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An. 3. Enc. Energ. Meio Rural 2003

 

Estimativa do potencial energético na indústria do óleo de babaçu no Brasil

 

 

Teixeira, M. A.

Departamento de Energia, FEM, UNICAMP, CEP: 13081, 970 Campinas, SP, Brasil, Fax: (019) 289 3722

 

 


RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo calcular o potencial máximo de aproveitamento energético da cultura de Babaçu no território brasileiro, representado pela disponibilidade termodinâmica, ou seja, a somatória de toda a energia disponível na biomassa uniformemente distribuída ao longo do tempo de aproveitamento considerado. A cultura apresenta um grande potencial inexplorado, pois somente é utilizado 7% (em peso) do fruto, para a extração do óleo, o que já garante parcialmente sua viabilidade econômica, sendo rejeitado o endocarpo fibroso que representa 59 % do fruto, material de boa qualidade energética (18000 kJ/kg). Com base nos valores da safra de 1996 foi calculado uma disponibilidade de 1,07 milhões de toneladas ano de endocarpo, o que representa um potencial termodinâmico de 20 milhões de GJ ano. Distribuídos uniformemente ao longo do ano, nos dá um potencial de 615 MW, se considerado somente o período da safra 1070 MW. Com relação à distribuição geográfica, este potencial se concentra nas principais unidades produtoras, os estados de Maranhão, Piauí e Tocantins, mormente a região nordeste do País. Os estudos concluem que é necessário e válido proceder uma análise de viabilidade deste potencial, em função de ser este um catalisador de desenvolvimento econômico e social para a região, bem com uma fonte energética capaz que suprir a demanda local.

Palavras-chave: Babaçu, biomassa, energia, Brasil, potencial.


ABSTRACT

The goal of the present work was to calculate the maximum thermodynamic potential of the Babaçu culture in the brazilian territory, what is represented by the sum of all energy available in the biomass that can be used during all of the considered period. The culture represent a huge unexplored potential, as only 7% of the fruit is used to extract the oil, already reaching the partial economic availability, been rejected the fibrous endocarp that represents 59% of the crop, a good energy content material (18000 kJ/kg). Using 1996 crop season numbers was calculated 1,07 millions tons per year of unused endocarp, that lead to 20 millions of GJ per year. If uniformly distributed during the year lead to a 615 MW potential, if only the cropping season is considered the potential goes to 1070 MW. The geographic distribution of this potential concentrates in the main production states: Maranhão, Paiuí and Toacantins, all in the Northeast region of the country. This work concludes that is necessary, and valid, to proceed a availability study of this potential regarding its connections to social and economic development of the region as well as been an energy source capable to supply local demand.


 

 

INTRODUÇÃO

O Babaçu é uma planta nativa brasileira importante no ciclo natural de conservação e melhoramento do solo, como uma mata sucessional da capoeira (ou desmatamento) para a floresta de grande porte. O fruto do Babaçu, de onde se extrai o óleo, é responsável por quase 30% da produção brasileira de extrativos vegetais, empregando mais de 2 milhões de pessoas. Mesmo com grande destaque na economia de estados da União, é uma cultura que carece de maiores estudos na exploração do seu potencial, uma vez que seu aproveitamento econômico está ligado à extração e aproveitamento do óleo da castanha, rejeitando 90 % do fruto, que pode ser aproveitado com as tecnologias disponíveis, quer como fonte energética ou como matéria prima para indústrias de alimento.

Como colocado por VIVACQUA FILHO (1968), a planta Babaçu apresenta múltiplas formas de aproveitamento: madeira do tronco - construção; palhas - telhado, utensílios, lenha; palmito - alimentação e industrialização; frutos com múltiplos aproveitamentos - amido, óleo e farinha protéica da amêndoa e energia do endocarpo, quer na sua utilização em queima direta como lenha, quer pela produção de carvão vegetal.

No âmbito do cálculo do potencial energético é necessário fazer algumas distinções entre os diferentes potenciais (HU, 1985): potencial termodinâmico - existe em termos termodinâmicos, desconsidera tecnologia disponível, usa 100% da energia disponível e nenhuma perda térmica; potencial tecnicamente viável - já leva em conta tecnologia disponível; potencial econômico - potencial que é economicamente viável, variando no tempo, local e política; e potencial de mercado - determinado pelas leis de oferta e procura, usualmente o menor potencial.

No caso da cultura do Babaçu, temos um parque industrial operando com uma tecnologia antiga (a maioria do parque foi instalado na década de 60), em virtude do baixo rendimento da extração do óleo - 0,5 % do peso inicial da matéria prima. O fruto apresenta um grande potencial de múltiplo aproveitamento: alimentar (amido do mesocarpo), como matéria prima para outras indústrias (farinha protéica da torta da castanha), etc. Mas, o maior potencial passa pelo aproveitamento energético do mesocarpo, material fibroso, de alta densidade energética e facilmente armazenável.

Neste sentido, o objetivo deste trabalho foi calcular o volume de biomassa que esta cultura torna disponível, sua distribuição espacial dentro do território brasileiro, no intuito de ressaltar o potencial inaproveitado e fornecer subsídios para a realização de trabalhos futuros, que levem a um melhor aproveitamento desta importante fonte de matéria prima para sistemas integrados de produção de energia e alimentos. Para tanto, foram levantados a distribuição das principais unidades processadoras do óleo de Babaçu e dos principais agrupamentos desta Orbignya, relacionando seus principais subprodutos agrupados de acordo com seus usos alternativos: energético e como fonte de matéria prima para indústrias de alimento.

 

MATERIAL E METODO

De forma a poder calcular a disponibilidade de energia contida na cultura do Babaçu, primeiro foi realizada a caracterização do furto, componentes e suas características. Em seguida, a quantificação da produção brasileira, sua distribuição espacial e volumes produzidos, utilizando para tanto os dados fornecidos pelo anuário estatístico do IBGE.

Uma vez caracterizado o fruto e sua produção, temos o cálculo da disponibilidade energética, representada pela oferta reprimida do endocarpo e seu poder calorífico. Estes valores de energia representam o máximo teórico de aproveitamento energético possível (Potencial Termodinâmico HU (1985)), devendo este montante energético ser ponderado, se considerado aproveitado somente durante a safra (como no caso da cana-de-açúcar) ou ao longo do ano todo, prevendo a armazenagem de material para o período da entre-safra.

Como resultado final foram obtidos os valores das potências que esta energia, uniformemente distribuída ao longo dos dois períodos considerados, representa. Este número, espera-se que sirva de indicador para futuros trabalhos, que levem ao cálculo da viabilidade no aproveitamento desta biomassa como fonte energética, para geração de energia junto ao setor extrator de óleo de Babaçu.

 

RESULTADOS

O FRUTO

O Babaçu é uma palmeira brasileira de grande porte (até 20 m), de tronco cilíndrico e copa em formato de taça. O fruto é uma drupa com elevado número de frutos por cacho, sendo estes em número de 4 (habitat natural), podendo chegar de 15 a 25. Os frutos são em formato elipsoidal, mais ou menos cilíndricos, pesando entre 90 a 280 g. Este fruto apresenta: epicarpo (camada mais externa bastante rija), mesocarpo (com 0,5 a 1,0 cm, rico em amido), endocarpo (rijo, de 2 a 3 cm) e amêndoas (de 3 a 4 por fruto, com 2,5 a 6 cm de comprimento e 1 a 2cm de largura). Um esquema geral do fruto pode ser visto na figura 1. A safra vai de Setembro a Março (VIVACQUA FILHO, 1968).

 

 

O principal produto comercial extraído do Babaçu é o óleo (extraído da castanha) e a torta (que resulta do processo). Este óleo representa 7% do peso total do fruto. Em números, o Babaçu emprega 2 milhões de pessoas (safra de 1984), cobre 14,5 milhões de hectares, produzindo 4 milhões t/ano, aproximadamente 30% da produção de extrativos (excluindo madeira, 1975 a 1977), com um potencial estimado de 15 milhões t/ano. Em peso, os percentuais dos diferentes componentes do fruto podem ser vistos na tabela 1 (EMBRAPA, 1984):

 

 

Com relação ao poder calorífico dos seu componentes, existem poucos trabalhos, sendo que os valores disponíveis variam de região para região, de acordo com solo, clima, espécie, etc.. Em VIVACQUA FILHO (1968), podemos encontrar os valores adotados para este trabalho, listados na tabela 1.

ÁREA DE OCORRÊNCIA

A área de ocorrência se concentra no Nordeste (maior região produtora), Norte, Centro Oeste e Mato Grosso, como pode ser visto na figura 2, ocorrendo também no México e na Bolívia. Engloba 8 espécies do Gênero Orgbnya e 4 do Attalea, adaptando-se à diferentes tipos de solo. As indústrias de beneficiamento se concentram no Maranhão, maior estado produtor (EMBRAPA, 1984).

 

 

PRODUÇÃO

No trabalho de AMARAL FILHO (1990) encontramos uma descrição bastante detalhada do que é, em termos sociais, econômicos, industriais e políticos a cadeia do Babaçu. Constitui-se de uma estrutura de produção-comercialização que tem como base social a pequena produção mercantil, na sua maioria, famílias de posseiros, arrendatários agrícolas, pequenos proprietários e parceiros de grandes proprietários de terra. Desta força de trabalho, vale destacar o papel fundamental desempenhado pelas mulheres e crianças, responsáveis pela etapa de quebra e separação da castanha, com aproveitamento endógeno da casca e do endocarpo (como carburante em fornos a lenha) e do mesocarpo para alimentação. Numericamente, estes trabalhadores da área rural no estado do Maranhão (o maior produtor nacional), representam 73,77% da população (dados de 1980).

Tendo como base o último censo agropecuário do IBGE disponível, a produção de Babaçu pelas diferentes unidades da federação pode ser vista na tabela 2, onde estão listados todos os estados com ocorrência registrada deste extrativismo vegetal.

 

 

POTENCIAL ENERGÉTICO

Com base nos valores das produções de Babaçu, foram calculados os volumes de cocos coletados, incluindo aqueles de que só foram aproveitadas as castanhas, para chegar aos valores produzidos de Endocarpo, divididos entre as unidades da Federação.

Com base nestes valores de produção de amêndoas e coco, foram calculados os volumes de frutos retirados das palmeiras, quer tenham sido comercializados inteiros, quer tenham sido beneficiados antes, e em decorrência, o volume de endocarpo produzido. Estes valores podem se vistos na tabela 3.

 

 

Baseado no volume de endocarpo produzido, poder calorífico, duração da safra, foram obtidos os valores dos potenciais energéticos máximos apresentados na tabela 4.

 

 

CONCLUSÕES

O fruto do Babaçu apresenta um grande potencial energético, comparável ao potencial apresentado pela cultura da cana de açúcar, e seu aproveitamento passa pela utilização integral do fruto, sem que ocorra o descarte do mesocarpo (que contém mais da metade da massa e a maior parte do potencial energético).

O paralelo com o setor sucro-alcooleiro é inevitável, visto que ambos fazem uso de uma matéria prima fonte de biomassa energética, bagaço e mesocarpo, respectivamente.

Numericamente, o potencial é de até 615 MW, se considerarmos a utilização durante todo o ano. No caso de considerarmos somente o período de safra, chegamos ao potencial de 1,07 GW. Em ambos os casos, não são números insignificantes, se observarmos que muito deste potencial aparece concentrado em três estados: Tocantins, Piauí e Maranhão, respectivamente: 19,49; 33,31 e 557,59 MW ao longo do ano e 33,88; 57,91 e 969,40 MW, considerando somente a safra.

No tocante à tecnologia de aproveitamento, parte deste potencial pode ser facilmente disponibilizado, uma vez que as particularidades do ciclo de potência a vapor não só são plenamente dominadas, como facilmente aplicáveis ao mesocarpo do Babaçu, sendo que os equipamentos necessários são de pleno domínio da indústria nacional.

Com relação à distribuição geográfica, obviamente o Babaçu se concentra na sua área de ocorrência natural, o Norte e Nordeste brasileiro, áreas carentes de grandes aproveitamentos hídricos para geração elétrica (característica da nossa matriz energética). É relevante notar que esta área é um complemento à aquela de ocorrência da cana de açúcar, podendo representar uma fonte energética baseada em biomassa que possa compor uma alternativa de produção energética ecologicamente sustentável para todo o território nacional. Pode, desta forma, acrescentar subsídios a uma política de auto suficiência energética nos novos padrões ecologicamente desejáveis, em nível nacional.

 

AGRADECIMENTOS

O autor agradece à CAPES pela bolsa concedida, sem a qual este trabalho não seria possível.

 

REFERÊNCIAS

[1] VIVACQUA FILHO, ANTÔNIO. Babaçu, Aspectos Sócios - Econômicos e Tecnológicos. Brasília: Universidade de Brasília, 217p, 1968.

[2] HU, S. DAVID. Cogeneration. Virginia: Reston Publishing Company Inc., 428p, 1985.

[3] EMBRAPA, Babaçu - Programa Nacional de Pesquisa. Brasília: EMBRAPA, 1984.

[4] AMARAL FILHO, JAIR DO. A Economia Política do Babaçu: um estudo da organização da extrato-indústria do babaçu no Maranhão e suas tendências. São Luís: SIOGE - Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado, 312p., 1990.

[4] EMMERICH, FRANCISCO GUILHERME. Modelo granular, percolação resistividade, RSE e módulo de elasticidade da materiais carbonosos: aplicação ao endocarpo de babaçu tratado termicamente até 2200° C. Campinas: Instituto de Física "Gleb Wataghin", tese de Doutorado apresentada em 08 de Julho de 1987.

[5] IBGE - Instituto de Geografia e Estatística. Anuário Estatístico. IBGE: Brasília, 1996.