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An. 6. Enc. Energ. Meio Rural 2006

 

Geração de eletricidade a partir da gaseificação de biomassa

 

 

Cristina Apª Vilas Bôas de SalesI; Rubenildo Vieira AndradeII; Electo Eduardo Silva LoraIII

IUniversidade Federal de Itajubá / Núcleo de Estudos em Sistemas Térmicos - NEST (IEM/UNIFEI). Av BPS 1303, CP 50, Itajubá, MG, CEP 37.500-903 - Brasil (cristinasales@unifei.edu.br)
IIUniversidade Federal de Itajubá / Núcleo de Estudos em Sistemas Térmicos - NEST (IEM/UNIFEI). Av BPS 1303, CP 50, Itajubá, MG, CEP 37.500-903 - Brasil (ruben@unifei.edu.br)
IIIUniversidade Federal de Itajubá / Núcleo de Estudos em Sistemas Térmicos - NEST (IEM/UNIFEI). Av BPS 1303, CP 50, Itajubá, MG, CEP 37.500-903 - Brasil (electo@unifei.edu.br)

 

 


RESUMO

O artigo apresenta uma análise técnico-econômica da utilização da gaseificação de biomassa acoplada a diferentes acionadores primários, como motores alternativos de combustão interna, microturbinas a gás, motor de combustão externa (Motor Stirling) e célula combustível para geração em pequena escala. A análise comparativa das tecnologias consideradas se limita a utilização em regiões isoladas da rede elétrica. O trabalho também apresenta as principais características das tecnologias consideradas na análise.

Palavras Chaves: Biomassa, Gaseificadores, análise-econômica, geração de eletricidade


ABSTRACT

This paper presents a techno-economical evaluation of the biomass gasification utilization with different technologies such as: reciprocating engine, gas microturbine, Stirling engine and fuel cells for small scale electricity generation. The comparative evaluation about the technologies is limited to the utilization in isolated areas. This paper shows the principal characteristics of these technologies.


 

 

1. Introdução

Considera-se biomassa como todo material de origem orgânica tais como madeira, detritos animais e resíduos orgânicos. Atualmente são de grande interesse as florestas energéticas e resíduos agrícolas como cascas de arroz, serragem e bagaço de cana, (Nogueira e Lora, 2003).

Segundo dados do Balanço Energético Nacional - BEN, (MME, 2005) no Brasil cerca de 43,9% da Oferta Interna de Energia tem origem em fontes renováveis, enquanto que no mundo essa taxa é de 13,6% e nos países desenvolvidos é de apenas 6%. Os 56,1% restantes no BEM são de origens fóssil e outras fontes não renováveis. Da participação em energia renovável, 14,4% correspondem a geração hidráulica e 29,4% a biomassa.

As pesquisas no Brasil no setor de energia alternativas foram desenvolvidas com o objetivo de diversificar a matriz energética brasileira, diminuir a dependência por combustíveis fósseis e contribuir com a redução das emissões de gases de efeito estufa. Porém as fontes renováveis de energia não poderiam se desenvolver sem um incentivo governamental e por isso alguns programas foram criados para atender esse objetivo. Dentre estes programas se destacam o Proálcool, Proinfa e Probiodiesel, (Cadernos NAE, 2005).

A biomassa tem sido utilizada para geração de eletricidade no setor sucro-alcooleiro com ênfase na cogeração.

 

2. Gaseificação de biomassa

Segundo CIFERNO (2002), a gaseificação é a conversão térmica da biomassa numa mistura gasosa (combustível) na presença de um agente oxidante em condições abaixo da estequiométrica. Os principais compostos formados nesse processo são monóxido de carbono (CO), dióxido de carbono (CO2), hidrogênio (H2), metano (CH4) e nitrogênio (N2), com traços de C2H4, C2H6 e C3H6, bem como, alcatrão e particulado. A conversão é realizada através da oxidação parcial da biomassa à alta temperatura, geralmente entre 500-1100ºC. O agente oxidante utilizado pode ser o ar, oxigênio puro ou vapor. O gás produzido num gaseificador cujo agente de oxidação é o ar tem um poder calorífico entre 4-6 MJ/Nm3, enquanto que se o agente for O2 puro é possível obter um gás com cerca de 10-20 MJ/ Nm3. Esse gás é conhecido como gás pobre, devido ao seu baixo poder calorífico.

O processo de gaseificação da biomassa ocorre em equipamentos denominados gaseificadores, onde o gás passa por quatro zonas no interior do reator: secagem da biomassa, pirólise, combustão e redução. A umidade admitida da biomassa para o processo de gaseificação é de 5 a 25% que é removida à temperatura de 100ºC na zona de secagem. A pirólise é uma zona do reator onde há a degradação térmica da biomassa na ausência de oxigênio. Esta é convertida em alcatrão, voláteis e sólidos (carvão) numa temperatura de cerca de 280-450ºC. Num gaseificador de leito fluidizado de leito fluidizado não é possível definir estas zonas.

 

3. Tipos de gaseificadores

Segundo CIFERNO (2002), os gaseificadores podem ser classificados segundo a pressão em atmosféricos ou pressurizados, e segundo o tipo de leito como fixo ou fluidizado. Os gaseificadores de leito fixo se dividem em concorrente, contracorrente e fluxo cruzado, os de leito fluidizados se dividem em borbulhante e circulante.

Gaseificador de leito fixo: Esse sistema apresenta a vantagem de utilizar uma tecnologia simples, porém há um limite de dimensionamento à planta de 10-15 ton biomassa seca por hora, e normalmente opera numa temperatura de 1000ºC. Dependendo da direção do fluxo do ar, os gaseificadores de leito fixo são classificados em: contracorrente ("updraft"), concorrente ("downdraft") ou fluxo cruzado ("cross-flow"). São sistemas simples e eficientes trabalhando com combustíveis de alta densidade e granulometria (10-100 mm), sendo indicado para gaseificar madeira e carvão, havendo projetos desenvolvidos na China com cascas de arroz.

Gaseificador de leito fluidizado: este sistema tem vantagem de fornecer uma distribuição uniforme da temperatura, possibilita um bom contato entre sólido e gás e uma boa circulação das partículas de biomassa além de alta velocidade de reação. Esse tipo de gaseificador normalmente utiliza um leito de areia com granulometria média de 250mm, que geralmente intensifica a troca de calor entre as partículas aumentando a eficiência do processo. O gaseificador de leito fluidizado permite trabalhar com uma ampla faixa de combustíveis sólidos, além de ser um sistema de maior capacidade produtiva. Esse tipo de gaseificador é classificado em leito fluidizado borbulhante (LFB) e em leito fluidizado circulante (LFC), podendo ser atmosférico ou pressurizado.

A Tabela 1 apresenta as principais condições operacionais dos diferentes tipo de gaseificadores.

 

4. Composição do gás

O gás pode conter impurezas como voláteis, alcatrão, amônia, acido cianídrico dependendo do tipo de tecnologia empregada, que podem causar graves problemas durante a operação dos equipamentos que utilizam este gás.

A concentração de contaminantes varia de acordo com o gaseificador utilizado. Como mostrado na Tabela 2.

 

5. Limpeza do gás

O gás deve ser limpo antes de ser aplicado em sistema de geração de potência (motores de combustão interna, turbinas, entre outros), e deve atender padrões de qualidade ambiental. A escolha do sistema de limpeza dos gases depende de uma série de fatores como a eficiência, o nível de emissão desejado, o custo operacional e de investimento, o espaço disponível, a temperatura, a característica do gás, o tamanho das partículas de biomassa, entre outros.

 

 

6. Aplicação do gás de biomassa

O gás de biomassa gerado em gaseificadores pode ser utilizado para diversas finalidades, entre as quais podemos citar: a queima em queimadores de caldeiras para geração de vapor; a queima em secadores para secagem de peças cerâmicas; a queima em câmaras de combustão de motores de combustão interna (Diesel e Otto) e externa (Stirling), turbinas a gás, e células combustíveis.

A utilização do gás de biomassa para geração de energia elétrica pode ser feita através de diferentes formas, todavia algumas alternativas podem ser mais atrativas que outras devido ao tratamento que esse gás necessite para ser utilizado, assim como fatores econômicos. A Tabela 4 apresenta a qualidade do gás requerida para diferentes aplicações tecnológicas.

 

7. Acionadores primários

O sistema de geração de eletricidade em pequena escala engloba diferentes tecnologias, cuja análise incluirá de um motor de combustão interna, combustão externa (Stirling), microturbinas e células combustíveis. As características das diversas tecnologias são apresentadas na Tabela 5.

7.1 Motor de combustão Interna

De acordo com VIANNA JÚNIOR (2001), uma tecnologia muito difundida em escala comercial são os motores alternativos de combustão interna devido ao seu reduzido custo de instalação, simplicidade e fácil manutenção, e podem ser operados com gás proveniente da gaseificação de biomassa.

Segundo NOGUEIRA & LORA (2003) um problema notável da utilização dessa tecnologia é com relação à remoção de particulados e alcatrão do gás para ser utilizado nos motores.

7.2 Motor Stirling

O motor Stirling consiste de um motor alternativo a pistão movido por fonte externa de calor e de forma semelhante a ciclos de vapor utiliza sistema fechado de expansão dos gases para obter potência mecânica, sendo que a eficiência do motor depende da temperatura do gás.

O motor Stirling pode ser movido por qualquer fonte capaz de fornecer calor para seu acionamento, desde combustíveis fósseis até renováveis, sendo que esta tecnologia não precisa de resfriamento do gás e nem de sistema de limpeza.

O sistema gaseificador acoplado a motor Stirling (Figura 1) apresenta uma eficiência global de 17,7%, sendo que a eficiência elétrica do motor Stirling é de cerca de 30,6%, uma vez que parte da energia é perdida na etapa de combustão ou na transferência de calor, (JENSEN).

7.3 Turbina a Gás

A turbina a gás é uma máquina térmica na qual se aproveita diretamente a energia liberada na combustão, armazenada nos gases produzidos que se expandem gerando eletricidade. As turbinas apresentam eficiência em torno de 20 a 25%.

De acordo com LENSUS & ALAKANGAS (2004), são denominadas microturbinas as turbinas com capacidade elétrica entre 25 kWe a 250 kWe, e de turbinas as de capacidade superior a 250kWe. As microturbinas se caracterizam por serem do tipo radial operando com velocidade de rotação nominal e por terem mancais suspensos a ar de ligas metálicas e cerâmicas resistentes a altas temperaturas e de componentes eletrônicos de alta potência.

Uma turbina a gás pode ser operada com gás de gaseificação de biomassa, embora a integração entre a turbina e o gaseificador ainda não se apresente em escala comercial, havendo poucos projetos demonstrativos. Nessa tecnologia devem ser considerados alguns fatores como a operação da turbina com um gás de baixo poder calorífico, deve ser determinadas a pressão de operação do gaseificador e a integração do fluxo de ar e de combustível com o resto do sistema, a limpeza e resfriamento do gás, e deve ser considerado o sistema de turbina a gás em ciclo combinado para aumentar a eficiência do processo.

7.4 Célula Combustível

De acordo com Fuel Cell Handbook (2002), as células a combustível são dispositivos que convertem a energia química de uma reação envolvendo hidrogênio e ar em eletricidade.

Uma célula consiste de dois eletrodos (anodo e catodo) separados por um eletrólito de diferentes composições químicas, onde o H2 passa pelo ânodo e o O2 pelo catodo. A Tabela 6 apresenta as características dos diferentes tipos de células combustíveis. O sistema gaseificador / células MCFC deve apresentar eficiência de 32- 43,5%. Para células do tipo SOFC a eficiência a obter é de 54,4%.

 

8. Análise técnico - econômica

Para analisar a melhor opção tecnológica para conversão de biomassa em eletricidade em pequena escala serão consideradas algumas rotas tecnológicas as que serão objetos de uma análise técnico-econômica. As tecnologias empregadas nessa análise podem ser divididas em dois cenários e englobam dois tipos de gaseificadores, os de leito fixo e os de leito fluidizado, sendo respectivamente acoplados a acionadores primários como verificado na Figura 2.

 

 

(*) O Nest-Unifei está desenvolvendo projetos que visam testes e demonstrações dessas tecnologias.

 

Tabela 7

 

Os cálculos foram efetuados considerando a taxa de cambio em 2,2R$/US$, a taxade juros 12%, tempo de operação definido em 6570 horas por ano, o gás com um poder calorífico de 5,6 MJ/kg.

A tarifa média de compra de energia elétrica foi estimado 150R$/MWh de acordo com dados obtidos do último leilão de energia (2005), a relação gás combustível no gaseificador igual a 2,46, considerando cerca de 40R$/t de biomassa.

A Tabela 8 apresenta os custos dos acionadores, do gaseificador, o sistema de limpeza do gás, assim como os custos totais de investimento.

Os resultados obtidos na análise técnico - econômica são representados pelas variantes TIR, custo de energia gerada em R$/MWh e investimento específico em R$/kW instalado nas figuras 3, 4 e 5.

 

 

 

 

 

 

Pela Figura 3 observa-se que a tecnologia com maior taxa interna de retorno considerando as diferentes faixas de potência é o motor alternativo de combustão interna, seguindo para a turbina e microturbinas a gás. O motor Stirling e a célula combustível apresentaram valores muito baixos da TIR.

De acordo com as figuras 4 e 5 o custo de geração de energia e o custo de investimento específico foi menor para o motor e a turbina enquanto que os custo se apresentam elevados para o motor Stirling e a célula combustível.

 

 

9. Conclusões

Os resultados da análise técnico-econômica apresentam valores da taxa interna de retorno (TIR), custo de geração de eletricidade e custo de investimento específico muito diferente entre as faixas de potência e entre as tecnologias consideradas.

A tecnologia que apresenta maior viabilidade econômica é o motor alternativo de combustão interna uma vez que possui maior taxa interna de retorno, menor custo de geração de energia e menor custo investimento específico comparadas às outras tecnologias.

A tecnologia gaseificador/ microturbina a gás apresentou valores favoráveis de viabilidade aproximando-se dos sistemas de motores alternativos, enquanto que para o motor Stirling e célula combustível a taxa interna de retorno é muito baixa, e os custos de geração de energia e investimento específico são elevados.

A análise econômica mostrou que para tecnologias emergentes como o motor Stirling e a Célula a Combustível tornar-se viáveis, o valor da tarifa média de compra de energia elétrica deveria ser muito alta da ordem de 400R$/MWh e o tempo de retorno de aproximadamente 10 anos. Isso pode desencorajar os investimentos nesse tipo de tecnologia uma vez que a tarifa média de energia gira em torno de 200R$/MWh, entretanto na análise não foi considerada o ciclo de vida, o que poderia conduzir a valores mais adequados. Também deve ser considerado que as tecnologias analisadas estão em fase de desenvolvimento, não tendo atingido uma escala comercial.

Alguns autores prognosticam num período de 10 - 15 anos custos específicos para os acionadores motor Stirling e célula a combustível na ordem de 3300R$/kW (1500U$/kW). Nesse caso o tempo de retorno desses investimentos estaria na faixa de 4,3 e 3 anos.

 

10.Referências Bibliográficas

BRIDGWATER, A.V., The Technical and Economic Feasibility of Biomass Gasification for Power Generation, Fuel, vol.74, nº5,pp.631-653, 1995.

Cadernos NAE- Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República- nº4, Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, 2005

CIFERNO, J. P.; MARANO, J. J. Benchmarking Biomass Gasification Technologies for Fuels, Chemicals and Hydrogen Production. Departamento de Energia dos Estados Unidos e National Energy Technology Laboratory. Junho 2002.

FUEL CELL HANDBOOK, - Sexta Edição "US-DOE/NETL, Novembro, 2002

HASLER, P.; NUSSBAUMER,Th. Gas cleaning for IC engine application from fixed bed bimass gasification , Biomass and Bioenergy, vol 16, pp. 385-395, 1999.

JENSEN, N.; WERLING, J.; CARLSEN, H.; HENRIKSEN, U. CHP From Updraft Gasifier and Stirling Engine. 12th European Conference and Technology Exhibition on Biomass for Energy, Industry and Climate Protection. Amsterdam June 2002, pp. 726-729

LENSU, T., ALAKANGAS, E., (2004), Small-scale Electricity Generation from Renewable Energy Sources. A glance of Selected Technologies, their Market Potential and Future Prospects-VTT.OPET Report 13.

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NOGUEIRA, L. A. H.; LORA, Dendroenergia: Fundamentos e Aplicações.2ª edição, 2003

OLOFSSON, I; NORDIN, A.; SÖDERLINDU. Initial Review and Evaluation of Process Technologies and Systems Suitable for Cost-Efficient Medium-Scale Gasification for Biomass to Liquid Fuels, março 2005

VIANNA JÚNIOR, A.L., VIEIRA, L. S. R., SOARES, G. F. W., NASCIMENTO, M. V. G.; (2001), Estudo Comparativo de Microssistemas de Geração Baseados em Combustíveis. CEPEL.