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An. 6. Enc. Energ. Meio Rural 2006

 

Diagnóstico do estado de funcionamento de sistemas de bombeamento de água fotovoltaico (SBFV) instalados em Pernambucano

 

 

Heitor Scalambrini Costa

Universidade Federal de Pernambuco, Núcleo de Apoio a Projetos de Energias Renováveis, Av. Hélio Ramos, s/n, 50.740-530, Recife-PE, hscosta@ufpe.br

 

 


RESUMO

No Brasil, os maiores projetos de disseminação do uso da energia solar fotovoltaica estão localizados na região Nordeste. O Estado de Pernambuco é um dos lideres no número de instalações e potência instalada de sistemas autônomos. Existem aproximadamente, 700 residências, 250 escolas e 150 sistemas de bombeamento de água, totalizando aproximadamente 250 kWp instalados em mais de 80 municípios. Este trabalho analisa o diagnóstico realizado sobre o estado de funcionamento de 64 instalações de bombeamento de água (PRODEEM), após um ano de operação. Estas instalações para poços tubulares com profundidades entre 30 e 60 metros, são acionadas com geradores fotovoltaicos, com potências variando de 300 a 1.600 Wp, fornecendo vazões entre 200 l/h a 2.000 l/h. Nas visitas realizadas foram identificados problemas de natureza técnica e não técnica, que vão desde a escolha do local, o projeto de dimensionamento, a própria instalação física dos geradores fotovoltaicos, a falta de capacitação dos usuários, a definição sobre as responsabilidades quanto à assistência técnica, e a falta de acompanhamento necessário a projetos desta natureza. Na parte final do trabalho são enumeradas propostas no sentido de se estabelecer uma estrutura organizativa local e municipal para a gestão das instalações de SBFV, garantindo assim uma probabilidade maior de êxito dos projetos.

Palavras chave: Energia fotovoltaica, bombeamento de água, sustentabilidade.


ABSTRACT

The major projects concerning the dissemination of the use of photovoltaic solar energy (PVSE) in Brazil are located in the Northeast region. Particularly, the State of Pernambuco has the largest number of installations and the largest installed power of autonomous systems. There exist approximately 700 residencies, 250 schools and 150 water pumping systems among other applications using PVSE, totaling 250 kWp installed in more than 80 cities of that State.
This work analyses a diagnosis report on the state of functioning of 64 one-year-old water-pumping installations in 30 m to 60 m depth wells, driven by 300 to 1,600 Wp photovoltaic generators, the flows varying from 200 l/h to 6,000 l/h. Technical and non-technical problems were identified, ranging from improper location choice, wrong system dimensioning, inadequate photovoltaic generator installations, lack of user instruction and training, lack of responsibility definitions regarding the technical assistance and the needed follow-up. In the final part of this report proposals are enumerated concerning the establishment of a local and municipal organizing structure aiming the management of the water-pumping installations and the assurance of a larger success probability in the use of that technology.


 

 

1. INTRODUÇÃO

A água é, evidentemente, o fator físico mais influente sobre as condições de vida no meio rural do semi-árido, principalmente, sobre a produção agrícola. É um produto que, mesmo sem ser raro, é encontrado em quantidades limitadas e nem sempre está disponível na superfície do solo, necessitando em muitos casos, ser retirada de poços ou cacimbas cavadas no subsolo. Portanto, sua utilização deve ser otimizada. No meio rural ainda hoje é um desafio colocar água a disposição e em volume suficiente para dar melhores condições de vida à população.

Um dos elementos que viabiliza o fornecimento de água é a energia elétrica. Porém, a rede de distribuição convencional deixa de abastecer um número expressivo da população rural, mesmo sendo Pernambuco, um dos cinco estados brasileiros de maior índice de eletrificação rural. Atualmente, mais de 400 mil pernambucanos não são servidos pela rede elétrica. Em muitos casos, a geração descentralizada de energia, ou seja, a produção no próprio local de consumo, é a mais indicada em virtude das distâncias entre casas, das dificuldades de acesso e do baixo consumo de energia.

A localização geográfica do Nordeste, próxima ao Equador, confere a esta região elevados índices de insolação (em torno de 3.000 horas por ano de brilho solar), tornando o Sol um recurso natural abundante, o que indica a viabilidade técnico-econômica de projetos de geração fotovoltaica autônomos não conectados a rede elétrica.

Nesta última década, inúmeras aplicações utilizando como fonte de energia elétrica o Sol, foram implementadas nas áreas rurais de vários países do mundo. Após a Conferência "ECO 92", realizada no Rio de Janeiro, promovida pelas Nações Unidas, o Brasil, em particular o Nordeste, foi alvo de programas e projetos de disseminação da tecnologia solar fotovoltaica.

O bombeamento de água é uma das aplicações mais nobre da tecnologia solar fotovoltaica, cujos componentes são altamente eficientes. Existem inúmeras configurações de sistemas de bombeamento: para poços profundos e rasos; utilização de bombas superficiais, imersas e flutuantes, podendo ser ainda acionadas por motores de corrente contínua ou alternada. Enfim, para dadas condições hidráulicas da fonte de água, das necessidades de água, e da quantidade de energia elétrica fornecida pelos módulos fotovoltaicos, existirá uma configuração otimizada para o sistema de bombeamento.

Neste trabalho é analisados a situação operacional e os impactos sócio-econômicos das instalações de bombeamento de água fornecidas e implantadas pelo Programa de Desenvolvimento Energético dos Estados e Municípios (PRODEEM) do Ministério de Minas e Energia (MME), e instaladas pelo Governo do Estado. Foram visitados 64 sistemas localizados na região semi-árida do Estado em 15 municípios, cujas potências variam de 300 a 1.600 Wp. Estes conjuntos geradores/moto-bombas estão instalados em poços tubulares, com profundidades até 60 m.

Foram visitados 64 sistemas de bombeamento localizados em 15 municípios do Estado de Pernambuco, conforme mostrado na figura 1.

 

2. METODOLOGIA

O processo de avaliação técnica e diagnóstico das instalações consistiu de uma inspeção no campo visitando diretamente o local onde se encontram os equipamentos. Em cada caso se revisam a localização dos módulos, orientação e inclinação, seu estado físico e de resistência às intempéries, o material e as condições físicas da estrutura de suporte dos módulos.

Verificou-se o estado operativo do conversor e o local de sua instalação, observando seu correto funcionamento. Revisa-se o estado geral da instalação elétrica, incluindo os cabos, caixa de conexões, chave liga-desliga e o estado físico de suas bases. As tubulações hidráulicas, conexões, válvulas, torneiras são também revisadas.

Os sistemas de bombeamento foram classificados, utilizando uma terminologia voltada ao desempenho e funcionamento da instalação. A classificação utilizada foi: bom estado de funcionamento - no caso que foi encontrada preservada sua configuração inicial e operando corretamente, estado precário de funcionamento - encontrado em operação, mas apresentando nos módulos, nas tubulações, na parte elétrica e/ou no reservatório, vazamentos, deficiência na geração de eletricidade, situações de não conformidade com normas técnicas mínimas; não funcionando - sistema encontrado inoperante por qualquer motivo.

Uma vez concluída a inspeção visual da instalação e feitas as medições, é entrevistado o proprietário/responsável sobre o grau de satisfação com o sistema, o uso da água, a capacitação recebida, a natureza dos problemas ocorridos, o tipo e freqüência da(s) falha(s), as práticas de limpeza dos módulos, os cuidados para proteção dos módulos, e é registrado qualquer outro comentário que deseja fazer. Aproveitou-se da visita para reforçar as instruções ao usuário/responsável sobre a melhor maneira de operar e manter o sistema em boas condições de uso. A tabela I apresenta as principais características técnicas das instalações de bombeamento de água

 

 

3. PRINCIPAIS PROBLEMAS ENCONTRADOS

Ao longo das visitas técnicas foram observados incorreções nas instalações de bombeamento que podem ser resumidos em:

- Sombreamento dos módulos geradores fotovoltaicos,

- Instalação precária da estrutura física dos módulos, colocando em risco sua integridade física,

- Falta da cerca de proteção e limpeza periódica da área dos módulos,

- Qualidade insatisfatória das instalações hidráulicas e elétricas,

- Reservatórios mal dimensionados,

- Ausência de sensores de nível (poço e reservatório),

- Moto-bombas mal dimensionadas às características hidro-geológicas dos poços.

 

 

Verificou-se que o instalador não observou certas regras básicas para uma boa e correta instalação elétrica e hidráulica.

As causas dos principais defeitos e erros constatados são diversas. Aqui uma tentativa de reuni-los:

- Falta de testes e certificação dos componentes do sistema de bombeamento,

- Projetos e dimensionamentos mal realizados, assim como a escolha dos componentes,

- Falta de manutenção: caráter descentralizado e disperso das instalações (falta de pessoal qualificado),

- Instalação: caráter local (qualidade dos materiais, instaladores, etc.), reposição de peças e infraestrutura local.

 

 

Existem aspectos relacionados à operação dos sistemas de bombeamento que não foram realizados como o estabelecimento de um controle de qualidade dos componentes, sistema, instalação e serviços pós-venda dos equipamentos, a capacitação do usuário final, a formação de técnicos locais (eletricistas solares), a colocação de peças de reposição, a falta de um esquema de seguimento detalhado e independente das instalações. Não houve também a identificação clara do papel/deveres dos atores envolvidos a nível estadual, municipal e local.

Os SBFV apresentarem características que os fazem especialmente atraentes para esta região. Por um lado são pequenos e extremamente confiáveis, e por outro, sua forma de trabalhar, consistindo de bombear baixa vazão durante longo tempo (6 a 8 horas), se adaptando bem as características dos poços tubulares desta região.

 

 

 

 

4. RECOMENDAÇÕES E PROPOSTAS DE GESTÃO PARA GARANTIR O BOM FUNCIONAMENTO DAS INSTALAÇÕES

Para garantir a sustentabilidade dos projetos que utilizam a tecnologia solar fotovoltaica em áreas rurais é necessária a realização de ações como, diagnóstico e o levantamento do perfil sócio-econômico-energético da comunidade, obtendo assim suas reais necessidades; a capacitação e formação dos usuários; o correto dimensionamento do sistema; a instalação dentro de requisitos e normas técnicas e o monitoramento.

O apoio às comunidades que utilizam a energia solar fotovoltaica é um trabalho amplo, que além do aspecto técnico, é fundamental atuar na orientação dos usuários sobre o uso eficiente da eletricidade solar, informando-os quanto ao zelo e a manutenção preventiva dos equipamentos, incentivando assim, a participação coletiva na gestão dos equipamentos.

Para que o Programa Luz do Sol, do governo estadual de uso da tecnologia solar em áreas rurais para o bombeamento de água e eletrificação de áreas de uso comunitário (igreja, escolas, sede de associações, ...), tenha sucesso, não basta apenas instalar os equipamentos, é necessário um trabalho de capacitação, manutenção, assistência técnica e gerenciamento do novo recurso energético, que preferencialmente as comunidades passarão a utilizar.

Assim, o conjunto de ações propostas, junto à organização comunitária local (OCL) incentiva o espírito associativo e a conscientização da responsabilidade de cada um, com a auto-sustentação dos sistemas. É possível incentivar a conscientização dos membros das comunidades quanto às vantagens e limitações do uso da energia solar fotovoltaica, além de difundir o interesse sobre o funcionamento dos componentes do sistema e como solucionar os problemas técnicos básicos que possam surgir.

A essência deste plano de gestão está baseada em compartilhar as responsabilidades quanto aos aspectos de assegurar um bom funcionamento aos sistemas de bombeamento de água com energia solar. O governo estadual, o municipal e a comunidade beneficiária da instalação se engajariam nas responsabilidades e ações propostas.

Nível Estadual (Secretaria de ______)

Utilização de um sistema informatizado como suporte, imprescindível para a manutenção do padrão de qualidade dos serviços elétricos prestados. São três módulos que compõem o sistema informatizado proposto:

- Sistema de gerência dos equipamentos fotovoltaicos (SGEFV)

Responsável pelo cadastramento e monitoramento dos equipamentos,

- Gestão dos sistemas fotovoltaicos (GSFV)

Reúne o Sistema de Informações Geográficas (SIG), associado a uma base de dados técnicos sobre o local e os equipamentos instalados, as características hidro-geológicas da fonte de água e recursos humanos envolvidos.

- Solicitação de atendimento técnico (SAT)

Realiza o controle de todas as solicitações dos municípios, este aplicativo fornece relatórios descrevendo os serviços realizados.

Realização da análise da água para fins de consumo humano e para irrigação.

Assegurar a montagem dos equipamentos do sistema de bombeamento (módulos, sensores de nível, reservatório e parte hidráulica).

Garantir a troca dos equipamentos como módulos, moto-bomba, sensores de nível e controlador/inversor, no prazo de validade da garantia dada pelos fabricantes.

Inspeção e levantamento de campo para confirmação da viabilidade técnica do poço para implantação do sistema fotovoltaico (situação física do poço, existência ou não de cata-vento ou outro tipo de sistema de bombeamento instalado, existência ou não de cisterna para armazenamento, reservatório ou caixa d'água, situação geral).

Dimensionamento técnico da configuração de módulos e do modelo moto-bomba, em função das características hidro-geológicas do poço e das necessidades de água da população.

Montagem dos sistemas seguindo as normas técnicas recomendadas.

Nível Municipal (Comissão de Desenvolvimento Sustentável/Secretaria de Agricultura)

Definir os técnicos responsáveis pela manutenção e assistência técnica dos sistemas fotovoltaicos instalados no município.

Assinatura do contrato de cessão dos equipamentos entre a SEIn, a Prefeitura e a Associação de moradores, onde ficará definido os direitos e deveres de cada parte.

Assinatura do termo de Servidão Pública entre o proprietário do terreno onde está localizado o poço de água e a Prefeitura, concedendo assim permissão para outros moradores próximos de se beneficiarem d'água daquele poço.

Ter a disposição, com o apoio do governo estadual, as peças de reposição necessárias para o bom funcionamento dos sistemas solares.

Promover a troca de experiências entre os usuários da energia solar.

Definição das responsabilidades da prefeitura

Manutenção da área coletiva, onde está situado o poço, o reservatório e os módulos fotovoltaicos mais acessórios. Reposição de peças (torneiras, .....).

Reforçar a organização dos usuários para que eles mesmos resolvam os problemas que apareçam nas instalações solares. Discutir propostas com referente a

Nível Local (Usuários/Associação/Sindicato)

Definição das responsabilidades das organizações comunitárias locais (por ex. associação de moradores).

Manter e zelar pelos equipamentos. Limpeza da área, dos módulos solares (conforme recomendações).

Promover reuniões entre os usuários para discutir os problemas relacionados aos sistemas solares que beneficiam a comunidade local.

Responsável pela construção de cerca para proteger os equipamentos.

Qualquer anomalia na instalação, e não sabendo resolver, comunicar com os técnicos na sede do município.

 

5. CONCLUSÕES

Apesar do grande número de instalações de SBFV, a experiência tem mostrado que o comportamento destas instalações não tem apresentado bom desempenho. As principais falhas encontradas têm conseqüências negativas: aumentando os custos de operação, insatisfação dos usuários, e barreiras à introdução da tecnologia fotovoltaica.

As deficiências técnicas encontradas nas instalações são inaceitáveis. As causas principais dos erros detectados são uma combinação de aspectos técnicos e locais.

É necessária a existência de um controle de qualidade cujos testes dos componentes certificará o cumprimento de normas técnicas previamente desenvolvidas. Também é fundamental conhecer as características hidro-geológicas da fonte de água (poço tubular), para definir o mais eficiente acoplamento moto-bomba.

A experiência de campo mostra que os problemas técnicos são: avarias e falhas, operação, segurança e instalação.

É considerado que as pré-condições para a sustentabilidade das instalações fotovoltaicas são de natureza interna-usuários e externas-atores. Existe uma maior probabilidade de êxito se:

Pré-condições internas (usuários)

- A demanda pelo sistema foi resultado de um processo de priorização participativa e de base,

- For atendida a satisfação de outras demandas previas: estradas, saúde, educação, saúde, apoio produtivo, acesso a capacitação técnica, etc...

- Existência de um grau de monetarização relativa dos usuários,

- Existência de uma correspondência entre os gastos atuais em energia e o que custara um sistema fotovoltaico em operação e manutenção,

- Existência da pré-disposição dos usuários em realizar um pagamento inicial.

Pré-condições externas (atores)

- Existência de um operador técnico qualificado,

- Existência de um ator financeiro comprometido com o projeto,

- Existe um marco institucional claro que garante a execução do projeto (papeis e responsabilidades estabelecidas),

- Existência de regras claras com os usuários finais e, capacidade de ambos lados para cumpri-las (tarifas acessíveis, compromissos reais de cumprimento).

 

AGRADECIMENTOS

A todos(as) que colaboraram para a realização deste trabalho, em particular a Organização não Governamental Diaconia-PE.

 

REFERÊNCIAS

Costa, H. S., Silva, G. F. e Eck, M., 1998, "Sustentabilidade de sistemas fotovoltaicos residenciais - A experiência do Naper no Semi-Árido", Revista de Ciência e Engenharia, Universidade Federal de Uberlândia, MG, Vol. 2, pp. 105-112.

Costa, H. S. e Silva, G. F., 1996, "Idéias e conceitos para a sustentabilidade de sistemas fotovoltaicos instalados nas zonas rurais", Anais do III Encontro para o Desenvolvimento das Energias Renováveis, São Paulo.

Costa, H. S. e Araújo, K., 2001, "Sistemas fotovoltaicos em comunidades rurais - Descrição e Comentários", Relatório Chesf.