5, v.1Energy inputs and outputs and sustainability of corn silage productionBiodigestor para validação de sistema produtivo auto-sustentável no semi-árido author indexsubject indexsearch form
Home Pagealphabetic event listing  





An. 5. Enc. Energ. Meio Rural 2004

 

Balanço, análise de emissão e seqüestro de CO2 na geração de eletricidade excedente no setor sucro-alcooleiro

 

 

Felipe Moreton ChohfiI; Francisco Antonio DupasII; Electo Eduardo Silva LoraIII

IEng. MSc, Universidade Federal de Itajubá, Av BPS, 1303, Itajubá, MG
IIProf. Dr, Universidade Federal de Itajubá, Coordenador, Instituto de Recursos Naturais, Faculdade de Engenharia Ambiental, Itajubá, MG
IIIProf. Dr. Universidade Federal de Itajubá, Coordenador, Núcleo de Excelência em Geração Termelétrica e Distribuída, Instituto de Engenharia Mecânica, Itajubá, MG

 

 


RESUMO

Ao longo dos últimos anos, as atividades de pesquisa acerca dos impactos ambientais globais causados pelas emissões de dióxido de carbono (CO2) têm sido intensificadas. O mercado de créditos de carbono é um grande esforço na busca pela minimização deste gás, pois possibilita incentivos para que os países desenvolvidos e em desenvolvimento tenham estímulo a não incorporarem em suas matrizes energéticas, fontes de energia mais propícias à emissão de CO2.
O presente trabalho estuda o balanço de massa de emissão e seqüestro de CO2 no setor sucro-alcooleiro. Utilizando uma metodologia de avaliação de ciclo de vida (ACV) de geração de eletricidade excedente, é calculado o balanço de CO2. Os resultados obtidos mostram que 145,3 toneladas de CO2/hectare/ciclo são seqüestradas no cultivo da cana-de-açúcar e 111,5 toneladas de CO2/hectare/ciclo são emitidas na cogeração de eletricidade excedente, resultando no saldo favorável de seqüestro de CO2 de 33,8 toneladas/hectare/ciclo de vida de eletricidade excedente, quantia que é fornecida às empresas de distribuição de energia.
Baseando-se na metodologia de ciclo de vida, conclui-se que o cultivo da cana-de-açúcar para a produção de eletricidade excedente renovável proporcionou um saldo positivo no seqüestro de CO2 . Ao se comparar com outras formas de geração de eletricidade, a energia produzida em usinas de álcool e açúcar apresenta os mais baixos valores de emissão de CO2.

Palavras chave: Emissão e seqüestro de CO2, Efeito Estufa, Cogeração, Mecanismo de Desenvolvimento Limpo


ABSTRACT

In recent years, research activities regarding the global environmental impacts of carbon dioxide (CO2) emissions have been intensified. The carbon market aims to minimize the emissions of this dangerous gas as it allows incentives for developed and developing countries to be stimulated not to adjust to a high carbon dioxide energy matrix.
This work studies the carbon dioxide emissions and capture mass balance in the sugar and alcohol sector. Through a life cycle analysis methodology of surplus electricity production the CO2 balance is calculated. The results obtained show that 145,3 tons CO2/hectare are sequestered during sugarcane cultivation and 111,5 tons CO2/hectare are emitted for electricity production, resulting in a viable capture balance scenario of 33,8 tons of carbon dioxide per hectare of plantation in one life cycle of surplus electricity production that is supplied to the electricity distribution companies.
The life cycle analysis of the cultivation of sugarcane biomass for surplus electricity production allowed a high value to be obtained for the CO2 absorption figure. If compared with other forms of electricity generation, the energy produced in sugar mills presents the lowest values of carbon dioxide emissions of all the other forms of electricity production.


 

 

1. Introdução

O planeta Terra manteve o seu processo de equilíbrio entre o seqüestro e a emissão de dióxido de carbono na atmosfera até que as emissões antrópicas aumentaram a uma taxa superior à capacidade de armazenamento dos fluxos naturais do planeta. O desenvolvimento industrial e tecnológico ocorridos nas últimas décadas, sobretudo o crescimento do uso de combustíveis fósseis no setor energético, favoreceu o surgimento deste desequilíbrio e de mudanças climáticas como o efeito estufa, o buraco na camada de ozônio e a chuva ácida.

Por causa disto, intervenções no sentido de encontrar novas saídas para adequar a área energética global às fontes alternativas têm sido buscadas. O Brasil é rico em clima, água, solo, recursos naturais e detentor de 22% da biodiversidade do planeta (Cenbio, 2002), o que favorece a sua participação no mercado de carbono, posto que tem grandes possibilidades de ajustar o seu sistema energético a um modelo ainda mais sustentável, baseado na geração de energia através de fontes alternativas, especialmente a biomassa.

Nos últimos anos, pesquisas têm sido feitas no que se refere ao uso de biomassa como fonte de energia renovável através da cogeração. No Brasil, a biomassa do setor sucro-alcooleiro apresenta-se como o maior aproveitamento nesta área. (Horta, 1987). Além disso, o aproveitamento dos vários resíduos da produção do álcool e do açúcar garante a diversificação nestas usinas. A cogeração e a comercialização de excedentes de eletricidade através do bagaço, folhas e palha apresentam-se como melhores alternativas para o aproveitamento destes resíduos, que atualmente garantem altos faturamentos. Há de se considerar, ainda, que populações que estão radicadas em localidades distantes e remotas do Brasil poderão se beneficiar, pois as regiões produtoras de cana são um potencial para a geração de energia local, favorecendo a geração distribuída.

O Protocolo de Kyoto, adotado em 10 de Dezembro de 1997, é uma acordo internacional que visa estabilizar as concentrações de GEE na atmosfera a fim de conter os efeitos danosos ao planeta. As metas impostas aos países industrializados é de redução nas emissões a um nível de 5,2% menos que os registrados em 1990, até 2008- 2012. Na última reunião da conferência das partes, o Protocolo contou com 134 países com emissões totais equivalentes a 44,2% das emissões de GEE dos países industrializados. Para que entre em vigor deverá contar com pelo menos 55% das emissões dos países industrializados.

O Protocolo estabelece três mecanismos para assegurar uma redução economicamente viável aos países industrializados. O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) incentiva projetos de redução de emissões que favorecem o desenvolvimento sustentável. O MDL permite que programas de redução de emissões em países em desenvolvimento gerem créditos que podem ser comercializados pelos países industrializados como forma de cumprimento de suas metas. Isto acontece porque os custos de redução de emissões não são homogêneos de país para país. Assim, é possível existir um mercado potencial, onde a redução das emissões com altos custos tendem a comprar e as de baixo custo tendem a vender.

 

2. Metodologia

Avaliação de Ciclo de Vida (ACV) é uma metodologia de estudo capaz de avaliar todos os possíveis impactos ambientais causados por uma cadeia produtiva desde sua origem até o seu termo. Para fins deste trabalho, esta análise permite o desenvolvimento de todo o contexto que envolve a geração de excedentes no setor sucro-alcooleiro, ou seja, desde a fase 1, que é a preparação do campo para o plantio até a fase 6, que consiste na cogeração de eletricidade excedente fornecida às empresas de distribuição como é mostrado na Figura 1.

A preparação do campo consiste na produção, manutenção e uso de tratores e máquinas agrícolas na gradagem e subsolagem, medidas necessárias para que o solo receba novas mudas através da sulcação e cobertura na fase 2. Na fase 3 é feita a produção, aplicação e transporte dos vários insumos agrícolas como o calcário, inseticidas e herbicidas. Após a colheita, os "treminhões" irão transportar a cana até a moagem, onde o bagaço é extraído e, em seqüência, levado à fornalha, onde será utilizado como combustível na geração de excedentes.

As atividades envolvidas nas fases mostradas na Figura 1, desde a origem até o termo da geração de eletricidade excedente irão ocorrer de acordo com as especificidades do ciclo de vida da lavoura da cana-de-açúcar que compreende de seis anos. As operações incluídas nas fases 1 e 2 de preparação do campo para plantio e plantio das mudas só são renovadas de seis em seis anos, no entanto, as brotas se propagam todo ano por cinco anos.

O ciclo de vida de geração de eletricidade excedente no setor sucro-alcooleiro compartilha as fases que antecedem a moagem da cana no ciclo de vida da indústria do açúcar e do álcool. A fim de analisar apenas a geração de excedentes será determinada a fração de bagaço total utilizado como combustível neste processo. Uma vez definido este valor, o mesmo será utilizado para a partição da emissões e do seqüestro nas etapas que antecedem a moagem da cana. Assim, os fluxos de emissão e seqüestro de CO2 associados às práticas da indústria do álcool e do açúcar não são considerados por não fazerem parte do ciclo de vida em estudo.

2.1. Metodologia de cálculo do CO2 seqüestrado

A biomassa da cana-de-açúcar absorve o dióxido de carbono através da fotossíntese e o armazena na sua composição na forma de carbono. O seu potencial fotossintético ultrapassa o da grande maioria das plantas na flora brasileira. Isto ocorre, em grande parte, por ser uma planta do tipo C4 ,capaz de eliminar as perdas de dióxido de carbono através da fotorrespiração das folhas, tendo assim um poder continuado de fixação de carbono, que pode ser notado por sua adaptação em países de alta incidência solar e alta composição de sacarose em sua composição (Alexander, 1973).

Através de dados de (Alexander, 1973) e (Beeharry, 2001b) determinou-se a porção de cana que constitui cada um dos componentes mostrados na figura 2, a porção total de cada componente da biomassa da cana-de-açúcar total é calculada como uma porcentagem em peso total dos colmos. O colmo extraído durante a colheita, consiste de 63,9% em fração de peso da biomassa da cana-de-açúcar total, a palha 6,5%, as folhas 20% e as raízes 9,6%. Após a moagem, é extraído o bagaço que consiste de 30% do colmo. O processamento do caldo na indústria resulta em impurezas, torta de filtro 5%, o melaço (3%) utilizado na produção de álcool e o açúcar que constitui 10% de fração em peso do colmo.

Ainda de acordo com (Beeharry 2001b), (Alexander, 1973) e (Horta, 1987), foram obtidas informações sobre a umidade e o conteúdo (teor) de carbono (%c) para cada componente da biomassa da cana-de-açúcar. Assim, foram feitos os cálculos do conteúdo de biomassa seca de cada componente, equação (1) e conteúdo de carbono presente na biomassa seca da biomassa da cana-de-açúcar na equação (2). Estes dados são necessários, dado que o carbono e a água estão presentes em diferentes concentrações de cada componente da cana-de-açúcar.

Utilizou-se a eq (1) e (2):

Onde: = porção de biomassa seca

(%u)= conteúdo de umidade na biomassa

(Cbs)= conteúdo de carbono

No cálculo do seqüestro equivalente de dióxido de carbono (CO2abs) utilizou-se a eq (3)

Onde: é a relação dos pesos estequiométricos do CO2 frente ao elemento carbono.

2.2 Metodologia de cálculo da emissão de CO2

A emissão total de CO2 advém de emissões diretas e indiretas. As emissões diretas são aquelas resultantes da liberação do carbono fixado pela vegetação da cana-de-açúcar. Emissões indiretas resultam de atividades e processos necessários à distribuição de excedentes de eletricidade.

Para o cálculo das emissões diretas advindas da liberação do carbono fixado pela biomassa da cana-de-açúcar, foi admitido que no final do ciclo de vida da biomassa, o carbono contido em sua composição seqüestrado durante a fotossíntese, irá voltar para a atmosfera na mesma quantidade seqüestrada.

As emissões indiretas de dióxido de carbono em usinas sucro-alcooleiras co-geradoras de excedentes de eletricidade ocorrem em várias atividades dentro das fases incluídas na avaliação de ciclo de vida. Algumas fases envolvem atividades que necessitam, de forma complementar, do combustível diesel que lhes permitem gerar excedentes. As emissões associadas à queima do combustível diesel ocorre em vários processos como as operações de transporte e distribuição em caminhões agrícolas e "treminhões". Também foram consideradas emissões indiretas em atividades mais complexas como a produção de equipamentos e insumos agrícolas e emissões do solo como mostrados na Figura 3. Para cada interferência - solo, produção de insumos, consumo de diesel e de energia - foram utilizados os respectivos fatores de emissão no cálculo da emissão de CO2 que podem ser definidos em quantidade de CO2 por consumo de energia ou unidades específicas de combustível.

Emissões provenientes da ampliação e modernização do parque industrial da usina são consideradas como de pequena relevância, por isto, não são levadas em conta.

 

3. Conclusão

Durante a avaliação de ciclo de vida de geração de eletricidade excedente, 31,8% do CO2 armazenado pela cana-de-açúcar é lançado para a atmosfera através da queima do bagaço. Além disso, 42,8% do carbono voltarão para a atmosfera na decomposição da palha, raízes, pontas e folhas. O restante do CO2 - 25,4% - será emitido através da metabolização do açúcar por organismos vivos. As emissões indiretas totais por hectare por ciclo de vida também são relevantes no balanço final, constituindo 2,7% da emissão total.

A diversificação através do manejo do bagaço para a cogeração garante um cenário altamente favorável em emissão de dióxido de carbono. Este combustível, produzido durante a moagem, já está inserido no sistema de produção das usinas sucro-alcooleiras. Portanto, o resíduo é obtido através de um sistema de produção pré-estabelecido. Todo o suporte em lavoura, sistema de distribuição e equipamentos correm por conta dos produtos nobres álcool e açúcar, possibilitando um cenário altamente favorável do ponto de vista de emissão e de seqüestro de CO2.

Os resultados do estudo mostram que ao se considerar a avaliação de ciclo de vida, o cenário de emissão para a comercialização de excedentes em usinas sucro-alcooleiras é mais favorável do ponto de vista ambiental dentre as outras formas de produção de eletricidade. Há de se considerar ainda que se este cenário for levado em consideração em cálculos de investimentos através da consolidação do mercado de crédito de carbono, isto poderá garantir incentivo financeiro que viabilizará a implementação de novos projetos no setor sucro-alcooleiro.

 

Referências

1.Beeharry, R, Strategies for augmenting sugarcane biomass availability for power production in Mauritius, Elsevier Science, Biomass and Bioenergy, pp 421-429, 2001 a

2. Beeharry, R, Carbon balance of sugarcane bioenergy systems, Biomass and Bioenergy; 20: pp 361-370, 2001 b

3. Alexander, A, Sugarcane physiology, a Comprehensive Study of the Saccharum Source-to-Sink System, University of Puerto Rico publishing house, 1973

4. Horta, L., Análise da utilização de energia na produção de álcool de cana-de-açúcar, Tese de doutorado, UNICAMP, 1987

5. Macedo, C e Leal, M, Ethanol production and use, ISCCT Co-products workshop, Piracicaba, 2003

6. Leão, R. Álcool, energia verde, São Paulo, SP, Instituto de Qualificação Editora Ltda, 1980

7. Lewandowski et al.CO2 balance for the cultivation and combustion of Miscanthus; Biomass and Bioenergy, 8 (2), pp 81-90, 1995