An. 4. Enc. Energ. Meio Rural 2002
Uso racional de energia em estações de bombeamento de água para irrigação de arroz
Gilnei Carvalho Ocácia; Humberto Amaral Duarte; Franco Muller Martins; Luciano Correa Henemann; André Luiz Bianchi
Departamento de Ciências Agrárias - Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). CEP: 92420-280 , Canoas-RS. Tel: (51) 4779285 Fax: (51) 4771313
RESUMO
Neste trabalho, foram analisadas 138 instalações de bombeamento utilizadas para irrigação de arroz na região Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul. Os levantes foram classificados por altura: até 10m; entre 10 e 15m; entre 15 e 20m; entre 20 e 25m; e, maior que 25m.
Foi constatado um grande potencial de conservação de energia, pois para uma potência total instalada, nos sistemas analisados, de 8757 kW, verifica-se uma potência líquida requerida de 4155 kW, representando 47,44% da potência instalada. Os principais motivos de perdas são tubulações mal dimensionadas, utilização de bombas de baixa eficiência, falta de manutenção, super dimensionamento de bombas, bombas mal instaladas e baixo fator de potência.
Os levantes que apresentam maior altura de recalque são os mais eficientes. Isto é decorrência da utilização de bombas centrífugas (que apresentam melhor rendimento em alturas superior a 10m) e ao fato de apresentarem uma maior demanda de potência útil, obrigando o lavoureiro a ter um maior cuidado com toda sua instalação. Onde as alturas de recalque são pequenas, devido a situação topográfica privilegiada, há uma preocupação menor com os custos.
Para possibilitar a comparação entre sistemas com diferentes alturas de recalque, foi estabelecido um índice de potência por unidade de área e de altura (W.ha-1.m-1), que indica a demanda para a irrigação de um hectare de lavoura, por metro de elevação da água. Os sistema eficientes devem apresentar valores menores que 30 W.ha-1.m-1 .Nos sistemas analisados, os valores variaram de 25 W.ha-1.m-1, até maiores do que 100 W.ha-1.m-1 .
Palavras-chave: Bombeamento; irrigação; arroz
ABSTRACT
138 facilities pumping used for rice irrigation were analyzed in the region Fronteira Oeste of Rio Grande do Sul. The installations were classified by discharge height level: smaller than 10m; between 10 and 15m; between 15 and 20m; between 20 and 25m; and, larger than 25m.
The possibility at a large energy conservation was verified. It was verified the requested net power of 4155 kW representing 47,44% of the installed power. The total power installed in the analyzed systems is 8757 kW. Losses main reasons: badly dimensioned piping; use of low efficiency pumps; maintenance lack; over dimensioned pumps; badly installed pumps; and, low power factor.
The most efficient installations are those that present larger discharger height level. That is a consequence of the use of centrifugal pumps (they present better efficiency in discharger heights above to 10m) and to the fact that they present a larger demand of net power, forcing the farmer to be very careful with its installation. Where the heights of pumping are smaller, due to privileged topographical situation, there is a smaller concern with the costs.
To make possible the comparison among systems with different water discharge heights, it was established a power index for unit of area and of height (W.ha-1.m-1). It indicates the demand for the irrigation of one hectare of farming, for one meter of water elevation. The efficient system should present values smaller than 30 W.ha-1.m-1. The values are between 25 W.ha-1.m-1 and 100 W.ha-1.m-1 in the analyzed systems,.
INTRODUÇÃO
Atualmente, a irrigação é das atividades mais representativas na composição do custo de produção do arroz. Nas safras 1997/98 e 1998/99, a irrigação ficou em segundo lugar, com uma participação de 12,29% e 11,22%, respectivamente, no custo total de produção, enquanto na safra 1999/2000, ficou em primeiro lugar, representando 13,02%, (IRGA, 2000).
A demanda energética
Em uma estação de bombeamento, o trabalho útil é aquele necessário para suprir as necessidades de água da lavoura, vencendo o desnível (altura geométrica) entre o manancial de água e a área a ser irrigada. Este sistema é composto pelos seguintes elementos: bomba; tubulação de sucção; tubulação de descarga e sistema motriz.
A potência (1) que a bomba transfere ao fluido é proporcional a vazão requerida, que é função de caraterísticas do solo, da topografia e do plano de irrigação da lavoura. A altura manométrica é constituída pela altura geométrica, pelas perdas na tubulação de sucção, pelas perdas na tubulação de descarga e da energia cinética no bocal de descarga da tubulação.
Onde:
Pa é a potência entregue ao fluido, W
Q é a vazão, m3s-1
γ é o peso específico, N.m-3
Hm é a altura manométrica, m
A vazão
Há muita controvérsia sobre o exato volume total de água necessário à lavoura, variando de 10.500 a 17.000 m3.ha-1, com o número de horas de irrigação variando de 1800 a 2100 horas por safra. Isto implica numa variabilidade de vazão de 1,4 a 2,2 L.s-1.
A vazão, ou demanda de água, calculada pelo balanço hídrico, para a região em estudo, resulta em torno de 1,76 L.s-1.ha-1, de acordo com BELTRAME & LOUZADA, 1997. Mas, segundo GOMES & PETRINI, 1996, são utilizados pelos arrozeiros, em média, no Rio Grande do Sul, cerca de 2,0 L.s-1.ha-1. Neste trabalho, considera-se uma vazão de 2,2 L.s-1.ha-1, que multiplicada pela área total de cada lavoura determina a vazão para bombeamento. Foi adotado este valor em função que os levantes hidráulicos, além das necessidades efetivas de água, na área de cultivo, ainda devem contemplar as perdas em canais e condutos, bem como uma taxa suplementar para compensar a parada no horário de ponta do sistema elétrico, para os consumidores em tarifa verde. Além disso, é necessário que exista uma folga no sistema, considerada a possibilidade de uma eventual interrupção no suprimento, por exemplo, durante o período de formação da lâmina de água na lavoura.
A altura manométrica
A altura manométrica é obtida pela equação (3):
Onde:
Hm: altura manométrica (m)
Hs: altura geométrica de sucção (m)
Hr: altura geométrica de recalque (m)
Hfs: altura de fricção na sucção (m)
Hfr: altura de fricção na descarga (m)
Vd: velocidade de saída (m.s-1)
g: aceleração da gravidade (m.s-2)
A soma das alturas geométricas de sucção e de descarga, resulta na altura geométrica total (4),
enquanto a soma das alturas de fricção (5) resulta na perda de carga total da instalação,
de modo que a equação (3) assume a seguinte forma:
Levantamento de dados de campo
Para o levantamento de dados de campo referentes aos levantes hidráulicos para irrigação de lavouras de arroz, a área considerada neste trabalho foi subdividida em quatro setores. São eles:
a) Uruguaiana - Alegrete;
b) Uruguaiana - Barra do Quaraí;
c) Uruguaiana - Itaqui; e,
d) Rosário do Sul - São Gabriel.
Os dados relativos aos levantes foram obtidos através de visitas a estes locais com a realização de medidas, verificados dados de placa e recolhidas informações com pessoal local. Também foram colhidas informações com pessoal local da AES-SUL e no escritório em Canoas (através do NUC - Número do Consumidor).
diagnóstico energético
O diagnóstico energético das estações de bombeamento para irrigação de lavouras de arroz, consiste de uma análise dos seguintes pontos:
a) requerimentos da lavoura (vazão e altura geométrica);
b) características e condições da tubulação;
c) características e condições da bomba; e,
d) avaliação do sistema motriz.
A tabela 1, mostra as potências instaladas nas regiões consideradas neste trabalho, num total de 8757 kW. No entanto, verifica-se que a potência líquida requerida, é de tão somente 4155 kW, isto é, representa 47,44% da potência instalada.
Evidentemente, isto denota um grande potencial de conservação de energia, onde os principais motivos de perdas são elencadas a seguir:
□ tubulações de descarga mal dimensionadas
□ tubulações longas pela dificuldade de construção de canais
□ falta de manutenção em tubulações de descarga
□ super dimensionamento de bombas
□ utilização de bombas de baixa eficiência
□ utilização de bombas atuando fora de seu ponto ótimo de operação
□ bombas mal instaladas
□ baixo fator de potência
Nas áreas mais próximas a Uruguaiana, sobretudo entre esta cidade e a Barra do Quaraí, é notória a utilização de bombas de maior rendimento do que as adotadas em outros locais como, por exemplo, na direção Uruguaiana - Alegrete e na direção Alegrete - São Gabriel. Também deve ser salientado um melhor cuidado com a tubulação, especialmente no que se refere a vazamentos.
Na tabela 1, é notório que o uso mais eficiente dos sistemas de bombeamento acontece naqueles levantes com maior altura de recalque. Isto é decorrência, em primeiro lugar, do tipo de máquina (bombas centrífugas) tradicionalmente utilizado. Estas bombas apresentam seu melhor desempenho justamente nesta faixa de alturas manométricas. Também contribui para o bom desempenho destes levantes, o fato que, representando uma maior demanda de potência devido a maior altura de elevação da água, obriga o lavoureiro a ter um maior cuidado com toda sua instalação, desde o fator de potência até as tubulações.
Para possibilitar a comparação entre lavouras com diferentes alturas de recalque, quanto ao uso eficiente do levante hidráulico, foi estabelecido um índice de potência por unidade de área e de altura de elevação (Wha-1m-1). Este índice indica a demanda (em Watts), para a irrigação de um hectare de lavoura, para cada metro de elevação da água.
As lavouras com uso eficiente da energia apresentam um valor em torno de 30 Wha-1m-1. Na tabela 2, observa-se que existem lavouras que apresentam índices excelentes, da ordem de 25 Wha-1m-1, até lavouras que apresentam índices absurdos, maiores do que 100 Wha-1m-1. Isto acontece nas pequenas alturas de recalque, onde apesar da ineficiência, os gastos com bombeamento são menores devido a situação topográfica privilegiada.
Como já referido, embora para pequenas alturas (e justamente por esse motivo) exista uma menor potência instaladas por ha, é justamente nesta faixa em que há um rendimento global menor dos levantes. Isto acontece basicamente por dois motivos:
a) utilização de bombas (embora em muitos casos de alto rendimento) atuando fora de seu ponto de operação pois foram projetadas para alturas maiores; e,
b) a participação da perda de carga na altura geométrica, quando a tubulação não está adequadamente dimensionada torna-se muito significativa.
A altura do levante, não significa necessarimente altura da lavoura em relação a fonte de água, pois em muitas delas há necessidade de vários "tombos", isto é, levantes em série, como os utilizados na sequência mostrada nas figs. 1 e 2.
dimensionamento da tubulação
Na fronteira Oeste, o dimensionamento da tubulação tem uma importância enorme pois, de modo geral, as distâncias entre pontos da captação e pontos de descarga são muito grandes. Isto é evidente principalmente nos levantes de Uruguaiana e Alegrete. Além disso, em muitos locais existem tipos de solos que difícultam a construção de canais exigindo o emprego de tubulações longas (figura 3).
Com este elevado comprimento de tubulação, vários são os fatores de maior consumo de energia: seja, pelo próprio comprimento excessivo de tubulação ocasionando grandes perdas de carga por atrito, seja, também, em alguns casos, pela má conservação da tubulação, consequência de uma ausência de manutenção no decorrer dos anos, ou, por já ter ocorrido o término da vida útil da tubulação que, provavelmente, ainda não foi substituída devido a seu elevado custo. Um outro fator, é o uso de diâmetros menores que os recomendados, ocorrendo grande velocidade da água dentro da tubulação.
CONCLUSÕES
A irrigação realizada através de bombas acionadas por motores elétricos, tem uma parcela significativa no custo de produção do arroz, devendo, por isso mesmo, buscar-se sua eficientização.
Como normalmente acontece, nas instalações consumidoras de energia elétrica, há a questão do suprimento energético propriamente dito e a questão da demanda de potência. As hipóteses que levam a uma diminuição de uma ,ou ambas, são as seguintes:
● Correção de fator de potência
A correção do fator de potência é a ação que apresenta resultado imediato para o produtor, com retorno do investimento na própria safra. A maioria dos produtores que utilizam bombas de baixo rendimento tem instalações que apresentam problemas de fator de potência, com valores em torno de 0,80 . Nestes casos, há que haver cuidados, pois não adianta corrigir o fator de potência se, logo a seguir, o produtor for modificar suas instalações.
● Melhoria das condições de sucção - As condições de sucção podem ser melhoradas com a colocação da bomba o mais proximo possível do nível da fonte de água, com o uso de curvas de raio longo e de válvula de pé adequada a vazão de trabalho, minimizando as perdas na sucção, de modo a inibir qualquer possibilidade de cavitação. Uma condição extremamente adequada, é, sempre que possível, colocar a bomba com o eixo na vertical.
● Melhoria das condições da tubulação de descarga - Para a tubulação de descarga, principalmente para comprimentos longos, a velocidade do escoamento nunca deve passar de 1,5 m/s. Além disso, os acessórios devem ser adequados para que não produzam perdas elevadas.
● Utilizar bombas de alto rendimento observando o ponto de operação recomendado -Evidentemente, a utilização de bombas de alto rendimento é fundamental, entretanto, tão importante quanto a qualidade da bomba, é o projeto do sistema para que a bomba selecionada trabalhe dentro da faixa para a qual foi projetada.
● Utilização de motores com bom rendimento - O principal problema relativo aos motores utilizados para irrigação, é o emprego de motores rebobinados mais de uma vez que apresentam, além de baixo rendimento, problemas de fator de potência. Devido ao baixo fator de carga anual e a diferença de preços, motores elétricos convecionais de mercado, trabalhando próximo à sua potência nominal, onde apresentam rendimentos elevados, são economicamente mais interessantes aos produtores que motores especiais de alto rendimento.
AGRADECIMENTOS
As Associações dos Arrozeiros de Uruguaiana, São Borja e de Sâo Gabriel e a AES-SUL
REFRÊNCIAS
[1] IRGA - DATER/NATEs, fev/1998 e fev/1999
[2] BELTRAME, Lawson F. S. & LOUZADA, José Antônio S. Consumo de água na irrigação do arroz por inundação. Revista Lavoura Arrozeira, Volume 50, número 432, julho/agosto, IRGA, Porto Alegre, RS, 1997, p. 3 - 8..
[3] GOMES, A. de S. & PETRINI, J. A. Agricultura Real: Arroz Irrigado. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA - CPACT), Pelotas, RS, 1996, 75 p.