4, v.2Produção de briquetes energéticos a partir de caroços de açaíProjeto de sistemas fotovoltaicos para oferta de energia elétrica a comunidades rurais author indexsubject indexsearch form
Home Pagealphabetic event listing  





An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002

 

Programa Xingó: atividades de inserção das tecnologias energéticas renováveis

 

 

Elielza M. de S. BarbosaI; Chigueru TibaI; Maria Afonso P. CarvalhoII; Ramiro P. da Silva JuniorIII; Ewton Vieira de SouzaIII; Marco Antônio M. OliveiraIII

IDepartamento de Energia Nuclear. Universidade Federal de Pernambuco -UFPE. Av. Prof. Luiz Freire, 1000 - Cidade Universitária 50.740-540 - Recife - PE - E-mail: elimsb@npd.ufpe.br
IIPro-reitoria de Planejamento -UFPE/Coordenação Executiva - Instituto Xingo
IIIBolsistas CNPq/ Instituto Xingo

 

 


RESUMO

Em meados de 1999, o Grupo de Energia do Instituto Xingó elaborou um programa quadrienal de Pesquisa e Desenvolvimento em Energias Renováveis, constituído por projetos específicos em três linhas de ação: Pesquisa e Desenvolvimento, Aplicação de Tecnologias e Capacitação e Difusão. Os objetivos específicos de cada projeto apontavam ao objetivo geral do programa de trabalho: melhoria da qualidade de vida e bem estar social das comunidades que habitam a área Xingo. Esse trabalho relata as atividades desenvolvidas e avalia as ações implementadas em três anos de trabalho que resultaram em: diversas publicações cientificas (12 trabalhos em congressos internacionais); 23 cursos ministrados (05 cursos de treinamento de técnico instaladores de sistemas fotovoltaicos com a capacitação de 213 técnicos, 14 cursos básicos de eletricistas com a formação de 280 eletricistas e 04 outros cursos); instalação de 32 sistemas fotovoltaicos em unidades públicas (26 escolas, 2 postos de saúde, 1 igrejas, 1 restaurante e 2 poços de água), com acompanhamento técnico sistemático, beneficiando cerca de 1.500 famílias; e na implementação do Centro de Pesquisa e de Demonstração em Energias Renováveis. Espaço este destinado a visitações, cursos de treinamento, além de ponto de assistência e manutenção técnica dos sistemas instalados em campo.

Palavras chaves: Energia solar, Desenvolvimento sustentável, Difusão e capacitação, Sistema solar fotovoltaico.


ABSTACT

This work relates to the implementation actions taken by the Xingó Institute / field of energy - photovoltaic rural electrification. the Xingó Institute has a multidisciplinary program, developed jointly by the CNPq- Brazilian National Council for Scientific and Technological Development and by CHESF- Hydroelectric Company of the São Francisco River. It describes summarily the electrification and systematic and technical process of the installed systems with monitoring of energy consumption by the energised unit. The activities began in middle of 1999 and in 2001 32 fotovoltaic systems had were installed: 26 schools, 02 health centres, 1 restaurant, 1 church and 2 water supply systems. The capacity of photovoltaic systems varies from 200 Wp to 1300 Wp, operating in 110 V.ac. All the systems were made available by the Federal Government / Mining and Energy Ministry through the State and Local Development Program-PRODEEM


 

 

INTRODUÇÃO

O Instituto Xingó (IX) atualmente é uma OSIP- criada a partir de um programa multidiciplinar, iniciado em meados de 1998. Esse programa - O Programa Xingó, nasceu de uma iniciativa conjunta entre o CNPq-Conselho Nacional Brasileiro para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico, a CHESF-Companhia Hidroelétrica do Rio São Francisco (11.000MW e 15.000 km de linhas de transmissão) e a SUDENE- Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, com o objetivo primordial de promover o desenvolvimento da região situada no semi-árido nordestino, composta por 30 municípios, cerca de 44.000 km2 e 600.000 habitantes e situada em torno da hidroelétrica Xingó (3.000 MW). Diversas instituições e organismos governamentais e não governamentais atuam em parceria com o IX, como as universidades federais e estaduais dos quatro estados envolvidos (AL, BA,SE e PE), as prefeituras dos 30 municípios situados na área de abrangência do IX, o SEBRAE e a Comunidade Solidária, entre outros.

O Instituto atua em diferentes áreas temáticas da ciência e tecnologia abordando desde o resgate histórico (arquitetura e patrimônio histórico), a educação (alfabetização de jovens e adultos, formação continuada do educador e gestão do trabalho), o meio ambiente (biodiversidade, energia e recursos hídricos) e novas técnicas de produção de produtos e cultivo (agropastoris e piscicultura)

Especificamente a área de Energia iniciou seus trabalhos em meados de 1999, objetivando três pontos básicos:

- Buscar soluções energéticas com tecnologias compatíveis com a região;

- Difusão, demonstração, informação e P&D de sistemas energéticos;

- Ações de inserção social visando a elevação da qualidade de vida;

- Infra estrutura de apoio ao IX

Dentro desse enfoque, foi elaborado um programa quadrienal de Pesquisa e Desenvolvimento em Energias Renováveis, mais particularmente na área da energia solar, constituído por projetos específicos Os seguintes projetos merecem destaques:

- Projeto PI: Centro de Pesquisa e de Demonstração em Energias Renováveis

- Projeto II: Aplicação de Tecnologias de Fontes Renováveis de Energia

- Projeto PIII: Capacitação e Difusão

Os projetos e atividades foram desenvolvidos e executados por uma equipe de trabalho composta por três professores da UFPE - Universidade Federal de Pernambuco e 10 bolsista CNPq/ano (04 bolsistas de nível superior e 06 de nível médio).

Projeto-PI: Centro de Pesquisa e de Demonstração em Energias Renováveis.

Tem como objetivo principal ser um espaço destinado à implementação de sistemas energéticos de tecnologias não convencionais visando, a difusão, o ensino, a realização de trabalhos em P&D e fonte de informação de dados meteorológicos da região. Esse projeto além de identificar o potencial da região para uma aplicação otimizada e adaptada das tecnologias apropriadas, cria oportunidades locais na capacitação de técnicos.

O Centro foi implantado num antigo edifício recuperado, onde anteriormente funcionava o posto de saúde do canteiro de obras da hidroelétrica de Xingo. Na parte interna situam-se as salas de estudo e os laboratórios e na parte externa um Show-room com diversos equipamentos e sistemas instalados. Para cada tipo de sistema instalado no campo há um similar no Centro, facilitando a assistência técnica e manutenção e proporcionando possibilidades de treinamento de técnicos e informação e ao publico em geral. A fig.1(a) mostra uma vista geral do Centro.

Os seguintes sistemas e laboratórios foram instalados e/ou implantados, como ilustram as demais fotos da Fig. 1

Área Externa - Show-room:

- Sistema híbrido solar/eólico

- Sistemas solar fotovoltaicos para: energização com diferentes modelos/tipos e configurações, iluminação pública, bombeamento de água e para cerca elétrica.

- Sistema solar térmico para aquecimento de água.

Área Interna -04 Laboratórios:

- Laboratório fotovoltaico para testes de equipamentos e sistemas,

- Laboratório de montagem de sistemas

- Laboratório do sistema híbrido

- Laboratório de aquisição de dados

Vale salientar que a carga elétrica de iluminação interna do Centro é atendida pelo sistema híbrido.

O Centro tem recebido um grande número de visitas, escolas, missões e público em geral e tem funcionado como base de apoio técnico as atividades de campo na área de energia solar.

Projeto-PII: Aplicações de Tecnologias de Fontes Renováveis de Energia

Esse projeto tem como objetivo geral detectar os prováveis sítios, dentro da área de abrangências do Programa Xingó, ainda não energizados e propor soluções energéticas para essas comunidades via energização fotovoltaica (FV).

Esse projeto tem um vínculo social muito forte pelos seus próprios objetivos específicos:

- Instalação de sistemas fotovoltaicos de uso coletivo: sistemas energéticos (tipo SHS- solar home system) e bombeamento de água;

- Estudo do desempenho dos sistemas em campo com acompanhamento e manutenção sistemáticas;

- Estudo e acompanhamento técnico-social nas comunidade antes e após a energização;

- Energização solar para outras aplicações (aquecimento de água, cerca elétrica, secagem..)

Conta com o apoio fundamental do PRODEEM (Programa de Desenvolvimento dos Estados e Municípios -MME) na alocação dos sistemas fotovoltaicos. Portando por princípio, os sistemas devem ser instalados em espaços coletivos priorizando a educação, a saúde, o fornecimento de água, a informação e lazer, além de aspectos produtivos ligados particularmente às atividades agropecuárias da região.

Na medida do possível as prefeituras locais contribuem com a parte de estrutura física (casa das baterias).

A metodologia adotada pode ser resumida nas seguintes fases:

- Levantamento e seleção das localidades mediante coleta de informações disponíveis, visitas de reconhecimento e vistorias, onde dados técnicos e educacionais da escola/comunidade são levantados. A seleção é por ordem de prioridade (Nº de alunos, aulas noturnas..);

- Diagnóstico técnico-socioeconômicos das comunidades selecionadas, mediante entrevistas e aplicações de questionários;

- Dimensionamento do sistema fotovoltaico e projeto elétrico da edificação;

- Instalação dos sistemas fotovoltaicos e das instalações elétricas;

- Acompanhamento periódico do desempenho dos sistemas, da energia consumida (kWh) e das possíveis mudanças sociais ocorridas com a chegada da energia elétrica.

As duas primeiras fases envolvem entrevistas por residência, levantamento das condições físicas/educacionais dos sítios (escolas, postos de saúde, igrejas) onde os sistemas serão instalados, e divulgação no seio da comunidade das possibilidades e limites da tecnologia solar. Na quinta etapa, um dos parâmetros básico é o grau de satisfação do usuário com o serviço oferecido. Esse parâmetro depende basicamente de dois fatores se a oferta de energia atende as necessidades do usuário e da qualidade desse atendimento, ambos relacionados ao desempenho técnico do sistema.

As capacidades do sistemas fotovoltaicos (FV) instalados depende da demanda da unidade a ser energizada (escola, posto de saúde, igreja..) variando entre 200 a 1.300 Wp em 110Vac. Basicamente são compostos por:

- Geradores (módulos FV de 50 a 315W)

- Acumuladores (baterias de 130 a 300Ah)

- Controladores de carga e descarga

- Inversores (400, 800 W;12/48 Vcc / 110 Vac)

A carga é composta por lâmpadas fluorescentes de 20W, TV e vídeo e em alguns casos um pequeno refrigerador ou freezer.

Em algumas comunidades foi possível implantar o projeto de uma forma mais completa com energização da escola, do posto de saúde, da igreja e da praça para recreação, além do abastecimento de água via um sistema de FV de bombeamento de água. No entanto essa situação, onde uma comunidade possua toda essa infraestrutura e um poço com água de boa qualidade é muito rara na região.

No quadro abaixo constam os resultados obtidos de 1999 a 2001, traduzidos em índices. As fotos da Fig.2 ilustram algumas das comunidades que foram atendidas.

 

 

O acompanhamento e a assistência técnica periódicos às comunidades mostram que de uma maneira geral, [1] e [3]:

- Do ponto e vista técnico, praticamente não foram observadas falhas importantes.

- Os valores obtidos para os fatores de desempenho (PR= Performance ratio) do sistemas FV deixam a desejar. Valores na faixa de 20 a 93%, para um mesmo tipo de sistema foram obtidos.

O acompanhamento do consumo elétrico nas unidades escolares justifica essas ocorrências. Geralmente as escolas não são equipadas com aparelhos de TV e vídeo e muitas vezes não há aulas noturnas, portanto os valores das leituras dos consumos (kWh) se mostram aquém da disponibilidade energética que o sistema instalado pode fornecer.

Do ponto de vista social, os resultados mostram pouquíssimas mudanças no quadro geral. O tempo de observação ainda é muito pequeno, a energização fotovoltaica é restrita aos centros comunitários e nem sempre ocorre ao mesmo tempo e na mesma localidade onde outros programas governamentais são implementados. Como por exemplo programas que viabilizam aparelhos de TV e vídeo com fins educativos ou de bibliotecas nas escolas.

No entanto, algumas mudanças comportamentais começam a aparecer:

- 98% dos entrevistados tem conhecimento da existência e da possibilidade de utilização do sistema solar;

- 94,5% acham que a energização solar trouxe benefícios para a comunidade, sendo muito importante para sua família (78%) e para seu trabalho (61%), principalmente com os sistemas fotovoltaico de abastecimento de água.

- 86%, a grande maioria, continua utilizando o óleo diesel como energético para a iluminação;

- 14% das famílias entrevistadas conseguiram, via cooperativas, adquirir sistemas solares para suas residências. Fato bastante importante, para o pouco tempo entre os períodos das duas avaliações;

- 90% dos entrevistados gostariam de adquirir esses sistemas com a finalidade de utiliza-los, por ordem de prioridade, para :iluminação, TV e som, geladeira e liqüidificador.

Projeto -PIII: Capacitação e Difusão

A formação de recursos humanos através de cursos de inserção tecnológica das energias solar, eólica e outras, direcionadas para os projetos de aplicação na região é o principal objetivo desse projeto.

Na realidade a parceria entre a UFPE e o Instituto Xingo se iniciou com os primeiros cursos de instaladores de sistemas fotovoltaico, ministrados pelo Grupo de Pesquisas em Fontes Alternativas- FAE, aos candidatos a instaladores do programa PRODEEM, [3].

Nesse projeto, as atividades desenvolvidas podem ser agrupadas em:

- Cursos de formação e difusão

- Realização de eventos educativos

- Implantação do CESANE - Centro Avançado de Estudos do Semi Árido do Nordeste

- Produção científica e de material didático.

Os cursos são ministrados para diferentes níveis de formação, desde analfabetos a graduados e mestrandos.

Eletricista Básico- esse curso é oferecido a semi-analfabetos. Numa linguagem apropriada e com auxílio de cartilhas ilustradas os princípios de uma instalação elétrica residencial são transmitidos. É um curso com caráter fortemente prático. Durante as aulas os alunos recuperam toda a instalação elétrica de um local público indicado pala prefeitura. Normalmente esse local é a própria escola. No final do curso, os alunos recebem um Kit de ferramentas básicas para que possam iniciarem seu novo ofício.

Este curso tem alcançado grande êxito. O nível escolar da população jovem e adulta é muito baixa e a ansiedade para saber algo mais muito grande, principalmente para sabar um ofício que possa proporcionar alguma renda.

Instaladores de sistemas solares - é oferecido tanto em nível de nivelamento para técnicos que já possuem algum grau de conhecimento em sistemas solares como também na formação de novos técnicos.

Eventos educativos - são bastantes variados tanto na forma quanto no conteúdo abordado. Um dos mais importante diz respeito a divulgação das possibilidades da energia solar para o meio rural. Essa divulgação é realizada geralmente no momento da inauguração do sistema instalado. Com o auxílio de teatros de boneco e filmes/vídeo, funcionando já com energia solar. É apresentada e distribuída uma cartilha com ilustrações numa linguagem muito simples que incentiva o uso, as vantagens e os cuidados que a comunidade deve ter com o sistema solar.

Como fruto do desenvolvimento das atividades nos diversos projetos e da pesquisa associada a essas atividades diversos trabalhos (12) foram apresentados e publicados em eventos e periódicos internacionais.

A tab.2 mostra em números os resultados obtidos nesses três anos de trabalho e as fotos da Fig.3, exemplificam as atividades realizadas

 

 

COMENTÁRIOS

Um dos grandes desafios que temos encontrado nos projetos de energização fotovoltaica em áreas rurais, diz respeito ao planejamento das ações e a continuidade dos programas institucionais. O que habitualmente, não é decidido nas instancias executivas e/ou técnicas.

A eletrificação rural em áreas remotas envolve diferentes instâncias como a social, a técnica e a econômica e em todas elas as decisões são fortemente marcadas pelo componente político. Independente da fonte e da forma da geração de energia, a eletrificação rural é um tema político.

Aliás, esses desafios não são exclusivos dos programas de energização fotovoltaica, outras iniciativas como programas de saúde e educação passam pelo mesmo dilema.

Normalmente, os programas de inserção da tecnologia solar, particularmente a eletrificação rural fotovoltaica têm recebido incentivos na forma de donativos. No entanto, as lições aprendidas no passado nos mostram que programas financiados somente por donativos resultam em gerenciamento e manutenção de baixa qualidade além da falta de compromisso por parte dos beneficiários.

Essa falta de compromisso diz respeito a sustentabilidade dessas iniciativas e é reflexo da não organização social das "comunidades".

Geralmente as localidades alvos desses projetos não apresentam propriedades inerentes ao que significa uma comunidade. Sem um mínimo de organização social e de resgate da identidade de ser um cidadão não se terá resultado positivo.

O programa Xingó tem como meta viabilizar esse resgate. Ações conjuntas de integração entre suas áreas temáticas poderá fazer florescer núcleos de desenvolvimento comunitários e participativos e uma melhoria na qualidade de vida.

Nesse sentido, durante esses três primeiros anos de atuação algumas ações foram implementadas e esperamos que possamos dá continuidade aos nossos projetos.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a CHESF, ao CNPq, a SUDENE e ao PRODEEM, pelo apoio institucional, aos técnicos do Grupo FAE/UFPE, Marcelo Rodrigues e Rinaldo Melo e aos técnicos bolsistas CNPq/IX pelo apoio e dedicação ao trabalho.

 

REFERÊNCIAS

[1] Barbosa, E. M. de S., Tiba, C.(2000).Abastecimento de energia fotovoltaica em comunidades del Program Xingó- estudo de caso: comunidade de Gualter/ NE brasileiro. Anais do : ISES Millennium Solar-FORUM 2000. NTA 26-03, Setembro-2000, México.

[2] Barbosa, E. M. de S., Relatórios Técnicos CNPq/Chesf/Sudene/PRODEEM, 1999 - 2000

[3] Barbosa, E. M. de S., C. Tiba., C. J. C. .Salviano , A..M. Carvalho, M. F .Lyra. (2000) Photovoltaic Water Pumoing Systems Installer Training: a Partnership experience between the university and São Francisco Hydroeletric Power Plant. Renewable Energy, vol. 21/2, pp 187-205.