3, v.2Estudo de motorização de um sistema de abastecimento de águaEnergia solar no meio rural amazonense: aspectos sociais e influência no sistema de produção author indexsubject indexsearch form
Home Pagealphabetic event listing  





An. 3. Enc. Energ. Meio Rural 2003

 

Utilização da energia excedente junto a usina hidrelétrica de Itaipú para a síntese de amônia para fertilizantes nitrogenados

 

 

Samuel Nelson Melegari de SouzaI; Ennio Peres da SilvaII

IUNIOESTE/Campus de Cascavel /CCET, Rua Universitária, 2069 CEP 85814-110 Cascavel, PR, Fone (0**45)2252100 r.249 Fax (0**45)2223600
IILaboratório de Hidrogênio, Universidade Estadual de Campinas/IFGW/UNICAMP, Cx. P. 6039, CEP 13083-970 Campinas SP, Fone/Fax (0**19)2891860

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A energia secundária pode ser descrita como o excedente de eletricidade em uma hidrelétrica devido a baixa demanda de energia em certos horários e excesso de água nos reservatórios durante os períodos chuvosos do ano. Neste estudo é proposto o uso da energia excedente em Itaipú Binacional para produção de hidrogênio eletrolítico e amônia para fertilizantes nitrogenados. A amônia é matéria prima para a síntese de fertilizantes nitrogenados e em sua produção são utilizados o hidrogênio e nitrogênio do ar. Foi determinado neste trabalho, o custo mínimo de produção de hidrogênio e sua capacidade de produção correspondente. Levando em consideração o mercado de amônia para fertilizantes nitrogenados na Região Centro/Sul estimou-se a melhor capacidade de produção para uma planta de amônia a ser instalada junto a Itaipú. O processo de produção de amônia eletrolíca via energia excedente é o mais favorável do ponto de vista ambiental.

Palavras-chave: Hidrogênio; amônia; fertilizantes nitrogenados


ABSTRACT

Secondary energy can be described as a surplus of electrical energy in a hydropower because the lower demand of energy in some times of the day and the excess of water in the reservoir during the rainy periods. In this study is proposed the use of the excess of energy at Itaipú Binacional for electrolytical hydrogen production and ammonia for nitrogenous fertilizers. Ammonia is raw material for nitrogenous fertilizers synthesis and for its production is used hydrogen and nitrogen of the atmosphere. It was determined in this paper the minimal cost of hydrogen production and the capacity of hydrogen production, with this datas and according the ammonia market for nitrogenous fertilizers in the Centre/Soulth region was estimated the better capacity of ammonia production for one plant close of Itaipu. The process of ammonia production using energy excess is the most environmental acceptable.


 

 

INTRODUÇÃO

A usina hidrelétrica de Itaipú localiza-se na na região Sul, entre o Brasil e Paraguai, no Rio Paraná. Ela tem uma potência instalada de 12600MW e atualmente é a maior planta hidrelétrica do mundo suprindo com eletricidade o Brasil e o Paraguai.

Durante o ano uma usina hidrelétrica apresenta um excesso de eletricidade, pois o reservatório da mesma é dimensionado para atender a carga quando ocorre uma situação hidrológica desfavorável. Também ocorre, quando uma usina tem um sistema de transmissão subdimensionado em relação a produção de energia, havendo um vertimento de energia turbinável. Este excedente de eletricidade pode ser denominado de energia secundária.

A energia secundária, por ser de origem hidráulica, pode ser caracterizada como uma fonte renovável de energia e também durante sua geração não há emissão de poluentes na atmosfera, ao contrário do que ocorre com a produção de eletricidade via combustíveis fósseis, tais como carvão mineral e gás natural (geração termelétrica). Sendo portanto uma fonte de energia que pode ser inserida nos objetivos de um desenvolvimento sustentável.

A energia elétrica pode ser armazenada de várias formas. Uma delas é transformá-la num outro produto, como por exemplo o hidrogênio eletrolítico (processo de eletrólise da água), que possui muitas vantagens adicionais, dentre elas o fato de poder ser usado na síntese de amônia para fertilizantes nitrogenados.

Neste estudo foi proposto o uso da energia secundária disponível em Itaipú para a produção de hidrogênio eletrolítico e uso deste produto na síntese de amônia para fertilizantes nitrogenados. Determinou-se o custo mínimo de produção de hidrogênio junto a Itaipú e a correspondente capacidade de produção. A partir de dados teóricos estimou-se a quantidade de amônia que poderia ser produzida com o hidrogênio junto a Itaipú. Com os dados de fertizantes nitrogenados importados e aqueles distribuídos ao consumidor final estimou-se o mercado de amônia na região Centro/Sul para a síntese de tais fertilizantes e estimou-se a capacidade da planta de amônia possível de ser instalada nas proximidades de Itaipú.

 

HIDROGÊNIO E AMÔNIA ELETROLÍTICA

O hidrogênio é produzido via eletrólise, o qual é um processo onde a água é dissociada em hidrogênio e oxigênio, pela aplicação de uma corrente elétrica contínua num meio condutor iônico, ácido ou básico, entre dois eletrodos inertes, ânodo (positivo) e cátodo (negativo). Esse processo é realizado por meio de eletrolisadores [1].

Na síntese da amônia utiliza-se o processo Haber-Bosch, que independe do tipo de produção de gás de síntese (eletrólise, reforma de gás natural, etc.). Neste processo são utilizados o nitrogênio do ar e hidrogênio como matéria prima para produção de amônia [2].

A amônia, no Brasil, é utilizada principalmente na produção de fertilizantes nitrogenados, tais como uréia (46% N2), nitrato de amônio (33% N2), sulfato de amônio (21% N2), sulfonitrato de amônio (26% N2), nitrocálcio (21% N2), fosfato mono amônio (11% N2), fosfato diamônio (16% N2) e nitrofosfato (20% N2). Cerca de 96% da amônia produzida no Brasil é utilizada para este fim [2],[3].

Na produção de amônia por reforma de gás natural, são emitidas 0,859 ton de dióxido de carbono (CO2) para produção de 1,0 ton de amônia, sendo que este gás é o principal responsável pelo aquecimento global da terra (efeito estufa). A maior parte da amônia no Brasil é produzida via reforma de hidrocarbonetos leves (nafta, gás natural, gás de refinaria, etc.), onde o valor médio de produção de CO2 seria de 0,706 ton para cada 1,0 ton de amônia produzida [4].

 

METODOLOGIA

DISPONIBILIDADE DE ENERGIA SECUNDÁRIA EM ITAIPÚ

A TABELA I mostra os dados de energia secundária disponível em Itaipú entre os anos de 1994 e 1999. Estes dados foram coletados junto a Superintendência de Operação de Itaipú [5].

 

 

ENERGIA NECESSÁRIA PARA PRODUÇÃO DE HIDROGÊNIO ELETROLÍTICO JUNTO A ITAIPÚ

Uma planta de hidrogênio com pequena capacidade de produção pode ser suprida totalmente com energia secundária de Itaipú. Em plantas de hidrogênio com grandes capacidades de produção, em alguns meses do ano, não há energia secundária suficiente, sendo que, neste caso, é necessário o uso de energia firme do sistema. Com isso foram estabelecidas equações empíricas para a previsão da quantidade de energia secundária e firme variando-se o tamanho da planta de hidrogênio.

De acordo com a TABELA I, entre os anos de 1994 e 1999 houve uma sobra mínima de energia secundária de 105433MWh (junho de 1996) em relação aos outros meses.

Uma planta eletrolítica com capacidade de produção de 40000 Nm3/h de hidrogênio utiliza 121733 MWh/mês de eletricidade (DE), com um consumo de 4,4 kWh/Nm3 de hidrogênio produzido, o qual pode ser determinada por

onde

DE – Consumo mensal de eletricidade da planta de hidrogênio (MWh/mês);

Cp – Capacidade da planta de hidrogênio (1000 Nm3/h);

E – Consumo de eletricidade (= 4,4 kWh/Nm3);

T – Disponibilidade da planta de hidrogênio (= 8300 horas/ano).

Utilizando os dados da TABELA I, foi observado que entre os anos 1994 e 1999, do total de 65 meses, em 4 meses (junho 1996, agosto 1996, setembro 1996 e maio 1999) o suprimento da planta de 40000 Nm3/h com energia secundária não seria completo, porque a disponibilidade desta energia é abaixo da demanda da planta, que é de 121733 MWh/mês

Com a observação feita acima é possível formular a equação 2, que mostra o número de meses por ano (P) onde cada planta de hidrogênio não é suprida com energia secundária (ver TABELA II)

 

 

onde N é o número de meses nos quais a capacidade de produção de hidrogênio não é suprida totalmente com energia secundária.

A planta com capacidade de produção de hidrogênio de 40000 Nm3/h, de acordo com a TABELA II, não pode ser suprida durante 0,74 meses por ano.

Na TABELA I, a disponibilidade mínima de energia secundária é 105433 MWh/mês (junho 1996), então para uma estimativa mais segura, foi suposto que esta disponibilidade mínima pode chegar a 100000 MWh/mês (Dmín), sendo Dmín chamado de disponibilidade mensal mínima de energia secundária.

Durante os meses onde a energia secundária não é suficiente, a planta tem que ser complementada com energia firme da rede (Ef). Através da equação 3 foi calculada a energia firme utilizada para complementar a demanda elétrica da planta de hidrogênio por ano em adição a energia secundária

onde

Ef – Energia firme (MWh/ano);

Dmín = 100000 MWh/mês

Por meio da equação 4 obtém-se o consumo total de energia elétrica da planta de hidrogênio

onde

Et – Consumo total de energia elétrica (MWh/ano)

A energia secundária necessária seria

onde

Es – Energia secundária (MWh/ano)

CUSTO DE ENERGIA ELÉTRICA PARA PRODUÇÃO DE HIDROGÊNIO

O custo da energia elétrica necessária para produção de hidrogênio pode ser determinado como uma média entre o custo da energia firme da rede (sistema) e o custo da energia secundária

onde, Ce, custo da eletricidade para produção de hidrogênio (US$/MWh), e, Ef, energia firme da rede (MWh/ano), Tf é o custo da energia firme (US$/MWh) e Ts é o custo da energia secundária (US$/MWh).

CUSTO DO HIDROGÊNIO PRODUZIDO EM ITAIPU

Por meio de formulações econômicas determinou-se o custo de produção de hidrogênio, o qual é representado pela equação

mas a capacidade de produção de hidrogênio (CP) deve estar entre 1000 e 100000 Nm3/h

onde

Ch – Custo do hidrogênio (US$/Nm3);

F – Fator de recuperação de capital;

hR – Eficiência do equipamento elétrico;

hEL – Eficiência de eletrólise;

d – Taxa de desconto anual (%);

n – Tempo de amortização do investimento(ano);

OM – Custo de O&M (0,06);

T – Disponibilidade da planta de hidrogênio (horas/ano);

Ce – Custo da eletricidade (US$/kWh);

F – Fator de recuperação de capital;

Cp – Capacidade da planta de hidrogênio (1000 Nm3/h).

Os dados econômicos e técnicos utilizados para os cálculos são mostrados na TABELA III. Os custos da eletricidade para produção de hidrogênio, Ce, foram determinados pela equação 6, utilizando-se um custo para energia firme de US$ 40.00/MWh e tomando-se três possibilidades de preços de energia secundária (A, B e C) para simulação [6].

 

 

A - Preço de energia secundária de US$ 0.00/MWh

B - Preço de energia secundária de US$ 5.00/MWh

C - Preço de energia secundária de US$ 10.00/MWh

Por meio da equação 7 foi possível determinar o custo mínimo de produção e a correspondente capacidade de produção de hidrogênio (capacidade ótima).

AMÔNIA PARA FERTILIZANTES NITROGENADOS

A síntese da amônia é um processo que requer uma grande quantidade de hidrogênio, cerca de 176, 47 kg de hidrogênio para a produção de 1 tonelada de amônia [4]. A reação do processo de produção de amônia, a uma temperatura de 25oC é a seguinte

Para a produção de uma tonelada de amônia é necessário 0,822 toneladas de nitrogênio (N) [7].

Logo utilizando-se as relações estequiométricas acima foi possível estimar, para efeito de cálculos, o hidrogênio necessário para síntese de amônia e a quantidade de amônia para produção de nitrogênio.

 

RESULTADOS

A TABELA II mostra o número de meses por ano (P) em que cada planta de hidrogênio não pode ser suprida totalmente com energia secundária de Itaipú. Numa planta de hidrogênio, a ser instalada junto a Itaipú, que apresenta uma capacidade de produção de 70000 Nm3/h, há em média 1,29 meses por ano onde a planta não pode ser suprida totalmente com energia secundária.

Utilizando-se a equação 7 determinou-se os custos de produção de hidrogênio (Ch) em função da capacidade da planta (Cp) e custo da energia elétrica (Ce), utilizando-se custos de energia secundária de 0.00, 5.00 e US$10.00/MWh (A, B, C) e um custo para energia firme de US$ 40.00/MWh [6], ver TABELA IV. A TABELA II e FIGURA I mostram essa variação do custo do hidrogênio em função de Cp e Ce.

 

 

 

Na TABELA V tem-se os custos mínimos de produção de hidrogênio e a capacidade de produção de hidrogênio correspondente (capacidade ótima) para os três preços de energia secundária utilizados nos cálculos. Se a energia secundária não for cobrada (US$ 0.00/MWh) então o custo mínimo de produção de hidrogênio é de US$ 0.045/Nm3 e tem-se uma capacidade de produção correspondente a 36000 Nm3/h, com a energia secundária a um custo de US$ 10.00/MWh o custo do hidrogênio é US$ 0.090/Nm3 e a capacidade de produção ótima é de 39000 Nm3/h, sendo este valor o mais próximo da realidade, pois na geração de energia secundária a empresa terá um certo custo.

 

 

O nitrogênio (N) distribuído ao consumidor final na área Centro/Sul (região centro oeste, sudeste e sul) foi de 1011482 ton./ano (1230513 ton./ano de amônia) em 1995, sendo que a capacidade de produção de amônia foi de 567600 ton./ano (Centro/Sul), contabilizando-se um déficit de produção de amônia de 662913 ton/ano (levando em conta a importação de amônia). Conclui-se que há mercado na área centro-sul para implantação de uma planta de amônia de 2009 ton/dia no mínimo (ano comercial de 330 dias/ano) [7], [8].

 

CONCLUSÃO

Analisando-se o mercado de amônia para fertilizantes nitrogenados verificou-se que é possível a implantação de uma planta de amônia de 2009 ton/dia, e de acordo com as capacidades otimizadas de produção de amônia junto a Itaipú, as quais são mostradas na linha 3 da TABELA V, observou-se que a amônia produzida em Itaipú pode suprir cerca de 24% desse mercado. A produção de 474 ton/dia de amônia via o processo de reforma de hidrocarbonetos leves produz uma emissão de 335 ton/dia de CO2 , utilizando o processo eletrolítico este dano ambiental poderia ser evitado.

Com a instalação de uma planta de amônia junto a Itaipú, empresas do setor de fertilizantes poderiam instalar-se na região próxima a Itaipú formando um pólo de fertilizantes, o que seria de grande importância do ponto de vista de desenvolvimento regional.

 

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Superintendência de Operação de Itaipú pelo fornecimento dos dados de energia secundária.

 

REFERÊNCIAS

[1] - SILVA, E. P. .Introdução a Tecnologia e Economia do Hidrogênio. Editora da UNICAMP, 1991.

[2] - SHREVE, R. N., BRINK Jr., A. Indústria de processos químicos, Editora Guanabara Dois, RJ, 1980.

[3] - ABIQUIM – Anuário Estatístico da Indústria Química Brasileira, 1994.

[4] - WEISSERMEL, K., ARPE, H. J. Industrialle Organische Chemie, 2nd ed Verlag Chemie, Weinheim, New York, 1978.

[5] - ITAIPU, Personal Information of the Operation Department, 1999.

[6] - ANEEL – Agencia Nacional de Energia Elétrica, Boletim, 1999.

[7] - ANDA – Associação Nacional para Difusão de Adubos e Corretivos Agrícolas, Anuário Estatístico do Setor de Fertilizantes, 1995.

[8] - IBGE – Anuário Estatístico Brasileiro (AEB), 1995.

 

 

Endereço para correspondência
Samuel Nelson Melegari de Souza
e-mail: ssouza@unioeste.br