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An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002

 

Impacto da utilização de inversores em sistemas de geração distribuída sobre equipamentos rurais

 

 

Falcondes J. Mendes de Seixas; Dionízio Paschoareli Jr.; Max J. A. Faria Jr.

Grupo de Pesquisa em Fontes Alternativas e Aproveitamento de Energia, UNESP - Universidade Estadual Paulista - DEE - Departamento de Engenharia Elétrica, Av. Brasil, 364 - Caixa Postal 31 - CEP: 15385-000 - Ilha Solteira - SP, Fone: (18) 3743-1150 Fax: (18) 3743-1163 - http://www.dee.feis.unesp.br

 

 


RESUMO

A utilização da capacidade energética disponível no local, através de geração alternativa de energia elétrica, reduz os custos associados a construção de grandes linhas de transmissão de energia e grandes usinas geradoras.
Entre as fontes alternativas de energia, as fotovoltáicas e as eólicas são facilmente implementadas e cumprem um papel importante na produção local de energia, pois utilizam fonte primária renovável com baixos custos de implantação e manutenção, quando comparada a outras formas de geração. Entretanto, por necessitarem de inversores para transformar a energia produzida em corrente contínua ou corrente alternada assíncrona, em corrente alternada a freqüência industrial, os sistemas alternativos sofrem o efeito das distorções nas formas de onda da tensão produzida. Estas distorções impostas pelos geradores, somadas as distorções provocadas por cargas não lineares alimentadas em corrente alternada, provocam efeito prejudicial ao sistema em CA como um todo.
Este artigo faz uma compilação das fontes de distorção harmônicas, apresenta as definições relacionadas a distorção harmônica e discute os efeitos de tais distorções nas cargas mais comuns aos sistemas elétricos rurais.

Palavras-chave: Fontes alternativas; inversores; conversores estáticos distorções harmônicas.


ABSTRACT

The utilisation of locally available energy, by using alternative electrical energy generation, reduces the costs related to building long transmission lines and large electric power plants.
Among the alternative energy sources, the photovoltaics and the wind generators are easily implemented and play an important role in local energy generation. These energy sources are totally renewable, with low implementation and maintenance costs, when compared to other sources.
However, as they need inverters to transform the generated direct current (or asynchronous frequency) energy into alternating current at industrial frequency, the alternative systems suffer the harmonic distortion effects. Such voltage and current distortions, imposed by the generators, when added to those generated by non-linear loads, results in harmful effects on the system as a hole.
This paper gives an overview on the harmonic distortion sources, presents definitions related to harmonic distortion and discusses the effect of such distortions on the main rural area equipment.


 

 

INTRODUÇÃO

A grande procura por formas alternativas de geração e de aproveitamento energético, motivada pela crise no setor energético do Brasil e também pela redução do impacto no meio ambiente, vem não apenas para substituir mas também para somar esforços no sentido de racionalizar o uso do potencial energético disponível.

O crescimento e modernização das atividades agrícola e industrial, somado ao crescimento populacional, demandam um volume cada vez maior da capacidade de geração de energia. A exaustão dos recursos naturais e a crescente agressão ao meio ambiente para suprir tal demanda vêm sendo apontados como um fator importante de desequilíbrio ao ecossistema. Neste contexto, as formas alternativas de produção e aproveitamento de energia limpa têm-se mostrado adequadas para agregar ao modelo energético em vigor.

No que diz respeito a quantidade de energia produzida, existem duas formas de produção de energia a partir de fontes alternativas. Grandes blocos de energia podem ser gerados de modo a substituir as usinas que atualmente alimentam os sistemas elétricos. Cria-se, desta forma, os sítios eólicos e solares (da ordem de algumas dezenas de MW), cujas características de operação se aproximam das gerações convencionais, no que se refere ao despacho e utilização da energia. Alternativamente, pequenos módulos geradores podem ser utilizados para suprir de maneira localizada as cargas ou grupo de cargas que compõe um sistema reduzido. Esta geração distribuída (da ordem de dezenas ou centenas de kW) caracteriza-se pela operação independente em relação ao sistema elétrico principal e é tipicamente utilizada em sistemas rurais ou mesmo em sistemas que atendem a comunidades isoladas.

A geração alternativa ao sistema principal de geração (no Brasil, quase que totalmente disponibilizada através de grandes usinas hidrelétricas) pode fornecer energia elétrica na forma alternada (utilizando basicamente máquinas rotativas como geradores) ou na forma contínua (energia gerada por painéis fotovoltáicos ou por sistemas eólicos, muito embora contenha partes girantes).

Para que a energia gerada na forma contínua possa ser utilizada pela maioria dos aparelhos elétricos rurais ou residenciais, que utilizam majoritariamente a corrente alternada), é necessário que seja feita uma conversão da energia. No que concerne a esta conversão de energia, os conversores estáticos realizam um importante e fundamental papel de interface entre os módulos geradores de energia e a carga. Como carga subentende-se um equipamento elétrico (ou eletrônico) específico ou ainda um consumidor já conectado à rede elétrica comercial.

A aplicação dos conversores estáticos nos sistemas é imprescindível para que haja um melhor aproveitamento da energia produzida pelos módulos geradores. Frente aos custos totais de implantação dos sistemas, os conversores representam pequena parcela de investimento, em torno de 10% para sistemas de médio porte [1]. No entanto, representam o elo mais frágil no que se refere a determinação da confiabilidade do sistema e da qualidade do fornecimento de energia.

Particularmente os inversores (ou conversores CC-CA), que são responsáveis para adaptar a tensão contínua gerada à forma alternada, devem alimentar as cargas do sistema (lâmpadas, moto-bombas, eletrodomésticos e equipamentos) com tensão compatível às solicitações de cada carga. Em muitos casos, principalmente para reduzir custos, a forma de onda da tensão gerada foge de um sistema senoidal convencional para uma forma de onda de três ou mais níveis, introduzindo aí um elevado conteúdo de distorção harmônica.

Se é vital manter baixo o nível de oscilação do valor eficaz do sistema de tensão gerado, para operação adequada e preservação das cargas que compõem a propriedade rural, é imprescindível que haja qualidade na forma de onda desta tensão gerada. Em outras palavras pode-se dizer que a vida útil e a correta operação dos principais equipamentos de uma propriedade, como as lâmpadas compactas, motores e equipamentos eletrônicos, estão diretamente influenciados pela distorção harmônica da tensão de alimentação. Até o sistema de proteção da instalação fica comprometido com a má qualidade do fornecimento de energia.

O principal objetivo deste trabalho é descrever os efeitos da utilização de inversores em equipamentos alimentados com corrente alternada, a partir da compilação de informações disponíveis na literatura. Esta análise é particularizada para equipamentos presentes em sistemas independentes de geração, mais especificamente em sistemas rurais.

É feito um levantamento dos principais tipos de inversores utilizados nos sistemas distribuídos, analisadas as respectivas formas de onda de tensão gerada e o impacto que as distorções podem trazer sobre os equipamentos usuais de uma propriedade rural que utiliza fontes alternativas de energia.

Além disso, este trabalho motiva pesquisas relacionadas ao aproveitamento energético regional através do recém criado Grupo de Pesquisa em Fontes Alternativas e Aproveitamento de Energia, junto ao CNPq, com o propósito de realizar pesquisas nas mais diversas áreas relacionadas com o tema do grupo.

 

INVERSORES

Como anteriormente citado, a corrente elétrica gerada pela maioria das fontes alternativas de energia é convencionalmente na forma contínua. Assim, a menos que o usuário necessite de corrente contínua na alimentação de sua carga, é necessária a conversão da energia produzida em corrente alternada. O conversor eletrônico de corrente contínua em corrente alternada, ou inversores, utilizados em fontes alternativas de energia, são divididos em três grupos principais, no que diz respeito a forma de onda da saída: onda quadrada, onda senoidal modificada (ou quasi-senoidal) e onda senoidal.

Os inversores de onda quadrada e os quasi-senoidais são bem mais baratos que os senoidais (para uma mesma ordem de potência), mas não apresentam forma de onda senoidal na saída. Várias cargas são sensíveis a forma de onda da alimentação, tais como TVs, computadores, etc. Além disso, a alimentação de cargas CA, a partir de fontes não senoidais, geram uma grande quantidade de problemas, que são objetos de análise neste artigo.

O inversor senoidal proporciona uma tensão de saída cuja forma de onda é muito próxima de uma senoide. Contudo, o custo pode ser muito superior ao dos conversores quasi-senoidais e, numa análise preliminar, as cargas a serem alimentadas podem não justificar tais investimentos. O fato de apresentar tensão de saída senoidal diminui os aspectos negativos associados à inserção de tensão não senoidal em sistema senoidais, como será avaliado oportunamente.

As formas de onda dos três grupos de inversores são apresentadas na Fig. 1.

 

 

Formas de onda em inversores. Os inversores, que fazem a conversão de corrente contínua em corrente alternada, são analisados como fontes de tensão senoidal, cujas componentes harmônicas dependem da característica do conversor. Alguns formas de onda típica são apresentadas, no que diz respeito ao seu conteúdo harmônico.

Onda quadrada. O inversor mais rudimentar tem tensão de saída não controlada com a forma de onda quadrada, de acordo com a Fig. 2 [2]

 

 

Esta forma de onda é composta por uma série infinita de harmônicas de ordem impar, sendo que a magnitude da tensão de cada ordem harmônica é apresentada na equação .

onde Van : é a tensão harmônica de n-ésima ordem

Val : é a magnitude da componente fundamental

Va : é o valor rms total.

Onda senoidal modificada. A forma de onda senoidal modificada (ou quasi-senoidal) é novamente apresentada na Fig. 3 [2].

 

 

As componentes harmônicas de tensão apresentadas por esta forma de onda é dada pela equação .

onde Vd é o valor da tensão CC de alimentação

Se =π/3, as componentes harmônicas presentes nos inversores monofásicos são as mesmas que para os inversores trifásicos.

Onda senoidal. O inversor que apresenta forma de onda senoidal possui a tensão de saída modulada em largura de pulso (pulse-width modulation- PWM). Este inversor apresenta componentes harmônicas cujas ordens são múltiplas da freqüência de chaveamento das chaves eletrônicas que, comercialmente, operam na faixa de 1kHz até 10kHz.

A forma de onda típica de um PWM é apresentada na Fig. 4 [2]. Esta é a forma de onda de um inversor PWM unipolar, cujas componentes harmônicas de tensão são dadas pela equação [3]

 

 

 

 

A forma de onda PWM unipolar tem como característica a geração de ordens harmônicas ímpares, múltiplas da freqüência de chaveamento, cuja lei de formação é dada por:

h=j(2mf)±k

sendo h= ordem harmônica

mf=relaçao entre a freqüência de chaveamento e a freqüência fundamental (mf=fs/fo)

k=número ímpar inteiro positivo

j= número par inteiro positivo

O resultado da utilização dos inversores de cada um dos dois grupos, no que diz respeito ao efeito da forma de onda não senoidal nos componentes do sistema são analisados, a partir das definições de potência e distorções harmônicas apresentadas a seguir [4,5].

 

FATOR DE POTÊNCIA

O fator de potência (FP) é um índice que define a eficácia do consumo de potência. Um baixo fator de potência indica uma utilização pouco eficiente da energia fornecida. O fator de potência, mostrado na expressão , é definido como a relação entre a potência ativa e a potência aparente consumidas por um dispositivo ou equipamento, independentemente das formas apresentadas pelas ondas de tensão e de corrente, desde que sejam sinais variantes no tempo, periódicos e de mesma freqüência.

Em um sistema com formas de onda de tensão e corrente senoidais, a equação torna-se igual ao cosseno da defasagem entre as duas ondas (φ), conforme a equação .

O produto das senóides resulta no valor instantâneo da potência, cujo valor médio resulta na potência ativa (P). Em torno deste valor médio flutua o sinal da potência instantânea e o valor de pico deste sinal é numericamente igual à potência aparente (S). Quando a defasagem é nula o produto (potência instantânea) será sempre maior ou igual a zero.

Para uma defasagem de 90º entre os sinais de tensão e de corrente, a potência instantânea apresenta-se com um valor médio (correspondente à potência ativa) nulo, como é de se esperar. A amplitude da onda de potência é numericamente igual à potência aparente.

No caso de defasagem entre 0 e 90º, a potência instantânea assume valores positivos e negativos, mas seu valor médio (que corresponde à potência ativa) é positivo

Se a tensão é senoidal e a corrente é distorcida, o FP é dado pela equação .

onde cosφ é o deslocamento entre as componentes fundamentais de tensão e corrente e I1/Irms é o fator de distorção de corrente.

O valor rms da corrente de entrada também pode ser expresso em função das componentes harmônicas, como mostra a equação .

Para uma situação em que a corrente está "defasada" da tensão (típica de retificadores controlados a tiristores, com filtro indutivo no lado CC), a componente fundamental da corrente (que está "em fase" com a onda quadrada) apresenta uma defasagem em relação ao sinal de tensão.

A relação entre as correntes é chamada de fator de forma e o termo em cosseno é chamado de fator de deslocamento

Define-se a Taxa de Distorção Harmônica (THD - Total Harmonic Distortion) como sendo a relação entre o valor RMS das componentes harmônicas da corrente e a fundamental, como mostrado na equação .

Assim, o FP pode ser reescrito pela equação .

É evidente a relação entre o FP e a distorção da corrente absorvida da linha. Neste sentido, existem normas internacionais que regulamentam os valores máximos das harmônicas de corrente que um dispositivo ou equipamento pode injetar na linha de alimentação.

O cálculo do FP para o caso da tensão e da corrente não-senoidais, mas de mesma freqüência, deve seguir a equação , ou seja, é necessário obter o valor médio do produto dos sinais a fim de se conhecer a potência ativa. Num caso genérico, tanto a componente fundamental quanto as harmônicas podem produzir potência, desde que existam as mesmas componentes espectrais na tensão e na corrente, e que sua defasagem não seja de 90º.

FP e THD da corrente. Esta análise é feita partindo-se de duas situações. Na primeira supõe-se constante a potência ativa, ou seja, parte-se de uma instalação ou carga dada, a qual precisa ser alimentada. Verificam-se algumas conseqüências do baixo FP. Na segunda situação, analisando a partir dos limites de uma linha de transmissão, verifica-se o ganho na disponibilização de energia para o consumo.

Podem ser citadas como desvantagens de um baixo FP e elevada distorção, dentre outros, os seguintes fatos:

• A máxima potência ativa absorvível da rede é fortemente limitada pelo FP;

• As harmônicas de corrente exigem um sobredimensionamento da instalação elétrica e dos transformadores, além de aumentar as perdas (efeito pelicular);

• A componente de 3ª harmônica da corrente, em sistema trifásico com neutro, pode ser muito maior do que o normal;

• O achatamento da onda de tensão, devido ao pico da corrente, além da distorção da forma de onda, pode causar mau-funcionamento de outros equipamentos conectados à mesma rede;

• As componentes harmônicas podem excitar ressonâncias no sistema de potência, levando a picos de tensão e de corrente, podendo danificar dispositivos conectados à linha.

Perdas de transmissão. As perdas de transmissão de energia elétrica são proporcionais ao quadrado da corrente eficaz que circula pelos condutores. Assim, para uma dada potência ativa, quanto menor for o FP, maior será a potência reativa e, como conseqüência, a corrente pelos condutores.

A Tabela 1 mostra um exemplo de redução de perdas devido à elevação do FP. Toma-se como exemplo uma instalação com consumo anual de 200MWh, na qual supõe-se uma perda de 5% e se eleva o FP de 0,78 para 0,92. Observa-se uma redução nas perdas de 28,1%.

 

 

Capacidade de transmissão. O caso do sistema de transmissão, para o qual a grandeza constante é a potência aparente, é ela que define a capacidade térmica das linhas.

Uma análise fasorial só pode ser aplicada para grandezas senoidais e de mesma freqüência. Assim, o triângulo de potência pode ser usado em análises dentro destas condições, ou seja, quando as ondas de tensão e/ou de corrente são não-senoidais a análise só será correta se for feita uma combinação de fasores relativos a cada componente harmônica.

Um baixo FP significa que grande parte da capacidade de condução de corrente dos condutores utilizados na instalação está sendo usada para transmitir uma corrente que não produzirá trabalho na carga alimentada. Mantida a potência aparente (para a qual é dimensionada a instalação), um aumento do FP significa uma maior disponibilidade de potência ativa, como indicam os diagramas da Fig. 6.

 

 

Uma análise análoga pode ser feita em termos de uma instalação existente, a qual poderia ser utilizada para alimentação de uma carga de maior potência, ou para uma quantidade maior de cargas.

 

EFEITOS DE HARMÔNICOS NOS COMPONENTES DO SISTEMA ELÉTRICO

O grau com que harmônicas podem ser toleradas em um sistema de alimentação depende da susceptibilidade da carga (ou da fonte de potência). Os equipamentos menos sensíveis, geralmente, são os de aquecimento (carga resistiva), para os quais a forma de onda não é relevante. Os mais sensíveis são aqueles que, em seu projeto, assumem a existência de uma alimentação senoidal como, por exemplo, equipamentos de comunicação e processamento de dados. No entanto, mesmo para as cargas de baixa susceptibilidade, a presença de harmônicas (de tensão ou de corrente) podem ser prejudiciais, produzindo maiores esforços nos componentes e isolantes.

Motores e geradores. O maior efeito dos harmônicos em máquinas rotativas (indução e síncrona) é o aumento do aquecimento devido ao aumento das perdas no ferro e no cobre. Afeta-se, assim, sua eficiência e o torque disponível.

O sobre-aquecimento que pode ser tolerado depende do tipo de rotor utilizado. Rotores bobinados são mais seriamente afetados do que os de gaiola. Os de gaiola profunda, por causa do efeito pelicular, que desloca a condução da corrente para a superfície do condutor em freqüências elevadas, produzem maior elevação de temperatura do que os de gaiola convencional.

Outro fenômeno é a presença de harmônicos no fluxo, produzindo alterações no acionamento, como componentes de torque que atuam no sentido oposto ao da fundamental, como ocorre com os harmônicos 5º , 11º, 17º, etc. Isto significa que tanto o quinto componente, quanto o sétimo induzem uma sexta harmônica no rotor. O mesmo ocorre com outros pares de componentes. Com isso, tem-se um possível aumento do ruído audível, quando comparado com alimentação senoidal, devido ao surgimento de torques contrários ao torque criado pela componente fundamental do fluxo. Este efeito provoca esforços mecânicos adicionais no eixo da máquina, além de irritabilidade auditiva.

O efeito cumulativo do aumento das perdas reflete-se numa diminuição da eficiência e da vida útil da máquina. A redução na eficiência é indicada na literatura como de 5 a 10% dos valores obtidos com uma alimentação senoidal. Este fato não se aplica a máquinas projetadas para alimentação a partir de inversores, mas apenas àquelas de uso em alimentação direta da rede.

Algumas componentes harmônicas, ou pares de componentes (por exemplo, 5ª e 7ª, produzindo uma resultante de 6ª harmônica) podem estimular oscilações mecânicas em sistemas turbina-gerador ou motor-carga, devido a uma potencial excitação de ressonâncias mecânicas. Isto pode levar a problemas industriais, como por exemplo na produção de fios, em que a precisão no acionamento é elemento fundamental para a qualidade do produto.

Transformadores. Também neste caso tem-se um aumento nas perdas. Harmônicos na tensão aumentam as perdas no ferro, enquanto harmônicos na corrente elevam as perdas no cobre. A elevação das perdas no cobre deve-se principalmente ao efeito pelicular, que implica numa redução da área efetivamente condutora à medida que se eleva a frequência da corrente.

Normalmente as componentes harmônicas possuem amplitude reduzida, o que colabora para não tornar esses aumentos de perdas excessivos. No entanto, podem surgir situações específicas (ressonâncias, por exemplo) em que surjam componentes de alta freqüência e amplitude elevada.

Além disso o efeito das reatâncias de dispersão fica ampliado, uma vez que seu valor aumenta com a freqüência.

Associada à dispersão existe ainda outro fator de perdas que se refere às correntes induzidas pelo fluxo disperso. Esta corrente manifesta-se nos enrolamentos, no núcleo, e nas peças metálicas adjacentes aos enrolamentos. Estas perdas crescem proporcionalmente ao quadrado da freqüência e da corrente.

Tem-se ainda uma maior influência das capacitâncias parasitas (entre espiras e entre enrolamento) que podem realizar acoplamentos não desejados e, eventualmente, produzir ressonâncias no próprio dispositivo.

Cabos de alimentação. Em razão do efeito pelicular, que restringe a secção condutora para componentes de freqüência elevada, também os cabos de alimentação têm um aumento de perdas devido às harmônicas de corrente. Além disso tem-se o chamado "efeito de proximidade", o qual relaciona um aumento na resistência do condutor em função do efeito dos campos magnéticos produzidos pelos demais condutores colocados nas adjacências.

A Fig. 7 mostra curvas que indicam a seção transversal e o diâmetro de condutores de cobre que devem ser utilizados para que o efeito pelicular não seja significativo (aumento menor que 1% na resistência). Note que para 3 kHz o máximo diâmetro aconselhável é aproximadamente uma ordem de grandeza menor do que para 50Hz. Ou seja, para freqüências acima de 3kHz um condutor com diâmetro maior do que 2,5mm já começa a ser significativo em termos de efeito pelicular.

 

 

Além disso, caso os cabos sejam longos e os sistemas conectados tenham suas ressonâncias excitadas pelas componentes harmônicas, podem aparecer elevadas sobre-tensões ao longo da linha, podendo danificar o cabo.

Na Fig. 8 tem-se a resposta em freqüência, para uma entrada em tensão de um cabo de 10km de comprimento, com parâmetros obtidos de um cabo trifásico de 2AWG, 6kV. As curvas mostram o módulo da tensão no final do cabo, ou seja, sobre a carga (do tipo RL). Dada a característica indutiva da carga, esta comporta-se praticamente como um circuito aberto em freqüências elevadas. Quando o comprimento do cabo for igual a 1/4 do comprimento de onda do sinal injetado, este "circuito aberto" no final da linha reflete-se como um curto-circuito na fonte. Isto repete-se para todos os múltiplos ímpares desta freqüência. As duas curvas mostradas referem-se à resposta em freqüência sem e com o efeito pelicular. Nota-se que considerando este efeito tem-se uma redução na amplitude das ressonâncias, devido ao maior amortecimento apresentado pelo cabo por causa do aumento de sua resistência.

Capacitores. O maior problema aqui é a possibilidade de ocorrência de ressonâncias (excitadas pelas harmônicas), podendo produzir níveis excessivos de corrente e/ou de tensão. Além disso, como a reatância capacitiva diminui com a freqüência, tem-se um aumento nas correntes relativas às harmônicas presentes na tensão.

As correntes de alta freqüência, que encontrarão um caminho de menor impedância pelos capacitores, elevarão as suas perdas ôhmicas. O decorrente aumento no aquecimento do dispositivo encurta a vida útil do capacitor.

A Fig. 9 mostra um exemplo de correção do fator de potência de uma carga e que leva à ocorrência de ressonância no sistema. Na Fig. 10 são mostradas as figuras relativas à tensão e às correntes da fonte nos diferentes circuitos.

 

 

Considere o circuito (a), no qual é alimentada uma carga do tipo RL, apresentando um baixo fator de potência. No circuito (b), é inserido um capacitor que corrige o fator de potência, como se observa pela forma da corrente mostrada na Fig. 10 (intermediária). Suponhamos que o sistema de alimentação possua uma reatância indutiva, a qual interage com o capacitor e produz uma ressonância série (que conduz a um curto-circuito na freqüência de sintonia). Caso a tensão de alimentação possua uma componente nesta freqüência, esta harmônica será amplificada. Isto é observado na Fig. 10 (inferior), considerando a presença de uma componente de tensão de 5ª harmônica, com 3% de amplitude. Observe a notável amplificação na corrente, o que poderia produzir importantes efeitos sobre o sistema.

Equipamentos eletrônicos. Alguns equipamentos podem ser muito sensíveis as distorções na forma de onda de tensão. Por exemplo, se um aparelho utiliza os cruzamento com o zero (ou outros aspectos da onda de tensão) para realizar alguma ação, distorções na forma de onda podem alterar ou mesmo inviabilizar seu funcionamento.

Caso as harmônicas penetrem na alimentação do equipamento por meio de acoplamentos indutivos e capacitivos (que se tornam mais efetivos com o aumento da freqüência), eles podem também alterar o bom funcionamento do aparelho.

Aparelhos de medição. Aparelhos de medição e instrumentação em geral são afetados por harmônicas, especialmente se ocorrerem ressonâncias que afetam a grandeza medida.

Dispositivos com discos de indução, como os medidores de energia, são sensíveis a componentes harmônicas, podendo apresentar erros positivos ou negativos, dependendo do tipo de medidor e da harmônica presente. Em geral a distorção deve ser elevada (20%) para produzir erro significativo.

Relés de proteção e fusíveis. Um aumento da corrente eficaz devido a harmônicas sempre provocará um maior aquecimento dos dispositivos pelos quais circula a corrente, podendo ocasionar uma redução em sua vida útil e, eventualmente, sua operação inadequada.

Em termos dos relés de proteção não é possível definir completamente as respostas devido à variedade de distorções possíveis e aos diferentes tipos de dispositivos existentes.

Estudos afirmam que os relés de proteção geralmente não respondem a qualquer parâmetro identificável, tais como valores eficazes da grandeza de interesse ou a amplitude de sua componente fundamental. O desempenho de um relé considerando uma faixa de freqüências de entrada não é uma indicação de como aquele componente responderá a uma onda distorcida contendo aquelas mesmas componentes espectrais. Relés com múltiplas entradas são ainda mais imprevisíveis.

 

FONTES DE DISTORÇÃO HARMÔNICA

Serão apresentados a seguir equipamentos e fenômenos que produzem contaminação harmônica no sistema elétrico. Quando se fizer referência ao termo ideal, significa que estão sendo desconsideradas os efeitos indutivos do sistema de alimentação, ou seja, considera-se a alimentação feita a partir de uma fonte ideal.

Conversores. Serão vistos aqui alguns casos típicos de componentes harmônicas produzidas por conversores eletrônicos de potência, tais como retificadores e inversores.

Formas de onda em retificadores. Uma grande quantidade de equipamentos elétricos domésticos e rurais utilizam retificadores na entrada de alimentação. Desta forma, o efeito dos retificadores na qualidade da energia deve ser avaliado.

A Fig. 11 mostra um retificador trifásico a diodos alimentando uma carga do tipo RL, ou seja, que tende a consumir uma corrente constante, caso sua constante de tempo seja muito maior do que o período da rede.

 

 

Na Fig. 12 tem-se a forma de tensão de saída do retificador, numa situação ideal. Supondo uma corrente constante, sem ondulação sendo consumida pela carga, a forma de onda da corrente na entrada do retificador é mostrada na Fig. 13.

 

 

As amplitudes e as ordens das componentes harmônicas deste sinal são dadas pelas equações e , respectivamente:

onde:

h - é a ordem harmônica;

k - é qualquer inteiro positivo;

q - é o número de pulsos do circuito retificador (seis, no exemplo).

A comutação. Uma forma de corrente retangular como a suposta na Fig. 13 pressupõe a não existência de indutâncias em seu caminho, ou então uma fonte de tensão infinita, que garante a presença de tensão qualquer que seja a derivada da corrente.

Na presença de indutâncias, a transferência de corrente de uma fase para outra não pode ser instantânea. Ao invés disso, existe um intervalo no qual estarão em condução o diodo que está entrando e aquele que está em processo de desligamento. Isto configura um curto-circuito na entrada do retificador. A duração deste curto-circuito depende de quão rapidamente se dá o crescimento da corrente pela fase que está entrando em condução, ou seja, da diferença de tensão entre as fases que estão envolvidas na comutação.

A Fig. 14 mostra as formas de onda de tensão e corrente na rede, considerando o efeito da comutação. Neste caso a corrente não é plana, mas apresenta uma ondulação determinada pelo filtro indutivo do lado CC. Mesmo neste caso pode-se notar que as transições da corrente de entrada não são instantâneas e que durante as transições, nota-se uma perturbação na tensão na entrada do retificador. O valor instantâneo desta tensão é a média das tensões das fases que estão comutando, supondo iguais as indutâncias da linha. Este "afundamento" da tensão é chamado de "notching".

 

 

Como se nota, a distorção na tensão ocorre devido à distorção na corrente associada à reatância da linha.

Retificadores com filtro capacitivo. Conforme já foi visto, a grande parte dos equipamentos eletrônicos possuem um estágio de entrada constituído por um retificador monofásico com filtro capacitivo. este tipo de circuito produz na rede correntes de forma impulsiva, centrados aproximadamente no pico da onda senoidal. Nota-se a grande amplitude das harmônicas, produzindo, certamente, uma elevada THD.

Com entrada trifásica, quando são observados dois pulsos de corrente em cada semi-ciclo, como mostra a Fig. 15, a significativa distorção que pode ocorrer na forma de onda da tensão devido à queda de tensão na reatância da linha.

 

 

CONCLUSÃO

O efeito das distorções harmônicas provocadas no sistema de corrente alternada, como resultado da utilização de conversores estáticos, é bastante conhecido pela maior parte dos profissionais na área da engenharia elétrica. Entretanto, quando da utilização destes equipamentos em sistemas rurais, muitas vezes os problemas advindos das formas de onda não-senoidais não são do conhecimento do usuário.

As distorções harmônicas causam má operação de equipamentos conectados ao sistema de corrente alternada, com perdas adicionais e respectivo aumento nos custos de manutenção do sistema.

Na operação de sistemas distribuídos de energia, especialmente daqueles que produzem energia através da conversão CA-CC, os custos da má operação dos sistemas de corrente alternada raramente são computados ao se definir os benefícios advindos da geração alternativa.

Especialmente em áreas rurais ou comunidades isoladas, onde o acesso muitas vezes é precário e as distâncias dos centros urbanos dificultam a manutenção dos sistemas elétricos, os proprietários de sistemas independentes devem estar bem informados sobre as causas e efeitos das distorções harmônicas, para que possam ter uma noção exata de custos e procedimentos da operação de tais sistemas.

 

REFERÊNCIAS

[1] ReNew; Alternative Technology Associated; Victoria, Australia; January-March; 2001.

[2] Bird, B.M.; King, K.G.; Pedder, D.A.G; "An Introduction to Power Electronics", John Wiley & Sons, second edition, England, 1993.

[3] Mohan, N.; Underland, T.M.; Robbins, W.P.; "Power Electronics: Converters, Applications and Design", John Wiley & Sons, second edition, USA, 1995.

[4] Pomílio, J.A.; "Harmônicos e Fator de Potência: um Curso de Extensão", FEEC/UNICAMP, apostila, janeiro, 1997, http://www.dsce.fee.unicamp.br/~antenor/harmo.html/

[5] Arrilaga, J.; Eguíluz, L.I.; "Armónicos en Sistemas de Potencia", Univ. de Cantabria, 1994.