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An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. May. 2002

 

Consulta de enfermagem: um processo de comunicação enfermeiro/cliente na construção da cidadania

 

Nursing consultation: a nurse/client communication process in the construction of citizenship

 

 

Sandra Maria de Mello Cardoso

Enfermeira, Especialista em Saúde Coletiva. Professora do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI – Santo Ângelo. Assessora da Secretaria Municipal de Saúde do Município de Entre-Ijuís–RS. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Saúde e Educação em Enfermagem (GEPESE/URI)

 

 


RESUMO

O presente estudo consiste na descrição de experiências vivenciadas com gestantes e puérperas no município de São Miguel das Missões no Rio Grande do Sul, onde a comunicação enfermeiro/cliente efetivou-se através da consulta de enfermagem, resultando em um processo educativo, com reflexos na melhoria da assistência e na qualidade de vida das clientes ali atendidas.

Palavras-chave: consulta de enfermagem, comunicação, cliente


ABSTRACT

The present study it consists of the description of experiences with women during pregnancy and the puerperium in the city of São Miguel das Missões in Rio Grande do Sul, where the nurse/client communication was accomplished through the nursing consultation, resulting in an educational process, which reflected in the improvement of care and in the quality of life of the clients that were attended.

Key words: nursing consultation, communication, client


 

 

1 - INTRODUÇÃO

Como enfermeira da Rede Básica de Saúde do município de São Miguel das Missões no Rio Grande do Sul, o qual apresenta uma população de cerca de 7 mil habitantes, conforme dados do (IBGE, 1998), constatava as deficiências em relação ao atendimento, tanto em saúde coletiva, quanto na área hospitalar naquela realidade.

Dentre as deficiências que podem ser apontadas, cito a inexistência de um hospital para internação de pacientes; a existência de apenas um pequeno posto de saúde, o qual oferecia, somente atendimento médico chegando no máximo a 16 consultas diárias de segunda à sextas-feiras. Além disso, o profissional médico não residia no município o que dificultava em caso de atendimentos de emergência médica. Não havia, também, o profissional enfermeiro naquele posto de saúde, sendo que a assistência de enfermagem era prestada pelos auxiliares de enfermagem.

A partir da aprovação em concurso público, passei a atuar como enfermeira da Rede Básica de Saúde do referido município, tendo como desafio a mudança daquela realidade. Busquei realizar um diagnóstico da situação de saúde, constatando dentre outras deficiências, que as gestantes e puérperas não recebiam nenhuma informação ou orientação no ciclo gravídico-puerperal, implicando em desconhecimento acerca dos cuidados com sigo próprias e cuidados com o bebê.

Através dessa análise empírica, e da constatação das necessidades de intervenção na realidade, optei por realizar consultas de enfermagem com gestantes e puérperas que buscavam atendimento no posto de saúde do município, por reconhecer a importância e a necessidade da educação para a saúde.

Como enfermeira, refletindo sobre os problemas identificados, a partir do contato com as gestantes, puérperas usuárias do serviço de saúde, notei que estas podem ser contemplados e referenciados às práticas educativas, conforme preconizam as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS).

Acredito, também que a própria gestante e puérpera pode cuidar melhor de si mesma e do bebê, desde que tenha o conhecimento, a compreensão e a motivação para refletir sobre sua saúde, adotando práticas que contribuam para a melhoria das condições do seu processo de saúde.

Diante da constatação das necessidade de atendimento em saúde das gestantes e puérpera buscamos, então, realizar consultas de enfermagem às clientes que buscavam atendimento no posto de saúde do município de São Miguel das Missões.

 

2 - A CONSULTA DE ENFERMAGEM COMO UMA PRÁTICA EDUCATIVA

A consulta de enfermagem é uma atividade que proporciona ao enfermeiro, condições para atuar de forma direta e independente com o cliente caracterizando, dessa forma, sua autonomia profissional. Essa atividade, por ser privativa do(a) enfermeiro(a), fornece subsídios para a determinação do diagnóstico de enfermagem e elaboração do plano assistencial, servindo, como meio para documentar sua prática.

Para Almeida e Rocha (1997, p.15) o enfermeiro é responsável pelo conjunto das ações assistenciais que competem à enfermagem e o enfermeiro em saúde coletiva é o profissional que visa a saúde coletiva, subordinando-se ás necessidades sociais dos indivíduos. "A concepção da doença não é o fenômeno individual centrado no corpo doente, mas um fenômeno coletivo, tendo a epidemiologia como um dos saberes fundamentais".

Na consulta de enfermagem às gestantes e puérperas, pode ocorrer a participação ativa da cliente através da interação com o profissional enfermeiro (a), em que ambos trocam saberes e informações visando a promoção do auto cuidado. Nessa perspectiva, através da consulta de enfermagem como um momento para o diálogo, enfermeira/cliente podem definir metas e objetivos a serem atingidos, dentre eles, a melhoria no atendimento em saúde.

 

3 – CAMINHO METODOLÓGICO

O presente estudo iniciou-se com a formação do grupo de gestante que reunia-se quinzenalmente, e consulta de enfermagem, a qual era realizada semanalmente. Os encontros do grupo duravam cerca de uma hora e eram realizados em uma sala nas dependências do posto de saúde. Já as consultas de enfermagem, eram realizadas semanalmente na sala da enfermagem do referido posto, não havendo tempo pré determinado para sua conclusão. Tanto os encontros em grupo, quanto as consultas de enfermagem, tinham como propósito a troca de experiências com as clientes, incentivando o aprendizado para o autocuidado, pois, este segundo OREM "é a pratica das ações que os indivíduos iniciam e executam por si mesmos para manter a vida, a saúde e o bem-estar." Com isso, espera-se que a própria gestante desempenhe o cuidado para si mesma, em que, após um estágio de maturidade, seja capaz de realizar ações que visam a promoção de sua saúde e do bebê.

Os dados significativos acerca das verbaliza e observações durante a consulta de enfermagem eram registradas em uma ficha individual; durante os encontros com o grupo, em um diário de campo. Estes dados após agrupados e analisados, retornavam ao grupo para serem discutidos e validados servindo como subsídios para a elaboração do plano de ações. Com isso criava-se, um vínculo forte com as gestante e puérperas, um elo de comunicação com o grupo, com o profissional enfermeiro e com o posto de saúde.

O primeiro encontro, constituiu-se em um momento de interação e de troca de experiências, onde cada uma, exteriorizou suas dúvidas e expectativas em relação aos temas a serem abordados. A partir das experiências relatadas, busquei trazer informações acerca de temas que constituíam-se em dúvidas exteriorizadas, tais como o funcionamento dos órgãos reprodutores masculino e feminino, aleitamento materno, planejamento familiar, preparo para o parto e cuidados com o recém-nascido, dentre outros.

Ao longo dos encontros, valorizávamos o diálogo, a troca de saberes, a comunicação, a reflexão crítica, constituindo-se desta forma, em uma prática educativa, buscando uma nova ação, uma postura reflexivo-crítica, tanto individual quanto coletiva, em que as gestantes se perceberam como sujeitos com possibilidade de construção de sua cidadania.

Todos esses esforços visaram assegurar medidas do acesso, da cobertura e da qualidade do acompanhamento no pré-natal, da assistência ao parto, puerpério, neonatal e principalmente humanizar a assistência à gestante e ao recém-nascido com atitude ética e solidária, na perspectiva do direito à cidadania.

No puerpério, as mulheres retornavam com os recém-nascidos para a unidade de saúde. Nesta fase, através da consulta de enfermagem à puérpera e ao recém-nascido, buscava-se detectar as deficiências em relação aos cuidados, sendo a chave para a estimulação da consciência crítica, da participação e co-responsabilidade para o exercício da cidadania.

 

4 - APRESENTANDO OS RESULTADOS

A implementação da consulta de enfermagem as gestantes e puérperas teve como um dos objetivos, a redução da mortalidade infantil , o baixo peso ao nascer, o aumento da cobertura vacinal, o incentivo ao aleitamento materno, o aumento da cobertura e qualidade do pré-natal e a reorganização do serviço de saúde, garantindo acesso, acolhimento, eqüidade e resolutividade.

A partir da implementação da consulta de enfermagem e das reuniões com o grupo de gestantes e puérperas, verificou-se alteração nos dados epidemiológicos do município, através da diminuição do coeficiente de mortalidade infantil de 24,19% para zero; diminuição do coeficiente de mortalidade neonatal que era de 16,16% passando para zero. Como significativo ainda, convém salientar o aumento dos indicadores de imunizações, que em alguns casos chegando a atingir mais de 100% da meta prevista.

 

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados objetivos demonstram a importância da consulta de enfermagem como um processo educativo em que a participação da enfermeira interagindo com as clientes, pode mudar a realidade através da educação em saúde. Demonstram, também como medidas consideradas simples podem mudar a realidade de saúde de uma comunidade. O conhecimento a informação recebidas durante os encontros e na consulta de enfermagem, certamente oportunizou a busca da cidadania.

Para finalizar trazemos para reflexão Freire (1987) que diz que a não socialização do saber é uma forma de dominação, fazendo com que o usuário seja mero dependente do saber e os detentores do saber, donos da verdade, impedindo assim uma comunicação ampla e franca.

 

Referências bibliográficas

ALMEIDA, M. C. P. de & ROCHA, S. M. M. (org.) O trabalho de enfermagem. São Paulo: Cortez, 1997.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

OREM, D. Nursing: concepts of pratice. 3 ed. New York: McGra-Hill, 1985.

VANZIN, N. S.; NERY, M. E. Consulta de enfermagem: uma necessidade social. Porto Alegre: RM&G, 1996.

WALL, M. L.; CARRARO, T. E. A metodologia da assistência: um elo entre a enfermeira a mulher-mãe. Revista Texto e Contexto. Florianópolis, v. 9, n. 2, pt. 2, p. 778-791, mai./ago., 2000.

 

 

Sandra Maria de Mello Cardoso

Fone: (55) 99.81.42.86