An. 5. Enc. Energ. Meio Rural 2004
Dimensionamento de sistemas integrados de energia em áreas rurais
Carlos Eduardo Camargo NogueiraI; Hans Helmut ZürnII
IProfº Assistente, Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas, CCET/UNIOESTE Cascavel - PR, (0xx45) 220-3153, e-mail: cecn@correios.net.br
IIProfº Adjunto, Centro Tecnológico, CTC/EEL/UFSC, Florianópolis - SC, (0xx48) 331-9506, e-mail: hans@labspot.ufsc.br
RESUMO
Este trabalho teve por objetivo o desenvolvimento de um novo modelo para dimensionamento de sistemas integrados de energia em áreas rurais, baseado em técnicas de simulação e programação linear, visando atender aos critérios de custo mínimo e confiabilidade desejada. Utilizou-se, como índice de confiabilidade do sistema, a probabilidade de perda de fornecimento de energia à carga (LPSP), para períodos de horas consecutivas. A partir do modelo desenvolvido, são realizadas inúmeras simulações com os parâmetros e variáveis de dimensionamento, possibilitando a análise de diferentes cenários para os sistemas energéticos otimizados.
Palavras-chave: fontes renováveis, sistemas integrados de energia, dimensionamento otimizado.
ABSTRACT
The purpose of this work was to develop a new model for sizing integrated energy systems in rural areas, based on simulation techniques and linear programming, producing a system with minimum cost and high reliability level. The used reliability level was the loss of power supply probability (LPSP), for periods of consecutive hours. With the developed model, many simulations are accomplished with the parameters and sizing variables, making possible the analysis of different scenarios for the optimized energy systems.
1. Introdução
Sistemas integrados de energia são normalmente caracterizados pela utilização conjunta e otimizada dos recursos energéticos renováveis disponíveis em determinada localidade, tipicamente áreas remotas ou rurais.
Vários trabalhos têm sido desenvolvidos visando o dimensionamento de sistemas de energias renováveis (isoladas ou integradas). Dimensionamento de sistemas energéticos híbridos (solar e eólico), com ênfase no custo e/ou performance do sistema, são apresentados por BEYER & LANGER (1996), PROTOGEROPOULOS, BRINKWORTH & MARSHALL (1997) e CELIK (2003). Estudos de sistemas integrados, onde diferentes fontes energéticas são combinadas, são realizados por ROZAKIS et al. (1997), BASSAM (2001) e NAKATA, KUBO & LAMONT (2003). Modelos de otimização de sistemas utilizando programação linear são propostos por RAMAKUMAR, SHETTY & ASHENAY (1986), KHELLA (1997) e CORMIO et al. (2003). Cálculos probabilísticos envolvendo a probabilidade de perda de fornecimento de energia à carga (ou, do inglês, loss of power supply probability - LPSP), são utilizados por BOROWY & SALAMEH (1996) e OFRY & BRAUNSTEIN (1983), como uma medida da confiabilidade do suprimento de energia.
Este trabalho apresenta o desenvolvimento de um novo modelo de dimensionamento integrado para fontes energéticas renováveis, baseado em técnicas de simulação e programação linear desenvolvidas em MATLAB 6.0, e visa atender aos critérios de custo mínimo e confiabilidade.
2. Material e métodos
Dados horários de radiação solar e velocidade do vento, bem como dados mensais de vazão disponível de uma queda d'água, disponibilidade de dejetos animais para produção de biogás e temperaturas médias do ar e da água, são utilizados no dimensionamento. Parâmetros referentes às diversas fontes ou dispositivos de conversão energética - como painel fotovoltaico, gerador eólico, microcentral hidrelétrica, biodigestor, coletor solar e banco de baterias - assim como parâmetros econômicos - como custo inicial dos equipamentos, custo de manutenção, vida útil, custo dos insumos energéticos, taxa de juros anual, subsídios governamentais, prazos de pagamento e prazos de carência - são disponibilizados no modelo. As necessidades energéticas a serem supridas foram agrupadas em três itens: cozimento, energia elétrica (para iluminação, eletrodomésticos, bombeamento de água, etc) e água quente. O primeiro item apresenta uma disponibilidade de dados diários e os demais itens apresentam uma disponibilidade de dados horários. O modelo desenvolvido permite que se estabeleçam, a priori, as combinações fonte-carga desejadas, de modo que se possam eliminar eventuais fontes não disponíveis ou evitar combinações não compatíveis.
O processo iterativo utilizado para o dimensionamento ótimo do sistema energético apresenta as seguintes etapas:
1. Leitura dos dados iniciais (necessidades energéticas e disponibilidade dos recursos energéticos naturais), parâmetros referentes aos equipamentos de conversão energética e parâmetros econômicos a serem utilizados no dimensionamento.
2. Cálculo, para cada hora do ano, das energias solar e eólica geradas pelos dispositivos de conversão energética, de acordo com RAUSCHENBACH (1980) e DALENCE (1990).
3. Cálculo dos custos dos equipamentos convertidos a valor presente, de acordo com WILLIS & SCOTT (2000).
4. Cálculo das disponibilidades energéticas para a carga 1 (cozimento). Por questões de compatibilidade, a única fonte energética utilizada para atender essa necessidade será o biogás. A partir dos tipos e quantidades de dejetos animais disponíveis, da eficiência de conversão energética do biodigestor ao longo do ano e das necessidades energéticas para cozimento, calcula-se o volume necessário de biogás a ser produzido, de acordo com BARRERA (1993) e LUCAS & SANTOS (2000). Havendo uma disponibilidade de dejetos animais maior que a necessária para a produção de biogás para cozimento, o excedente poderá ser utilizado, juntamente com os demais recursos energéticos disponíveis, para suprir as demais cargas.
5. Cálculo das disponibilidades energéticas para a carga 2 (energia elétrica). Os dispositivos de conversão energética - como painel fotovoltaico, gerador eólico, microcentral hidrelétrica, biodigestor e banco de baterias - poderão ser utilizados para a produção/armazenamento de energia elétrica. Deste modo, faz-se necessária a utilização de ferramentas de simulação e otimização para quantificar e dimensionar esses dispositivos, de modo que atendam às necessidades da carga, a partir dos critérios de custo mínimo e confiabilidade. Um maior detalhamento deste item é apresentado no fluxograma da figura 1. Os eventuais excedentes de energia elétrica produzidos nesta etapa (não consumidos e nem armazenados) serão dissipados num resistor e utilizados para aquecimento de água.
6. Cálculo das disponibilidades energéticas para a carga 3 (água quente). O aquecimento de água, utilizado para banhos ou outros fins quaisquer, poderá ser realizado pelo excedente energético produzido na etapa anterior, e complementado, conforme as temperaturas finais desejadas, pelo coletor solar, biodigestor e microcentral hidrelétrica. De maneira semelhante ao item anterior, aqui também serão utilizadas ferramentas de simulação e otimização para o dimensionamento dos dispositivos.
7. Resultados apresentados: dimensionamento otimizado dos dispositivos de conversão energética das fontes renováveis locais e análise econômica do sistema.
Algumas considerações referentes aos dispositivos de conversão energética:
- a microcentral hidrelétrica e o biodigestor apresentam limites máximos de produção energética em função das disponibilidades dos recursos naturais existentes ao longo do ano;
- o coletor solar para aquecimento de água é utilizado somente nos horários em que existe disponibilidade de radiação solar e é dimensionado a partir das equações apresentadas por COLLE (1999). A água quente produzida pode ser armazenada nos reservatórios térmicos apropriados, considerando-se, evidentemente, as perdas de calor que ocorrem ao longo do dia.
O fluxograma ilustrado na figura 1, referente ao detalhamento do item 5 discutido anteriormente, apresenta as seguintes etapas:
I. Determinação do período crítico inicial para o dimensionamento, considerado como sendo uma quantidade de horas consecutivas onde ocorre o maior déficit energético, a partir de uma comparação preliminar entre as necessidades energéticas horárias da carga e a disponibilidade de energia produzida pelos diversos dispositivos de conversão. Neste trabalho, considerou-se o período com 72 horas.
II. Cálculo do dimensionamento ótimo dos dispositivos de conversão energética para o período crítico determinado. O modelo de otimização utiliza programação linear para minimizar o custo do sistema e atender à LPSPmax desejada (índice de confiabilidade estabelecido em projeto). A realização do dimensionamento para períodos determinados é importante para evitar que eventuais déficits energéticos fiquem concentrados em algumas épocas do ano. Ou seja, ao longo de um ano todo, não haverá um único período de 72 horas consecutivas onde o déficit energético exceda os limites estabelecidos pela LPSPmax.
III. Ajuste dos resultados obtidos para valores inteiros, utilizando o algoritmo de bifurcação e limite (BRONSON, 1982).
IV. Cálculo da LPSP para o período crítico, de acordo com a metodologia apresentada por BOROWY & SALAMEH (1996). São utilizados os resultados obtidos nos itens anteriores e todos os dados horários disponíveis de carga e geração (8760 dados horários). Se LPSPCALC < LPSPMAX, ir para o item VI. Caso contrário, ir para o item V.
V. Ajuste do valor do nível de carga das baterias, definido para o início do período crítico. O parâmetro utilizado para representar o nível de carga das baterias pode variar de 1 (valor inicial para baterias totalmente carregadas) a zero (baterias totalmente descarregadas), em intervalos de 0.005. Feito o ajuste, retorna-se ao item II e realizam-se todos os cálculos novamente, seguindo a seqüência apresentada. Este ajuste é necessário tendo em vista que o dimensionamento ótimo do sistema é realizado para o período crítico, e considera-se que no início do mesmo as baterias estão completamente carregadas. Como esse fato normalmente não ocorre, é importante que esse valor inicial do nível de carga das baterias seja diminuído progressivamente, para que o dimensionamento dos dispositivos e a LPSP também possam ser progressivamente ajustados (o primeiro aumentando e o segundo diminuindo) até que o valor calculado da LPSP seja satisfatório (LPSPCALC < LPSPMAX).
VI. Cálculo do novo período crítico, comparando-se os dados de déficit energético ao longo do ano, a partir dos resultados obtidos nos itens II, III e IV. Com esse novo período, calcula-se novamente a LPSP. Se LPSPCALC < LPSPMAX, ir para o item VII. Caso contrário, retornar ao item II.
VII. Resultados obtidos para a carga 2 (energia elétrica): dimensionamento otimizado dos dispositivos energéticos e análise econômica do sistema.
Utilizando-se metodologia semelhante, pode-se realizar o cálculo das disponibilidades energéticas para a carga 3 (água quente), considerando-se as devidas especificidades (utilização das fontes energéticas apropriadas e exclusão das baterias).
3. Resultados e discussão
A partir do modelo de dimensionamento apresentado, realizou-se uma série de simulações visando comparar e discutir os resultados obtidos. Utilizou-se uma típica propriedade rural situada em uma área inicialmente não atendida pela eletrificação convencional. Os dados de entrada utilizados para a realização do dimensionamento de referência estão apresentados a seguir:
Recursos ambientais:
- Radiação solar. Série histórica de dados horários (coletados pelo LABSOLAR na Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, no período de 1997 a 2001), W/m2.
- Velocidade do vento. Série de dados horários, gerados aleatoriamente para um período de cinco anos, a partir de uma função densidade de probabilidade de Weibull. Os valores obtidos variam de 0 a 22,3 m/s, e apresentam média igual a 5,5 m/s.
- Temperatura do ar. Dados médios mensais, variando de 15 a 26 ºC.
- Temperatura da água. Dados médios mensais, variando de 17 a 23 ºC.
- Vazão de água. Dados mensais de vazão garantida de uma queda d'água, variando de 0,10 a 0,14 m3/s.
- Dejetos animais. Disponibilidade de 30 cabeças de gado bovino adulto.
Sistemas energéticos:
- Painel fotovoltaico. Fabricante e modelo: Kyocera LA51; potência máxima: 51 W; área do painel: 0,438 m2; tensão de máxima potência (Vmp): 16,9 V; tensão de circuito aberto (Voc): 21,2 V; corrente de máxima potência (Imp): 3,02 A; corrente de curto-circuito (Isc): 3,25 A; coeficiente térmico de corrente (α): 1,6 mA/ºC; coeficiente térmico de tensão (β): -144mV/ºC.
- Gerador eólico. Fabricante e modelo: Vergnet GEV4; potência máxima: 1,1 kW; tensão de geração: 220 V; velocidade inicial do vento para geração energética: 2,5 m/s; velocidade nominal do vento, após a qual a geração é constante: 10 m/s; velocidade final do vento para geração energética: 22 m/s.
- Microcentral hidrelétrica. Queda bruta: 5 m; rendimento do conjunto turbina-gerador: 0,7.
- Biodigestor. Eficiência de coleta: 0,9; eficiência do biogás para cozimento: 0,6; eficiência do biogás para aquecimento de água: 0,3; eficiência do biogás para produção de energia elétrica: 0,25; consumo médio de biogás para cozimento: 0,39 m3/pessoa/dia; consumo médio de biogás para aquecimento de água para banho: 0,74 m3/banho; produção de biogás a partir de dejetos de bovinos: 0,4 m3/animal/dia; taxa de produção de biogás ao longo dos meses: varia de 100% (para os meses mais quentes) a 40% (para os meses mais frios); poder calorífico do biogás: 5,815 kWh/m3.
- Coletor solar. Tipo plano com funcionamento por termossifão ou circulação natural; fator de remoção de calor (Fr): 0,7; coeficiente global de transferência de calor entre o coletor e o ambiente (UL): 5 W/m2/ ºC; massa específica da água (ρ): 1,0 kg/l; calor específico da água (c): 1,1639 Wh/kg/ºC.
- Banco de baterias. Tipo de bateria: chumbo-ácido de ciclo profundo; capacidade de armazenamento energético: 1,2 kWh (100 Ah, 12 V); profundidade de descarga: 0,8; eficiência da bateria: 0,85; eficiência do inversor: 0,9.
Parâmetros econômicos:
- Painel fotovoltaico. Custo inicial: US$ 5000 /kW; custo de manutenção: US$ 0,005 /kWh; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 20 anos.
- Gerador eólico. Custo inicial: US$ 1800 /kW; custo de manutenção: US$ 0,012 /kWh; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 20 anos.
- Microcentral hidrelétrica. Custo inicial: US$ 1500 /kW; custo anual de manutenção: 5% do custo inicial; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 20 anos.
- Biodigestor. Custo inicial: US$ 300 /m3 de gasômetro; custo anual de manutenção: 5% do custo inicial; custo anual de mão-de-obra: US$ 50 /m3 de gasômetro; custo do gerador elétrico a biogás: US$ 500 / m3 de biogás; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 20 anos.
- Coletor solar. Custo inicial: US$ 200 /m2 de placa coletora; custo anual de manutenção: 5% do custo inicial; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 20 anos.
- Banco de baterias. Custo inicial: US$ 100 /kWh; subsídio para aquisição do equipamento: 0%; prazo para o consumidor pagar o financiamento do equipamento: 2 anos; prazo de carência para o início do pagamento: 0 anos; vida útil do equipamento: 4 anos.
- Taxas e prazos. Taxa de juros anual: 12%; período de realização da análise econômica: 20 anos.
Cargas:
- Cozimento (carga 1). Suficiente para atender 5 pessoas por dia.
- Energia elétrica (carga 2). Potências uniformemente distribuídas (8760 dados horários), variando de zero a 12 kW; probabilidade de perda de fornecimento de energia à carga (LPSP): 0%.
- Água quente (carga 3). Quantidade de água a ser aquecida diariamente: 300 litros; temperatura final desejada para a água: 40 ºC; eficiência do reservatório térmico para manter a temperatura da água: 0,8; probabilidade de perda de fornecimento de energia à carga (LPSP): 0%.
Combinações carga-fonte:
- Cozimento. Será utilizado somente o biogás.
- Energia elétrica. Serão utilizados o painel fotovoltaico, gerador eólico, microcentral hidrelétrica, biodigestor e banco de baterias.
- Água quente. Serão utilizados a microcentral hidrelétrica, biodigestor e coletor solar.
Alguns resultados das simulações de dimensionamento realizadas estão apresentados nas tabelas 1 e 2. Nestas tabelas, a primeira coluna, referente à definição dos parâmetros do dimensionamento, apresenta a seguinte nomenclatura:
a1 - número de painéis fotovoltaicos;
a2 - número de geradores eólicos;
a3 - número de baterias;
a4 - potência da microcentral hidrelétrica, kW;
a5 - volume do biodigestor, m3;
a6 - área do coletor solar, m2;
a7 - energia total gerada, kWh/ano;
a8 - energia aproveitada para aquecimento de água, utilizando-se o excedente de energia elétrica gerada, kWh/ano;
a9 - energia útil efetivamente utilizada para as cargas, kWh/ano;
a10 - geração excedente de energia elétrica, kWh/ano;
a11 - carga total, kWh/ano;
a12 - carga não atendida, em função da LPSP estabelecida em projeto, kWh/ano;
a13 - custo total do sistema convertido a valor presente, US$;
a14 - custo da energia gerada pelo sistema, US$/kWh.
A tabela 1 apresenta os resultados do dimensionamento otimizado para uma probabilidade de perda de fornecimento de energia à carga (LPSP) de 0, 5, 10 e 15%. Pode-se verificar que, quanto maior o valor estabelecido para a LPSP, menor a exigência de confiabilidade para o sistema, e portanto, menos robusto o dimensionamento realizado e menores os custos obtidos. A carga não atendida (a12) indica a perda de fornecimento de energia que ocorre em determinados períodos, sendo este déficit distribuído ao longo do ano, de modo que nenhum período de 72 horas consecutivas possa apresentar percentuais de perdas maiores que o estabelecido pela LPSP.
A tabela 2 apresenta uma simulação de dimensionamentos energéticos otimizados, sendo que as três variações apresentadas consideram valores pré-definidos para algumas variáveis do dimensionamento (potência hidrelétrica e volume do biodigestor, em particular). Essas variáveis, destacadas em negrito na tabela, são fixadas com valores próximos aos obtidos no dimensionamento de referência, e com os novos resultados obtidos, permite-se verificar o comportamento geral do sistema (tal procedimento é viável com quaisquer variáveis).
A partir da tabela 2, observa-se que todas as variações simuladas produzem um aumento do custo total do sistema, quando comparado ao custo do dimensionamento de referência. Esses resultados são justificáveis pois, apesar de todos os dimensionamentos minimizarem o custo do sistema, o dimensionamento de referência não fixa, a priori, o valor de quaisquer variáveis (a não ser no caso das limitações impostas pela própria fonte energética), e por isso possui maior grau de liberdade para a otimização do sistema.
A tabela 3 apresenta uma análise de custos detalhada para o dimensionamento de referência, ao longo de 20 anos (WILLIS & SCOTT, 2000). Nesta tabela, a primeira linha, referente à definição de parâmetros econômicos e energéticos, apresenta a seguinte nomenclatura:
b1 - subsídio dado para aquisição dos equipamentos de conversão energética, US$;
b2 - custo inicial dos equipamentos de conversão energética, US$;
b3 - custo anual de operação e manutenção do sistema, incluindo custos referentes a seguros, taxas diversas, etc, US$;
b4 - custo anual do consumo de combustível, US$;
b5 - custo total anual do sistema - somatório dos três itens anteriores, US$;
b6 - fator de valor presente (FVP), decimal;
b7 - custo total anual do sistema convertido a valor presente - multiplicação dos dois itens anteriores, US$;
b8 - energia total anual gerada pelas fontes renováveis, kWh;
b9 - energia total anual convertida a valor presente - multiplicação dos itens b6 e b8, kWh.
Verifica-se que a tabela 3 contempla os custos normalmente utilizados para o dimensionamento de sistemas energéticos. O somatório da coluna b7 representa o custo total do sistema convertido a valor presente, e o somatório da coluna b9 representa a energia total gerada no sistema, convertida a valor presente. A relação entre esses dois valores fornece o custo total da energia gerada (US$ 0,131 /kWh).
A figura 2 mostra a variação dos custos de geração de energia de cada fonte renovável isolada (US$/kWh), em função dos custos iniciais dos equipamentos de conversão, em suas unidades mais usuais. Pode-se verificar, pela figura, que cada dispositivo de conversão energética apresentado (painel fotovoltaico, gerador eólico, microcentral hidrelétrica, biodigestor e coletor solar), apresenta um comportamento linear do custo inicial em relação ao custo da energia gerada, considerando-se fixos os parâmetros referentes à taxa de juros anual, à vida útil dos equipamentos, ao fator de carga e aos custos de operação e manutenção do sistema. As linhas tracejadas da figura destacam os custos iniciais estabelecidos nos dados de entrada e os respectivos custos da energia gerada ao longo de todo o período de análise. Dessa forma, torna-se possível simular variações nos custos iniciais dos equipamentos e comparar os resultados obtidos (custos da energia gerada) entre as diversas fontes energéticas, verificando-se a viabilidade e competitividade econômica de cada uma delas.
4. Conclusões
O modelo desenvolvido apresenta uma nova metodologia para dimensionamento de sistemas integrados de energia em áreas rurais, utilizando ferramentas de otimização e programação linear, garantindo resultados que apresentam custo mínimo e confiabilidade para períodos de horas consecutivas. A flexibilidade apresentada para a variação dos níveis de confiabilidade desejada (LPSP estabelecida em projeto), bem como para a variação dos parâmetros e variáveis de dimensionamento, permite a realização de inúmeras simulações e comparações entre diferentes cenários de dimensionamento, com resultados bastante detalhados e extremamente confiáveis. Os gráficos apresentados permitem uma avaliação dos custos da energia produzida pelas diferentes fontes energéticas, em função dos demais parâmetros econômicos.
Agradecimentos:
Ao Laboratório de Sistemas de Potência (LABSPOT/UFSC), UNIOESTE e CAPES pelo apoio dado a este trabalho.
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