An. 5. Enc. Energ. Meio Rural 2004
Processo de eletrificação rural e a expansão da agroindústria no extremo sudoeste goiano
Josias Manoel Alves1
RESUMO
A princípio, o processo de eletrificação rural no extremo sudoeste goiano poderia ter sido uma importante ferramenta para o homem do campo em função do melhoramento da sua qualidade de vida através do uso da eletricidade para fins domésticos ou como insumo aplicado no seu processo produtivo.
Toda via, o Programa de Eletrificação Rural, nesta micro-região, se desencadeou ainda na segunda metade da década de 1980 através do convênio técnico e financeiro firmado entre o Governo Estadual, Federal e o The Overseas Economic Cooperation Fund, OECF (organismo do governo japonês que naquele momento estava proporcionando mecanismo de dependência técnica e financeira a projetos em países em desenvolvimento). Mediante tal panorama internacional favorável, no extremo sudoeste goiano, acabou se deflagrando o processo de eletrificação rural. Em dez anos,
período em que o projeto se manteve mediante a manutenção dos devidos investimentos técnicos e financeiros, foram atendidas 981 propriedades rurais nas cidade de Rio Verde, Jataí e Mineiro, compondo assim a micro-região do extremo sudoeste goiano, com a instalação efetiva de 2.078 km de rede elétricas nas tensões de 13,8 e 34,5kV2.
Por conseguinte, quase duas décadas depois de tal evento, é necessário ir a campo para se constatar os efeitos que esse projeto produziu na vida do homem do campo. Com o objetivo de caracterizar o aproveitamento de energia elétrica em três propriedades rurais beneficiadas pelo projeto OECF, no extremo sudoeste goiano, se procedeu à verificação, análise e descrição de situações pertinentes às instalações elétricas para fins produtivos e necessidades domésticas.
Constatou-se assim, que todas as propriedades que foram contempladas pelo respectivo projeto faziam uso de motores elétricos para diversos fins tais como: irrigação, fabricação de ração, trituradores de ração e ordenha mecânica; Além é claro, do uso do respectivo insumo para fins domésticos, assim como, iluminação e conservação de alimentos.
Ficando assim evidente, que nas propriedades identificadas, resguardadas suas particularidades, se verificou um uso expressivo de energia elétrica, seja para fins domiciliares ou como insumo a ser agregado ao processo produtivo para a obtenção de melhores índices de produtividade e qualidade dos produtos.
Palavras-chave: Eletrificação Rural, Uso Final de Eletricidade e Expansão da Agroindústria.
ABSTRACT
The electric energy is an important tool to rural communities, promoting quality of life through its use at home or as part of the productive process. The Rural Electrical Project of the State of Goiás began with the collaboration between The Overseas Economic Cooperation Fund (OECF) and the Electric Company of the State of Goiás. The subject of this paper is to characterize the electric energy use in three farms attended by OECF project, in Rio Verde, Jataí and Mineiro. It was done the checking, analysis and description of situations related to the electric installation, motors starting, conservation and use of alternative energy source. It was evident that all farms use electric motors to several purposes (irrigation, manufacture of ration, trituraters, mechanic milking, etc). Two farms used electric fences, while only one used hybrid system. It was verified at the visited farms presented an expressive use of the electric energy in its domestic usage as much as an input to the productive process.
1. Introdução
Rio Verde, Jataí e Mineiro compõem a micro-região do extremo sudoeste goiano, constituindo ali uma pequeníssima parcela da população que vive no meio rural. Convém também salientar, que ali também se desenvolve um significativo contingente de trabalhador rural agregado as grandes propriedades agrícolas ou agroindustriais.
A produção agrícola e agropecuária representa, basicamente, as principais atividades econômicas daquela micro-região, e está inserida dentro do contexto econômico regional, atuando como uma das forças de equilíbrio diante dos compromissos políticos e econômicos do capital moderno, atestando assim, o importante papel que o setor agrícola, agropecuário, além é cloro, a agroindústria desempenha nesse âmbito micro-regional. Os atores responsáveis por esse quadro são os produtores rurais agraciados, na última década, pelo poder público através da implantação do sistema de eletrificação rural.
O processo de eletrificação rural, naquela micro-região, deveria ter sido um forte aliado do homem do campo por meio do melhoramento da sua qualidade de vida. Utilizando assim, a eletricidade para fins domésticos ou como insumo agregado ao seu processo produtivo, contribuindo dessa maneira, para a obtenção de melhores índices de produtividade e qualidade em seus produtos. Todavia, Ribeiro questiona o impacto da energia elétrica no desenvolvimento rural e no seu crescimento econômico. Segundo o autor, ainda não foi comprovada a correlação existente entre eletrificação rural e o crescimento econômico.
É certo que ela cria demanda para aparelhos elétricos, beneficiando a economia urbana. É um incentivo para a entrada de novos recursos. Porém, somente quando há conjunção de vários outros fatores, principalmente, investimentos em infra-estrutura de produção, comercialização e transporte, é percebido crescimento econômico3.
No entanto, o autor acaba ponderando a sua fala e nas entre linhas diz que é possível comprovar, cientificamente, se é a eletrificação rural que traz os outros benefícios, ou, se são os outros benefícios - isto é, o próprio desenvolvimento rural - que traze a eletrificação.
No Planalto Central Goiano, os primeiros ensaios para levar energia elétrica ao homem do campo se processaram, exatamente, em outubro de 1987. Período em que, o Governo do Estado precisava de novos recursos para aplicar na expansão do sistema de energia elétrica, já que tinha reduzido os seus investimentos neste setor devido à crise econômica que assolava a esfera política do governo federal. Forçando assim, o Estado a buscar ajuda financeira junto aos agentes internacionais. Na ocasião, o Governo japonês estava promovendo a abertura internacional dos seus artigos tecnológicos e, subseqüentemente, financeiro. Tal coincidência acabou resultando em um acordo comercial entre ambos os Governos, intermediados, pelo Ministério da Agricultura, recebendo assim, colaboração da Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda do Governo Brasileiro. Assim,
o Projeto de Eletrificação Rural do Estado de Goiás nasceu, oficialmente, no dia 5 de setembro de 1991, ocasião em que foi assinado o Acordo de Empréstimo nº BZ-P7 entre o The Overseas Economic Cooperation Fund (OECF) - organismo do governo japonês que presta ajuda técnica e financeira a projetos em países em desenvolvimento - e a CELG4.
Cabe ressaltar que os agentes financiadores do respectivo projeto foram o OECF, a CELG, o consumidor, o Ministério da Agricultura e a associação entre o PRONI e o Banco Mundial (o PRONI foi um programa criado pelo governo do presidente José Sarney para incentivar a agricultura irrigada no país). Para suprir a falta de recursos, o governo brasileiro buscou financiamento junto ao Banco Mundial, assim como, se demonstra logo abaixo através da divisão das responsabilidades de alocação dos respectivos recursos financeiros.
Assim propositado,
o financiamento do respectivo programa ficou subdividido da seguinte forma: o OECF com 36,32%, o PRONI - Banco Mundial com 35,26%, o Ministério da Agricultura com 16%71, a CELG com 8,05% e o Consumidor com 3,65%.5
No Planalto Central Goiano, este projeto recebeu o seguinte nome: Luz no Campo. A partir de então, o consumo de eletricidade no meio rural passou, também, a provocar um significativo e sucessivo aumento da oferta de eletricidade, refletida dessa forma, pelo crescimento crescente do consumo do respectivo insumo nos processos produtivos e domésticos no meio rural. Para constatar tais afirmações, verifique os números que são disponibilizados logo abaixo.
Na segunda metade da década de 1980, o Planalto Central Goiano atingiu uma geração, aproximadamente, de 5.600 MW. No mesmo período, constatou-se que o consumo de eletricidade na zona rural do extremo sudoeste goiano não passou de 0,05% tendo como referência àquele total de eletricidade gerada6.
No entanto, em 2003, a geração de eletricidade alcançou a ordem de 7.845 MW. Porém, o consumo de eletricidade na zona rural da respectiva micro-região atingiu o volume de 5,09% referente ao total gerado. Demonstrando dessa maneira, que o programa de eletrificação rural foi um dos principais fatores que acabou contribuindo para a expansão do parque gerador de eletricidade no Planalto Central Goiano.
Por fim, conforme exposto logo acima, cabe esclarecer que esta pesquisa pretende, apenas, identificar as principais características do uso final de eletricidade na zona rural do extremo sudoeste goiano nos municípios de Rio Verde, Jataí e Mineiro a partir da seleção de três propriedades rurais que foram contempladas pelo Projeto OECF. A partir daí, procurar-se-á observar, analisar e descrever as situações pertinentes às instalações elétricas utilizadas para fins produtivos e domésticos.
2. Aplicação da Metodológica
Realização do levantamento de informações mediante o seguinte roteiro:
a) Identificação do sistema elétrico rural existente na micro-região
b) Informações sócio-econômicas da micro-região
c) Informações sócio-econômicas das propriedades identificadas
d) Informações técnicas sobre a distribuição e uso final da eletricidade
e) Análises casos identificados
A respectiva micro-região e as três propriedades identificadas nos municípios de Rio Verde, Jataí e Mineiro (Fazenda São José, Onça e Rio Paraíso), foram escolhidas levando-se em consideração que é no município de Jataí que, atualmente, mantenho residência. Todavia, procurou-se eleger um conjunto de três propriedades que possuíssem graus de utilização de energia elétrica diferenciados, fornecendo assim, uma maior diversidade de informações.
3. Resultados dos Dados
O sistema de eletrificação rural na micro-região possui as seguintes características de fornecimento de eletricidade pela CELG:
- tensões nominais de atendimento:
- 13,8 e 34,5 kV para sistema trifásico;
- 7,96 e 19,91 kV para sistema monofásico.
- tensões secundárias para transformador particular:
- 440/220 V para transformador monofásico;
- 380/220 V para transformador trifásico;
- 220/127 V para transformador trifásico.
- limites de fornecimento:
O fornecimento de eletricidade pela CEGL é efetuado em tensão primária de distribuição se a demanda contratada ou estimada pela companhia for inferior ou igual a 2.500 kW. Os fornecimentos monofásicos são limitados a uma potência de transformação máxima de 37,5 kVA. Potências superiores a esse limite podem ser atendidas em tensão primária de distribuição, em caráter excepcional, a critério da CELG, desde que seja definida a viabilidade deste atendimento com base em estudo técnico-econômico.
A micro-região cobre uma extensão, aproximadamente, de 280 mil Km e se situa a uma distância relativa em relação à Goiânia na ordem de 300 Km. A sua população foi estimada pelo último senso do IBGE/2002 na ordem de 280.308 mil habitantes. A base econômica dessa micro-região é a agricultura, agropecuária e uma plantaforma agroindustrial. Por fim, cabe ainda salientar, que esta micro-região concentra um grande número de propriedade latifundiária agrícola e agroindustrial. Talvez em termos proporcionais, em relação ao restante do território goiano, seja a micro-região que mais concentra propriedade agrária.
3.1 Características das Propriedades
a) Fazenda São José
Esta fazenda situa-se no município de Rio Verde possuindo uma área de 1.500 alqueires e a sua principal atividade é pecuária de corte com 3.500 cabeças de gado nelore em regime de semiconfinamento.
É interessante informar que essa propriedade é dividida em três áreas (pastos), subdivididas em áreas menores (piquetes), aonde se faz o uso de cercas eletrificadas, contribuindo para a melhoria do manejo das pastagens e do gado. Todas os cercas dos pastos estão eletrificadas e servidas por três aparelhos eletrificadores localizados em um abrigo próximo à sede. Os eletrificadores estão ligados à rede de energia elétrica local.
b) Fazenda da Onça
Esta fazenda situa-se no município de Jataí possuindo uma área de 1000 alqueires, cuja atividade principal é a exploração da atividade leiteira com 1640 cabeças de gado cruzado. Naquela propriedade também se cultiva um viveiro de mudas de espécies frutíferas, além da produção de húmus de minhoca, da lavoura de milho e sorgo.
Esta propriedade também possui pastos subdivididos em 6 piquetes de 200 alqueires cada um. Por conseguinte, para dividir esses piquetes são utilizadas cercas eletrificadas servidas por três aparelhos eletrificadores alimentados pela rede local.
c) Fazenda Rio Paraíso
Esta propriedade situa-se no município de Mineiro possuindo uma área de 500 alqueires, cujas atividades se concentram na produção da soja e milho irrigado. A respectiva propriedade possui duas grandes represas que abastecem o milharal, horta de verduras e legumes e um pomar de citros, abacate e manga. A exploração agrícola da soja e do milho é a principal atividade desta estância.
3.2 Usos Finais de Eletricidade
a) Fazenda São José
O fornecimento de energia elétrica é feito pela CELG e se organiza da seguinte forma: A propriedade é servida por dois transformadores, sendo um trifásico (35 kVA) e outro monofásico (10 kVA) com tensões de distribuição de 13,8 kV e 7,97 kV, respectivamente. A tensão de utilização é de 220 volts (fase-neutro) para o monofásico e 220 e 380 volts para o trifásico.
A propriedade possui, basicamente, dois centros de carga. O primeiro é atendido pelo transformador trifásico que abastece à sede da fazenda e as instalações adjacentes, tais como, uma pequena escola, o abrigo para os eletrificadores de cerca, à casa do gerente da fazenda e, por fim, um galpão para fabricação de ração. E o segundo é atendido pelo transformador monofásico que abastece as instalações de manejo do gado (currais) e uma casa do empregado encarregado por esse setor.
O transformador trifásico, além do consumo domiciliar, atende também três motores, sendo dois no galpão para fabricação de ração (um de 10 cv de potência para acionar um triturador e outro de 5 cv para acionar um moinho de ração, ambos trifásicos). O outro motor fica próximo à sede e é utilizado para misturar os micro-nutrientes na ração. Essa máquina possui um motor de ¾ de cv ligado diretamente à rede.
Existe um grande cuidado com a utilização da energia elétrica, sendo a qualidade das instalações elétricas adequadas, principalmente, nos sistemas de acionamento e proteção dos motores da fábrica de ração e também nas instalações do sistema de cerca eletrificada. Todas as modificações nos projetos elétricos passam pela apreciação e/ou elaboração por parte do proprietário, como pode ser observado no sistema de controle dos eletrificadores de cerca.
De acordo com o proprietário, o consumo médio mensal de energia elétrica está em torno de 2.400 kW, sendo observado uma grande preocupação de sua parte em relação ao uso racional de energia, haja vista que até a iluminação noturna externa das dependências próximas à sede é dispensada.
b) Fazenda da Onça
O fornecimento de energia elétrica é feito, diretamente, pela CELG e o sistema utilizado é monofásico. A tensão de distribuição é de 7,97 kV e o transformador possui uma potência de 10 kVA com uma tensão de utilização de 220 volts (fase-neutro) e 380 volts (fase-fase). Este sistema abastece a sede da fazenda, a casa dos empregados, a uma oficina mecânica e, a uma fabrica de ração e, por fim, a um conjunto de motobomba de 5cv (monofásico) que atende o sistema de ordenha mecânica e a irrigação da lavoura de milho.
O transformador se encontra localizado de modo a atender da melhor forma os pontos de maior consumo de energia elétrica, ficando bem evidente sua locação no centro de cargas da propriedade. Todavia, vale ressaltar que a carga de maior consumo, conjunto motobomba, está bem mais afastada do transformador que as outras cargas, contudo, como seu uso se restringe somente a poucos períodos do ano, sua localização não compromete a determinação do centro de cargas. A oficina possui vários equipamentos, dentre eles esmeril, solda elétrica, furadeira, etc., sendo todos ligados diretamente à rede de energia. De acordo com o proprietário o consumo médio de energia é de 2.100 kW.
c) Fazenda Rio Paraíso
A energia elétrica da propriedade é monofásica com um transformador de 15 kVA, sendo a tensão de distribuição de 7,97 kV e as de utilização de 220 volts (fase-neutro) e 440 volts (fase-fase).
O centro de carga do sistema é monofásico e abastece uma casa sede, uma casa de empregado, e dois abrigos (na margem direta das represas) contendo cada um uma tomada de água feita por um conjunto motobomba para atender a horta e o pomar. Em uma outra área (do outro lado esquerdo das represas), existem um retiro contendo as instalações pertinentes à exploração leiteira (curral, silos trincheira, galpão) e a casa do gerente. No curral há um motor de 3 cv que aciona um esguichador de água responsável pela lavagem das instalações zootécnicas.
Os dois conjuntos motobomba mencionados possuem motores de 12 ½ cv (com alimentação de 440 volts em fase-fase) e 5 cv (com alimentação de 220 volts em fase-neutro), sendo que o primeiro atende a irrigação do pomar e o segundo a da horta. Por fim, de acordo com o gerente da propriedade o consumo médio de energia nessa propriedade é de 1.300 kW.
4. Análises dos Dados
A partir do processo de eletrificação rural, é evidente constatar, que essa micro-região se consolidou como importante área de expansão agropecuária e agroindustrial. Assistiu-se a um acelerado processo de expansão da área cultivada, incorporação de novas tecnologias e diversificação da agricultura tais como a soja e milho e a produção de carne e leite.
A estrutura de produção existente foi drasticamente afetada, ocorrendo uma redução da participação relativa das tradicionais culturas, principalmente arroz e feijão, e aumento da importância de culturas voltadas à exportação, provocando assim, o aumento da demanda por energia elétrica para ser utilizada, sobretudo, como insumo nos processos produtivos agropecuários e agroindustriais7.
Esse processo de intensificação do uso de eletricidade mediante a modernização da produção pecuária, no extremo sudoeste goiano, pode ser identificados nos exemplos dos estudos de casos observados, analisados e descritos apresentados nesse trabalho investigativo. Além do mais, é necessário também perceber outros índices correlatos de aplicação da eletricidade no processo de diversificação da sua produção agrícola, assim como, é apresentado por Estevão.
Enquanto a soja, ainda nos anos 90, aumentou a sua participação, a produção de feijão, por exemplo, perdeu a sua importância relativa, passando de 65% da produção de grãos na micro-região em 1995 para 38% em 19988.
É no extremo sudoeste goiano que se concentra os maiores frigoríficos da região, entre eles, a Perdigão, a Frigoestrela, a Frigoalto, o Frango Galle etc. Além é claro, de algumas plantas agroindustriais tais como, a Coimbra, a Comigo, a Caramuru, a Nestlé etc. Conseqüentemente, a micro-região tem que ofertar uma grande produção de grãos para garantir a alimentação dos animais e as matérias-primas para os processos agroindustriais. Portanto, é factível induzir que toda essa demanda por matéria-prima vá provocar, inevitavelmente, o crescimento escalonar do consumo de eletricidade nessa micro-região.
Assim, a produção do milho, apesar de sua menor importância relativa, aumentou de 14% para 20% do total produzido nesse município entre 1995 e 2003. Depois de atingir 11,0% da produção Estadual em 2000, nos dois anos subseqüentes, a participação micro-regional caiu para 7,0% em relação à produção Estadual, devido à adversidade da conjuntura econômica e política nacional. O caso da soja é, no entanto, o mais ilustrativo em função da sua rápida expansão produtiva na micro-regional. De uma posição, praticamente, insignificante nos anos 80, a respectiva produção na micro-região chegou a representar 13% do total produzido no Estado em 2003. No mesmo ano essa micro-região chegou a responder por cerca de 1,4% da produção nacional.
Rezende salienta que,
o crescimento da importância relativa da produção de soja do Centro-Oeste, não se deve apenas ao aumento absoluto, da ordem de 258% no período 1980/86, mas também à queda, em termos absolutos, ocorrida no Sul-Sudeste. A expansão da produção no Centro-Oeste se inscreveu, portanto, em um movimento de redistribuição regional da produção de soja no Brasil9.
A produção de milho e de soja cresceu em um ritmo muito mais intenso no extremo sudoeste goiano, se comparada com o restante da região e até mesmo em relação ao país. Condicionando assim, também o crescimento do consumo de eletricidade nos respectivos processos produtivos. Nesse sentido, Castro afirma que,
a taxa geométrica de crescimento desses produtos entre 1990 e 1995 na Região foi, em média, 9,41% e 16,54% ao ano respectivamente; enquanto que para o conjunto do país a média é de 2,7% e 4,7% respectivamente10.
Sem dúvidas, é no caso da soja que o desempenho do extremo sudoeste goiano alcançou melhores resultados se comparados com outras regiões do Estado de Goiás. Em relação ao conjunto do país, a micro-região apresentou um rendimento entre 10 a 20% superior, principalmente, a partir de 1995. Diferentemente do caso do milho, a produção da soja caracterizou-se por grande homogeneidade dos padrões tecnológicos utilizados, fazendo com que a média de rendimento da região se igualasse aos níveis internacionais. Esta observação é importante porque demonstra que
este mesmo padrão tecnológico é capaz de apresentar, ainda, rendimentos crescentes nas condições do cerrado 11.
É importante enfatizar que, a explicação para a explosão do extremo sudoeste goiano, mais explicitamente vinculada ao caso da soja, deve ser buscada menos nos novos conhecimentos sobre o manejo dos solos de cerrado do que na descoberta de novas variedades dessa leguminosa aptas às condições da região.
No entanto, o autor enfatiza que além dessas vantagens associadas a inovações biológicas, outros aspectos ainda pouco enfatizados na análise da aptidão agrícola regional, como a maior viabilidade da moto-mecanização agrícola, contribuíram para a grande expansão da soja no extremo sudoeste goiano12.
Portanto, esta aptidão agrícola, refere-se mais às características da topografia do que às do solo, que sabidamente, é menos fértil que o restante da região.
Os maiores gastos com a correção do solo (calagem e adubação), são compensados não só pelo menor preço da terra, mas pelos ganhos de escala devido à mecanização13.
Outro fator importante é a qualidade dessa soja, que apresenta menor grau de umidade e maior percentual de proteínas, o que é considerada uma grande vantagem na produção de ração animal. Possibilitando dessa maneira, a utilização em grande escala desse produto para a cria, recria e engorda dos animais que passaram a abastecer as agroindústrias frigoríficas e as benificiadoras de cereais.
5. Considerações Finais
Não tem como negar que estas propriedades rurais observadas, analisadas e descritas, resguardadas suas particularidades, registram o aproveitamento expressivo da energia elétrica, seja para fins domésticos ou como insumo a ser agregado ao seu processo produtivo.
Desde o início da ocupação, a agropecuária foi, e ainda é, a base econômica da respectiva micro-região, e vem apresentando algumas fortes características preocupantes: a primeira é a constante queda da oferta de emprego de mão-de-obra na atividade agrícola, devido principalmente, à incorporação de novas tecnologias ao processo produtivo e, a segunda é intensificação da pecuarização da micro-região, também utilizando um processo moderno de mecanização nas respectivas atividades. Nos últimos 10 anos a área total utilizada na pecuária aumentou em cerca de 9,5% sendo que a área de lavoura diminuiu 600 mil hectares, enquanto a área de pastagem aumentou em 15 milhões de hectares.
Uma outra preocupação também marcante é a concentração fundiária. Apesar do processo que vem se dando nos últimos anos de ocupações de novas terras, praticamente, não houve nenhuma alteração na estrutura fundiária nos últimos dez anos. O extremo sudoeste goiano continua sendo uma micro-região com alta concentração de terras.
Por conseguinte, em 1980, os estabelecimentos de até 100 hectares somavam 59% do total das terras agriculturáveis e perfaziam 4,5% da área. Os com mais de 1000 hectares totalizavam 8,5% e detinham 72% da área total. O número total dos estabelecimentos caiu 6,6% entre 1990 e 2002. Houve diminuição dos estabelecimentos de até 100 hectares (16,3%) e, ao mesmo tempo, um aumento de cerca de 20% dos estabelecimentos com mais de 100 hectares. Demonstrando assim, que o processo de eletrificação rural no extremo sudoeste goiano provocou um acelerado processo de concentração de terras agrícolas.
No entanto, cabe aqui uma reflexão. Certamente, a princípio, o programa de eletrificação rural no Planalto Central Goiano surgiu mediante o pressuposto ideológico da socialização da eletricidade entre o campo e a cidade. Essa foi à idéia vinculada pelos canais de comunicação de massa e pelas instituições governamentais na época em que se desencadeou tal processo. Não obstante, esta idéia estava fundamentada na crença de que com o processo de eletrificação rural desencadeado milhares de camponeses passariam a fazer, concomitantemente, o caminho inverso que tinham feito em um passado bem recente.
Entretanto, em termos conclusivos, o que se pode abstrair a partir das observações, análises e descrições realizadas nestas propriedades rurais não foi isto. O resultado, não é senão, a constatação de que a propriedade rural na micro-região, após o processo de eletrificação rural, concentrou-se ainda mais em torno dos grandes latifúndios agropecuários e agroindustriais. Impondo assim, mais restrições às camadas populares de poderem ter acesso a terra.
Em vez de desenvolvimento econômico, o processo de eletrificação rural, acabou causando a concentração da rende e da propriedade agrária. Desmobilizando assim, uma pequena camada populacional, que até meados da década de 1980, persistia em permanece sobrevivendo em suas pequenas gleba de terra. Esta afirmação é sustentada mediante a apresentação dos números registrados pelo IBGE. Assim,
no senso populacional de 1980 no micro-região se registrou 148.453 habitantes sendo que desse total 50,2% mantinha sua residência na zona rural e 49,8% na zona urbana. No entanto, em 2002 o senso já registrou 280.308 habitantes sendo que desse total, apenas 11,3% permanecia na zona rural e 88,7% da população passou a se concentrar na zona urbana14.
Por fim, cabe registrar que estes números são por demais denunciadores de uma realidade que ainda não está esclarecida. Portanto, merecendo dos pesquisadores maior atenção para o problema, a fim de que, possam desenvolver pesquisas no sentido de elucidar as seguintes questões: Para quê? Para quem? e Por quê? a eletrificação rural no Planalto Central Goiano.
6. Referenciais Bibliográficos
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1 Josias Manoel Alves é professor da UFG, CEFET/GO, CEFORT/GO e atualmente desenvolve o doutorado em Planejamento de Sistemas Energéticos através do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas - São Paulo.
2 CELG. NTD - 07. Critérios de Projetos de Redes de Distribuição Rural. Goiânia, CELG, dezembro. 1997. p. 14.
3 RIBEIRO, F.S. A eletrificação rural ao alcance de todos. In: SERAPHIM, O.J. (ed) - Tecnologia e Aplicação Racional de Energia Elétrica e de Fontes Renováveis na Agricultura. Campina Grande: UFPB/SBEA, 1997. p. 29.
4 CELG. Indicadores Econômicos - Séries Estatísticas Básicas. Economia e Desenvolvimento: Conjuntura Sócio Econômica de Goiás. Governo de Goiás. Goiânia, ano I, n.1 p. 39, out/dez, 1999.
5 Cabe ressaltar que estes dados foram coletados do Projeto de Eletrificação Rural do Estado de Goiás. Luz no campo. Goiânia: 1987.
6 Cabe ressaltar que estes dados foram coletados no seguinte documento: CELG. NTD - 07. Critérios de Projetos de Redes de Distribuição Rural. Goiânia, CELG, dezembro. 1997.
7 Teixeira, S. M. (Coord.). Análise sócio-econômica da agricultura em Goiás. Ed. Kelps. Goiânia: 1999. p. 22.
8 Estevão, L.A. O tempo da transformação: estrutura e dinâmica na formação econômica de Goiás. Tese de Doutoramento, Campinas, IE-UNICAMP, 1997 p. 141.
9 Rezende, G.C. A agricultura de grãos no Centro-Oeste: evolução recente, vantagens comparativas regionais e o papel da política de preços mínimos. Brasília, IPEA, 1990.(Texto para discussão n. 197). p. 03.
10 Castro, A. C. E Fonseca, M. De G.D. A dinâmica agroindustrial do Centro-Oeste. Série IPEA, n. 148, Brasília, IPEA, 1995. p. 03.
11 Castro, A. C. e Fonseca, M. de G.D, ibid, p. 05.
12 Rezende, 1990, p. 10.?
13 Segundo Rezende (Ibid. p. 17) é óbvia a hipótese de que a retirada do subsídio à mecanização agrícola alterou as vantagens comparativas regionais e contribuiu para a redistribuição da produção agrícola brasileira. O extremo sudoeste ganhou vantagens comparativas nas atividades onde economia de escala são maiores e as regiões Sul e Sudeste tornaram-se mais competitivas nas atividades de menor escala e/ou mais intensivas de mão-de-obra.
14 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Senso Populacional. Rio de Janeiro: Sereis Anuais de 1985 a 2002.