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ISBN 978-85-60944-35-4 versão on-line

An 8 Col. LEPSI IP/FE-USP 2011

 

Enodam-se os nós: o real, o simbólico e o imaginário no fazer do coordenador pedagógico

 

 

Poliana Marina Mascarenhas de Santana

Mestranda em Educação – Universidade Estadual da Bahia – UNEB, Programa de pós-graduação em Educação e Contemporaneidade. Pesquisadora do Grupo de Estudos em Psicanálise, Educação e Representação Social - GEPE-RS. Pedagoga. Professora Substituta do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS. E-mail: polianamms@gmail.com

 

 


RESUMO

"Enodam-se os nós: o real, o simbólico e o imaginário no fazer do coordenador pedagógico" é um estudo que pretende escutar sobre as demandas do coordenador pedagógico na contemporaneidade, analisando como este profissional percebe esse fazer, seus furos, faltas e afetos com relação a si mesmo e ao outro, na tentativa de enredar o nó borromeano para expressar na sua práxis de que jeito o real, o simbólico e imaginário estruturam o sujeito ensinante e aprendente. O marco teórico desse estudo funda-se em alguns pressupostos da teoria psicanalítica e em autores que discutem sobre o coordenador pedagógico. A metodologia aplicada é a abordagem qualitativa, e os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram a observação e a entrevista semi-estruturada. Os sujeitos foram oito coordenadores do ensino fundamental, de ambos os sexos, com idade entre 28 e 47 anos, da rede pública dos municípios de Salvador, Feira de Santana e Riachão do Jacuípe. Após a leitura do material de coleta algumas categorias de análise foram levantadas, o que contribuiu para aprofundar as análises. As possíveis conclusões demonstram o desejo do coordenador em (re)construir cotidianamente a sua forma de ver seu fazer, na busca de enodar os nós do cotidiano educativo e trabalhar o real, Simbólico e Imaginário com os professores, com vistas a reconhecer à impossibilidade, nomear, especular seu ato mesmo que esteja na ordem do gozo. Dessa forma, é preciso constituir o fazer do coordenador pedagógico de maneira que na sua práxis tenha possibilidade de escutar o professor na sua castração e criação.

Palavras-chave: Real Simbólico - Imaginário - Coordenador Pedagógico Fazer


RESUMEN

"Nodos nudos: el real, lo simbólico y lo imaginario en la toma de coordinador pedagógico" es un estudio que desea escuchar acerca de las exigencias del asesor académico contemporáneo, analizar cómo estos profesionales se dan cuenta de esto, sus faltas agujeros, y el afecto con sobre sí mismo y el otro en un intento de atrapar el nudo borromeo de expresar en su práctica de esa manera la estructura real, imaginario y simbólico que el profesor y el alumno. El marco teórico de este estudio se basa en algunos supuestos de la teoría psicoanalítica y los autores discuten coordinador pedagógico. La metodología es la aproximación cualitativa, y los instrumentos utilizados para recoger datos fueron la observación participante y entrevistas semi-estructuradas. Los sujetos fueron ocho coordinadores de educación primaria, ambos sexos, con edades comprendidas entre 28 y 47 años, la red pública en las ciudades de Salvador, Feira de Santana y Jacuípe Riachão. Después de leer el material recogido algunas categorías de análisis se han planteado, lo que contribuyó a profundizar el análisis. Posibles resultados demuestran el deseo del coordinador de (re) construir su manera cotidiana de ver a su hacer, en busca de la mancha de nosotros todos los días la educación y el trabajo real, simbólico e imaginario con los maestros, a fin de reconocer la imposibilidad, nombre, especulando con que su acto es en el mismo orden de disfrute. Por lo tanto, tenemos que estar haciendo el coordinador de la enseñanza de manera que su práctica ha sido capaz de escuchar al maestro en su castración y la creación.

Palabras clave: Real-simbólico–imaginário-Coordinador Pedagógico-Hacer


 

 

O primeiro nó

As discussões acerca do fazer do coordenador pedagógico giram em torno de muitas questões distintas, mas às vezes pouco definidas: supervisão, relação, comunicação, inspeção, construção, formação, autoridade, orientação, entre outras. Por não ser uma profissão regulamentada, mas uma "função", fica a cargo do Estado ou da empresa, no caso das escolas privadas, definirem as atribuições do trabalho do coordenador pedagógico.

Se tomarmos como base Lei n°. 8.261/02, da Secretaria de Educação do Estado da Bahia, ao coordenador pedagógico compete vinte atribuições, que vão desde articular a elaboração participativa do projeto pedagógico, até a promoção de atividades formadoras para professores e pais, e outras que contribuam para o desenvolvimento da qualidade da educação; sem contar com atividades que surgem da urgência do cotidiano e que colocam o coordenador pedagógico no risco de atuar, permanentemente, focado nos problemas que aparecem, sem dar conta da promoção do desenvolvimento do trabalho na escola (PLACCO, 2008).

Assim, o fazer do coordenador pedagógico inclui a responsabilidade de pensar a função social da escola e gerir a equipe de trabalho de maneira a atingir os objetivos do projeto escolar, uma vez que esta se caracteriza por um sistema de saberes e de relações interativas. Ou seja, o coordenador deve se preparar para acompanhar esses processos em atitude de colaboração com o professor, além de organizar e desenvolver o currículo em parceria com a comunidade escolar; prestar assistência aos professores na elaboração dos planejamentos e práticas de avaliação; diagnosticar problemas de ensino e aprendizagem, e adotar medidas preventivas, adequando conteúdos, metodologias e avaliações, além de coordenar atividades de formação continuada.

Toda essa demanda nos faz pensar se é possível que o coordenador pedagógico dê conta de executar, com o mínimo de excelência, todas as funções atribuídas ao seu cargo, quais os motivos o impede de cumpri-las, e quais sentimentos são evocados quando não há a satisfação do fazer cumprido.

Neste artigo, abordaremos como o coordenador pedagógico concebe o seu fazer profissional, e sobre os sentimentos gerados a partir da não eficácia deste fazer, buscando estabelecer uma possível articulação com o Real, o Simbólico e o Imaginário, trilogia proposta por Lacan (1974), uma vez que o fazer do coordenador pedagógico hora envolve questões do real, hora do simbólico e/ou do imaginário. Logo, envolve questões de ordem consciente, bem como processos inconscientes.

 

A tentativa de enlaçar

Para iniciar a discussão sobre o fazer do coordenador pedagógico, se faz necessário compreender o significado da palavra "coordenar".

Coordenar vem do latim "coordinare" e significa dispor em ordem, organizar, ligar. Observando a etimologia "co + ordenar", o prefixo "co" significa juntamente, mutuamente, parceria. Dessa forma, coordenar é ordenar em parceria, organizar mutuamente.

Já o verbete coordenação significa "Relação entre objetos situados na mesma ordem" (ALBBAGNANO, 2007, p. 244). Segundo Batista (2001, p. 110), "Coordenação pressupõe, portanto, uma disponibilidade para transitar em diferentes cenários e espaços (...) construindo caminhos de aproximação, negociação, diálogo e troca, entendendo os constituintes do grupo coordenado como pares legítimos".

Rangel (2008) também conceitua a coordenação, quando diz: "A coordenação implica criar e estimular oportunidade de organização comum e de integração do trabalho em todas as suas etapas. (...) O qualitativo pedagógico tem, como significante, o estudo da prática educativa" (p. 77). Essa fala confirma a necessidade de que o coordenador pedagógico, ao assumir o seu fazer, precisa assumir a responsabilidade de gerir o projeto político pedagógico, mediante o trabalho em conjunto com professores, alunos, pais e administrativo.

"Na coordenação é possível buscar parcerias, fazer conceituações, planejar, executar e acompanhar muito de perto o desenrolar das ações" (HASS, 2000, p. 123 APUD BATISTA, 2001, p. 112). Como dito anteriormente, essas ações incluem basicamente a gerencia do projeto político pedagógico da instituição. Parece simples, mas essa atividade traz a tona dezenas de outras tantas que por vezes escapa da capacidade de realização do coordenador. É preciso ter claro, em primeiro lugar, que o projeto é de responsabilidade coletiva, levar em conta que cabe a ele estimular e criar situações de debates e ações sobre este projeto. O que exige sensibilização e formação do professor, no intuito de mostrar a importância da colaboração, do compromisso e do diálogo para o funcionamento do mesmo.

Um projeto de lei, que tenta regulamentar o exercício da profissão de supervisor educacional1, no seu artigo 4°, lista as responsabilidades deste profissional. São elas:

Coordenar o processo de construção coletiva e execução da Proposta pedagógica, dos Planos de Estudo e dos Regimentos Escolares; investigar, diagnosticar, planejar, implementar e avaliar o currículo na integração com outros profissionais da educação integrantes da comunidade; supervisionar o cumprimento dos dias letivos e horas/aula estabelecidos legalmente; velar o cumprimento do plano de trabalho dos docentes nos estabelecimento de ensino; assegurar processo de avaliação da aprendizagem escolar e a recuperação dos alunos com menor rendimento, em colaboração com todos os segmentos da comunidade escolar, objetivando a definição de prioridades e a melhoria da qualidade de ensino; promover atividades de estudo e pesquisa na área educacional, estimulando o espírito de investigação e a criatividade dos profissionais da educação; emitir parecer concernente à Supervisão Educacional; (...) propiciar condições para a formação permanente dos educadores em serviço; promover ações que objetivem a articulação dos educadores com as famílias e a comunidade, criando processos de integração com a escola; assessorar os sistemas educacionais e instituições públicas e privadas nos aspectos concernentes à ação pedagógica (VIEW, 2007, p. 13-14).

Estas se assemelham bastante com as da Lei n° 8261/02, o qual estabelece as atribuições do coordenador pedagógico, profissional que desde a lei 7023/97, substituiu o antigo orientador educacional e o supervisor escolar, no estado da Bahia, abraçando assim, as funções de ambos. Antes da junção das funções, ao supervisor cabia o trabalho direto com o professor e o orientador lhe dava com os problemas referentes ao aluno e à família. Atualmente, o coordenador tem o seu fazer pautado na gestão do Projeto político pedagógico da escola, ou seja, no trabalho com toda comunidade escolar.

Dessa forma, gerir o projeto político pedagógico da instituição significa diagnosticar, registrar, refletir, orientar, avaliar, planejar, executar, supervisionar, comunicar. São inúmeros os objetivos deste profissional. Além disso, atende às demandas burocráticas exigidas pela secretaria de educação; as demandas administrativas em parceria com a direção; e às demandas formativas e pedagógicas junto ao professor, ao aluno e à família.

 

O nó Borromeu

Diante de tantas demandas as quais fazem parte do fazer do coordenador pedagógico, se faz pertinente refletir sobre de que maneira este profissional pensa esse fazer; como se estrutura perante ele; e quais subjetividades estão envolvidas nos avanços e limitações do mesmo. Porque segundo Clementi (2001, p. 54),

Acreditar nesse papel do coordenador como interlocutor não soluciona, contudo, as contradições e os conflitos enfrentados todo dia no espaço escolar. São solicitadas inúmeras tarefas – de ordem burocrática, organizacional, disciplinar – que dificultam sua dedicação à um trabalho de formação dos professores e o faz cair numa certa frustração pelo mundo das vozes que ouve, que vê e que subentende, mas não consegue administrar.

Acrescento às vozes citadas pelo autor, as vozes dos pais e da comunidade que acabam interferindo na rotina do coordenador e contribuem para o não enfrentamento adequado por parte do mesmo. A rotina do coordenador exige administração do seu tempo para conseguir dar conta das muitas e diversificadas atividades que são colocadas no seu cotidiano, a exemplo de: formar professor; planejar reuniões e atendimento à professores, pais e alunos; refletir sobre as necessidades dos atores escolares e propor soluções para a superação das mesmas; fazer registro de observação do trabalho de professor e de acompanhamento dos alunos; além de supervisionar diário de classe, entrega de nota, conferência de boletins, entre outras.

A conseqüência de tantas e variadas demandas, muitas vezes, caracteriza a atuação do coordenado pedagógico como desordenada e imediatista. Para Placco (2003), isso interfere no âmbito profissional e pessoal do coordenador.

Nesse contexto, suas intencionalidades e seus propósitos são frustrados e suas circunstâncias o fazem responder à situação do momento, "apagando incêndios" em vez de construir e reconstruir esse cotidiano, com vistas à construção coletiva do projeto político pedagógico da escola. (PLACCO, 2003, p. 47).

Além disso, existe uma tensão permanente entre o que a escola pode realizar e o que a sociedade espera dela. E uma vez que o coordenador pedagógico é gestor do projeto da escola, se torna responsável por atender os anseios dessa sociedade. Isso gera uma ansiedade aos coordenadores, Clementi (2001, p. 61) afirma que: "De forma geral, reclamam sobre a falta de tempo, o stress e a ansiedade decorrentes do desejo de fazer tudo o que precisaria ter feito". Às vezes o coordenador tem seu fazer pautado numa rotina de trabalho que nem sempre é respeitada pelos outros atores escolares, que solicitam esse profissional para atuar em outras frentes, impedindo que o mesmo se centre nas funções de formação e organização do trabalho pedagógico.

Essa discussão permite fazer uma alusão ao Nó Borromeu, simbologia introduzida por Lacan (1972) para explicar a estrutura do sujeito à nível do inconsciente (ver figura 1). Correia (2005) chamou de trilogia, por enlaçar três registros inseparáveis entre si: real, simbólico e imaginário.

 

 

A autora (2005) conceitua o real baseado nos estudos de Lacan (1974):

O real talvez seja melhor compreendido como aquilo que ainda não foi simbolizado, resta a ser simbolizado ou resiste à simbolização. Se pensarmos o real como tudo que ainda não foi simbolizado, a linguagem sem dúvida nunca transforma completamente o real, nunca suga tudo do real para dentro da ordem simbólica; fica sempre um resto (CORREIA, 2005, p. 100).

Logo, o real está no campo da impossibilidade, da incompletude e não pode ser simbolizado, apenas vivido.

Segundo Ornellas (2008, p. 82):

O real é o elo que não se pode simbolizar, porque escapa. (...) O simbólico é o registro da fala, é o que se pode ser nomeado, mesmo que não possa dizer tudo. Enquanto isso, o imaginario é especular, é fantasmático, tem a ver com a imagem.

O real está no campo da impossibilidade, da incompletude e não pode ser simbolizado. Já o simbólico, "(...) é uma conversão, com o qual o significante e o significado mantêm uma relação de complementaridade e permuta ao materializar aqueles objetos que, até então, eram estranhos para aquele grupo" (PINTO, 2009, p.29). Ou seja, o simbólico é a palavra, é o que se pode dizer. O imaginário está ligado à idealização, à fantasia, à imagem. Os três construtos permeiam esse fazer da falta, da fala e da idealização.

Clementi (2001, p. 62-63) destaca que: "É comum aos coordenadores a vivência de uma insatisfação ao comparar o que gostariam com o que conseguem fazer. Os desejos de atuação não condizem com o que a escola pensa e possibilita sobre isso". Talvez este seja o campo do real, aquilo que o coordenador vive, mas não consegue verbalizar, o desejo pela completude, pela integralidade. Por não se perceber enquanto sujeito da falta, o que acontece também com a escola que acredita educar de forma integral e completa, ambos, coordenador e escola se descontentam e se frustram na tentativa de dar conta de todas as demandas do real.

Portanto, o coordenador pedagógico precisa se perceber enquanto constituição do real, do simbólico e do imaginário. Segundo Ornellas (2009, p.124),

O sujeito revela-se num outro campo, no campo do simbólico, não se constitui enquanto uma unidade é dividido, fendido, é falante, faltante, desejante, incompleto e traz nas suas Formações do Inconsciente o sonho, ato falho, chiste, fantasia, sintoma, os quais estão assujeitados ao inconsciente.

Se percebendo enquanto sujeito constituído por conceitos conscientes e processos inconscientes, o coordenador terá mais facilidade de lidar com as demandas do seu fazer. Ornellas (2008, p. 82) cita que "A docência na contemporaneidade precisa se estruturar de modo que o ato educativo se organize nos planos real, simbólico e imaginário". Assim é o fazer do coordenador pedagógico: Real, simbólico e imaginário se entrelaçam na tentativa de esgotar as atribuições competidas a este profissional, a fim de atender às necessidades da educação na contemporaneidade.

Dessa forma, o real, o simbólico e o imaginário no fazer do coordenador pedagógico expressam a busca pelo que é idealizado e às vezes compartilhado pela linguagem. Expressam o desejo presentificado na mediação entre seus pares na escola, na tentativa de fortalecer o ato educativo.

 

O enlaçamento

Para a realização deste estudo, apoiei-me na abordagem qualitativa. "A terminologia pesquisa qualitativa é logicamente distinta de pesquisa quantitativa. O qualitativo aqui faz toda a diferença" (GALEFFI, 2009, p. 17), pois permite o aprofundamento no universo dos significados, das ações e das relações do professor e do coordenador pedagógico.

Como instrumento de coleta de dados, foram utilizadas a observação, que permite coletar dados em situações impossíveis de usar outras formas de comunicação, além de proporcionar o contato pessoal do pesquisador com o fenômeno pesquisado, e a entrevista semi-estruturada por considerar que é um instrumento flexível que permitiu escutar o sujeito sobre como ele concebe o seu fazer na escola.

Inicialmente, os sujeitos da pesquisa foram oito coordenadores pedagógicos do ensino fundamental de diversas escolas da rede pública dos Municípios de Salvador, Feira de Santana e Riachão do Jacuípe, de ambos os sexos, com idade entre 28 e 47 anos, com mais de três anos de atuação na área de coordenação pedagógica. A opção por escolher sujeitos de diferentes escolas e cidades, foi baseada na lei n°. 8261/02, da Secretaria de Educação do Estado da Bahia, que estabelece as atribuições do coordenador pedagógico no Estado. Assim sendo, a pesquisa tem a intenção de perceber as semelhanças e/ ou diferenciações do cumprimento das funções e dos sentimentos que afetam o coordenador pedagógico.

Após as observações dos sujeitos da pesquisa e a aplicação da entrevista semi-estruturada, foram construídas as categorias de análise, que permitiram encontrar as respostas para os questionamentos propostos.

Como o coordenador pedagógico concebe a sua função. A maioria dos sujeitos responderam que a principal função do coordenador pedagógico é a formação continuada de professores: "O coordenador deve ter como foco do seu trabalho aformação continuada do professor, visto que é através da reflexão do fazer pedagógico que é possível ressignificar a prática" (Sujeito 2). Isso vem contrariar em partes a falade Christov (2008, p. 124): "Toda emergência e imediatismo que marcam o cotidiano dos coordenadores impedem que estes percebam a si mesmos como formadores dos professores, atribuição relegada a terceiro ou quarto plano". Embora nem sempre essa formação seja prioridade no seu fazer, o coordenador se reconhece enquanto formador, ressaltando que momentos de acompanhamento, orientação e planejamento são oportunidade de formação.

Os limites da função de coordenar. Todos os sujeitos responderam que o maior entrave no seu fazer é a resistência. Eles justificaram que a maioria dos professores apresentam resistência ao trabalho de mediação da coordenação, principalmente por causa do descompromisso de muitos professores, como cita um deles:

(...) Gerenciar a falta de compromisso no serviço público é uma ação altamente difícil, pois não temos uma política séria de avaliação do profissional; nenhuma estratégia de formação consegue resultados positivos com o profissional descompromissado, pois a mudança perpassa o nível técnico, é algo muito pessoal (sujeito 8).

Esse descompromisso, por sua vez gera conflitos, que geram resistência por parte dos dois lados. Segundo Clementi (2001, p. 64):

Reconhecer, em seus espaços e relações, aspectos facilitadores do trabalho é importante para que o coordenador não se deixe levar por descrédito e desânimo em relação à estrutura escolar em que se encontra, aos educadores com quem convive, a si próprio enquanto educador engajado na própria formação e na de seus professores.

O coordenador precisa estar atento para não cair nesse ciclo vicioso. E não tornar-se resistente, mas procurar estar sempre aberto a ultrapassar essa resistência.

Com relação ao sentimento que afeta o coordenador pedagógico. Os sujeitos relataram que os sentimentos de frustração e impotência são muito recorrentes, quando não conseguem dar conta do trabalho. Como cita um dos sujeitos: "É o desejo nãosatisfeito, não gozado" (Sujeito 1).

Por outro lado, os sujeitos falaram também em perseverança, como sentimento que impulsiona o seu fazer. "É importante refletir sobre todas as ações realizadas, sobretudo no que não deu certo, para ter coragem de retomar a ação". (sujeito 4). Estarpronto para retomar o trabalho na tentativa de enfrentamento dos problemas vivenciados, talvez seja o início do reconhecimento da incompletude do sujeito. Retomar a ação indica desejo de buscar algo diferente, novo.

Clementi cita que:

(...) Se os coordenadores apenas se detêm na queixa ou na constatação das dificuldades encontradas, fica estabelecida a distância entre o que cada um quer e o que cada um consegue fazer; e essa disâancia não se altera, bem como também não se alteram os sentimentos e as insatisfações delas decorrentes. (2001, p. 64)

Essa superação, destacada por Clementi, é retratada nesta fala:

Coordenar não é fácil, pois o líder só se afirma e só torna-se verdadeiramente líder quando caminha lado a lado com os liderados, convivendo com as mais diferentes personalidades e competências, promovendo assim estratégias constantes para potencializar os diferentes saberes e habilidades que cada membro da equipe possui. Trabalhamos para alcançar objetivos, algumas vezes não conseguimos e os sentimentos inerentes são muitos, mas sempre cultivo a perseverança que é o que me fortalece a continuar acreditando e investindo na educação (sujeito 8).

Sendo assim, cabe ao coordenador (re)construir a base do seu fazer, reconhecendo os limites reais da sua prática, imaginando suas possibilidades e simbolizando com seus pares o que pode ser dito. Percebendo dessa forma, que o seu fazer é pautado em avanços e retrocessos gerados por si mesmo, pelos atores escolares ou pelo próprio sistema. Essa percepção lhe permitirá questionar constantemente sobre esse fazer, sua formação, suas relações, sua postura e suas prioridades. Portanto, será tão mais fácil desempenhar a função, havendo reflexão sobre o conhecimento associado à prática profissional, desenvolvendo a capacidade de pensar o real, o simbólico e o imaginário. Talvez seja esse o segredo de fazer Coordenação Pedagógica.

 

Bibliografia

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1 Em algumas regiões do país o coordenador pedagógico ainda é chamado de supervisor educacional.