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An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002

 

Avaliação de biomassa para uso energético na indústria oleira no município de Iranduba, estado do Amazonas, Brasil: um estudo de caso

 

 

Eyde Cristianne Saraiva dos SantosI; Rubem Cesar Rodrigues SouzaII

INúcleo de Eficiência Energética - NEFEN, Faculdade de Tecnologia, Universidade Federal do Amazonas. Av. General Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000, Campus Universitário, Aleixo, CEP: 69.0077-00 Manaus-AM, fone/fax (92) 248-7525. e-mail: eyde_cristianne@yahoo.com.br
IINúcleo de Eficiência Energética - NEFEN, Faculdade de Tecnologia, Universidade Federal do Amazonas. Av. General Rodrigo Octávio Jordão Ramos, 3000, Campus Universitário, Aleixo, CEP: 69.0077-00 Manaus-AM, fone/fax (92) 248-7525. e-mail: rcsouza@internext.com.br

 

 


RESUMO

A indústria oleira no município de Iranduba/AM apresenta-se como um segmento bastante expressivo para a economia local. No entanto, esta atividade apresenta dificuldades para sua sustentabilidade devido a problemas associados tanto ao suprimento energético (grande parte das empresas utilizam lenha) quanto a exploração de matéria-prima (argila). Buscando contribuir para a superação dos problemas, realizou-se um estudo comparativo entre o uso de resíduo de madeira e resíduo de petróleo. Realizou-se ainda, um estudo para plantio de lenha valendo-se de recursos a serem obtidos através da comercialização de créditos de carbono.

Palavras chaves: Seqüestro de carbono, mitigação, plantio energético, biomassa, olarias.


ABSTRACT

The potter industry in the municipal district of Iranduba/AM comes as a quite expressive segment for the local economy. However, this activity presents difficulties for sustainability due to problems associated as much to the energy supply (most of the companies uses firewood) as the raw material exploration (clay). Fetching to contribute for the problems prevailing, it carried out a comparative study between the wood residue and petroleum residue use. It still carried out a demand estimate for firewood originating from an energy planting.


 

 

INTRODUÇÃO

A distribuição populacional na região Norte do país, apresenta uma forte concentração nas capitais comparativamente ao interior do estado. Tal realidade decorre da precariedade das atividades industriais no interior comparativamente as capitais. A baixa atividade industrial do interior deve-se a falta de política adequada para exploração econômica dos recursos locais, associada a precariedade no suprimento energético. Sendo assim, necessário se faz que oportunidades sejam vislumbradas no sentido de garantir a sustentabilidade e o desenvolvimento das atividades econômicas no interior, e assim, contribuir para o desenvolvimento regional mais homogêneo.

Nessa perspectiva, o estudo aqui apresentado, identifica barreiras para a sustentabilidade e desenvolvimento da indústria oleira no município de Iranduba no estado do Amazonas, e procura avaliar a viabilidade e factibilidade de superação dessas barreiras no que refere-se ao suprimento energético, valendo-se não só da utilização de resíduos de recursos naturais disponíveis localmente, mas também das oportunidades que podem ser vislumbradas com a futura implementação dos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo - MDL.

 

PANORAMA DA INDÚSTRIA OLEIRA NO MUNICÍPIO DE IRANDUBA

O município de Iranduba encontra-se situado geograficamente à margem esquerda do Rio Solimões com área de 2.354 km2. Dentro dessa área existem sedimentares dominantes da formação Alter do Chão, que se apresentam como importante fonte de argilo-minerais utilizados no fabrico de cerâmica vermelha (DNPM, 200).

O segmento cerâmico-oleiro está representado por 12 olarias, cuja maioria encontra-se situada no Distrito do Cacau-Pirera, distribuídas ao longo da rodovia Manuel Urbano, margem direita do Rio Negro. Grande parte das jazidas encontram-se localizadas próximas as indústrias oleiras. Segundo DNPM (DNPM, 2000), a disponibilidade de argila no município de Iranduba é de 35.993 x 103 t, superior as reservas de Itacoatiara e Manaus, 36.203 x 103 t e 4.167 x 103 t, respectivamente.

A prevalência do uso das argilas no pólo oleiro de Iranduba é para fabricação de tijolos tipo "8 furos" e, secundariamente, na produção de telhas dos tipos Colonial, Portuguesa e Marselha.

 

CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA

O estudo foi realizado junto a empresa Nóvoa Indústria de Cerâmica LTDA - NOVICEL, localizada na Estrada Manoel Urbano, km 1,26 a 2,0 s/n, margem direita do Rio Negro. Tal empresa foi identificada através do cadastro existente no Departamento Nacional de Produção Mineral.

O transporte dos produtos são feitos via fluvial através de balsa com custo da ordem de R$ 15,00 por deslocamento para capital, além disso, há o custo com o frete do caminhão.

Na tabela 1 são descritos os produtos e suas especificações.

 

ESTUDO PARA UTILIZAÇÃO DE RESÍDUO DE MADEIRA

A Indústria NOVICEL faz uso de dois tipos de fonte no seu processo produtivo. Como fonte não renovável é utilizado um combustível fóssil denominado borra armazenada, esse é um resíduo de petróleo que fica no fundo do tanque. Esse resíduo é queimado em uma cadeira e o calor produzido é direcionado para uma câmara de queima onde os tijolos são "queimados".

Inicialmente esse resíduo era fornecido a custo zero, devendo a empresa se responsabilizar somente pelo transporte, porém como a demanda pelo resíduo cresceu bastante, a PETROBRÀS/REMAM começou a comercializá-lo.

Com a elevação do custo do resíduo de petróleo, cogitou-se a utilização de lenha e pó de serragem para o atendimento da demanda energética

O aproveitamento da serragem como energético resolveria um problema ambiental visto que os resíduos são incinerados no local produzido ou, depositados no terreno ou em cursos d'água próximos as madeireiras. Os resíduos madeireiros são destacados em diversas pesquisas como alternativa de geração de energia (BARBOSA, 1990; HUMMEL, 1994; FALK, 1997).

Diariamente são produzidos 50.000 tijolos de "8 furos", o que demanda 3 toneladas de resíduo de petróleo por mês. A energia necessária para o processo ao longo do ano é de 7.191.374.400 kcal/kg/ano. A partir desse dado fez se uma estimativa da demanda de serragem. Para tal, assumiu-se que há uma ineficiência associada à tecnologia da ordem de 5% na produção de calor utilizando serragem, comparativamente ao uso de resíduo de petróleo. Dessa forma obteve-se uma quantidade de 1.498,20 toneladas de serragem por ano.

O forno utilizado para a queima da serragem seria do tipo túnel, dotado de uma câmara de queima de geometria retangular consistindo em alvenaria de tijolos comuns, apresentando uma grela horizontal localizada na parte superior do forno. A carga de tijolos a ser "queimada" fica adequadamente distribuída em cima de um carinho que atravessa o forno. Os gases da combustão atravessam de cima para baixo a carga de tijolos, sendo depois levados, através de um canal subterrâneo situado na base do forno, até a chaminé sob o principio de tiro natural da chaminé ou até a estufa (secador) são aproveitados para secar os tijolos úmidos que irão ser queimados em seguida (Figura 1).

Os valores assumidos para a análise de viabilidade econômica estão apresentados na tabela 2.

Com a análise de viabilidade econômica obteve-se uma Taxa Interna de Retorno de 90% ao ano e um Tempo Retorno (TR) de 1 ano e 3 meses. Considerando-se o valor que pode ser obtido com a comercialização dos créditos de carbono devido a substituição do combustível fóssil pelo resíduo de madeira, o resultado da análise de viabilidade econômica manteve-se, porém verificou-se a disponibilidade de US$ 7.498,50/ano. Tal recursos poderia ser utilizado na recuperação de áreas degradadas pela extração da argila e/ou desmatamento, garantido a condição de exigibilidade necessária para a comercialização dos créditos de carbono.

A fase embrionária do mercado de carbono desperta interesse de participantes do lado da oferta bem como da demanda. Embora não haja uma estatística oficial, o constante monitoramento do mercado auxilia a torná-lo mais tangível. Uma análise deste mercado encomendada pelo Banco Mundial revelou que já foram realizadas várias transações e que esse número se aproxima de 60 desde 1996, representando 55 milhões de toneladas de CO2, a preços que variam de US$ 0,60 até US$ 3,00 por tonelada (JUNQUEIRA, 2002).

Para fazer a avaliação das emissões dos gases do efeito estufa, utilizou-se uma equação na qual multiplica-se o fator de emissão do combustível pelo poder calorífico inferior do combustível e multiplica-se ainda, pelo consumo do combustível (COELHO et al., 2000). Na tabela 3 são apresentados os valores assumidos para essa análise.

A equação utilizada para o cálculo das emissões foi:

Emissões: F.E.*P.C.I. * Consumo          (1)

Onde:

F.E.: fator de emissão (t/TJ de combustível);

P.C.I.: pode calorífico inferior (kJ/kg ou kJ/m3);

Consumo: consumo anual de combustível (kg/ano ou m3/ano).

O resultado dessas estimativas são apresentados na tabela 4. A queima de resíduo de petróleo na olaria emite consideráveis conteúdos de GEEs. A substituição de uma fonte não renovável por uma renovável, é uma ação mitigadora, que além de reduzir as emissões, visa o aproveitamento de biomassa que era desprezada e diminui a pressão sobre a floresta, visto que sem o combustível fóssil, eles voltariam a utilizar a lenha.

Portanto, deve-se pensar como estratégia de sustentabilidade ao pólo oleiro do município de Iranduba, o uso resíduos do setor madeireiro para fins energéticos e no caso da NOVICEL em substituição ao resíduo de petróleo.

 

ESTUDO PARA GARANTIR O SUPRIMENTO DE LENHA

Quase toda a experiência com biomassa para geração de energia é baseada no uso de refugos e combustíveis residuais, primariamente refugos de madeira e resíduos agrícolas. O uso comercial de combustível de plantações desenvolvidas para geração de energia é limitado a poucos exemplos (WINROCK INTERNATIONAL, 1997).

Visando minimizar os efeitos negativos das atividades oleiras no meio ambiente, estudos relacionados à produção de biomassa para fins energéticos têm sido conduzidos na Estação Experimental da Costa do Caldeirão pertencente a EMBRAPA-CPAA, no projeto institucional intitulado "Seleção e manejo de espécies com potencial para produção de energia", em parceria com o Instituto de Pesquisas da Amazônia - INPA, e a Universidade Federal do Amazonas - UFAM, através do projeto "Alternativas para a produção de energia elétrica de comunidades isoladas na Amazônia". Além dos estudos a cerca do crescimento e manejo, a análise do poder calorífico da lenha e do carvão provenientes das amostras coletadas estão em andamento para que se comprove o potencial das espécies vegetais estudadas para uso energético (DUZAT et al., 2002).

Resultados preliminares são apresentados na tabela 5 e confirmam a aptidão em termos de crescimento de algumas espécies exóticas e nativas para o estabelecimento de um banco de lenha na região de Iranduba. As essências florestais com idade de corte para três anos são Acácia Mangium, Acácia augustifólia e para cinco anos Tachigalia chrysophylhum. A A. Mangium e A. augustifólia destacaram-se frente às outras espécies com características e potencial para produção de lenha (ATAYDE & AZEVEDO, 2002).

Adotando-se como estratégia a utilização de lenha plantada, quando não houver disponibilidade de resíduos madeireiros e assim evitar que o resíduo de petróleo seja novamente utilizado, calculou-se a área a ser plantada por diferentes espécies para garantir o suprimento energético da empresa em estudo. Para definição da área necessária assumiu-se a quantidade de energia necessária para o processo ao longo do ano na ordem de 7.911.374.400 kcal/kg/ano e ainda um percentual de ineficiência associada à tecnologia da ordem de 5% na produção de calor, obteve-se uma demanda de 1.527,32 toneladas de lenha da A. manguim, sendo necessária uma área de 42 hectares. Quando comparada com a A. augustifolia e com a T. chysophylhum, tanto a quantidade de lenha necessária para processo por ano, quanto à área a ser plantada para o fornecimento da lenha são inferiores (Tabela 6), podendo ser mais proveitosa à utilização da A. manguim do ponto de vista econômico, pois os custos para implantação do plantio seriam menores, considerando-se a área.

 

 

É importante ressaltar que a área foi obtida partindo-se da premissa que a idade de corte é de 3 anos. Sendo assim, essa seria a área total para garantir o crescimento da espécie após o corte.

Sob o ponto de vista ecológico, deve-se considerar que as acácias são espécies florestais exóticas, e teoricamente por seu centro de origem não ser na Amazônia, seus inimigos naturais teoricamente não estariam neste ecossistema. Também não foram encontrados estudos sobre a ocorrência de pragas e doenças nos plantios dessa espécie no Amazonas, porém sabe-se que as plantações homogêneas estão mais suscetíveis à incidência de pragas e doenças (DUBOIS, 1998).

Os sistemas agroflorestais são formas de uso da terra que se apoiam numa forte integração (social e ecologicamente aceitável) de árvores e ou arbustos nas atividades agrícolas e pecuárias de uma forma simultânea ou seqüencial e visando assegurar uma produção global maior e sustentável, em longo prazo (DUBOIS, 1992). As alternativas de uso agroflorestal são numerosas. Para o caso em discussão seria necessário um estudo mais aprofundado considerando informações sobre os custos de implantação, manejo e ecologia da espécie para proposição de alternativas.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esse estudo demonstrou que a substituição de resíduo de petróleo por serragem é viável. Além de ser um ótimo negócio, a substituição da fonte não renovável de energia pela renovável, possibilita o aproveitamento de biomassa podendo ainda resolver um problema ambiental. Com relação implantação de plantios para produção de lenha, pesquisas devem ser conduzidas com relação ao manejo e custos de implantação do plantio, visto que o potencial já foi comprovado para produção de lenha a partir de acácias.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] DNPM - Departamento Nacional de Produção Mineral. Relatório do Projeto Regularização e Levantamento ambiental do Setor Oleiro nos Municípios de Iranduba e Manacapuru, DNPM, Manaus, 2000.

[2] BARBOSA, R.I Análise do Setor Madeireiro do, Estado de Roraima, Acta Amazônica, 22(3):17-25, 1990.

[3] HUMMEL, A. C. Diagnóstico do Subetor Madeireiro do estado do Amazonas. Series Estudos Setoriais. Edição SEBRAE, Manaus, 1994.

[4] FALK, B. Wood recycling: oportunities for woodwaste recurce. Forest Products Journal, 47(6):17-22, 1997.

[5] JUNQUEIRA, M. S. Histórico e Mercado de Créditos de Carbono. In: Worshop Mudança Climática, Belo Horizonte, 2002.

[6] COELHO, S. PALETTA, C.E.M.; FREITAS, M.A.V. Medidas Mitigadoras para Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa na Geração Termelétrica, Brasília, Dupligráfica, 2000.

[7] GASA-FCT. Emissão e controle de gases do efeito estufa em Portugal. Universidade de Lisboa, Lisboa, 2000.

[8] Winrock International. Biomass fuel from Woody Crops for Electric Power. Bioenergy Systems Report, December, 1997.

[9] DUZAT, R.M; SOUZA, R.C.R; AZEVEDO, A.C.; AZEVEDO, C.P.; SANTOS, E.C.S.; SOUZA, C.M. Relatório do Projeto Alternativas para o Suprimento Energético em Comunidades Isoladas na Amazônia, Manaus, 2002.

[10] ATAYDE, C.; AZEVEDO, C.P. Caracterização da Biomassa e de Propriedades Tecnológicas de Sete Espécies com potencial para produção de Energia, Instituto de Tecnologia da Amazônia, (monografia), Manaus, 2002.

[11] DUBOIS, J.C.L. Manual Agroflorestal para Amazônia. Rebraf. 1998.

[12] DUBOIS, J.C.L. Alternativas Agroflorestais de Desenvolvimento para o Trópico Úmido Brasileiro, Rebraf. 4(1), 1992.