An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002
ASES: programa para análise de sistemas eólicos e solares fotovoltaicos
Wilson Negrão Macêdo; João Tavares Pinho
Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas, DEEC/CT/UFPA. Caixa postal 8605 - Ag. Núcleo Universitário, CEP 66.075 - 900, Belém, PA. Fone/Fax: 91 2111299, e-mail: nmacedo@iee.usp.br
RESUMO
Este trabalho apresenta um programa computacional para análise de sistemas eólicos e solares fotovoltaicos (ASES), desenvolvido na linguagem de programação Visual Basic 6.0®, com o objetivo de oferecer uma fácil interação com o usuário. Sua finalidade principal é possibilitar a análise do potencial energético, dimensionar e estudar sistemas de energia eólicos e fotovoltaicos, a partir de informações básicas das características das potencialidades energéticas locais e dos equipamentos de geração.
O programa é constituído por dois módulos independentes, um para análise de sistemas eólicos e outro de sistemas fotovoltaicos, ambos incluindo o tratamento dos dados meteorológicos disponíveis. Esses módulos podem ser interligados, constituindo um pacote mais completo e possibilitando uma análise mais ampla da interligação das duas fontes em um único sistema híbrido.
Para demonstrar a aplicabilidade do programa, é feito um estudo de caso para um sistema híbrido de pequeno porte, instalado em uma localidade isolada da rede elétrica da concessionária. Esse estudo demonstra claramente a importância da escolha da turbina adequada ao regime de vento local e a possibilidade de complementariedade entre as fontes solar e eólica para a localidade estudada.
Palavras chaves: Sistemas Híbridos, Características do Vento, Sistemas Isolados, Energia Solar Fotovoltaica, Modelo de Sistemas Híbridos.
ABSTRACT
This work presents a computational program to analyse wind and solar photovoltaic systems (ASES), developed in the Visual Basic 6.0® programming language, which has the purpose of offering an easy interaction with the user. The program's main advantage is to make it easy for the user to analyze the energy potential, to design and to study wind and photovoltaic energy systems, starting from information of the local characteristics and the generators.
The program is composed of two independents modules; one to analyse the wind system and another to analyse the solar photovoltaic system, both including the processing of the meteorological data available. The individual modules can be put together in a package to allow for a more complete analyse of the two sources in only one hybrid system.
To show the applicability of the program, a case study is used here for a stand-alone hybrid system. This study clearly shows the importance of the right choice of the wind turbine to match the wind characteristics of the site and the possibility of complementarity between the wind and solar sources for the studied site.
1 - INTRODUÇÃO
O Brasil possui uma grande quantidade de pequenas, médias e grandes ilhas ou comunidades, que estão longe dos grandes centros urbanos, e não conectadas à rede elétrica convencional, dependendo da queima de combustível para produção de energia elétrica. Muitos desses locais apresentam evidências para a penetração de turbinas eólicas e módulos fotovoltaicos para produção de eletricidade, irrigação, entre outros usos. Porém, um número muito pequeno de geradores eólicos e fotovoltaicos tem sido utilizado. Indicativos das capacidades instaladas dessas tecnologias estão no fato de que, até anos recentes, poucos sistemas tradicionais para bombeamento estavam em operação suprindo potência mecânica, ou pequenos sistemas para produção de energia elétrica.
Futuramente, mais instalações estão sendo previstas, e há uma crescente necessidade de analisar-se as condições dos recursos energéticos de cada local em particular, de modo a se estabelecer uma base de dados confiáveis. Devido às características individuais de cada local, em termos da disponibilidade dos recursos solar e eólico e da demanda de energia elétrica, faz-se necessário analisar cada caso em particular.
O estudo das características da radiação solar e do vento em um local em particular está relacionado aos seus potenciais para produção de eletricidade, com o objetivo de substituir ou complementar os sistemas a diesel convencionais. A análise da expansão, substituição ou implementação mais adequada é um problema típico de planejamento. As análises da expansão dos sistemas de potência de uma área isolada, diferem daquelas dos grandes centros urbanos, uma vez que uma área isolada não tem a vantagem do fornecimento de energia por parte da rede elétrica convencional e interconexão com outros sistemas. Nesse sentido, é fundamental a combinação de fontes alternativas que possam ser utilizadas localmente.
Em termos de uso de energia elétrica, áreas isoladas são aquelas que não podem ser conectadas à rede elétrica convencional, devido a razões econômicas ou técnicas. A impossibilidade econômica e técnica de conectar-se áreas isoladas com a rede elétrica convencional pode resultar da distância entre a rede e a localidade, ou do fato desta estar localizada em zonas inconvenientes para a conexão.
O planejamento adequado depende essencialmente das fontes disponíveis para geração de eletricidade. Os tipos de fontes disponíveis diferem de local para local. Uma ilha, por exemplo, pode ser um local aceitável para uma geração que combine geradores eólicos e fotovoltaicos.
Sistemas eólicos e fotovoltaicos (FV) autônomos são tecnologias consolidadas para suprimento de eletricidade em locais isolados, longe da rede de distribuição e, em alguns casos, não tão isolados, em que estes possam ser conectados à rede elétrica de distribuição local. Se bem dimensionados, eles proporcionam um serviço confiável e diminuem a necessidade do suprimento de combustível para geradores a diesel.
Os locais para implantação de sistemas híbridos solar-eólico devem ser selecionados com bastante cuidado, principalmente com relação à energia eólica, para se ter certeza de que a melhor velocidade de vento foi encontrada em uma determinada área selecionada. Medidas das propriedades dos recursos eólico e solar em uma localidade são importantes para evitar erros de projeto dos sistemas de geração a serem implantados no local.
Com esse objetivo, destaca-se o interesse do Grupo de Estudos e Desenvolvimentos de Alternativas Energéticas (GEDAE) no desenvolvimento de programas computacionais que possam auxiliar no dimensionamento, planejamento e expansão de sistemas fotovoltaicos e/ou eólicos para geração de eletricidade. Esses programas têm como principal vantagem possibilitar o estudo dos sistemas com base em informações geralmente disponíveis para o usuário.
A seguir são apresentados o programa desenvolvido, algumas simulações obtidas a partir da execução do programa desenvolvido, utilizando dados obtidos de um projeto implantado em uma localidade do interior do estado do Pará [1], bem como sugestões para melhoria do atendimento da carga, pela inserção de um sistema solar fotovoltaico.
2 - PROGRAMA PARA ANÁLISE E DIMENSIONAMENTO DE SISTEMAS EÓLICOS E SOLARES FOTOVOLTAICOS
O programa computacional utilizado foi desenvolvido na linguagem de programação Visual Basic 6.0®, sendo constituído basicamente de dois módulos, que têm como principais vantagens proporcionar uma fácil interação com o usuário e possibilitar, a partir de informações mínimas, a obtenção de uma série de informações de essencial importância para o estudo e projeto de sistemas alternativos que utilizem as fontes eólica e/ou solar.
2.1 - MÓDULO PARA ANÁLISE DE SISTEMAS EÓLICOS
O módulo para análise de sistemas eólicos, ao ser carregado, apresenta a tela inicial ilustrada na figura 1. Primeiramente, os dados de velocidade de vento são utilizados como entrada, através de séries temporais horárias [2]. Essas informações podem ser obtidas através de medidas na própria localidade em que se deseja fazer o estudo (maior confiabilidade dos resultados), ou extraídos de programas consolidados tal como, METEONORM 4.0 [3]. Essas informações devem ser organizadas em um arquivo com extensão DAT, que será lido pelo programa. Esse arquivo de dados deve conter as 8760 médias horárias, correspondentes a um ano de registros de velocidade de vento, no formato de uma única coluna, sendo que a primeira linha do arquivo corresponde à primeira média horária do ano e a última linha à última média horária do ano (de número 8760). Esse formato foi utilizado pela sua grande simplicidade, facilitando a entrada de dados para o usuário. Por outro lado, esse tipo de organização tem como inconveniente a necessidade da seqüência correta dos dados, de acordo com a época do ano. Se o usuário tiver os dados referentes a um período do ano, como por exemplo, janeiro a março, e quiser analisar esses dados, terá que organizá-los de tal maneira que a primeira linha corresponda ao primeiro valor, e a última ao valor de número 2.160 e, posteriormente, selecionar a opção referente a este período na tela, para leitura do arquivo de dados.
Após à leitura do arquivo de dados de velocidade de vento, três opções são disponibilizadas na tela do programa, permitindo ao usuário selecionar o período de análise, que pode ser anual, sazonal ou mensal, tal como ilustra a figura 2. Dessa forma, é possível se fazer a análise do potencial eólico para o período desejado.
Após a leitura do arquivo de dados, os botões da figura 1 são abilitados, dando opções a serem estudadas. Pressionando-se o botão com o nome Tratamento de Dados, a tela da figura 3 surge no monitor do computador, e o usuário pode analisar o regime dos ventos em termos de suas médias mensais, diárias e horárias. Essa análise dá ao usuário uma boa caracterização do regime dos ventos para uma determinada região, no período de um ano de dados de velocidade de vento [4, 5 e 6].
Além das análises das distribuições de Weibull, Rayleigh e Normal, quatro parâmetros importantes são calculados a partir da figura 1:
1) A densidade de energia disponível no vento é calculada a partir das médias horárias de velocidade para o período analisado;
2) A densidade de energia disponível no vento é calculada a partir da distribuição de Weibull para o período analisado;
3) A densidade de energia disponível no vento é calculada a partir da distribuição de Rayleigh para o período analisado;
4) A velocidade de projeto obtida a partir da distribuição da densidade de energia obtida por Weibull, corresponderá à velocidade para a qual se obtém a maior densidade de energia para o período analisado.
Esses parâmetros são muito importantes para a avaliação do recurso eólico do local, bem como para a especificação da turbina eólica a ser utilizada para geração de eletricidade [7].
Para o cálculo da energia gerada por uma turbina eólica em um determinado período, é de fundamental importância ter-se o conhecimento da distribuição de freqüência da velocidade do vento para o mesmo. Dessa forma, ainda referindo-se à figura 1, quando o botão com o nome Distribuição e Análise de Desempenho é pressionado, a seguinte tela do programa é carregada.
A partir dessa tela, o usuário é capaz de calcular a distribuição de freqüência, obter histogramas, traçar curvas de freqüência acumulada e duração, além de estudar o desempenho de uma até três turbinas, através de suas curvas de potência, ou de uma determinada turbina, através dos modelos matemáticos, os quais têm a vantagem de proporcionar bons resultados a partir de algumas informações referentes à turbina eólica. A figura 5, ilustra a tela para entrada de dados da curva de potência e a figura 6 mostra o relatório técnico da geração anual da ou das turbinas analisadas [8, 9 e 10].
2.2 - MÓDULO PARA ANÁLISE DE SISTEMAS FOTOVOLTAICOS
A tela inicial deste módulo do programa é ilustrada na figura 7. Ela contém uma série de informações relacionadas às características de operação do módulo fotovoltaico que devem ser informadas ao programa. Se o usuário não tiver acesso a essas informações, ele deve pressionar o botão Localizar, e, em seguida, digitar a palavra Padrão ou simplesmente Pad para encontrar os coeficientes correspondentes ao módulo de referência. Além disso, o programa contém um banco de dados com uma série de módulos comerciais, os quais podem ser selecionados através do objeto de acesso ao banco de dados, denominado de Selecione o Módulo, na parte inferior direita da tela (figura 7).
A desvantagem desse tipo de entrada de dados está relacionada ao número de variáveis a serem informadas ao programa; porém, isso é solucionado a partir do momento que se disponibiliza ao usuário um valor padrão ("default") para o qual o usuário possa executar o programa. Por outro lado, o programa pode fazer análises e cálculos considerando os efeitos da temperatura e da radiação solar no desempenho dos módulos, o que os torna mais confiáveis e precisos [11, 12, 13 e 14].
Escolhido o tipo de módulo e o arranjo, o usuário pode prosseguir na execução do programa, pressionando o botão OK para carregar a tela denominada Parâmetros Geográficos do Local, tal como ilustra a figura 8. Nessa etapa do programa, o usuário terá a opção de ler um arquivo de dados com um formato pré-definido, tal como ilustra a figura 9, que contém informações sobre a localização (latitude e longitude) e as 8.760 médias horárias de: radiação global no plano horizontal, temperatura ambiente, e velocidade do vento local ao nível de instalação dos módulos.
Essas informações são necessárias para se obter as médias mensais que são utilizadas pelo modelo usado no código do programa, além de que, de maneira análoga à apresentada no item anterior, o usuário pode avaliar o potencial energético do recurso solar em termos de suas médias mensais e distribuição anual de freqüência. Dessa forma, são obtidas informações importantes para análise e dimensionamento dos sistemas solares. Se o usuário dispuser dos valores médios mensais de radiação, temperatura e velocidade de vento, ele poderá entrar manualmente com esses valores nos seus respectivos campos, tal como mostra a figura 8.
Após o usuário ter disponibilizadas as informações sobre a radiação, temperatura e velocidade de vento local, ele pode prosseguir na execução, pressionando o botão Calcular, fazendo com que o programa calcule o melhor ângulo de inclinação para os módulos, em termos da radiação média anual disponível no plano do coletor [12 e 15].
Posteriormente, aciona-se o botão OK, que carrega a tela em que constam os valores médios calculados, que definem a condição de operação do módulo FV. Essas informações são importantes para o dimensionamento de sistemas de geração. A figura 10 ilustra essa tela, que permite ao usuário alterar, além da condição de trabalho dos módulos FV, os valores referentes à área e ao número de células dos mesmos, permitindo, assim, verificar a influência desses parâmetros na operação dos módulos e, conseqüentemente, na produção de energia.
Uma tela com duas opções para o cálculo do dimensionamento de sistemas fotovoltaicos e duas para a análise é disponibilizada tal como mostra a figura 11.
Escolhendo-se a opção denominada de Curva I-V e P-V, o programa carrega a tela mostrada na figura 12, onde o usuário pode visualizar as curvas de tensão versus corrente (I-V) e potência versus tensão (P-V), para o arranjo nas condições de trabalho anteriormente especificadas. Esse aspecto é importante na escolha do módulo a ser utilizado [16].
Na opção denominada de Análise de desempenho, o usuário pode simular o desempenho de um arranjo FV, pré-definido na tela inicial deste módulo do programa, ou simular o desempenho de um sistema FV, previamente dimensionado através da opção Multi-uso. A figura 13 ilustra a tela para a entrada de dados para essa análise, onde as informações necessárias referem-se basicamente ao posicionamento do arranjo, dados horários de temperatura ambiente e carga, considerando apenas as 12 horas do dia (6 às 18 h), o dia juliano para o qual se deseja fazer a análise, e as características do sistema de condicionamento e armazenamento de potência.
Fornecidas as informações necessárias ao programa, o usuário pode visualizar, através da tabela denominada de Desempenho Diário (figura 13) e do botão Calcular, as características de operação do sistema tais como: eficiência do arranjo, energia de saída, carga, energia de saída excedente, e fração da carga atendida, com e sem o banco de baterias. Na tabela denominada de Desempenho Anual, pode-se visualizar graficamente as variações sazonais de desempeno do sistema, considerando o mesmo perfil de carga especificado na tabela de entrada de dados ao longo de todo ano, tal como ilustra a figura 14 [12 e 14].
No que se refere aos dimensionamentos, vale ressaltar que ambos baseiam-se nas condições de operação especificadas na tela da figura 10 e nas características do módulo FV (figura 7). A partir dessas condições calcula-se a temperatura e a eficiência de operação do módulo FV, permitindo uma aproximação mais realística da energia de saída deste e, conseqüentemente, um dimensionamento mais exato do sistema de geração, minimizando, dessa forma, sobredimensionamentos indesejáveis do sistema.
A diferença entre as opções de dimensionamento denominadas de Bombeamento e Multi-uso (figura 11) está basicamente na maneira de se estimar a energia a ser fornecida pelo arranjo fotovoltaico, tendo em vista que, no dimensionamento de sistemas de bombeamento, alguns parâmetros mais específicos, tais como, capacidade do poço, altura manométrica e consumo diário de água, devem ser considerados.
No caso do dimensionamento para usos diversos, utiliza-se a tela da figura 15 para auxiliar no cálculo do consumo médio diário de energia, para o qual o sistema FV será dimensionado. Nessa tela, tem-se ainda a opção de escolha de outros perfis de carga, nos quais o usuário pode entrar com um valor constante de consumo, em kWh, ou especificar um perfil de carga diário, para qual o sistema será projetado.
Após o cálculo do consumo médio diário de energia, o usuário tem acesso à tela de dimensionamento, tal como ilustra a figura 16.
Esta tela é comum, tanto para o dimensionamento de sistemas de bombeamento, quanto de sistemas para usos diversos; porém, para o primeiro caso, deve-se se desconsiderar o banco de baterias. Na tela, o usuário é capaz de visualizar o número de baterias e módulos em série e paralelo necessários para o sistema.
Para o dimensionamento do sistema FV, o usuário deve fornecer as perdas em percentagem (perdas na fiação, conexões, etc.), a profundidade de descarga máxima à qual as baterias serão submetidas, a tensão de operação do barramento DC, e a autonomia requerida pelo sistema. Fornecidas essas informações ao programa, o usuário primeiramente calcula, através do submenu Capacidade Sugerida, no menu Calcular, os valores em Ah (baterias) e Wp (módulos FV) necessários para o consumo calculado anteriormente. Posteriormente, calcula-se a quantidade real do sistema, de acordo com as características do módulo selecionado e do sistema FV. Isso é feito através do submenu Capacidade Real, localizado também no menu Calcular.
Os menus Análise e Selecionar permitem que o usuário carregue as telas para análise de desempenho do sistema dimensionado (figura 13), ou para escolha de um outro módulo FV (figura 7), respectivamente.
3 - SIMULAÇÕES COM DADOS OBTIDOS DA MONITORAÇÃO DE SISTEMAS DE GERAÇÃO DE ELETRICIDADE
O objetivo deste tópico é ilustrar alguns resultados de simulações a partir de dados de um sistema isolado, implantado no interior do Estado Pará [1]. Ao contrário de estudos prévios, de curtos períodos de tempo, a ênfase é voltada aqui para as variações sazonais, mais que as variações horárias ao longo do dia. O benefício potencial desta aproximação torna-se aparente a partir da observação de um padrão sazonal típico da disponibilidade da energia eólica e solar no local em que se deseja implantar o sistema, ou no qual o sistema se encontra implantado.
3.1 - DESCRIÇÃO DOS LOCAIS - DADOS METEOROLÓGICOS
Para o presente estudo, os dados foram monitorados nas estações implantadas pelo Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas (GEDAE), pertencente à Universidade Federal do Pará (UFPA). As séries temporais de médias horárias utilizadas foram obtidas do projeto para geração de eletricidade de Praia Grande, no município de Ponta de Pedras, interior do estado do Pará.
A comunidade de Praia Grande situa-se às margens da Baía de Marajó, nas coordenadas geográficas de 10 22' 54" S e 480 50' 10" O. Distante de sua sede municipal cerca de nove quilômetros e aproximadamente quarenta e quatro quilômetros da capital (Belém), é acessada por meio de avião de pequeno porte ou barco, com tempos de aproximadamente vinte minutos e três horas, respectivamente [1].
3.2 - ANÁLISE DAS CARACTERÍSTICAS DO VENTO E DA RADIAÇÃO SOLAR
As características da velocidade do vento e da radiação solar são examinadas através da análise das variações diárias horárias e intersazonais. Essas variações dão uma boa idéia das características dessas fontes, permitindo o estudo da combinação das mesmas, como complementação ao longo do dia e dos meses do ano, bem como o estudo da implementação da estratégia de operação mais adequada para um sistema híbrido que utilize essas fontes.
3.2.1 - VARIAÇÕES DIÁRIAS
Sabe-se que as características da velocidade do vento e da radiação solar podem conter variações bruscas quando analisadas em curtos intervalos de tempo para um mesmo dia. Porém, para o estudo em questão, apenas as variações diurnas horárias são consideradas, permitindo-se dessa forma, a visualização do perfil dessas fontes de energia.
A fim de investigar as variações diurnas da velocidade do vento e da radiação solar, foram calculadas as médias horárias para cada mês do ano. Os resultados são mostrados nos gráficos da figura 17, referentes à comunidade de Praia Grande (1998).
A partir desses resultados, pode-se ver que, para um dia típico do mês de outubro na comunidade de Praia Grande (melhor mês de vento encontrado para esta localidade), a maior velocidade de vento média do dia, ocorrida às 21:00 h, é quase que o dobro da menor velocidade média ocorrida às 12:00 h. Um outro aspecto muito importante, que pode ser observado das figuras 17(a) e 17(b) , é o fato de que em praticamente todos os meses do ano, o perfil diário caracteriza-se por altas velocidades de vento que começam no meio da tarde mantendo-se até o inicio da madrugada do dia seguinte, quando a velocidade começa a decrescer, atingindo seus valores mínimos quase sempre entre as 9:00 e as 14:00 h.
O ultimo aspecto mencionado para a comunidade de Praia Grande, favorece a idéia de complementaridade entre o recurso eólico e o recurso solar, tendo em vista que o período do dia em que ocorrem as velocidades de vento mais baixas, coincide neste caso em particular, com o período onde há a maior incidência de radiação solar. Dessa forma, um sistema híbrido solar-eólico, pode explorar bem esse aspecto.
3.2.2 - VARIAÇÕES INTERSAZONAIS E DISTRIBUIÇÃO DE FREQÜÊNCIA
Ainda considerando o caso particular da comunidade de Praia Grande, as figuras 18(a) e 18(b) mostram as variações sazonais correspondentes à comunidade. Está claro que os melhores ventos sopram durante os meses de agosto a dezembro, e que há um período de baixas velocidades durante os meses de janeiro a maio. A velocidade média anual, a velocidade média horária máxima e o desvio padrão, para as alturas acima da superfície do solo em que foram realizadas as medições (Praia Grande, 25 m), são: 5,1 m/s, 11 m/s e 2,44.
As distribuições de freqüência anual de velocidade do vento e radiação solar para a comunidade em questão são mostradas na figura 19. Pode-se observar, que as velocidades de vento relativamente baixas, são as predominantes.
Em sistemas isolados de pequeno porte, o potencial solar-eólico para a produção de eletricidade deve estar compatível com a verdadeira demanda de eletricidade do local, quando não há rede elétrica ou grupo gerador a diesel (ou ambos) interconectados ao sistema, para transferir a energia gerada em um outro local. Estudos mais detalhados dos valores médios e da distribuição dos recursos energéticos a serem utilizados, são fatores muito importantes na implantação e na operação desse tipo de sistema.
Com relação à distribuição da radiação solar, nota-se a incidência de uma boa percentagem de ocorrência de níveis de radiação entre 1.000 e 1.200 W/m2. Esse aspecto é muito interessante, principalmente em se tratando da localidade de Praia Grande, pois estes valores altos de radiação solar, ocorrem geralmente entre 11:00 e 14:00 h, coincidindo com o período onde se tem a maior deficiência no recurso eólico.
3.3 - COMPARAÇÃO ENTRE A PRODUÇÃO DE ENERGIA DE TURBINAS EÓLICAS
O cálculo da produção de energia é de fundamental importância para auxiliar no processo de dimensionamento, implantação, planejamento, estratégia de operação ou estudo de um sistema eólico. As turbinas eólicas para geração de eletricidade devem ser escolhidas adequadamente de acordo com cada local em particular, algo que deve ser feito com bastante cautela.
Compatibilizar adequadamente as características do vento com a curva de potência da turbina eólica é essencial para alcançar uma boa produção de energia. Pala ilustrar esse aspecto, as figuras 20(a) e 20(b), mostram uma comparação entre os desempenhos de duas turbinas, cujas características se encontram na tabela 1 e suas curvas são ilustradas nas figuras 21(a) e 21(b). Essas simulações foram obtidas considerando as alturas das turbinas iguais às alturas em que foram obtidos os dados de velocidade de vento para a localidade de Praia Grande.
Após os cálculos das variações sazonais das curvas 20a e 20b, pode ser visto que o melhor rendimento anual vem da turbina Fortis Montana de 5,8 kW, com uma produção de energia anual de 6.994 kWh contra 6.958 kWh gerados pela turbina BWC EXCEL de 7,5 kW. Isso se deve ao fato das características da turbina Montana de 5,8 kW adequarem-se mais ao perfil do vento local. Mais especificamente falando, a turbina da Fortis tem uma velocidade de partida menor, que favorece o aproveitamento da energia em baixas velocidades de vento, justamente na região onde a turbina da Bergey é menos eficiente. A partir da distribuição de freqüência anual mostrada na figura 19, é possível observar que as velocidades de vento mais freqüentes são menores que 7 m/s, com uma grande parte dessa distribuição contendo velocidades menores que 5 m/s.
Nota-se porém, que o fato da turbina Montana de 5,8 kW ter uma potência nominal menor que a turbina BWC EXCEL de 7,5 kW, não implica necessariamente em uma produção de energia inferior à gerada pela turbina de maior potência nominal. Por isso, o perfil do vento e das características das turbinas eólicas devem ser conhecidos, obtendo-se uma maior eficiência e um menor custo para o sistema de geração de eletricidade.
Vale ressaltar que ao se especificar uma determinada turbina eólica para um determinado local, aspectos importantes como o custo do kW instalado, a disponibilidade de mercado da turbina e de seus equipamentos auxiliares existentes, dentre outros, devem ser considerados.
4 - CONCLUSÕES
O programa desenvolvido neste trabalho, além de fornecer bons resultados, que podem ser visualizados na forma de curvas obtidas a partir de uma entrada de dados relativamente simples, apresenta uma interface gráfica amigável para o usuário. Vale ressaltar que a ferramenta descrita neste trabalho está em fase de teste e apresentando bons resultados, tal como pode ser visto em alguns resultados aqui ilustrados. No entanto, há muitos detalhes a serem aperfeiçoados e novos módulos que poderão ser integrados ao mesmo, tornando-o cada vez mais confiável e flexível. Um dos pontos positivos da utilização desta ferramenta, está relacionado à sua simplicidade.
As análises feitas neste trabalho retratam bem o aspecto da complementaridade e funcionam como um bom indicativo da principal razão pela qual os sistemas híbridos solar-eólico são mais confiáveis e em muitas situações mais baratos que os sistemas que utilizam apenas uma dessas fontes de maneira isolada, que é o fato da geração poder aproximar-se mais da carga a ser atendida durante praticamente todo o dia. Isso pode ser observado de maneira mais clara quando se analisa o caso particular de Praia Grande.
A combinação das características do vento local com as características da turbina eólica, em sistemas para geração de eletricidade, é um fator fundamental para um bom aproveitamento do recurso eólico. Isso pode ser facilmente constatado, comparando-se os valores de energia anual obtidos para as turbinas aqui estudadas, onde se observa, que uma turbina de menor capacidade pode gerar mais energia que uma turbina de maior capacidade para uma mesma altura de turbina.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos os membros do Grupo de Estudos e Desenvolvimento de Alternativas Energéticas - GEDAE , que participaram ativamente no desenvolvimento deste trabalho.
Ao meu orientador, Professor João Tavares Pinho, por sua dedicação e pelos seus incentivos.
Ao CNPq, pelo apoio financeiro.
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