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An. 3. Enc. Energ. Meio Rural 2003

 

Incidências ambientais de aproveitamentos de baixa potência em Portugal

 

 

Carlos Alberto MariotoniI; Frederico Fábio MauadII

IDCC, FEC/NIPE/AISPE-FEM, UNICAMP, Universidade Estadual de Campinas, 13083-970, Campinas, SP
IIDepartamento de Hidráulica e Saneamento, Escola de Engenharia de São Carlos, USP,
13560-970, São Carlos, SP Tef: (016) 273-9525 fax: (016) 273-9550

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Neste artigo descreve-se, sumariamente, a situação atual do processo de licenciamento de aproveitamentos de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH's) em Portugal e analisa-se os aspectos ambientais e a legislação que regulamenta. Aborda-se o problema dos impactos cumulativos e sinergísticos resultantes da presença de vários aproveitamentos numa mesma bacia hidrográfica e, discute-se as conseqüências, em termos de futura gestão de recursos hídricos. São apresentadas algumas incidências ambientais previsíveis deste tipo de aproveitamento, em função das suas características e localização, assim como as discussões das medidas de minimização dos impactos.

Palavras-chave:Pequenas Centrais Hidrelétricas, Recursos Hídricos, Energia e Meio Ambiente, Impactos Ambientais, Legislação e Regulação.


ABSTRACT

This work presents a brief discussion about the recent situation of licencing the construction of small hydroelectric power plants in Portugal, and also analyses the environmental aspects as well as the regulating legislation. Both the cummulative and the sinergetic impacts from the presence of various hydroelectric plants at the same hydrografic basin are also discussed, with special emphasis to the interference of the future hydraulic resources management. The expected environmental impacts related to both the location and characteristics of the small hydroelectric power plants are important to establish the minimization of the environmental impacts.


 

 

INTRODUÇÃO

Desde a entrada em vigor da nova regulamentação da produção de energia em Portugal, pela iniciativa privada, com o decreto-lei n° 189/88 de 27 de Maio e Portaria n° 445/88 de 8 de Julho, tem-se verificado um elevado número de pedidos de autorização de utilização de água, na Direção-Geral dos Recursos Naturais – (DGRN, 1998), relativamente à produção de energia elétrica.

Os pedidos são, na sua maioria, de empresas particulares, muitas delas constituídas especificamente para este efeito. Existem também pedidos de indústrias e autarquias. Neste último caso o empreendimento não se limita à produção de energia elétrica sendo, geralmente, para fins múltiplos.

Verifica-se uma maior incidência de pedidos na região Norte e Centro, nomeadamente nas bacias hidrográficas dos rios Minhos, Cávado, Lima, Douro, Vouga e Mondego. Em alguns cursos de água, o numero de empreendimentos propostos ultrapassa quinze, havendo dois ou tres pedidos para um mesmo local.

Esta situação pode trazer problemas graves para o ambiente. E, mesmo que o empreendimento seja considerado isolado, e sozinho não apresenta efeitos significativos, pode, em conjunto com outros empreendimentos, vir a alterar irremediavelmente, as condições naturais de equilíbrio do meio circundante. Ainda que cada um dos aproveitamentos previstos para uma dada bacia hidrográfica esteja dispensado de realização de um estudo de Impacto Ambiental (EIA), tal como definido na futura legislação de Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), quando se considera o conjunto dos aproveitamentos numa mesma bacia os impactos podem vir a ser graves. São estes, os chamados impactos cumulativos e sinergísticos, que devem ser previamente analisados.

Nas circunstâncias atuais, em Portugal, onde se pretende implementar um novo sistema de gestão de bacias hidrográficas, a autorização da implantação de dezenas de novos empreendimentos hidráulicos poderá comprometer irreversivelmente a futura gestão de recursos hídricos. Há que se fazer uma análise integrada do problema, de forma a cminimizar os efeitos da ausência de planejamento e do uso intensivo dos recursos hídricos.

É conveniente que se efetue uma análise conjunta dos diferentes projetos propostos para uma mesma bacia hidrográfica e, que se analise as diferentes interações entre eles, de modo a escolher as combinações de empreendimentos mais convenientes para cada bacia. Dessa forma, tenta-se, simultaneamente, minimizar as repercussões sobre o meio ambiente e maximizar a rentabilidade energética.

Esta situação é problemática, uma vez que o proponente só pode analisar os seus pedidos e, como para uma mesma bacia hidrográfica podem existir pedidos de outras entidades, isto impossibilita que os próprios proponentes realizem a análise conjunta para a bacia, como seria desejável.

Pelo lado da administração pública, como os pedidos não chegam todos ao mesmo tempo, existe uma certa dificuldade para que eles sejam analisados conjuntamente. Além disso, a legislação estabelece que a data da entrega do processo é determinante para a atribuição de prioridades, no caso de existirem vários pedidos para o mesmo local ou que interfiram entre si, o que dificulta a escolha de uma combinação ótima dos aproveitamentos.

Frente a esta situação, a solução é analisar-se seqüencialmente os vários pedidos, atendendo a sua ordem de entrada, e conceder licenças do uso da água até atingir-se o limite a partir do qual os efeitos cumulativos e/ou sinergísticos, atinjam proporções suportáveis limites. Este procedimento levará possivelmente à escolha de soluções não adequadas em termos energéticos e ambientais, mas frente à impossibilidade de um prévio planejamento, este é o processo mais viável de licenciamento.

Mesmo a avaliação dos pedidos individuais tem-se revelado problemática ,uma vez que a portaria n° 445/88 apenas exige, com relação aos elementos ambientais, a inclusão, no pedido, da caracterização da vegetação circundante , da topografia e da documentação fotográfica. Estes elementos são insuficientes para avaliar se o projeto terá ou não efeitos negativos sobre o meio ambiente; desse modo, a portaria n° 445/88 acaba por não dar cumprimento às exigências do decreto lei n° 189/88, no sentido de evitar-se "a grave lesão do interesse público, nomeadamente o grave dano para o meio ambiente" e a garantia de que "a utilização da água é, em cada situação, a mais adequada frente aos usos existentes e previsíveis". No entanto, a grande maioria dos estudos apresentados, até a presente data, nem sequer refere-se aos aspectos mínimos requeridos pela portaria n° 445/88, o que provoca que a análise das incidências ambientais não tem sido possível até o momento.

Tendo em vista a análise destas incidências ambientais, elaborou-se uma matriz de impactos, quando são consideradas, por um lado, as principais fases do projeto e, por outro, as principais componentes ambientais podem ser potencialmente afetadas pelo empreendimento.

Apresenta-se os impactos mais significativos que se pode esperar dos empreendimentos de PCH's, discutindo-se de que maneira diferem dos impactos ambientais dos aproveitamentos hidrelétricos de maiores dimensões. São igualmente discutidas as medidas mais adequadas com vistas à minimização desses impactos.

 

IMPACTOS NO AMBIENTE GEOFÍSICO

No caso de açudes descarregadores com soleira livre, a retenção de sedimentos e nutrientes não terá tanto significado como no caso das barragens, embora a erosão à jusante possa ser superior, em função da altura da crista do descarregador. Os problemas de erosão também podem ser incluídos na fase de construção.

 

IMPACTOS NO MEIO HÍDRICO

A maioria de aproveitamentos de PCH's recorre à solução do pequenas barragens com descarregador de soleira livre, geralmente de altura inferior a 10 metros. Nestes casos, a subida do nível da água à montante não será muito acentuada, não ensejando a formação de um grande reservatório. A alteração do regime hidrológico será neste caso menos pronunciada, dado que a capacidade de regularização deste tipo de obras é relativamente reduzida. Contudo, se a vazão afluente for integralmente turbinada, o trecho do rio compreendido entre a barragem e a restituição poderá ficar completamente seco. Este problema se agrava em função da extensão da adução. Será praticamente nulo no caso das centrais com casa de máquinas junto à barragem. Em qualquer dos casos há necessidade de assegurar-se uma vazão sanitária no trecho do rio à jusante do aproveitamento. O cálculo desta vazão deverá atender simultaneamente à vazão reservada (consumos de água à jusante para irrigação, abastecimento público e industrial, etc.) e à vazão sanitária necessária para preservar os ecossistemas aquáticos e ribeirinhos à jusante (Mariotoni et all, 1999).

Em termos de qualidade da água não se observa alterações significativas, nem problemas de eutrofização da água, sendo aconselhável que se proceda ao desmatamento e limpeza da área a ser inundada. Por outro lado, o descarregador da pequena barragem poderá provocar um arejamento importante, contribuindo para o incremento do oxigênio dissolvido no trecho à jusante do aproveitamento.

A diminuição da vazão do curso de água entre a captação e a restituição diminui a sua capacidade de diluição de poluentes. Torna-se, portanto, necessário conhecer quais as fontes poluidoras industriais e domésticas situadas entre aqueles dois pontos e, prever a necessidade de manter-se uma vazão adicional para assegurar a capacidade auto-depuradora do curso de água, nas situações onde as fontes poluidoras se mantenham.

Durante a fase de construção poderá verificar-se um aumento temporário do teor de sólidos suspensos, como conseqüência direta das obras ou em função do resultado do incremento dos processos erosivos a eles associados (Moniton et all,1994).

 

IMPACTOS NA BIOTA

O principal impacto incidirá sobre a ictiofauna, cuja circulação será impedida pela presença do empreendimento. Este problema poderá tornar-se grave nos cursos de água onde está prevista a instalação de aproveitamentos em "cascata", em que a cota de retenção de cada aproveitamento coincida com a cota de restituição de aproveitamento imediatamente à montante. Nesta situação poderá se provocada a transformação de praticamente todo o curso do rio de um meio lótico para um lêntico, com as conseqüentes alterações em nível biótipo. Nestes casos, a população piscícola poderá ficar, de tal modo, "compartimentada", que os problemas de isolamento genético e reprodução poderão, até mesmo, inviabilizá-la completamente.

A instalação de escadas de peixes ou outros dispositivos que permitam aos peixes transporem o açude ou barragem poderá, em alguns casos, minimizar este tipo de impacto. Porém, para que estes dispositivos sejam eficazes é necessário que sejam escolhidos, dimensionados e localizados de acordo com as espécies existentes e as características do local. No entanto, há que se entender, que em certas situações, a eficácia destes dispositivos é reduzida. Por outro lado, em cursos de água com vários aproveitamentos, a probabilidade de os peixes conseguirem transpor as sucessivas escadas de peixe diminui muito com o número de obstáculos a serem ultrapassados.

Se a vazão sanitária não for adequadamente calculada, de forma a atender às necessidades da ictiofauna, esta poderá também ser afetada negativamente. O mesmo pode acontecer aos ecossistemas ribeirinhos à jusante do empreendimento. A área crítica será, em ambos os casos, aquela que se situa entre a captação e a restituição do aproveitamento.

A formação de um reservatório poderá também ter impactos negativos sobre a biota, especialmente através da inundação da área ribeirinha à montante do aproveitamento. Mais uma vez, os descarregadores de soleira livre com altura reduzida não apresentarão, à princípio, maiores problemas, por provocarem a inundação de uma área relativamente reduzida.

A movimentação do pessoal e maquinaria durante a fase de construção poderá afetar negativamente a vegetação circundante. Esta poderá, também, ser afetada pela construção de acessos e outras obras auxiliares. Portanto, essas atividades deverão ser restritas às áreas devidamente assinaladas e vedadas. As áreas de extração e deposição de inertes deverão ser selecionadas de forma a evitar-se as áreas com interesse do ponto de vista ecológico. Será aconselhável sua localização em áreas de cobertura vegetal reduzidas e, quando possível, na área a ser inundada pelo reservatório. Após a conclusão das obras e infra-estruturas auxiliares, as áreas deverão ser recuperadas de forma a repor, tanto quanto possível, a situação inicial, nomeadamente através de medidas do replantio da vegetação.

As vazões de adução a céu aberto poderão representar um obstáculo à circulação da fauna. Este impacto poderá ser minimizado através da identificação dos locais preferenciais de passagem de animais e da instalação de coberturas sobre o canal nesses locais (Henriques, A.G. , 1998)

 

IMPACTOS SÓCIO-ECONÔMICOS

Uma parte considerável dos empreendimentos propostos localiza-se em vertentes inclinadas, visto que a perda de terrenos agrícolas não será, em geral, muito significativa; para isso contribuí a subida do nível das águas relativamente reduzida, que o empreendimento irá provocar, na maioria dos casos. Porém, haverá situações em que poderão ser verificadas perdas apreciáveis de terrenos agrícolas. Estas poderão resultar também do corte de terrenos pelo canal de adução e pelo conduto forçado. O corte que estas estruturas introduzem poderá dificultar, ou até inviabilizar, a exploração agrícola dos terrenos, ainda que não sejam tão significativas em termos de área ocupada.

O aproveitamento de uma pequena central hidrelétrica poderá, também, afetar as áreas de irrigação situadas à jusante, especialmente aquelas que se situam entre a captação e a restituição da água, que poderão ter diminuídas as suas disponibilidades de água para irrigação. O mesmo poderá acontecer relativamente a qualquer outro uso da água à jusante, tal como o abastecimento público ou industrial.

A reduzida dimensão dos reservatórios leva a crer, à princípio, que este tipo de empreendimento não apresenta maiores problemas, no que diz respeito ao corte de vias de comunicação, embora a presença do canal de adução possa interferir com a circulação de pessoas. Este impacto poderá ser facilmente minimizado mediante a instalação de acessos para passagens nos locais mais freqüentados.

Estes aproveitamentos poderão ter impactos econômicos importantes, na medida em que afetam a exploração de recursos piscícolas, nomeadamente através da interferência com piscicultura e dos efeitos sobre a circulação da ictiofauna.

A subida do nível das águas à montante provocada pela presença da barragem poderá afetar a integridade de edifícios ou outro patrimônio construído, localizados nas margens do curso da água, ou ocasionar a perda de patrimônio arqueológico localizado na área a submergir. A reduzida dimensão que esta área ocupa, na maioria dos casos, faz com que estes impactos não sejam, geralmente, muito significativos. O aumento da erosão à jusante poderá por em risco a integridade de edificações e outras estruturas.

Ao contrário de outros tipos de empreendimentos hidráulicos, não é previsível que os aproveitamentos de pequenas potências induzam a um desenvolvimento econômico significativo a nível local, dado que a sua finalidade é quase que exclusivamente a produção de energia para a rede da concessionária (essa é a modalidade mais favorecida pela atual legislação). No caso em que o aproveitamento está diretamente associado a uma indústria ou que está inserida em aproveitamentos de fins múltiplos, o empreendimento poderá ter impactos muito significativos a nível local. No segundo caso torna-se, contudo, necessário compatibilizar os diversos usos (irrigação, piscicultura, recreação, etc.) ou selecioná-los, de forma que interfiram o mínimo possível entre eles.

Outro aspecto importante em termos sociais está ligado à aceitação do empreendimento por parte da população local: se a população se sentir prejudicada porque as desapropriações foram mal conduzidas, ou por não terem sido garantidas as vazões para irrigação ou abastecimento à jusante, ou por tornar inviáveis explorações agrícolas, poderá interferir com o aproveitamento do aproveitamento hidrelétrico. Este aspecto será de difícil controle, uma vez que o funcionamento da maioria dos aproveitamentos será automático, não existindo vigilância no local. É, portanto, indispensável que a implantação do empreendimento se faça de comum acordo com a população local e que o proponente respeite integralmente o que for estipulado nesse acordo.

 

RUÍDO

A princípio, a única fonte de poluição sonora durante a fase de exploração será a central elétrica e, convém que ela se situe longe das povoações, ou que seja devidamente insonorizada.

Na fase de construção poderá verificar-se aumentos significativos, e temporários, dos níveis de ruído, especialmente se for necessário recorrer-se aos explosivos ou a outros processos de construção ruidosos (especialmente no que diz respeito à escavação no canal de adução em substratos rochosos).

 

IMPACTOS PAISAGÍSTICOS

A presença da barragem e de outras obras auxiliares constituem-se num impacto estético que está muito dependente das características do local, das dimensões da obra e de sua futura integração na paisagem local. Os impactos paisagísticos serão mínimos no caso de barragens de altura reduzida, onde o canal de adução é subterrâneo. Em outras situações, o impacto paisagístico poderá ser minimizado através da instalação de vegetação apropriada. As linhas de média tensão a serem instaladas entre a central elétrica e a rede já existente, e a construção de acessos poderão constituir-se num impacto paisagístico importante em áreas naturais.

O recurso a materiais da região nos acabamentos finais da PCH e obras associadas poderá, em alguns casos, contribuir para a minimização de eventuais impactos paisagísticos. A pintura do conduto forçado em cores adequadas em relação à paisagem circundante, poderá contribuir para a redução do impacto estético daquelas estruturas.

 

RISCOS

A presença dessas pequenas centrais poderá aumentar os riscos de inundação. Por outro lado, há que se considerar os riscos resultantes da eventual ruptura da barragem, aspecto que será de pouca relevância no caso de barragens de altura reduzida.

Para a análise de todas estas incidências deverão ser levadas em conta as características dos empreendimentos e as suas localizações. Se o pedido de licença for para um local situado numa área definida como protegida pela legislação portuguesa, existe a necessidade de fazer-se um estudo mais detalhado do estado do ambiente, e de quais vão ser as conseqüências, durante e após, a construção do empreendimento. Nestas áreas é necessário solicitar-se parecer ao Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza. Numa fase posterior, de licenciamento da obra, o parecer do SNPRCN é de caráter vinculativo.

No caso do local considerado ficar situado numa área de Biótopo definida de acordo com o programa CORINE, deve-se dar especial atenção aos aspectos ambientais, mesmo que seja com detalhamento inferior ao dado às áreas protegidas.

A ausência de uma boa caracterização ambiental em Portugal significa um sério obstáculo para à análise das incidências ambientais, problema que se torna particularmente grave nas áreas de biótopo; a localização exata e a caracterização destas áreas de elevada sensibilidade/importância em termos ecológicos não se encontram disponíveis. Por outro lado, deve-se registrar que existe um grande número de pedidos que se incidem nestas áreas.

A localização de uma PCH numa área protegida ou de biótopo não vai, por si só, inviabilizar o processo, constituindo-se, no entanto, um importante fator condicionante. Ou seja, nestes casos há que se dar maior atenção à análise das incidências ambientais e exigir-se a aplicação de medidas de minimização adequadas. Nota-se que neste último aspecto, as PCH's apresentam uma relativa flexibilidade em termos de alternativas viáveis, por suas reduzidas dimensões, que permitem a consideração de soluções menos ruins do ponto de vista do ambiente, sem que se comprometa a rentabilidade energética do empreendimento. Todos os empreendimentos localizados fora das áreas protegidas ou biótopo, porém, não são analisados detalhadamente, sem que isto signifique incidências menos agravantes que nos casos anteriores, já que existem locais de alta importância do ponto de vista ambiental, mas que não se encontram classificados.

No que se diz respeito à obrigatoriedade de realização de estudos de impacto ambiental, essa é determinada, essencialmente, pelas características do empreendimento e, de acordo com os critérios previstos nas propostas de Decreto Lei de Avaliação de Impacto Ambiental, uma vez que não está ainda publicada em Portugal a legislação que regulamentará a Diretiva 85/337/CEE. De acordo com aquelas propostas, só necessitam apresentar EIA completo os projetos que tenham uma ou mais das seguintes características: altura da crista da barragem superior a 15 metros; extensão da barragem superior a 50 metros; volume do reservatório superior a 106 m3; área do reservatório superior a 10 há e, condições especiais de fundação ou outras características que possam por em risco as populações à jusante. Nos demais casos, o empreendedor deverá apenas fornecer os elementos mínimos para que se possa avaliar quais as incidências sobre o ambiente, resultantes da construção e exploração dos empreendimentos.

Este tipo de procedimento não pode ser sugerido indiscriminadamente, pois um empreendimento com 20 metros de altura, que tem que apresentar um EIA pode, eventualmente, ter menores incidências ambientais do que um com 13 metros de altura, para o qual não é obrigatória a apresentação desse estudo. Assim, deve-se analisar os projetos caso a caso e, em função das suas características, estabelecer-se o grau de exigências em termos ambientais, (Mariotoni et all, 1999).

Aliás, esta consideração de diferentes graus de exigências ambientais poderá vir a ser regulamentada através da implementação da legislação de AIA, onde será possível estabelecer-se diversos tipos de estudos consoante a significância dos impactos ambientais em questão.

Para que a instalação de empreendimentos (PCH's) causem impactos mínimos sobre o ambiente é importante:

Rever o Decreto Lei n° 189/88 e a Portaria n° 445/88, de forma a dar maior atenção aos aspectos ambientais;

Disponibilizar as informações já recolhidas pelo Programa CORINE em relação às áreas de biótopo;

Proceder o levantamento de informação de base, no sentido de obter-se uma caracterização ambiental mínima e adequada para as bacias hidrográficas;

Analisar os empreendimentos de uma forma conjunta e integrada, e não caso a caso.

 

CONCLUSÕES

Adotando-se as medidas técnicas que podem evitar a eutrofização do reservatório e, que assegurem a manutenção de uma vazão adequada para os sistemas naturais e humanos à jusante dos aproveitamentos, espera-se que a qualidade da água não seja prejudicialmente afetada e, os outros usos da água não sofram danos significativos .

Os principais impactos não minimizáveis decorrentes da construção de barragens são as perdas de terrenos agrícolas e os ecossistemas terrestres inundados pelo reservatório. O obstáculo criado à circulação dos peixes migradores nas barragens de grande altura, pode ser considerado como um impacto de dimensões não desejáveis e distorcivas. Contudo, em barragens de menor altura, a instalação de dispositivos adequados à transposição da barragem pelos peixes, permite minimizar esse impacto. O desalojamento das populações e a perda das explorações agrícolas importantes para sua subsistência, constituem-se, muitas vezes, em impactos dificilmente minimízaveis e, que devem merecer uma maior atenção das autoridades, comparada com a que tem sido dada até agora.

Os riscos oferecidos pelas barragens para as populações à jusante podem ser significativos e, podem gerar um sentimento de insegurança nestas populações.

A criação de um reservatório também poderá provocar impactos positivos, pelas potencialidades que abre em termos de usos múltiplos (irrigação, psicultura, navegação, lazer, abastecimento de água, etc.), que se forem devidamente explorados podem trazer eventuais benefícios diretos ou indiretos à comunidade como um todo. Mas, o fator mais importante, do ponto de vista do empresariado, sempre acaba sendo o aumento da capacidade de produção de energia elétrica e os lucros adquiridos, o que pode catalizar novos investimentos e a participação da iniciativa privada. No que diz respeito aos impactos ambientais dos aproveitamentos mini-hídricos é fundamental levar em consideração o problema dos efeitos cumulativos e sinergísticos, dado o grande número de pedidos existentes e sua concentração elevada em certas bacias hidrográficas. Com isto, embora um empreendimento, quando considerado isoladamente, possa não Ter efeitos significativos sobre o meio ambiente, pode, em conjunto com outros empreendimentos, vir a alterar irremediavelmente, as condições naturais de equilíbrio.

A implantação de um elevado número de empreendimentos mini-hídricos poderá também Ter repercussões negativas sobre a gestão de recursos hídricos em algumas área de Portugal. Este problema surge em decorrência do processo de licenciamento de aproveitamentos mini-hídricos não estarem enquadrados numa política integrada de recursos hídricos. Podem portanto surgir situações em que a implantação desses empreendimentos vem a condicionar ou mesmo comprometer definitivamente as futuras hipóteses de gestão da água.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à CAPES pela concessão de bolsa PDEE-Programa de Doutoramento com Estágio no Exterior, para estágio do Prof. Frederico F. Mauad junto ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), Lisboa, Portugal. Agradecem, também, ao LNEC pelo inestimável apoio e atenção.

 

REFERÊNCIAS

[1] Centro de Estudos em Economia de Energia, dos Transportes e do Ambiente (1998). Aproveitamentos mini-hídricos – realização de um empreendimento ao abrigo da nova legislação; apresentação de uma candidatura ao programa VALOREN. Direcção Geral dos Recursos Naturais, Lisboa.

[2] Henriques, A. G. (1998). Avaliação do impacto ambiental de aproveitamentos mini-hídricos. Seminário sobre Energia Mini-Hídrica, Porto, 15-17 Dezembro 1998.

[3] Ministry of Water Conservation, China (1985). Chinese experiences in mini-hydropower generation. Small Hydropower Series, n 3. United Nations Industrial Development Organization, New York. 122 pp.

[4] Moniton, L. , Le Nir, M.& Roux, J. (1994). Les Microcentrales Hydroeléctriques, Paris. 188 pp.

[5] Mariotoni, C. A , Mauad, F. F - Novos Rumos do Setor Elétrico Brasileiro Discutindo-se a Inserção de Pequenas Centrais Hidrelétricas, IV Simpósio de Hidráulica e Recursos Hídricos dos Países de Língua Oficial Portuguesa, 1999, Portugal

[6] Mariotoni, C. A ., Mauad, F. F. – Vantagens da Viabilização de Pequenas Centrais Hidrelétricas Relativamente ao Planejamento Energético Estratégico no Estado de São Paulo – Brasil, IV Simpósio de Hidráulica e Recursos Hídricos dos Países de Língua Oficial Portuguesa, 1999, Portugal

 

 

Endereço para correspondência
Carlos Alberto Mariotoni
e-mail: cam@fec.unicamp.br