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An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. May. 2002

 

Comunicando com o corpo do cuidado a partir das emoções: acadêmicos de enfermagem testam sua prática

 

Communicating with body care on the basis of emotions: nursery academics test their practice

 

 

Priscila de Castro HandemI; Ronilson Gonçalves RochaII; Nébia Maria Almeida de FigueiredoIII

IGraduanda do 7º período do curso de Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – EEAP/UNIRIO (bolsista IC – UNIRIO). Contato: Rua Gustavo Sampaio n.º 98, apt.º 202 – Leme- RJ CEP: 22010-010 TEL: (0XX21) 2543-2949 / (021) 97322936 E-mail: ronilsonrocha@yahoo.com.br
IIGraduando do 6º período do curso de Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – EEAP/ UNIRIO(bolsista PET – UNIRIO)
IIIDoutora, Professora Titular do Departamento de Enfermagem Fundamental - EEAP/ UNIRIO

 

 


RESUMO

Trata-se de uma pesquisa "quase"-experimental vivida ao construir um boneco para apresentação e discussão, por acadêmicos do 6º período de graduação em enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro, quando do desenvolvimento da disciplina "Paradigmas do Saber em Enfermagem II". Os objetivos são: Explorar as emoções sentidas na confecção do boneco a partir dos sentidos paladar e tato; Investigar se a construção de um boneco como corpo do cuidado leva os acadêmicos a refletirem sobre a melhor forma de cuidar do corpo humano. Apresenta abordagem qualitativa e a estratégia para coletar informações foi a confecção de um instrumento para entrevista direcionada a dez acadêmicos que participaram da construção deste boneco, permitindo a construção de duas categorias, nomeadas: A CONTENÇÃO das EMOÇÕES do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO; A EXPRESSÃO das Emoções do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO. Concluímos assim que os acadêmicos, ao personificarem o boneco, passaram a oferecer-lhe cuidados especiais, dando-lhe "vida" e cuidando dele como se um "ser" fosse. Foi a imaginação que construiu a tentativa do boneco-gente onde existe uma racionalidade que é mediadora do sensível e do inteligível.

Palavras-chave: enfermagem, cuidado, comunicação


ABSTRACT

This is an "almost" experimental research experienced when students from the 6th period of the undergraduate course in nursing at the Alfredo Pinto College of Nursing/University of Rio de Janeiro constructed a doll for presentation and discussion, on the occasion of the subject matter " Paradigms of Nursing knowledge II". The goals were: to explore emotions felt in making the doll on the basis of the taste and touch senses; to investigate if the construction of a doll as a body for care makes the academics reflect about the best way to care for the human body. This research presents a qualitative approach and the strategy used for collecting information was the confection of an instrument for interviewing ten academics who participated in the construction of this toy, which allowed for the construction of two categories, called: CONTAINING the EMOTIONS of the student’s body in creating a DOLL as a BODY for CARE; the EXPRESSION of the emotions of the student’s BODY in creating a DOLL as a BODY for CARE. We conclude that, in personifying the doll, the academics started to offer special care, providing it with a rationality that mediates the sensitive and the intelligible.

Key words: nursing, care, communication


 

 

I. INTRODUÇÃO

O interesse por este estudo surgiu no decorrer da disciplina Paradigmas do Saber em Enfermagem II, que é oferecida durante o 5º período do curso de graduação em Enfermagem na Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro (UNIRIO). Nesta disciplina nos foi proposta a confecção de um boneco que representasse o corpo do cuidado, enfocando, dentre os cinco sentidos humanos, paladar e o tato.

O processo de criação deste boneco, nos despertou para a importância e complexidade dos sentidos, fato que não identificamos em nossas atividades diárias por nos apropriarmos dessas sensações de forma tão natural. Essa nova percepção a respeito do tato e paladar, torna evidente a necessidade de reconhecer não só as diversas sensações relacionadas a estes, tais como sabor, prazer, culpa, dor, mas também suas inter-relações com a visão, audição e o olfato.

Guyton; Hall (1997, p.161) afirmam que: " A gustação é sobretudo uma função dos corpúsculos gustativos da boca, mas é experiência comum que o sentido do olfato contribui fortemente para a percepção do gosto. Além disso, a textura da comida, tal como é detectada pelos sentidos táteis da boca, e a presença de substâncias como a pimenta na comida, que estimula terminações de dor, condiciona muito a experiência gustativa."

A partir daí, selecionamos a questão do estudo: as emoções de criar um boneco como corpo do cuidado.

Diante da necessidade de representar o tato no boneco, optamos por fixar no seu corpo diferentes tipos de materiais tais como: plásticos porosos, tecidos finos, grossos e ásperos. Sendo assim, ressaltamos que o toque da enfermeira pode ser feito de diversas formas e provocar sensações diferentes, porém, sempre visando a melhora da saúde de seu cliente, podendo oferecer atenção, tranqüilidade, alívio, amparo e carinho.

Caldas; Figueiredo (1998, p.90), nos dizem que: "O cuidado básico da enfermagem é aquele que concentra tudo que a enfermagem faz, que é primeira e fundamental da enfermeira. Esse cuidado exige presença física e espiritual, implicando o uso de todos os sentidos, objetivos e subjetivos. É tocar com a mão, tocar com o corpo, tocar com o cheiro, tocar com o olhar, tocar com a voz, tocar com a sensibilidade, tocar com amor, tocar com estética, tocar com ética."

Para configurar o paladar em nosso boneco utilizamos três faces que caracterizam expressões distintas. As duas primeiras são referentes aos sabores que os diferentes alimentos nos proporcionam, onde uma traz a satisfação e a outra o desagrado, e a última traz a importância da higiene bucal para apreciarmos esses sabores.

Derivando de Ackerman (1996, p.64 ), o gosto que sentimos e a composição de nossa saliva são individuais, assim, não existem duas pessoas que sintam o mesmo gosto. Nos diz ainda que o alimento deve ser gostoso e recompensar-nos, estimulando-nos a comer para viver. Vale destacar que a opção pelo paladar e o tato, foi devido a distribuição da turma em quatro grupos para construir quatro bonecos sob diferentes olhares acerca dos cinco sentidos. Nós ficamos com estes dois, até porque o objetivo da disciplina é nos ensinar a olhar o todo a partir do paradigma cartesiano.

Desta forma, estabelecemos como objeto do estudo a construção de um boneco para apresentação e discussão sobre o corpo do cuidado.

I. 1. OS OBJETIVOS

I. 2. RELEVÂNCIA DO ESTUDO

Através da construção deste boneco verificamos a amplitude de aspectos que o cuidar do corpo envolve. Manipular o corpo do cliente ou apenas abordá-lo verbalmente requer a compreensão não só de seu estado físico ou das emoções sentidas por ele , mas também dos significados das ações da enfermagem para este cliente. A partir destas premissas, passamos a reconhecer a melhor forma de oferecer conforto a este corpo.

Os sentidos paladar e tato permitem que o corpo perceba o mundo ao seu redor, decifrando seus significados. Quando tocamos através do paladar e identificamos sabores e sensações, ou através da pele que recobre todo o corpo, possuindo grande importância para o tato, estamos conhecendo nossos limites, sentindo a vida.

A partir dos sentidos a enfermagem pode ler as expressões dos clientes, como respostas aos seus cuidados fato essencial para a comunicação enfermeiro-cliente, auxiliando na aplicação do cuidado a este corpo. Bittes Jr e Matheus (1996, p.64) salientam que: "A comunicação não-verbal ganha importância no processo comunicativo, pois ela pode suplementar uma informação verbal(completando ou rejeitando), contradizer, enfatizar, substituir, oferecer indícios sobre emoções ou mesmo controlar ou regular um relacionamento."

 

II. METODOLOGIA

A abordagem metodológica utilizada para este estudo foi a qualitativa, devido a impossibilidade de mensurar emoções vivenciadas por um determinado grupo. Haja vista, que estamos estudando as transformações da emoção como prática e como ciência, para isso, torna-se inviável quantificar tais fenômenos.

De acordo com Minayo (1994, p.21): "A pesquisa qualitativa se preocupa, nas ciências sociais com nível de realidade que não pode ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das reações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser realizados à operacionalização das variáveis"

Considerando que a característica do estudo é de uma pesquisa quase-experimental, buscamos em Polit e Hungler (1995, p.115) apoio sobre a característica desta modalidade: "A pesquisa que utiliza o projeto quase-experimental parece-se muito com um experimento. Tal como nos experimentos, os quase-experimentos envolvem a manipulação de uma variável independente, isto é, a instituição de um tratamento".

Sendo assim, a metodologia utilizada privilegia a variável independente como aquela relativa as emoções sentidas, tendo como método a construção de um boneco como corpo do cuidado.

II. 1. MOMENTOS DA PESQUISA

ÉTICO: Os dez acadêmicos que participaram da construção do boneco como corpo do cuidado, direcionado para os sentidos paladar e tato, autorizaram a utilização de suas falas, sendo por nós garantido o anonimato.

CONSTRUÇÃO DO INSTRUMENTO PARA COLETA DE INFORMAÇÕES: Elaboramos um instrumento contendo perguntas abertas que utilizamos como roteiro para gravar as falas dos acadêmicos (anexo I). Gravamos as entrevistas em fitas cassete que posteriormente foram transcritas para a organização das categorias emergentes das falas.

LOCAL: Essa pesquisa surgiu a partir da proposta de construir um boneco como corpo do cuidado, apresentada pelas docentes da disciplina "Paradigmas do Saber em Enfermagem II", ministrada pelo Departamento de Enfermagem Fundamental, sendo realizada na Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro.

OS SUJEITOS: Participaram desta pesquisa dez acadêmicos de enfermagem com faixa etária que varia de 20 a 25 anos, que haviam cursado o 5º período da graduação de enfermagem na Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro, onde na disciplina de "Paradigmas do Saber em Enfermagem II" construíram um boneco como corpo do cuidado, voltado para os sentidos paladar e tato.

TRABALHANDO AS INFORMAÇÕES: Após leitura das falas dos estudantes participantes do estudo, destacamos expressões que se aproximavam e deste trabalho de organização das informações surgiram 2 (duas) categorias de análise que chamamos de:

1)A CONTENÇÃO das EMOÇÕES do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO

2) A EXPRESSÃO das Emoções do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO

 

III. OS RESULTADOS

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS – as categorias

A primeira categoria: A CONTENÇÃO das EMOÇÕES do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO.

Esta categoria concentra informações sobre as emoções sentidas, guardadas ou não-ditas de dois participantes do estudo, assim registradas:

Entrevista 1: "... não senti nada..."(2) , "... ééé..."(3) "... eu não sabia o que ia encontrar..."(3), "... não sabia nem como... fazer com que o boneco expressasse o paladar e o tato..." , "... não consegui... muito obstáculo, não sei nem como falar direito..."

Entrevista 7: "... eu não vi nada demais que pudesse fazer eu pensar em algum tipo de cuidado ..." , "... não vem nada à mente... que eu me lembre de...de boneco, essas coisas..."

São falas que falam do sentir, mesmo que aparentemente o sentir não seja "nada" e este modo pode ser também um silêncio sobre a experiência que viveram porque ela não fazia parte do comum, do que estão acostumados. A uma prática de ensino que estimula o raciocínio (racional) e esquece das ressonâncias (subjetividades) que estão na vida e no viver.

Isto tem feito com que os estudantes se distanciem da atividade de sonhar, criar porque isto não é ciência, não lhes dá estatus e por isso negam, mesmo quando foram capazes de criar um boneco e se sensibilizarem com sua criação, se emocionar ao ponto de cuidar do boneco como se fosse gente.

Apesar de construírem um boneco onde foram explorados os sentidos humanos, de perceberem a essencialidade deste em suas vidas, não conseguiram apropriar-se de sua sensibilidade o que impulsionou-os a restringir , no imaginário, seus sentimentos.

Mas a emoção é parte do sensível e está em todos os nossos sentidos, quando me emociono ao ver algo que me agrada ou o que me constrange e me faz sofrer; me emociono quando ouço uma música, a voz de alguém querida; me emociono quando sinto o cheiro de alguém, de algum perfume que me lembra momentos; me emociono quando alguém me toca. No entanto, não estamos acostumados a assumir isto. Ninguém tem associado ao sensível o conhecimento sensitivo e que segundo Johas (1970), este só pode ser útil à inteligência para que criem conceitos intelectivos e a essência do ser sensível é o objeto formal próprio da inteligência humana.

A própria linguagem utilizada pelos alunos, dão som ao que aparentemente nos parece silêncio sobre a experiência vivida por eles. E o corpo que silencia por que não se deixa invadir pela expressão que criar provoca em nossos corpos contidos e calados pela disciplina, pelo poder do racional sobre o emocional que nos é incutido na universidade. Quanto a isso Le Breton (1997, p.7) diz que: " se a linguagem e silêncio se misturam na expressão da palavra, podemos dizer também que todo enunciado nasce do silêncio interior do indivíduo em permanente diálogo consigo mesmo". Para ele o silêncio questiona os limite de qualquer palavra e por que não o compreendemos acabamos nos esbarrando com ele.

Mesmo assim, podemos ousar dizer que as informações desta categoria não são vazias, por que nos permite ouvir suas ressonâncias nas reticências, nos: "... eu não sabia o que ia encontrar ...", "...não consegui...", "muito obstáculo..., nem sei como falar direito...", "eu não vi nada demais...", nelas circulam sentidos, emoções, elos de "algo" que eles não conseguem falar. Nelas existem encadeamentos de dificuldades que eles não conseguem ultrapassar quando tentam falar sobre a experiência.

Não dizer nada pode ser uma escolha, uma opção, as vezes inconsciente, uma defesa, não assumir algo que lhe fez bem por que pode enfraquecer-se e assim parece um corpo sem sentido ,"aparente", nesta experiência de criar o corpo do cuidado – o boneco a partir do sentido paladar e do tato. Enfim, nos parece que os sujeitos (2) desta categoria apesar da ação de criar o boneco, a experiência lhes foi mais crucial que prazerosa, mesmo sabendo que o organismo tem uma estrutura neural – sensível – motora, mas neste momento eles se apresentam mais limitados do que livres pela possibilidade de criar. São corpos do devir - das possibilidades e como diz Bezerra Jr (2001): "é o corpo da emergência onde os alunos dependem de aquisição, por parte dos organismos humanos, de uma habilidade especial: a de configurar a sua experiência no mundo por meio de significações".

Assim é possível assumir, agora, que são corpos ainda "sem sentido", mas que podem estar em processo de reconstrução ou de transformação de uma experiência concreta para uma experiência subjetiva.

A segunda categoria: A EXPRESSÃO das Emoções do CORPO do estudante ao criar um BONECO como CORPO do CUIDADO

As informações desta categoria contém as informações de quatro estudantes e assim foram registradas:

ENTREVISTA 2: "... construir um boneco eee..."(3) , "... disciplina diferente, inovadora... foi um lazer... brincar, desenvolver junto com os colegas" , "... usar a criatividade, sair da rotina, da grade das disciplinas, momento de descontração...", "... jogo de criatividade..."

ENTREVISTA 3: "... senti impacto porque era completamente diferente de tudo que já tinha visto na escola...", "... uma viagem construir um boneco(2)...usar a criatividade...", "...fizemos o possível ééé..."(9), "...o tato foi testado nos vários tecidos diferentes... tocar a boneca, o tecido podia ter bolhas no corpo, estar ressecada ou estar macia...quando a gente toca alguém a gente observa e a gente relata..."

ENTREVISTA 6: "...achei muito interessante...foi uma dinâmica diferente..." , "... a gente nunca teve a possibilidade de fazer... nunca pensou nisso de direcionar o nosso ensino em outros coisas que o próprio paciente pode mostrar para a gente tanto no tato e no paladar..." , "...a construção do boneco me deu outra, outra visão de como a gente pode ver esse paciente..."

ENTREVISTA 9: "... a gente se divertia muito... descobri coisas novas... as coisas iam se transformando bem perto do que a gente imaginava..." , "....ficamos muito satisfeitos com o resultado..." , "... foi divertido construir...chegava super a vontade, descontraído...uma terapia..."

A linguagem utilizada por eles é a de um corpo descontraído, de um corpo sensível, de corpos que fizeram da experiência vivida uma brincadeira, "...sair da rotina...", "...descontrair...", "....inovação...", "...diversão...", "... de satisfação...". Nos parece que este é o corpo que pensa que criar pode ser o caminho para aprender a cuidar a partir de experiências mais sensíveis.

A identificação, o envolvimento dos acadêmicos, no decorrer da atividade de criação do boneco, ocorreu tão intensamente que possibilitou a descoberta de novos métodos de aprendizagem, a compreensão de que através das expressões seus clientes emitem mensagens, a percepção de que os sentidos direcionam o indivíduo a comportamentos diferentes.

O que identificamos é que a experiência vivida demonstra que os alunos reconhecem a importância desta abordagem pedagógica e que ela deu a eles um outro sentido de aprender, seriamente sobre o cuidado, através da brincadeira. Também é possível identificar nas falas que eles tiveram um "impacto afetivo" como afirma Platino (2001), e , continuo dizendo que este impacto produz mudanças de atitude que pode ser pensada como afirmação de hegemonia de EROS (vida ) sobre a pulsão de morte, encarnada na anorexia desvitalizante". Diríamos a anorexia de estratégias no ensino que permanece rijo, sem graça, sem prazer. Os alunos reafirmam que a disciplina Paradigma II, é um paradigma emergente, pois, estamos incluindo (docentes) e nós (discentes) outros saberes e outras práticas para pensar o cuidado de enfermagem. Criar não é parte do conteúdo teórico-prático da enfermagem. A criação que se fala nas salas de aula trata de habilidades e destrezas ao preparar os materiais do cuidado.

Ao trabalhar a criação do boneco os alunos disseram: "... juntos", "... o impacto", "...o uso da criatividade", "... tiveram possibilidades nunca pensadas", "...ser um agente da imaginação". O que indica que ao viverem a experiência desenvolveram um espírito novo como diz Bachelar (1996) é pré-entendida de diversas formas de pensar, conhecer que depende de experiência sensorial dos estudantes "os falantes", que também dão sentido as suas experiências ao criar o boneco que são carregados de expressões de emoção, entendido por Costa (2001, p.206) que este sentido emoção está "causalmente conectado" a processos confiáveis de discriminação pré-verbal de sentimentos ou "sensações cruas", mas tudo, também, envolve uma questão de linguagem que merece muita teorização, que este texto não suporta enquanto número de páginas exigidas para que o trabalho seja aceito para apresentação em eventos científicos.

Brincar, construindo o corpo do cuidado é fazer com que os alunos sonhem com um cliente que não conhecem, não sabem onde ele está e se o encontrarão do modo como o moldaram, criaram, representaram. Para Bachelar (1994) sonhar e ver concordam um pouco: quem sonha muito livremente perde o olhar, quem desenha sucessivamente bem o que vê perde os sonhos da profundidade. Ao contemplar o boneco como sua obra de criação e ao fazê-lo eles brincavam, saíam do tédio cotidiano e do cansaço do estágio, eles "devem" ter entrado em devaneios, pois os devaneios características dos jovens. Como pergunta Bachelar (1994, p.160) " o espaço do sonho é o espaço de repouso?". Mas repensa e diz que "o sonho é fragmentos de espaço onírico, feito de marés que não condizem a lugares e tempos."

Sonharam os estudantes? Perguntamos. Talvez sim, talvez não sonhar pode estar ligado ao sono e nesta brincadeira eles se mantiveram acordados, no claro, durante o dia ou permaneceram numa zona intermediária entre o dia e a noite, mesmo que simbolicamente?

O que sentimos é que as falas/mensagens dos alunos indicam desdobramentos de seus pensamentos sobre suas experiências de criar e automaticamente pode ser o desdobramento de seu próprio ser "a nostalgia de ser dois" Bachelar (1994, p.191)

 

IV. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pudemos identificar o quanto pode ser difícil expressar as emoções sentidas, negando-as. Observamos ainda, a importância da expressão dessas emoções e como a criatividade e o brincar enriqueceram o aprendizado.

Deste modo, consideramos que a construção do boneco como corpo do cuidado, além de salientar a necessidade de conhecer os sentidos paladar e tato e de exercitar, desenvolver a criatividade, despertou inúmeras emoções que alguns acadêmicos conseguiram expressar, porém, outros não, sendo que reconhecê-las torna-se essencial na prática assistencial do enfermeiro.

Do ponto de vista da aprendizagem a experiência produziu nos alunos uma forma de construir conhecimento a partir de atividades de expressão do sensível que existia dentro deles e entendido como "morador", "diferente". Isto significa que o estímulo a criação e a imaginação é uma pedagogia sensível de ensinar a jovens a cuidar dos outro e assim fomos obrigados a "mergulhar nas profundezas abissais da arte" Bachelar (1996).

Foi a imaginação que construiu a tentativa do boneco-gente onde existe uma racionalidade que é mediadora do sensível e do inteligível.

O que identificamos como indicadores de que a experiência mexeu com seus corpos é de que eles se descobriram emoção - fonte oculta em seus "eus" e puderam verificar que nada é separado. A experiência deve ter feito seus corpos se efervescerem de curiosidades, de possibilidades ou de indiferenças o que importa é que essa efervescência é entendida por Bachelar (1996) como "alegria indicadora de ludicidade, de um momento privilegiado de recomeço por meio do jogo criador".

 

V. Referências bibliográficas

ACKERMAN, D. Uma História Natural dos Sentidos. 2ª ed.- Rio de Janeiro: Editora Bertrand do Brasil,1996. 360p

BACHELAR, G. O direito de sonhar. 4ª edição, Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil,1994. 202p.

BACHELAR, G. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Contraponto,1996. 313p.

BEZERRA JR, B. (Org.) Corpo, afeto, linguagem: a questão do sentido hoje. Rio de Janeiro: Editora Rios Ambiciosos/ Marca d’agua,2001. 377p.

BITTES JR, A.; MATHEUS, M.C.C. Comunicação. In: CIANCIARRULLO, T.I. (Org.). Instrumento Básico para o Cuidar: um desafio para a qualidade de assistência. São Paulo: Editora Atheneu,1996. p. 61-73.

CALDAS, L.M.R.; FIGUEIREDO, N.M.A. O cuidado que embala o berço: cinco olhares da enfermeira para tocar a criança. Caderno de Pesquisa: Cuidado é Fundamental. Núcleo de Pesquisa e Experimentação em Enfermagem Fundamental da EEAP-UNIRIO, Rio de Janeiro, ano II, n. 1, p. 70-104, jan/fev/mar. 1998.

COSTA, J.F.A questão do sentido em psicanálise. In: BEZERRA JR, B. (Org.). Corpo, afeto, linguagem: a questão do sentido hoje. Rio de Janeiro: Editora. Rios Ambiciosos/Marca d’agua,2001. p. 199-218.

GYUTON, A.C; HALL,J.E. Tratado de Fisiologia Médica. Tradução de Charles Alfred Esbérard. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1997. p. 3-178.

JOHAS, H. Filosofia dos sentidos. Rio de Janeiro: Editora Vozes,1970. 110p.

LE BRETON, D. Do Silêncio. Lisboa: Editora Piaget,1997. 423p.

MINAYO, M.C.S. (Org.). Pesquisa Social: Teoria, Método e Criatividade. Petrópolis: Editora Vozes, 1994. 80p.

PLATINO, C. A. Sentido e Complexidade. In: BEZERRA JR, B. (Org) Corpo, afeto, linguagem: a questão do sentido hoje. Rio Janeiro: Editora Rios Ambiciosos/Marca d’agua, 2001. p. 43-90.

POLIT, D.; HUNGLER, F. Fundamentos da Pesquisa em Enfermagem. Tradução de Regina Machado Garcez. Porto Alegre: Editora Artes Médicas, 1995. 391p.

 

 

ANEXO

ANEXO 1

INSTRUMENTO PARA ENTREVISTA

1. O que você sentiu ao Construir um Boneco como Corpo do Cuidado, direcionado para os sentidos Paladar e Tato?

2. Essa experiência interferiu no seu modo de cuidar? Como?