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On-line ISBN 978-85-60944-35-4

An 8 Col. LEPSI IP/FE-USP 2011

 

Mãe social: profissão de agenciamento de discurso?

 

 

Paula Moreau Barbosa de Oliveira

Psicóloga mestranda do Departamento de Psicologia Clínica – PSC – IPUSP, sob orientação da Prof. Drª Maria Lúcia de A. Andrade. E-mail: paulamoreau@yahoo.com.br

 

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho surgiu a partir da disciplina Psicologia e Educação: limites e alcance de uma integração, oferecida ao curso do mestrado de psicologia da Universidade de São Paulo, lecionada pela Dra. Maria Cristina Kupfer, durante o primeiro semestre de 2010.

Algumas questões importantes foram levantadas a partir do livro Freud Antipedagogo de Catherine Millot. É possível existir uma educação orientada pela a psicanálise? Essa e outras perguntas fizeram pensar sobre os limites e alcances da psicanálise em relação à educação. Com a leitura do livro Educação para o Futuro psicanálise e educação1, foi possível vislumbrar a possibilidade de existir essa orientação psicanalítica não só no âmbito da escola, mas também no da profissão da Mãe Social.

Dentro desse contexto, foram feitas algumas reflexões sobre o conceito de educar, tratar, função materna assim como sobre a teoria dos quatro discursos de Lacan. Foram utilizados textos como educação no âmbito escolar, o cuidar na creche com os bebês e o Seminário 17 de Lacan para, após, responder a pergunta: "Mãe Social: profissão de agenciamento de discurso?". 

 

MÃE SOCIAL: PROFISSÃO DE AGENCIAMENTO DE DISCURSO?

Tanto na situação de ser professor como a de ser cuidador de creche, supõe-se que as crianças e os bebês, com os quais os profissionais trabalham, têm pais que ocupam suas funções, ficando encarregado àqueles exercer seu ofício. Objetivamente haveria uma separação quanto à descrição de papéis, auxiliando e lembrando muitos desses profissionais quanto a seu lugar. Como a Mãe Social, em sua profissão, faria essa separação sendo que, muitas vezes, cuida de crianças sem pais instituídos? Isso leva a questão central desse trabalho: como conciliar função de educador e cuidador, dimensão social, com a de mãe, âmbito privado, na profissão da Mãe Social? Seria por meio de um agenciamento de discurso?

Antes de abordar essas perguntas, cabe esclarecer qual seria a visão de educação entendida nesse trabalho, para isso será feita uma breve reflexão sobre esse conceito na abordagem de Millot e, após, na visão de educação terapêutica desenvolvida por Kupfer.

O exercício especializado da pedagogia fica no polo oposto a um espaço para a subjetivação, pois esta se dá dentro de um discurso diverso daquele o qual visa conduzir o sujeito. Educador, em função de pedagogo e analista, segundo Millot (2001), não é possível, uma vez que, ocupada a posição de pedagogo, fica impedido de funcionar como analista frente à mesma pessoa, pois dificilmente haveria uma neutralidade quanto ao desejo, dificultando, assim, a estruturação psíquica da criança.  As possibilidades seriam: o analista alertar o educador contra certos abusos da posição e este, por meio de análise pessoal, saber por limites em sua ação como conseguir reduzir demandas às crianças em relação ao seu próprio desejo.

Seria uma educação vista somente como aquela que endireita e amolda. Diferentemente desse pensamento, Kupfer (2000) defende uma educação orientada pela psicanálise, uma educação terapêutica2, a qual teve sua prática aplicada no Lugar de Vida3. Essa nova forma de pensar a educação foi concebida para os desafios da clinica da psicose e neurose grave, o que permitiu "(...) imaginar que haverá também espaço para uma educação psicanaliticamente orientada."4. O manejo, portanto, não necessariamente se restringe ao campo de necessidades especiais, mas também pode ser aplicado na educação comum e até em variados tipos de relações que envolvem a educação com o  trabalho da Mãe Social.

A presença da psicanálise na educação não viria com o objetivo de tornar as pessoas mais felizes ou menos neuróticas como pretendia Freud, mas sim como um possível diálogo. Algo da psicanálise pode ser transmitido e o sujeito transformado, em sua particularidade, explica Kupfer (2000).

Haveria transmissão da psicanálise ao educador, sem necessariamente ter que passar pelo divã. Esse encontro dar-se-ia de modo operativo5 ao educador se apropriar do saber da psicanálise por meio de uma demanda desse saber, pois ao formular questões, supõe saber sobre seu desejo.  Nessa posição, ouvirá uma teoria, implicando seu recalque como sujeito, mas extrairá desse lugar o que lhe aprouver, dando um sentido ditado por seu desejo. Mas, o recebimento da informação de forma objetiva não é garantia, a incorporação do conhecimento ocorrerá somente se existir uma implicação do sujeito.  (Kupfer, 2000).

Seguindo essa linha de raciocínio, pensar um direcionamento da psicanálise na educação, seria supor um sujeito em sua singularidade, não como depositário de regras e informações, mas com possibilidade de se constituir em seu processo de subjetivação. Uma educação marcada por um segundo momento, ou melhor, uma reeducação, onde o Outro, professor se colocaria de forma faltosa como veremos. Pensar uma educação assim é pensar em tratamento, em cuidar do sujeito para que ele se constitua num processo de reconhecimento da própria fala.

Mas, como esses processos aconteceriam no caso da profissão de Mãe Social no papel de educador e cuidador em um abrigo? Como é possível fazer uma educação para o sujeito6 dentro desse contexto? Quais seriam as funções da Mãe Social? Como conciliar a função de educador e cuidador, dimensão social, com a de mãe âmbito privado?

Primeiramente, cabe saber um pouco sobre essa profissão que se constituiu em virtude da necessidade de cuidar de crianças, cujos pais, por diversos, motivos estão sem ou está em suspenso o poder familiar. A lei no 7.644, de 18 de dezembro de 1987 dispõe sobre a Regulamentação da Atividade de Mãe Social:

Art. 2º - Considera-se mãe social, para efeito desta Lei, aquela que, dedicando-se à assistência ao menor abandonado, exerça o encargo em nível social, dentro do sistema de casas-lares.
Art. 4º - São atribuições da mãe social:
I - propiciar o surgimento de condições próprias de uma família, orientando e assistindo os menores colocados sob seus cuidados;
II - administrar o lar, realizando e organizando as tarefas a ele pertinentes;
III - dedicar-se, com exclusividade, aos menores e à casa-lar que lhes forem confiados.
Parágrafo único. A mãe social, enquanto no desempenho de suas atribuições, deverá residir, juntamente com os menores que lhe forem confiados, na casa-lar que lhe for destinada.

A profissão de Mãe Social, portanto, se define basicamente por dedicar a assistir, com exclusividade, no nível social, as crianças7 que se encontram nas casas-lares8, e administrar o lar, o qual deve habitar, organizando tarefas. Parece que, segundo a lei, isso seria dar condição de família, envolvendo aí uma dupla responsabilidade: cuidar das crianças e administrar o lar. O assistir é entendido aqui nesse trabalho como cuidado no sentido da psicanálise, o qual seria, além de fornecer o alimento e o aquecimento a criança, a transmissão da lei do desejo.  Já o administrar a casa, se for tomado no sentido de coordena às crianças, enumerá-las, construindo um ideal de arrumação e de como elas devem se comportar pode "(...) favorecer o anonimato deste outro a quem a criança é entregue, posto que incentiva o exercício do ofício numa perspectiva padronizante e tecnocrata, com tendência a exclusão de um saber inconsciente;" (Mariotto, 2009, p 26). A criança, portanto, dificilmente conseguiria colocar algo de si onde ela mora e no que ela faz, propiciando uma forte alienação no Outro, causas possíveis sofrimento. A postura de onipotência, do saber absoluto, reforça a posição objetal da criança, levando a uma simbiose que seria tão problemática quanto um anonimato, sendo este talvez mais complicado.

Parece que, então, seria fundamental, não transforma o ambiente da Casa-Lar em intervenções administrativas e pedagógicas, mas propiciar um espaço para o cuidar. Assim, o papel de mãe substituta feito pela cuidadora possibilitaria fazer não só a maternagem, no nível básico, mas "(...) práticas de cuidado que essa criança vai se constituindo subjetivamente". (Revista Estilos, 2007, p.89). O cuidado seria exercer a função materna?

A criança pequena, por possuir necessidade biológica como o fornecimento de alimento, aquecimento, precisa de uma mãe ou de alguém que encarne o lugar dela para propiciar o necessário para sua sobrevivência. Além das necessidades físicas, o bebê,  precisa se identificar com o lugar prefigurado pelo desejo, o que antecipará sua existência subjetiva. Por meio do olhar dos pais (ou educadores, ou cuidadores), das palavras nomeando o corpo da criança, está portará marcas fundamentais para a sua constituição subjetiva.

A criança receberá as primeiras inscrições psíquicas fornecidas pelos seus cuidadores, tais marcas darão a singularidade do sujeito e sua estrutura que se faz na dependência do Outro, daquilo que este possa simbolizar para a criança e do lugar disponível e endereçado daquele a esta. A educação é, portanto, a instalação de uma criança na ordem simbólica, instalar na criança o que não se instalou, permite que a criança se reconheça no outro, recuperando assim, dispositivos simbólicos. (Kupfer, 2000).

Esse reconhecimento do educar põe em ato o processo de filiação, sujeição a ideais e a desejos. Na medida em que filia, possibilita cada um se reconhecer no outro, que cada um reconheça uma marca semelhante a sua no outro. (Lajonquière, 2009).  

Essa filiação é fundamental, é preciso que primeiro a criança se aliene no Outro para depois se separa. A educação terapêutica viria, num segundo momento, instituir o simbólico e não moldar a criança no ideal do eu do educador, não seria colocar a criança no lugar de modelo identificatório."Também não é educação stricto sensu, porque seu tempo já passou e qualquer esforço de retomá-la produzirá algo novo, e será sempre uma reeducação". (Kupfer, 2000, p. 116).

Sendo assim, a educação pode ser vista como um ato importante: "o ato de educar está no cerne da visão psicanalítica de sujeito. Pode-se concebê-lo como o ato por meio do qual o Outro primordial se intromete na carne do infans, transformando em linguagem. É pela educação que um adulto marca seu filho com marcas de desejo; assim o ato educativo pode ser ampliado a todo ato de um adulto dirigindo a uma criança (...)." (Kupfer, 2000, p. 35).

A Mãe Social em relação as crianças, portanto, pode educar de forma terapêutica, se conseguir exercer essas funções. Conforme Ribeiro (2005): pressupõe que os cuidados da mãe, ou de quem representa, devem possuir marca de uma falta que permite a criança acesso a alteridade, transmitindo um desejo não anônimo, fazendo, por exemplo, a palavra do pai como lei para ela e que seu desejo vá além da criança, que tenha outros interesses e afazeres. Isso é a função materna.

As Mães Sociais ocupam um lugar difícil e fundamental na composição subjetiva da criança, pois "(...) a função materna é condição de emergência do sujeito, ao mesmo tempo, pode ser obturadora e prejudicial quando não é atravessada pela alteridade".  (Estilo da Clínica, 2008, Vol. XIII, nº 2, 176-189)

Tarefa essa, deste modo, não muito fácil, pois propõe a existência de um educador e cuidador, com condições de exercer função materna, ou seja, alienação e separação. Como isso seria possível? Parece que por meio da suplência, seria um bom caminho. A Mãe-Social com desejo voltado a desempenhar bem seu papel profissional, teria condições de se fazer suplente à criança, dando meios para que esta se estabeleça de alguma forma sem engolfá-la, dando recursos para a criança se constituir na linguagem e na cultura. Mas, o que seria suplência?

Suplência é tentar adquirir aquilo que foi perdido. "Chamamos de suplemento a tudo que – e só se pode tratar de significantes – sirva de meio para o sujeito se restabelecer em face da confusão do trauma. Esses recursos (sintomas) organizam o campo do desejo; (...). Ora, deve-se enfatizar que cada suplência, cada novo broto, se agência como um órgão." (Násio, 1991, p. 133). Vem reparar algo que não vai bem, mas não deixa de evidenciar a falta. Possibilita uma estruturação, uma amarração do sujeito, evitando desordem psíquica, mas sem ocultar a falta estrutural.

Lacan (2007) designa esse enodamento do sujeito como o Nome-do-Pai.  É este que amarra o imaginário, o simbólico e o real, a partir da singular forma de enlaçamento entre a criança e o Outro da linguagem. É nesse momento em que a função de suplência da Mãe-Social se mostra importante e também seria esse o papel do psicanalista.   

Além dessa função de suplência, saber da não possibilidade de ensinar tudo que se quer e "suportar esse impossível de nunca saber as ressonâncias de nosso ato é tarefa, pois, do educador, já que, a cada ato educativo na tentativa de educar, o real faz reconhecer que sempre restará algo de mal-entendido." (Mariotto, 2009, p.129). É preciso "suportar não saber o que esse saber significa para o sujeito do inconsciente"9. "Só assim o saber poderá produzir os efeitos que lhe cabe produzir: efeitos de modelização do gozo, de sustentação do mal-estar na civilização e, talvez, a criação de saídas – sempre provisórias – para a inevitável falta-para-ser"10.  Outro barrado permite ao outro faltar para ser. O que fica é a incerteza do resultado da educação da Mãe Social em relação às crianças.

A distinção entre a profissão de Mãe Social com o papel da mãe é essencial, pois, ao contrário, poderia, além dessa profissional passar a adotar crianças do abrigo, o que ficaria inviável, num certo momento, não exercer a função importante do cuidado do modo como foi visto, incorrendo risco de engolfa-las. 

A separação entre função de acolhimento da Mãe Social e papel parental também ocorre na medida em que se tem clareza que se exerce uma profissão e que se tenha desejo de fazer bem seu trabalho.  O educador, quando acolhe uma criança, desempenha essa função por meio de seu desejo em relação ao trabalho escolhido. Além das gratificações afetivas imaginárias presentes no desempenho da tarefa, é fundamental que o caráter profissional, enquanto meio de subsistência sobressaía, pois o salário do educador é um importante operador de limite na sua função, reforçando o caráter terceiro desse ofício. (Mariotto, 2000).

Além disso, a Mãe Social pode vir a ocupar em determinado momento uma posição correlata ao do psicanalista que defendemos como a do cuidador. Mas, essa posição seria possível sendo que mora junto com as crianças? Como aconteceria? A hipótese seria que sim, é possível, bem como importante. Para essa compreensão, serão abordados os quatro discursos de Lacan.

Segundo Lacan (1992), discurso é uma estrutura necessária que vai além das palavras. É um posicionamento que faz laço social. Ao falar, o sujeito determina sua posição discursiva, colocando o outro num lugar específico, mas este pode vir ou não se enganchar. Ninguém é dono de um discurso. Lacan sita quatro discursos possíveis: o do mestre, o da universidade, o da histérica e o do analista.

Esses discursos ligam quem fala ao Outro na medida em que aquele se dirige a este, o que propicia uma estruturação. Essa conecção também é vista no processo de educação, podendo assim conceber a educação como forma de discurso, o que amplia seu conceito, tornando-se uma prática social discursiva a qual insere a criança na linguagem, numa rede discursiva, capaz de produzir um discurso. (Kupfer, 2000).

Com a extensão desse conceito, pode-se pensar na Mãe Social como educadora ocupando o posicionamento do discurso do analista, pois esse não é exclusivo do psicanalista. É um lugar, segundo Kupfer (2000), de desinflar o imaginário e encaminhar o simbólico para o real. Nas palavras de Lacan (1992) o "discurso do analista: ele deve se encontrar no pólo oposto a toda vontade de dominar"11.

A posição de analista institui a histerização do discurso que significa nunca atingir um saber absoluto e que a verdade nunca pode ser dita se não pela metade. Essa (Lacan, 1992).

Sendo assim, a Mãe Social pode se valer do discurso do analista, produzindo um discurso histérico na instituição, arejando o ambiente. A circulação das posições discursivas no papel da Mãe Social é tão importante quanto na instituição (Casa-Lar).

Existe uma tendência dos discursos institucionais produzirem repetições e cristalizações com o objetivo de preservar sua permanência, o que dificulta a possibilidade de manifestações dos sujeitos, de colocarem sua singularidade. Essa situação opressora, segundo Kupfer (2000), dataria o fim da instituição, proporcionando inibição intelectual, por outro lado, se encarar a instituição como linguagem, como uma rede interligada, com possibilidade de girar o discurso, com espaço para questionamentos, as modificações feitas por um poderá repercutir no outro. "Assim o objetivo do trabalho de um profissional orientado pela psicanálise na escola é o de abrir espaço para a circulação de discurso". (Kupfer, 2000, p. 13). Entende-se educadores, nesse texto, como o papel da Mãe Social.

Agenciar o discurso significa arejar, apontar furos no discurso da instituição, ou seja, no discurso do mestre, produzindo um mestre não-todo, dando, assim, possibilidade às crianças pequenas se constituírem em sua subjetividade, diminuindo aos poucos sua alienação ao grande Outro, pois na medida em que pode furar este, produzir discurso com efeito de verdade.  

Segundo Kupfer, ler o discurso da Casa-Lar, torna-se possível tanto quanto o de um sujeito em analise, mas é preciso ser alvo de transferência, só nessa condição é que é possível ler o discurso e intervir.

A Autora em sua livre docência faz referência a instituição Belga Le Courtil, a qual atende crianças psicóticas e neuróticas graves. Essa instituição se utiliza da teoria dos quatros discursos de Lacan para ler a instituição. Mas, há uma pergunta: se toda instituição é regida pelo discurso do mestre em vista de estar submetida às leis e às regras, como seria possível pensar a presença da psicanálise. Responde ao constatarem que não é preciso eliminar o discurso do mestre constitutivo de toda instituição, trata de não se colocar como mestre absoluto, idealizado, não atuar como resposta a um ideal, como encarnação da mestria. Nesse sentido Kupfer pontua:

A saída, em resumo, só poderá ser então a de buscar uma identificação com um mestre que não é o detentor do saber absoluto, nem mestre da verdade. Será necessário buscar a identificação com um mestre não-todo, atravessado pela barra, pela renúncia ao Ideal, pelo saber de que seu saber é não-sabido porque se funda no inconsciente e porque não sabe sobre o desejo. (Kupfer, 2000, p. 78)

Na Casa-Lar, portanto, é possível haver uma orientação pela psicanálise da profissional e um discurso institucional balizado pelo mestre não-todo, visão contrária de Millot."Ademais, qualquer profissional pode sustentar, em dado momento, o lugar de agente do discurso analítico, se uma criança o elege para isto. Em uma instituição, não haverá necessariamente um só sujeito sustentando essa posição de agente do discurso analítico – este lugar se deslocará de um profissional a outro"12. Aí estaria a fronteira entre psicanálise e educação bem como a junção entre o âmbito privado e o público. Privado porque mãe diz respeito à esfera particular na medida em que tem um desejo específico, endereçado a seu filho, e Social na medida em que exerce uma profissão, ou seja, é paga para educar, cuidar e tratar todas as crianças que são encaminhadas para o abrigo, situação que joga esse ofício para esfera pública.

Por fim, a educação como uma forma de discurso amplia o modo de definir o que é educar e as possibilidades de interação da psicanálise com a educação. A partir disso foi possível pensar a profissão de Mãe Social dentro da teoria dos quatro discursos bem como perceber seu caráter Público e privado.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 7.644, de 18 de dezembro de 1987. Dispõe sobre a Regulamentação da Atividade de Mãe Social e dá Outras Providências. DOU , Brasília ,21 Dezembro 1987.

Kupfer, Maria Cristina Machado. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo, Escuta, 2000.

Lacan, Jaques. O seminário, livro 23: o sinthoma. Rio de Janeiro: Jorge zahar, 2007.

Lacan, Jaques. O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge zahar, 1992.

Lajonquière, Leandro. Infância e Ilusão (Psico) pedagógica. Rio de Janeiro: Vozes, 2009.

Mariotto, Rosa Maria Marini. Cuidar, educar e previnir: as funções da creche na subjetivação de bebês. São Paulo: Escuta, 2009.

Mariotto e Oliveira. Dois casos e uma questão: qual é o lugar do cuidador na subjetivação da criança. Estilos da Clínica, 2008, vol. XIII.

Millot, Catherine. Freud antipedagogo. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2001.

Násio, J. A criança magnífica da psicanálise: o conceito de sujeito e objeto na teoria de Jacques Lacan. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1991

Ribeiro, Jeanne Marie de Leers Costa. Acriança autista em trabalho. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005.

Revista: Estilos da Clínica.  Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, 2007, vol. XII, n.22.

Revista: Estilo da Clínica, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, 2008, Vol. XIII, nº 2.

 

 

1 Livre docência da profª Doutora Maria Cristina Machado Kupfer.
2 "A educação terapêutica, termo cunhado para fazer em face à um tipo de intervenção junto a crianças com problemas de desenvolvimento (...) é um conjunto de práticas interdisciplinares de tratamento, com especial ênfase nas práticas educacionais, que visa à retomada do desenvolvimento global da criança ou à retomada da estruturação psíquica interrompida pela eclosão da psicose infantil ou, ainda, à sustentação do mínimo de sujeito que uma criança possa ter construído". (Kupfer, 2000, p. 82).
3 "A pré-escola Terapêutica Lugar de Vida é uma instituição de atendimento terapêutico e educacional para crianças com graves distúrbios; está em funcionamento no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo desde 1991. As crianças recebem atendimento em grupo, quatro vezes por semana, alternadamente,  nas atividades dos grupos do jogo, do educacional, da recreação, nos espaços dos ateliês de artes e contar história". (Kupfer, 2000, p. 84).
4 Kupfer, Maria Cristina Machado. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo, Escuta, 2000, p. 116.
5"Operativo significa dizer que o saber da psicanálise poderá inclinar o educador a transmitir e fazer aprender por meio de um ato educativo tal como ele é entendido pela psicanálise: como transmissão da demanda social além do desejo, como transmissão de marcas, como transmissão de estilos de obturação da falta do Outro". (Kupfer,  2000, p. 119).
6 Termo usado no mesmo sentido que educação terapêutica por Maria Cristina Machado Kupfer em seu livro Educação para o futuro, 2000.
7 A partir do Estatuto da Criança e do Adolescente passou a ser usado o termo crianças ao em vez de menor. Essa mudança não foi só semântica, mas de como ela era vista pela sociedade: de objeto a sujeito de direito.
8 Casas financiadas pelo poder público de acolhimento de crianças menores de dezoito anos.
9 Kupfer, Maria Cristina Machado. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo, Escuta, 2000, p. 122.
10 Kupfer, Maria Cristina Machado. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo, Escuta, 2000, p. 122.
11 Lacan, Jaques. O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge zahar, 1992, p. 73
12 Kupfer, Maria Cristina Machado. Educação para o futuro: psicanálise e educação. São Paulo, Escuta, 2000, p. 97.