocadas pela irrupção da puberdade e o processo subjetivo de apropriação de um corpo de mulher "terminado". Assim, entre o corpo "contingente"12 e em transformação de uma adolescente e o corpo de mulher, os ensaios e experiências sexuais surgem para testar/confirmar essas novas potências. Dessa forma, identificamos intervalos temporais para o processo de engravidamento na adolescência, a partir da noção lacaniana de tempo lógico (Lacan, [;1966] 1978), onde o instante do ato sexual (sem a utilização de métodos anticoncepcionais) dá início à implicação subjetiva com este ato, através da dúvida (estar ou não estar grávida), passando por um tempo de espera e de cogitação ("fiz, logo estou") até a certeza antecipada que instaura a asserção subjetiva.

Em segundo lugar, enfatizamos a importância dos processos de simbolização entre as adolescentes, os quais justamente escapam e se furtam diante das nossas tentativas e preocupações em "informar" e estabelecer normas e cuidados para a saúde sexual reprodutiva. Antes de produzirmos materiais informativos e recursos que sirvam para todas as adolescentes, precisamos saber responder como uma adolescente antecipa a sua possibilidade de engravidar, levando em conta seu contexto social e geracional, e além disso que significações ela produz para a sua experiência sexual. Para isso, precisamos escutar e deixar emergir a fala dessas jovens.

O convívio entre gerações, a linhagem familiar e a filiação tomam um lugar privilegiado para refletirmos sobre a transmissão dos traços familiares que constitui a geração de um filho, tornando visível a dimensão coletiva e cultural desta experiência. O processo de engravidamento é vivido de forma singular, mas vem dar conta de um laço coletivo e de uma herança intergeracional.

 

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1 "Rap" é uma manifestação musical e também uma atitude relativa ao movimento Hip-Hop, que vem consagrar a narrativa como modo de transmissão oral de experiências.
2 Fuller (2001) refere a necessidade de um período de circulação sexual ou de experimentação erótica na adolescência, como equivalente ao período de preparação para o ingresso no mercado de trabalho.
3 Para Rassial (1997) trata-se da recapitulação, na adolescência, do estádio do espelho.
4 Este envolvimento dito amoroso aparece caracterizado como "paixão", nas letras produzidas pelas meninas.
5 Para Birman (1999), a novidade da teoria psicanalítica sobre a incidência do sexual, a partir da obra de Freud, é a sua abordagem desde a infância.
6 Estamos utilizando este termo para enfatizar a construção de narrativas ficcionais. Chemama (2002) define o termo ficção como estando para além do erro ou da exatidão: seria "toda construção linguageira pela qual, de maneira mais ou menos direta e mais ou menos manifesta, tentamos suturar a hiância sexual."(p. 295)
7 Tratam-se de nomes fictícios para que a identidade das adolescentes seja preservada.
8 Substituímos o nome da comunidade, citado na letra duas vezes, por "vila" para garantir o anonimato.
9 As palavras entre aspas neste parágrafo foram destacadas porque aparecem em algumas letras de rap do grupo Racionais (grupo paulista composto por Mano Brown, Ice Blue, K.L. Jay e Edy Rock), segundo destaca Maria Rita Kehl (2000).
10 Cytotec é uma medicação indicada para prevenção e tratamento de úlceras gástricas e foi lançada no Brasil em 1984. É usado ilegalmente como abortivo porque provoca fortes contrações no útero, deslocando a placenta. Em 1998, o Ministério da Saúde restringiu a venda do produto, entretanto há um comércio ilegal e de fácil acesso nas comunidades de periferia.
11 Freud ([;1905]1981), Três Ensaios Para uma Teoria Sexual: terceiro ensaio A Metamorfose da Puberdade.
12 A contingência do corpo em transformação e os aspectos defendidos pela teoria psicanalítica relativos ao abandono do corpo infantil. A metáfora do "complexo da lagosta" usada por Dolto & Dolto-Tolitch (1993) expressa a perda de referências físicas e o estado de fragilidade que o processo adolescente impõe ao púbere, o qual seria análogo ao crustáceo, quando este perde a sua carcaça para crescer, passando a ficar sem defesas e exposto aos perigos de predadores até que seu organismo produza uma nova proteção adequada para seu tamanho.