5, v.2Particularidades da geração distribuída com sistemas fotovoltaicos e sua integração com a rede elétricaPolítica energética, planejamento e regulação para os sistemas isolados author indexsubject indexsearch form
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An. 5. Enc. Energ. Meio Rural 2004

 

Planejamento energético em regiões isoladas da amazônia utilizando sistemas de informações geográficas

 

 

Arthur C. AlmeidaI; Brígida R. P. RochaII; José H. A. MonteiroII; Raimundo. N. N. Aarão JrIII; Gabriella C. M. GasparII

IUFPA-PPGEE - Grupo de pesquisa ENERBIO - Universidade Federal do Pará (UFPA) 66.075-110 - (91) 211-2072 - Belém - PA - Brasil
IIUFPA-DEEC - Grupo de pesquisa ENERBIO - Universidade Federal do Pará (UFPA) 66.075-110 - (91) 211-2072 - Belém - PA - Brasil
IIIUFPA-DEM - Grupo de pesquisa ENERBIO - Universidade Federal do Pará (UFPA) 66.075-110 - (91) 211-2072 - Belém - PA - Brasil

 

 


RESUMO

Este trabalho discute uma proposta de planejamento energético em regiões isoladas da Amazônia. Para essas comunidades, propõe-se o uso de sistemas descentralizados de energia elétrica, usando biomassa como combustível. Para apoio ao planejamento energético, propõe-se um sistema informatizado usando sistemas de informações geográficas, por sua característica abrangente e integradora de informações espaciais, tão importantes no contexto amazônico.

Palavras-chave: Planejamento energético, Sistemas de informações geográficas, Biomassa, Energias renováveis.


ABSTRACT

This paper proposes a system of electric planning in isolated amazonian communities. For those communities, we propose the use of decentralized systems of electric energy with biomass as fuel. We also propose a computer system of electric planning with geographical information systems for its facilities of integrating geographical information, so useful in an amazonian context.


 

 

1. Introdução

O Programa do Governo Federal "Luz Para Todos", pretende levar energia elétrica para 12 milhões de brasileiros até 2008. Para isso, oferece três alternativas em termos de tecnologia: conexão a um sistema interligado, geração descentralizada com rede isolada e o consumidor isolado.

Na Região Amazônica, o Estado do Pará responde por 6,3% da produção de energia hidráulica nacional e 73% da produzida na região. Mesmo assim, só no Pará, temos 1,5 milhões de brasileiros (25% da população paraense) sem acesso a um serviço público de energia elétrica. Para esses, a solução de conexão à rede interligada é difícil ou inviável, técnica ou economicamente, dadas as condições amazônicas, sendo o atendimento com geração descentralizada com rede isolada um caminho mais viável para esse atendimento.

Neste trabalho, mostraremos uma proposta de planejamento energético apoiado em Sistemas de Informações Geográficas e de como esta tecnologia se presta ao uso nas condições amazônicas.

 

2. Mudança de Paradigma no Planejamento Energético.

O planejamento energético tradicional, que vigorou até meados da década de 80, consistia basicamente em estender a oferta de energia, preocupando-se unicamente com os aspectos relacionados à disponibilidade, confiabilidade e ao custo ótimo da energia distribuída. Porém, considerar apenas os aspectos mencionados anteriormente leva a um planejamento energético deficiente, que compromete o meio ambiente e não torna eficiente o uso desta energia.

Com a crescente pressão de grupos ambientalistas e com a constatação de grandes impactos ambientais em projetos de geração de energia elétrica, alguns deles na região amazônica, como o Lago de Tucuruí, que desalojou 24 mil pessoas, incluindo três nações indígenas, a preocupação com o custo ambiental da produção de energia passou a fazer parte do cenário de planejamento energético. Além disso, a conscientização de que a energia elétrica produzida estava sendo consumida de forma não-eficiente também levou os planejadores a se preocuparem com a inclusão do uso eficiente da energia por parte do consumidor final.

No caso da Amazônia, há ainda uma outra variável a ser levada em conta, quando se trata de planejamento energético para comunidades isoladas: a abundância local de biomassa (resíduos da floresta e da agricultura, cascas e sementes de frutos da região) não pode ser desconsiderada como fonte de combustível para produção de energia elétrica, em comparação com outras fontes renováveis ou com o óleo diesel importado. A utilização da biomassa como combustível para geração de energia elétrica de forma distribuída pode ser a solução mais adequada as características amazônicas, tendo em vista a grande potencialidade na obtenção desta matéria na região. A biomassa, neste caso, é constituída por caroços, sementes e cascas característicos da flora regional, que pode ser utilizado como recurso energético através da sua queima ou gaseificação.

 

3. Sistemas de Informações Geográficas

O SIG (Sistema de Informação Geográfica) é um conjunto de ferramentas para coletar, armazenar, recuperar, transformar e visualizar dados sobre o mundo real para um objetivo específico (Burrough & McDonnell, 1998). Esta definição enfatiza as ferramentas do SIG: hardwares, softwares, bancos de dados e Sistema de Gerência de Bancos de Dados.

O SIG tem como principais características a capacidade de inserir e integrar, numa única base de dados, informações espaciais provenientes de dados cartográficos, dados censitários e cadastro urbano e rural, imagens de satélite, redes e modelos numéricos de terreno; oferecer mecanismos para combinar as várias informações, através de algoritmos de manipulação e análise, bem como para consultar, recuperar, visualizar e plotar o conteúdo da base de dados geo-referenciados.

Os Sistemas de Informações Geográficas trabalham com bancos de dados geográficos, que se diferem dos bancos de dados normalmente utilizados, pois armazenam dados relacionados com a localização espacial das entidades, além dos dados alfanuméricos. O SIG armazena dados a partir de várias origens e tipos, tais como imagens, dados vetoriais, matriciais, redes, faz modelagem numérica de terrenos e permite consultas espaciais do tipo "quais são os clientes que moram a menos de 5km de um shopping?".

Alem disso, comportando estruturas de captura, exibição e de análise (transformações dirigidas) associadas ao conjunto territorialmente integrado de dados ambientais, esse tipo de modelo, denominado Sistema de Informação Geográfico, tem a capacidade de analisar relações taxonômicas e topológicas (adjacência, por exemplo) entre variáveis e entre localidades constantes da sua base atualizável de dados geo-referenciados. A estrutura topológica representa os relacionamentos entra as suas entidades como conectividade, adjacência, proximidade, continência, interseção. Essa estrutura é que dá identidade ao sistema, diferenciado-o dos demais.

Os SIGs permitem, assim, uma visão holística do ambiente e, através de análises sinópticas ou particularizadas, propiciam a aplicação de procedimentos heurísticos à massa de dados ambientais sob investigação (XAVIER-DA-SILVA, 1999). Nesta definição, o adjetivo geográfico é relativo ao sistema e não à informação. É devido à estruturação específica do sistema geográfico que se deve sua capacidade para gerar ganho de conhecimento sobre a realidade territorial analisada. O SIG seria, assim, um sistema de análise geográfica.

Por isso pode-se definir SIG como um sistema com capacidade para aquisição, armazenamento, processamento, análise e exibição de informações digitais geo-referenciadas, topologicamente estruturadas, associadas ou não a um banco de dados alfanuméricos.

 

4. Um Sistema de Apoio ao Planejamento Energético.

O sistema de apoio ao planejamento energético nos termos propostos, isto é, usando biomassa para prover energia elétrica para comunidades isoladas da Amazônia, oferece basicamente as seguintes funções:

(a) identificar a cobertura vegetal da região, de tal forma que se possa ter uma idéia precisa do tipo e quantidade de biomassa disponível para uso como combustível a ser transformado em energia elétrica;

A avaliação da biomassa disponível na região, em tipo e quantidade, é uma informação fundamental para a exeqüibilidade do projeto de geração de energia elétrica. Fazer levantamento de campo, na vastidão amazônica, entrecortada por rios, igapós e florestas densas tem um custo proibitivo. Uma abordagem macro se impõe nesta atividade. Assim, o uso de imagens de satélite e fotos de pequeno formato obtidas em vôos de baixa altitude com câmeras digitais torna-se uma solução eficiente e barata. Entretanto, para que isto seja possível é necessário que se disponha de uma forma de identificação da cobertura vegetal por processo automatizado. Uma técnica, baseada em tecnologia de redes neurais, que faz classificação de padrões, para que se possa a partir das imagens aéreas ou de satélites, classificar com pequena margem de erro, os tipos interessantes de cobertura vegetal, como por exemplo, açaizeiros ou plantações de cacau, se faz necessária para a obtenção dessa informação. Redes neurais para classificação de uso de solo em agricultura através de imagens de satélite já foram usadas com algum grau de sucesso, como por exemplo, em (VENTURIERI, 1998).

(b) modelagem da superfície de custo da biomassa;

A biomassa, mesmo sendo um combustível barato, pode ter associado a ela um custo de coleta e/ou transporte. Em geral, esse custo está diretamente ligado à distância em que se encontra e de onde deve ser trazida essa biomassa. O sistema permitirá fazer uma modelagem de uma superfície, no entorno da usina geradora, mostrando a variação do custo da coleta e transporte da biomassa até o seu local de utilização.

(c) modelagem da sustentabilidade da biomassa;

O problema da sustentabilidade da biomassa é um problema crítico em qualquer projeto que a use como combustível e que se torna mais importante ainda na Amazônia, dada a natureza de seu ecossistema. Um impacto ambiental produzido por um sistema descentralizado pode arruinar o equilíbrio de sustento e produção da própria comunidade. Por esse motivo é necessário que, com informações de campo e outras, fornecidas por agrônomos e engenheiros florestais, para o tipo de biomassa em questão, seja estabelecido um modelo matemático adequado para que se possa gerenciar de forma eficiente essa disponibilidade.

(e) mapas comparativos entre as diversas opções de energia renovável;

Apesar de nosso foco ser no uso da biomassa, impõe-se a necessidade de se avaliar outras formas competidoras de geração de energia elétrica a partir de outras fontes tais como energia eólica, solar, a diesel ou combinadas.

(f) custo normalizado do kwh gerado para diversas alternativas.

Este é um resultado importante, pois permitirá comparação do custo final do kwh gerado para cada uma das possíveis tecnologias disponíveis e aplicáveis ao caso.

 

5. Aplicação do SIG: Ilha de Combu

Um projeto piloto da utilização de sistemas de informação geográfica como ferramenta de auxílio no planejamento energético vem sendo realizado na Ilha do Combu, no Município de Belém, estado do Pará.

A ilha do Combu (Figura 1) possui uma área de 15,4 km2, sendo limitada a norte pelo rio Guamá; a sul pelo furo São Benedito; a leste pelo Furo Paciência e a oeste pela baía do Guajará. Essa ilha está localizada no estuário Guajarino, encontrando-se a 1,3 km da zona urbana de Belém.

A população da ilha do Combu é de 807 habitantes, domiciliados em 149 residências, predominantemente construídas em madeira, concentradas às margens dos cursos d'água (SILVA, 1997). A estrutura sócio-produtiva da ilha do Combu está organizada em função do aproveitamento dos recursos naturais locais. A colheita do açaí e cacau; extração de palmito; pesca de camarão e criação (galinhas, patos e porcos) são exemplos de atividades realizadas na região.

Para a caracterização do tipo de vegetação existente na ilha e também da dispersão e localização de seus moradores, foram usadas imagens de satélite Landsat-TM, com resolução de 30m e fotos aéreas de pequeno formato, obtidas a 400m de altitude, com câmera digital de 2.0 Mpixel. Em seguida, as fotos foram geo-referenciadas e plotadas sobre uma imagem de satélite da ilha (Figura 2).

 


Figura 2 - Clique aqui para ampliar

 

A partir da figura acima, confirma-se que a ocupação da ilha ocorre preferencialmente ao longo dos rios e furos que existem na ilha. Foram também feitas visitas por terra à ilha do Combu, para reconhecimento do local, tomada de coordenadas geográficas para validação de geo-referenciamento e entrevista com moradores. Os pontos coletados durante a visita foram sobrepostos a uma imagem de satélite da região (Figura 3).

Alguns resultados são mostrados nas figuras abaixo. Na figura 4, temos um mapa, produzido pelo MEAPA, com a quantidade anual de biomassa, em toneladas/km2, na região em estudo.

 

 

Na figura 5, vemos o resultado de uma modelagem com os custos de transporte de biomassa para uma usina, localizada em uma das margens da \ilha das Onças, próxima a Belém.

 

6. Conclusões

A tarefa de levar energia elétrica a populações isoladas da Amazônia requer métodos diversos daqueles utilizados em outras regiões do Brasil. Aqui, dada a vastidão da planície, uma abordagem macro se torna mais viável do que aquelas pontuais. A interligação com as redes nem sempre se mostra como a solução mais adequada. Às vezes, ela sequer e viável técnica ou economicamente. Assim, um sistema de planejamento energético para essas regiões precisa levar em conta de forma explicita alem da tradicional oferta de energia elétrica de forma adequada e confiável a baixo custo, a inclusão do custo ambiental e a modelagem da sustentabilidade dos recursos disponíveis. De posse das informações coletadas e através do seu devido tratamento no sistema de informação geográfica ArcView®, foi possível fazer o planejamento de atividades na região de Combu, demonstrando, desta forma, o uso da ferramenta SIG como apoio ao planejamento energético.

 

7. Referências

ALMEIDA, A. C., ROCHA, B. R. P.; Energia, Desenvolvimento Sustentável e Inclusão Social nas Ilhas do Município de Belém; Anais: Simpósio Amazônia, Cidades e Geopolítica das Águas. Belém. 2003.

BURROUGH, P. A & MCDONNELL, R. A.; Principles of Geographical Information Systems. Spatial Information Systems and Geo-statistics. Oxford University, Oxford, 1998.

ROCHA, B. R. P, I.M.O. DA SILVA, A.O.F. DA ROCHA, E.C.L. PINHEIRO, V. MIRANDA LOPES; Technologies for Electric Energy Production Using Biomass in Marajo Island, Brazil, Proceedings of The Fourth Biomass Conference of the Americas. California, USA.1999 pag.- 187-192.

SILVA, I.M.O., BRIGIDA R. P. DA ROCHA. Biomass Residues Evaluation For Energy Generation in Marajo Island, Brazil, 5th Biomass Conference of the Americas. Florida, USA. 2001.

VENTURIERI, ADRIANO, J. R. DOS SANTOS; Técnicas de Classificação de Imagens para Análise de Cobertura Vegetal, In: Sistemas de Informações Geográficas - Aplicações na Agricultura. Embrapa. 1998.

XAVIER-DA-SILVA. J. A digital model of the environment: An Effective Approach to Area Analysis. LATIN AMERICAN CONFERENCE, IGU, Rio de Janeiro,1982,Anais, vol. 1, p. 17-22.