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ISBN 978-85-60944-35-4 versão on-line

An 8 Col. LEPSI IP/FE-USP 2011

 

Adolescência e educação: uma proposta de intervenção na escola

 

 

Luciana Gageiro CoutinhoI; Bruna Osório de OliveiraII; Saulo Nunes de SouzaIII

I Professora Adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense.   Coordenadora do projeto Adolescência, Educação e Inclusão Social
II Aluna de graduação em Psicologia, bolsista de iniciação científica Pibic/UFF
III Aluno de graduação em História, bolsista de iniciação científuca Faperj

 

 

Este trabalho origina-se de uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense intitulada Adolescência, Educação e Inclusão Social, cuja proposta baseia-se na realização de grupos de reflexão em escolas como uma forma de investigação e intervenção junto aos adolescentes em seus dilemas frente à educação no mundo contemporâneo.  Para isso trabalhamos na interface entre a psicanálise e a educação, buscando construir um diálogo que seja fecundo para as questões que a adolescência nos coloca hoje.

O encontro do adolescente com a Educação e com a escola envolve bem mais do que a aquisição do conhecimento, possibilitando o estabelecimento de laços sociais e afetivos, bem como a ampliação dos horizontes culturais e humanos que o constituem enquanto sujeito.  Quanto a isso, o depoimento do próprio Freud a respeito de sua experiência como jovem na escola, no artigo "Algumas reflexões sobre a psicologia do escolar" ([1914]1974), revela o valor inestimável das relações com os professores e com os outros alunos, segundo ele, em grande parte responsável por quem se tornou no futuro.  De fato, supomos que o laço do adolescente à escola e as experiências vividas na escola tomam parte no trabalho subjetivo da adolescência, tal como é concebido em psicanálise.

A definição de adolescência na psicanálise com a qual trabalhamos, parte das indicações iniciais de Freud ([1905]1972;[1914]1974), articulando-as com as contribuições atuais a ela através das teorias lacaniana (Alberti, 2004; Rassial, 2000; Lesourd, 2004) e winnicottiana (Winnicott, [1962]2001; [1968]1975; Jeammett, 2005).  A adolescência implica o afastamento do Outro parental da infância e o re-encontro com o Outro da cultura.  Nesse sentido, o material simbólico que é ofertado pelo social e pela cultura, cuja transmissão é feita em grande parte na escola, tem participação importante nesse processo. Estabelece-se assim um ponto de encontro entre a educação e a subjetivação adolescente.

Como já foi dito, temos como pressuposto que a travessia adolescente implica na possibilidade de novas inscrições do laço social a serem feitas pelo jovem.  Não é à toa que os adolescentes são tão afeitos aos grupos, que lhes proporcionam um meio de identificações e de partilha de experiências no momento de uma reafirmação da pertença ao meio sociocultural em maior escala.  Assim, como já trabalhamos anteriormente (Coutinho, 2009), a busca espontânea dos adolescentes pelos grupos de pares, pelas chamadas "tribos" contemporâneas, expressa um trabalho subjetivo em curso. 

A proposta de trabalho nos grupos de reflexão com jovens na escola surge, em parte, por favorecer a investigação e a intervenção exatamente numa situação de sociabilidade entre os adolescentes, ao mesmo tempo, atravessada pela instituição escolar. Nesses grupos o trabalho com a transferência ganha um lugar privilegiado e fundamental.  Entendemos o conceito de transferência no âmbito deste trabalho, menos enquanto repetição de um laço a uma pessoa e mais como um laço ao significante que, dirigido ao Outro/analista, carrega uma significação, um saber inconsciente, tal como acontece com o sintoma. Assim, como diz Miller (1987), a transferência é a atualização da realidade do inconsciente, do Outro que constitui o sujeito enquanto rede de significantes que promovem o desejo e os modos de gozo.

A intervenção nos grupos de reflexão pressupõe que o psicanalista, ou alguém que seja atravessado pelo discurso da psicanálise, possa sustentar essa função, ao garantir um lugar de fala e acolhimento das questões que afligem os adolescentes em um setting diferente da clínica privada, no caso na escola, como já tem sido feito por alguns psicanalistas hoje (Gavarini, 2009, Lacadée, 1999/2000; Santiago, 2008, Coutinho & Rocha, 2007). No entanto, ao contrário de se identificar com o sujeito suposto saber, fornecendo as respostas e os significados, promovendo com isso um saber fechado ao qual os adolescentes devam se submeter e em torno do qual devam se identificar – o que faria com que o trabalho fosse puramente imaginário -, o psicanalista deve garantir um lugar de alteridade, onde as falas possam ser endereçadas e re-apropriadas pelos sujeitos para que possam se situar diante do Outro, produzindo um saber em nome próprio.  O método adotado nestes grupos inspira-se na "conversação", trabalhada pelos pesquisadores dos Laboratórios do CIEN (Lacadée, 1999/2000), mas inclui a oferta de algum material de interesse dos adolescentes (filme, fotos, câmera) que possa funcionar como disparador para o trabalho.

 

O desafio do trabalho com o grupo  "autonomia"

Em 2009 iniciamos um contato com a Escola Estadual Leopoldo Fróes, em Pendontiba, Niterói.  Ao apresentarmos a proposta da pesquisa à escola, foi-nos sugerido o trabalho com turmas de alunos multirepetentes que fazem parte de um projeto novo, em andamento na escola, proveniente de uma parceria da Fundação Roberto Marinho com a Secretaria de Estado, o projeto Autonomia. O trabalho com estas turmas nos pareceu interessante por incidir exatamente sobre um grupo de alunos com problemas de engajamento no sistema escolar, uma vez que nossa pesquisa incide justamente nos impasses presentes na relação entre o adolescente e a escola hoje.

Autonomia é o título de um  samba de Cartola, que, reforçado pelos ideais de Paulo Freire, no livro Pedagogia da Autonomia (Freire, 1996), trouxe a inspiração para o Projeto Autonomia no Rio de Janeiro. É um programa de Educação baseado nos Telecursos que tem por objetivo escolarizar alunos do Ensino Fundamental e Ensino Médio que estão em distorção idade-série.  O projeto, desenvolvido pela Fundação Roberto Marinho e a FIESP( Federação das Indústrias do Estado de São Paulo ), é oferecido pela TV, mas também em parceria com o Governo de Estado do Rio de Janeiro em algumas escolas.

Trabalharemos aqui com o material relativo a uma turma do projeto, com a qual tivemos  oito encontros no primeiro semestre de 2010. Apresentamo-nos à turma como pesquisadores da universidade interessados em conhecer mais sobre os jovens e sua relação com a escola.  Éramos três no trabalho com esta turma, sendo uma professora/coordenadora da pesquisa e dois estagiários de iniciação científica. Fizemos uma proposta a eles de, durante nossos encontros,  conversarmos sobre os jovens e a escola e realizarmos algumas atividades, mediadas por fotos e filmes, que eles mesmos poderiam produzir com uma câmera que disponibilizamos para isso. Já neste primeiro dia, evidenciamos algumas marcas da transferência que deu o tom dos encontros.  As expectativas em relação ao trabalho eram de "um tempo de férias", "um tempo livre", de não ter "as aulas chatas" do telecurso.  Apresentaram-se  a nós como "a turma de repetentes" da escola e não mostraram muito interesse em saber sobre nós.  Apenas uma menina pergunta sobre a universidade e as relações de amizade que se pode fazer por lá.  Ali entre eles, predominava o barulho, a zoação de um com o outro e a dificuldade de sustentar uma fala individual, o que se traduzia em falas como: "ele não falou, eu também não vou falar"; "deixa pra lá, eu não disse nada"; eu quero ver as fotos porque eu quero apagar a minha"

A seqüência dos encontros reforçou essa configuração.  Propusemos algumas atividades em grupo, tais como a realização de um painel com fotos de jovens ou a escrita de um diálogo a partir de uma cena de sala de aula. Nas atividades em grupo, observamos a ausência de diálogo entre eles, cada um fazia alguma coisa isoladamente, sem acordos.  Isso não significa que eles não falavam, o barulho era novamente uma marca do grupo.  Falavam sobretudo para depreciar o que o outro fazia, sempre num tom de deboche e brincadeira bastante agressivos. 

Em relação à nossa presença, predominava a indiferença ou tratamento equivalente ao utilizado na relação com as professoras: "posso beber água?"; "olha, ele está escrevendo errado";  "Veja se está certo".  Muitos simplesmente não se engajaram no trabalho e contribuíam para dispersar o grupo da proposta.  Uma das alunas nos pede uma atividade que "não precise falar tanto" e outro, em resposta à idéia de fazermos um jogo, nos pergunta: " o que vamos ganhar nesse jogo?" Ao final dos encontros, era comum ouvirmos frases paradoxais como despedida: "tchau, até mês que vem" e "fiquem mais, até às cinco horas..."

Como entender essas demandas aparentemente tão paradoxais?  Como manejar o trabalho com esta turma, diante de alguns limites colocados pela escola, tais como a impossibilidade de trabalharmos só com os alunos voluntários, que desejassem participar do projeto?  Como trabalhar com a situação de uma turma cuja configuração moldada pela escola reforça nos alunos a identificação com o lugar de "repetente"? Entendendo a alienação  como o sujeitar-se ao campo da linguagem, próprio do humano, em contraposição à separação que possibilita o acesso ao discurso e à posição de desejante, não podemos deixar de notar que a oscilação desta báscula depende não somente das razões estruturais do sujeito, mas também da posição que o Outro assume no discurso social e institucional.  Parece-nos que temos na turma "autonomia" uma situação de alienação instituída cuja configuração, ironicamente; dificulta imensamente à produção de um discurso próprio, singular, por parte de cada um dos alunos. 

O trabalho com a turma autonomia foi perpassado por inúmeras interrogações, discutidas nos encontros dos grupos de pesquisa que aconteciam semanalmente e nos quais eram pensadas as estratégias para o encontro seguinte.  A direção do trabalho com os adolescentes foi a de tentar confrontá-los com suas falas, atos e produções, seja nos momentos de conversar sobre o material produzido por eles coletivamente, seja no planejamento da continuidade dos encontros.  Pouco a pouco fomos percebendo que as atividades que exigiam muito planejamento e organização se aproximavam demais do modelo escolar, o que esvaziava a possibilidade de um discurso próprio deles, tornando-se assim desinteressantes para nós e para eles.  Assim, passamos a iniciar cada encontro retomando o que havia surgido no anterior e introduzindo como tema de trabalho as questões que surgiam ali no contato conosco.

Um dos momentos em que essa estratégia de devolver a eles as questões que apareciam nos pareceu produtiva se deu quando, em meio a uma tentativa de conversa sobre a autoridade dos professores – após a sugestão deles próprios para que fôssemos mais duros, sob o argumento de que "se deixar a gente faz bagunça"; delegamos a eles a tarefa de conduzir a turma como professores.  Esta proposta surpreendeu a turma que, por uns instantes, silenciou como em resposta a uma bronca.  Mas, depois de nossa insistência em nos mantermos sentados, alguns passam a representar o papel de professores e, pela primeira vez, a atenção da turma toda é despertada e concentrada.  As dramatizações tiveram sempre um tom de comédia, e as cenas provocaram risos e participação da turma toda.  De modo geral os alunos se manifestavam muito mais pela "pose" e trejeitos do que pela fala. Surge um professor de sexologia, um professor de dança e uma professora dando explicações sobre como os homens deveriam tratar as mulheres.  Chama-nos a atenção para a entrada em cena do corpo e do sexo.  Será que há lugar para o desejo na rotina escolar à qual estão submetidos?  Se não há, como fica a participação da escola no trabalho da nova amarração dos três registros que é exigido ao adolescente?  Será que o gozo com a bagunça não expressa uma experiência do real que não encontra inscrição em outras amarrações possíveis?

As dramatizações continuaram no encontro seguinte e sugerimos fazer um pequeno filme delas com nossa câmera.  Interessou-nos o fato de reforçar, com a câmera, a inauguração de um olhar Outro sobre eles, aberto às suas falas e às suas produções.  Aparece na cena um jogo de forca proposto pela professora, onde o significante "burros" é a palavra a ser adivinhada.  Não há nenhuma reação ou questionamento da turma sobre o aparecimento dessa palavra, mesmo após os instigarmos a pensar nisso.  Reação semelhante se deu quando, durante a exibição dos filminhos no nosso último encontro com eles, questionamos o barulho constante que impossibilitava ouvir os diálogos de forma mais nítida.  Para nossa surpresa, nem os alunos, nem a professora presente no dia, manifestaram incômodo algum com o barulho.  Pelo contrário, gostaram muito de assistir aos filmes e pediram para vê-los novamente.

 

Da "autonomia" ao laço possível com a escola

No trabalho com a turma autonomia identificamos um mau encontro entre escola (e instituições educacionais) e alunos, com consequências subjetivas importantes. Constatamos que os adolescentes da turma "Autonomia" demonstram uma impossibilidade de sair do lugar que lhes foi imposto, o lugar de repetentes, alunos-problema. A proposta do projeto "Autonomia", que pretensamente visa incluir aos alunos com problemas na adaptação escolar, criando uma turma especial para os alunos que tem uma maior dificuldade de aprender, acaba por reforçar a exclusão e ao apego dos sujeitos a esse lugar, o lugar dos alunos "burros" e "repetentes".

A turma autonomia nos convoca a pensar sobre a indisciplina e a relação de oposição que os alunos estabelecem com a instituição educativa e os professores. Para psicanálise, como lembra Jerusalinsky (1996), disciplinar é tentar garantir que a criança ou o adolescente seja um adulto a quem nada falta, porém essa é uma tarefa impossível. Essa expectativa, por parte da sociedade, de fabricar uma criança ideal, faz com que qualquer imprevisto que surja seja considerado como um desvio em relação a uma norma. Isto é, todo imprevisto vai ser visto como um incidente da indisciplina, ao invés de ser visto como a diferenciação, que habita o campo subjetivo.  A indisciplina marca então a presença do sujeito na situação educacional.

Vale evocar aqui também o pensamento de Henry Giroux (1986) que, através de um olhar foucaultiano, trabalha com o conceito de resistência para criticar as teorias de reprodução em educação, que visualizam de forma unilateral a relação entre a instituição escolar (e seus representantes) e alunos dentro do processo de aprendizagem.  Nesse sentido, rejeita a idéia de "fracasso escolar". Para Giroux, a resistência apresenta-se de forma crítica e desconstrutiva em relação àquilo a que ela faz frente; é um ato intencional e consciente de libertação.  A resistência se diferencia, então, da acomodação e da oposição.  Segundo Giroux o comportamento de oposição absorve a lógica de dominação ao invés de desafiá-la, e acaba por se transfigurar no oposto da resistência, na acomodação.

Voltando à turma autonomia e a indisciplina reinante no grupo, devemos vê-la como resistência ou  acomodação?  A psicanálise vem em nosso auxílio para sair desta cilada dicotômica na medida em que parte do pressuposto de que o sujeito é sempre dividido, não é inteiramente senhor dos seus atos.  Nesse sentido, como ressalta Melman (1994) a oposição da criança ou do adolescente à educação deve ser vista de um ponto de vista dialético, já que tal oposição preserva a educação recebida ao mesmo tempo que a anula. 

Se consideramos que todo sujeito dividido está implicado em seu ato, em tudo aquilo que faz e fala para além do que está previsto, pensamos a indisciplina como um ato.  Cabe então a nós a pergunta sobre como os adolescentes da pesquisa respondem por seus atos.  É possível para eles se reconhecer nos seus atos, falar sobre eles e dar um sentido próprio a eles, para além daquele que é dado pelo discurso pedagógico?  O que vimos no grupo foi muito mais uma impossibilidade de dizer de si, um dizer além do barulho coletivo, única forma encontrada por eles para falar. Notamos que esse barulho silencioso, ou esse silêncio barulhento, não parecia incomodar nem os alunos nem as professoras, mostrando assim estar presente sempre. Pudemos notar também que nos poucos momentos em que conseguimos ouvir alguém individualmente, normalmente era para falar do outro, para zoar e quase nunca para falar realmente de si mesmo, havendo assim uma dificuldade muito grande de se sustentar uma fala. Pouquíssimas vezes o discurso saiu do caminho da brincadeira coletiva e se singularizou, mas alguns alunos conseguiram falar um pouco sobre a família, sobre seus sonhos, sobre problemas que tiveram ou têm na escola, mas sempre pareciam hesitar, não entrando em detalhes, respondendo como que para se livrar da obrigação.

Lacan definiu o acting out (Lacan, [1962-63] 2005) como uma transferência selvagem que precisa ser domesticada colocando cada um dos elementos em questão em seu lugar, a fim de  desfazer o laço agalmático entre o sujeito e o objeto e situar o Outro em seu campo. Assim, o agir na transferência consiste em um modo de responder ao Outro quando o sujeito não tem mais um hiato que o separe dele.  Demanda para que o Outro mantenha-se em seu campo.  Isso significa que para além da alienação, a dimensão do agir na transferência comporta um apelo.  Assim, o agir nos revela que, paradoxalmente, para se separar do Outro, é necessário encontrar o Outro.  Num momento em que a falta falta, trata-se de tentar, com o agir, no caso em questão com o confronto, fazer furo no Outro e encontrar uma maneira de se separar dele.

Resta aos educadores pensar sobre como acolher esse apelo, sem cair numa oposição que reforçaria a alienação, mas também sem se furtar ao encontro.  É interessante notar uma distinção na posição ocupada pelas duas professoras que trabalham com a turma (em dias alternados) no que diz respeito ao modo de responder à transferência a elas dirigida.  Pudemos notar isso nas conversas e contatos que tivemos com elas durante o período em que realizamos os encontros com a turma. Uma delas responde de maneira reativa à indisciplina dos alunos, exigindo deles uma mudança de postura e afirmando, inclusive na presença de nossa equipe, que "eles não querem nada e assim não vão ser nada na vida"1. Já a outra professora, conta que apesar de ter tido muito dificuldade com o comportamento dos alunos no início do ano, notou uma mudança na atitude deles com o passar do tempo.  Diz ter se surpreendido com atos de carinho da turma para com ela e com o empenho deles em cuidar do ambiente e do material que fica na sala reservada para a turma.  Esta professora é mais flexível em relação às exigências do projeto - como, por exemplo, o trabalho com tele-aulas - e mais criativa no que diz respeito às atividades que propõe a eles2.  Essa mesma professora se integrou mais ao nosso trabalho e até aproveitou algumas das produções feitas conosco, como fotos e filmagens, para seu trabalho com a turma.

A diferença no manejo da turma adotado pelas duas professoras nos remete à idéia já trabalhada por Kupfer (1995) e por Lajonquière (1996) da diferença entre o discurso pedagógico mais tradicional, que se dirige ao aluno ideal e um outro, mais próximo do discurso psicanalítico, marcado pela falta e pelo impossível da educação.  No caso da professora que teve mais sucesso na relação com os alunos, de fato, podemos identificar o discurso de um mestre não-todo, que sustenta seu lugar e seu valor na transmissão, sem identificar-se ao lugar de todo saber que implicaria num embate com os adolescentes.  Desta forma, talvez essa professora tenha facilitado a circulação discursiva e desejante dos alunos, de forma que o saber por ela transmitido tenha tido valor, não de coerção, mais de oferta de significantes para que os sujeitos adolescentes possam se apropriar na construção de um discurso próprio.

 

Bibliografia

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1 Apesar do constrangimento de estarmos presentes nesse momento e da interferência em nosso trabalho que isso poderia representar, optamos por aproveitar a situação para falar sobre com eles e assim dar uma direção ao trabalho no sentido de problematizar essa "briga" deles com a escola.
2Entre tais atividades, destacamos a realização de entrevistas feitas pelos alunos da turma com ex-alunos do projeto "autonomia" que já estavam no ensino médio.