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An. 3. Enc. Energ. Meio Rural 2003

 

Avaliação de um motor do ciclo diesel operando com óleo de dendê para suprimento energético em comunidades rurais

 

 

Ednildo Andrade Torres

Universidade Federal da Bahia/Escola Politécnica/DEQ/Laboratório de Energia, Rua Aristides Novis, 2 Federação, Salvador, Bahia, 71-336-1288 ramal 125 fax 71 247-3410

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo faz uma análise sobre a implantação da cultura do dendezeiro, Elaeis Guineensis, no Brasil, com particularidade para o Estado da Bahia, mostrando o atual estágio da tecnologia de beneficamente, os diversos tipos de indústrias existentes, e uma avaliação técnica de um motor de combustão interna, ciclo diesel, operando com óleo de dendê na forma in natura como combustível. Analisa também o comportamento da potência desenvolvida e o consumo específico para o motor operando com 50, 75 e 100% da carga nominal em função da rotação.

Palavras-chave: Motor de combustão interna, óleo de dendê, Energia alternativa, Energia renovável.


ABSTRACT

This article makes an analysis on the implantation of the culture of the palm, Elaeis Guineensis, in Brazil, with particularitity for the State of the Bahia, showing the current period of training of the technology of beneficially, the diverse types of existing industries, and an evaluation technique of an engine of internal combustion, from diesel's cycle, operating with oil of palm in the form in natura as fuel. It also analyzes the behavior of the developed power and the specific consumption for the engine operating with 50, 75 and 100% of the ate load in function of the rotation.


 

 

INTRODUÇÃO

Conhecido no Brasil como dendezeiro, a palma africana ou palma aceitera, cujo nome científico é Elaeis Guineensis, é originária da África, e foi introduzido no Brasil no período colonial, pelos escravos africanos. As sementes foram plantadas no litoral e recôncavo baiano, onde encontrou as condições de solo e clima para o seu desenvolvimento. Durante séculos, a cultura era somente para atender as necessidades da culinária regional, nesse período, a produção era essencialmente artesanal.

O aumento crescente do consumo do azeite de dendê, não foi acompanhada pelo o da produção devido ao processo rudimentar de processamento. O aumento da demanda provocou a evolução do processo de extração, passando do antigo pilão para o roldão acionado por animal e em seguida, motorizado. A parti da década de 50, com o processo de industrialização do Brasil, a demanda aumentou sendo necessário o desenvolvimento do processo industrial.

Posteriormente, foram introduzidas sementes de qualidade genética melhorada, do híbrido "tenera", e inicia o plantio de grandes área com tecnologias modernas capitaneadas por empresas privadas.

Atualmente existe uma capacidade ociosa da industria maior que 50%. A falta dos frutos para atender as necessidades da indústria, na Bahia, dar-se, basicamente, por dois motivos: inicialmente, os dendezais existentes ainda são em grande parte povoado com plantas de baixa produtividade; e em segundo lugar; o preço baixo do produto.

Apesar das grandes empresas possuírem suas próprias plantações, estas não atendem as necessidades para a plena produção industrial, sendo obrigadas adquirirem a matéria-prima junto aos pequenos produtores.

A cultura da palmácea tem grandes vantagens entre as quais cita-se: a capacidade de geração de empregos; geração decentralizada de energia preservação do ecossistema; melhoria da distribuição de renda; desenvolvimento sustentável, entre outros.

Entre as plantas oleaginosas a cultura do dendê é de maior produtividade com um rendimento de 4 a 6 toneladas de óleo/ha.

Na região amazônica, o principal produtor é o Estado do Pará, que iniciou o cultivo no final da década de 60, sendo hoje o principal produtor do país.

O Brasil é atualmente o terceiro produtor de óleo de palma da América latina, onde destacam-se a Colômbia em primeiro e o Equador no segundo lugar.

A participação do Brasil na produção mundial de óleo de palma foi de apenas 0,53%, em 1998, segundo a dados da Oil World, e a Bahia a segunda produtora do país.

Além do óleo de palma, seu principal produto, ainda pode-se extrair o óleo palmiste oriundo da amêndoa, tendo um subproduto, a torta que se destina a ração animal.

No processamento dos frutos de dendê são produzidos resíduos sólidos que podem gerar energia térmica ou elétrica para a própria unidade industrial ou para uso nas comunidades rurais.

Este trabalho é uma tentativa do aproveitamento do óleo de palma para geração de energia mecânica e ou elétrica sendo o combustível utilizado na sua forma in natura, em um motor do ciclo diesel, sendo o óleo apenas filtrado para eliminar partículas em suspensão.

 

PRÓ-DENDÊ X INDUSTRIALIZAÇÃO

O Programa Pró-dendê foi constituído pelo Governo do Estado da Bahia, pelo Decreto 3.270 de 07/12/1989, para tornar o Estado o primeiro produtor nacional . A meta era plantar 50 mil hectares na década de 90 e mais 50 mil até o ano de 2010. Além da parte agrícola, estava prevista a instalação de 120 micro usinas de processamento com capacidade de 1,0 tonelada de óleo por hora e outras cinco com capacidade de 30 mil t de óleo/h [TORRES E. A . et all. ,1984. TORRES E. A . et all, 1992.

De acordo com as estimativas [ALCOFORADO F. et alli, 1990, SANTOS A . O . e SOUZA R. C., 1984].

3, 4], a renda per capita da população rural seria elevada, sendo uma alavanca para o desenvolvimento regional com um custo de investimento de aproximadamente 4.000,00 US$ por emprego gerado, aplicados durante os 20 anos. Além da produção do dendê seriam cultivadas lavouras de subsistência como feijão, arroz, mandioca, milho, frutas etc., especialmente durante os primeiros anos da implantação da cultura definitiva.

Por outro lado, no atual processo de desenvolvimento industrial da Bahia, foi anunciada a recente instalação do Complexo Ford, e estima-se um investimento da ordem de US$1,3 bilhão para gerar cerca de 55.000 empregos, segundo as estimativas mais otimista. Se essas premissas acontecerem a contento ter-se-á um investimento per capito de 23.600US$/emprego gerado. Mas ainda é mais grave se considerado o investimento do Pólo Petroquímico do Nordeste, em Camaçari, Bahia, segundo [ALCOFORADO F. et alli, 1990] o valor atual seria estimado em US$6,5 bilhões para gerar segundo as estimativas mais atuais de 20.000 empregos (5.000 diretos e 15.000 indiretos), então o investimento per capita seria o eqüivalente a 325.000,00 US$/emprego gerado.

Fica evidente que o investimento que não foi realizado no Pró-Dendê, só agravou a situação sócio-econômica do Brasil, em particular no Estado da Bahia. A efetivação do programa além de trazer benefícios para o homem do campo e as cidades de pequeno e médios porte, iria contribuir de forma decisivas para a região com a melhoria da renda e ajudar na diminuição do desmatamento e a substituição dos campos degradados, portanto, uma política de desenvolvimento sustentável com geração de empregos, riquezas e energia descentralizada.

 

PROCESSAMENTO DO DENDÊ

O dendê desponta como uma alternativa ao desenvolvimento sustentável para a região sul da Bahia e para parte da Amazônia. A cultura é de ciclo de vida longa (25 a 30 anos) e para a variedade tenera é de alta produtividade, 25 t de cachos de frutos por hectare ano, eqüivalendo a cerca de 4 a 6 t/óleo.ha.ano. Esse volume é cerca de dez vezes maior que o extraído da soja, o dobro do coco, quatro vezes mais que o produzido pela cultura do amendoim. A produção dos cachos acontece durante todo o ano, mas, aumenta nos meses de novembro a maio. A cultura adapta-se em clima úmido com altos índices pluviométricos (acima de 1.200 mm/ano), solos pobres e de alta insolação (mais que 1.800h/ano).

Nas regiões escolhidas para o cultivo do dendê existia no passado mata atlântica e pelo processo de devastação a floresta fora dizimada. O cultivo pode estabelecer uma cobertura arbórea, protegendo os solos contra a lixiviação, erosão, convivendo com plantações de menor porte durante a fase inicial e contribuindo com o balaço hídrico e climatológico e no processo da fotossíntese.

A Palmácea inicia a produção a partir do 4º ano e atinge o estado adulto após o 7º ano com plena produção até a sua eliminação após ao 30º ano.

Após o corte, os cachos têm que serem imediatamente transportados e processados, antes de 24 horas, para não acidificar e perder qualidade.

Na atividade industrial as etapas do processamento são:

Esterilização – O cacho do dendê após o corte e transporte é cozido a temperatura de 100ºC e baixa pressão do vapor;

Debulhamento – Depois de cozido o fruto é separado do cacho com um debulhador mecânico acionado por um motor de combustão interna ou elétrico;

Digestão – Tem a finalidade o esmagamento da polpa, sem afetar a semente ou o óleo de palma.

Prensagem ou Extração – O produto obtido da digestão ou seja, amêndoas e polpa é submetido numa pressa hidráulica de onde sai o óleo de palma e os resíduos (fibras e amêndoas).

Clarificação – O óleo bruto que sai da etapa anterior, deverá ser processado separando o óleo de palma da borra. Esta separação é realizada com o aquecimento do óleo bruto com vapor de baixa pressão.

 

DENDÊDIESEL

Após a crise do petróleo na década de setenta, o Governo Federal criou o Pró-álcool e o país adotou como substitutivo para a gasolina. Portanto, para motores do ciclo Otto tinha-se encontrado a alternativa energética. Mas para o óleo díesel não acontecera uma ação similar, porém, várias experiências foram tentadas. Inicialmente, os testes foram com misturas de óleos vegetais com álcool em proporções variadas [ SANTOS A . O . e SOUZA R. C., 1984]

A Segunda tentativa foi a obtenção de um éster pelo processo de transesterificação ou pelo craqueamento catalítico.

No primeiro processo é modificada a estrutura molecular do óleo, gerando um éster com desempenho semelhante ao óleo diesel. A França é uma das pioneiras juntamente com a Bélgica na década de 40 e, posteriormente, o CTA – Centro Tecnológico da Aeronáutica, trabalhou com ésteres processando a partir do óleo de soja e algodão.

O craqueamento catalítico é um processo que gera um hidrocarboneto quando o óleo vegetal em presença de um catalisador específico recebe um tratamento térmico entre 400 e 500ºC [MARETIC, V., 1984.[6] OLIVEIRA H. P., 1986].

Figura 1

Em ambos os processos o rendimento do óleo varia entre 70 e 80%. A geração do resíduo diminui a rentabilidade e dificulta a viabilidade econômica.

No final da década de oitenta e posteriormente nos anos noventa surgiram motores que operavam com multi-óleos, porém, com custos elevados. O passo seguinte seria tentar viabilizar um motor que operasse com o óleo na forma in natura. Nesse sentido existiam informações que alguns motores do ciclo diesel operam em países produtores do óleo de palma da África. Sendo assim o passo seguinte foi tentar operar um motor de pequeno porte que atendesse a uma família ou a uma pequena comunidade rural.

Na Bahia existem cerca de 600 mil propriedades rurais, das quais cerca 15% são eletrificadas. Esta situação pode aumentar a migração de populações sem ou com pouca escolaridade para as grandes cidades aumentando a pressão social.

 

REALIZAÇÃO DOS TESTES

O estudo foi realizado com um motor do ciclo diesel, da marca Agrale model M-80, apropriado para a zona rural, especialmente para ser acoplado em pequenos geradores elétricos ou para geração de energia mecânica para implementos agrícolas.

Foi utilizado um dinamômetro da marca Shenck, com controle eletrônico. O procedimento dos testes com o motor foi mantê-lo com rotação constante, com cargas variando em 50% 75% e 100%.

 

COMBUSTÍVEL

O combustível utilizado foi óleo de palma adquirido no mercado baiano, sendo apenas filtrado.

Na tabela 01 são apresentadas as características do óleo de palma e outros.

 

CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS DO MOTOR TESTADO

O motor utilizado para os testes foi da marca Agrale modelo M80, refrigeração a ar, 4 tempos, 1 cilindro vertical, diâmetro do pistão 80 mm, curso de pistão 100 mm, 503 cm3 de cilindrada, 7CV, partida manual, injeção indireta, e taxa de compressão 1:20. O gráfico 01 mostra a potência (kW ou CV) versus rotação (rpm), fornecido pelo fabricante

 

 

DINAMÔMETRO

O Dinamômetro utilizado no teste foi da Marca Schenck, modelo 210, com controle eletrônico, com medidas de rotação, temperatura, pressão, consumo e potência.

 

PROCEDIMENTO DOS TESTES

Todos os testes realizados com o motor M80 foi utilizando o óleo de dendê com combustível único. Nos testes foi adotado a rotação constante (n=cte), para ter estabilidade no conjunto ensaiado. A potência do motor variou de 100, 75 e 50% da potência máxima. A rotação do motor foi testada para os padrões indicado pelo fabricante, até 2400rpm.

Os principais parâmetros monitorados foram:

Rotação do motor; Torque; Consumo de combustível; Temperatura dos gases de escape; Temperatura do Cabeçote; Potência; Temperatura do ar de refrigeração, Nível e coloração do Óleo lubrificante; Gases de Escape e Vibração.

 

RESULTADOS

Por limitação de espaço foram apresentados apenas os gráficos de rotação em função do consumo específico e potência fornecida pelo motor.

Para o motor operando com 50% da carga os valores são mostrados no gráfico 02. Verifica-se que a potência medida variou de 2 a 3,53 CV e o consumo especifico de 0,271 a 0,303 kg/CV.h. Para o motor operando com 75% da sua carga nominal os valores são apresentados no gráfico 03. Verifica-se que a potência medida variou de 3,14 a 5,14 CV e o consumo especifico de 0,247 a 0,259 kg/CV.h. . Para o motor operando com 100% da sua carga nominal os valores são apresentados no gráfico 04. Verifica-se que a potência medida variou de 4,19 a 6,74 CV e o consumo especifico de 0,235 a 0,272 kg/CV.h. No teste o motor não atingiu a potência máxima indicada pelo fabricante, iste deveu-se pelo fato do motor não ser novo assim como também os dados do fabricante é para o motor operando com óleo diesel.

 

 

 

As temperaturas também foram medidas e para o motor operando com 50% da carga, no cabeçote variou de 104 a 109ºC e os gases de escape variou de 191 a 250ºC. As temperaturas medidas para o motor operando com 75% da carga, no cabeçote variou de 118 a 126ºC e os gases de escape variou de 236 a 318ºC. As temperaturas medidas e para o motor operando com 100% da carga, no cabeçote variou de 112 a 136ºC e os gases de escape variou de 318 a 411ºC.

 

ANÁLISE DOS RESULTADOS E CONCLUSÃO

Para o motor operando com carga máxima verificou-se um diferença de potência de 5 a 15% quando operado com óleo de dendê, com relação ao óleo diesel. Entretanto, apesar da diminuição da potência ainda é uma vantagem operação desta máquina numa propriedade rural onde não dispõe de energia elétrica com fornecimento garantido pela concessionária. Outro fator importante a ser observado é o fato da fonte energética ser produzida na própria propriedade rural.

Se implantada a cultura do dendê iria contribui de maneira decisiva para o desenvolvimento sustentável para a região. Pois além da produção de produtos agrícolas seria gerada a energia na própria região. Entretanto, isto não significa que a concessionária de energia elétrica não possa contribuir energizando a região.

Ampliar os testes com máquinas maiores será certamente um fator importante para identificar a viabilidade do uso do óleo de dendê na forma in natura em motores de combustão interna do ciclo diesel.

 

AGRADECIMENTOS

O autor agradece a FEP – Fundação Escola Politécnica, o CEPED – Centro de Pesquisas e Desenvolvimento do Estado da Bahia, ao Eng. Ernesto Paulo Cencin, e os alunos de engenharia mecânica da UFBA, que contribuíram para a realização do projeto.

 

REFERÊNCIAS

[1] TORRES E. A . et all. La micro planta en la agroindustria de palma aceiteira - La experiencia Brasileña, IIIª mesa redonda da FAO - Belém - 1984.

[2] TORRES E. A . et all. Pulsating combustion of palm oil fruit bark - FUEL vol. 71 march 1992.

[3] ALCOFORADO F. et alli, Relatório sobre a Implantação da Cultura do Dendê na Bahia, Salvador 1990.

[4] SANTOS A . O . e SOUZA R. C. Óleos vegetais em substituição ao óleo diesel como combustível, III Congresso Brasileiro de Energia, Rio de Janeiro, 1984.

[5] MARETIC, V. Aceite de diesel se aceite palma: viabilidade e tecnologia. IIIª mesa redonda da FAO - Belém - 1984.

[6]OLIVEIRA H. P. Micro Usina para Extração de Óleo de Dendê, CEPED Informe Técnico Número 17, Camaçari, 1986.

[7] MELO E. E. de S.M. e GUIMARÃES M. F. Reflexões sobre a utilização do óleo de mamona em substituição ao óleo diesel, Secretaria de Minas e Energia da Bahia, Salvador, 1984.

[8] FUNDAÇÃO CPE A Indústria de óleos vegetais e Rações na Bahia, Série Estudos e Pesquisas 07, Centro de Projetos e Estudos – CPE, Salvador, 1988.

[9] CENBIO Noticia Mistura álcool-diesel: um projeto viável Ano 1 nº 4 1998.

[10] CENBIO Noticia Óleo de Palma, a matéria prima do século XXI, Ano 2 n

 

 

Endereço para correspondência
Ednildo Andrade Torres
ednildo@ufba.br