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An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. May. 2002

 

Repensando educação em saúde na ótica da enfermagem

 

Rethinking health education from the nursing perspective

 

 

Fernanda Garcia BezerraI; Laura JohansonI; Adriana Lemos PereiraII

IAcadêmica de Enfermagem do 6º período da graduação da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto/UNIRIO
IIMestre em Tecnologia Educacional para as Ciências de Saúde, professora do Departamento de Enfermagem em Saúde Pública da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto/UNIRIO, orientadora. R. Lopes da Cruz, 287 Amendoeira São Gonçalo/RJ CEP: 24746-040. fernandabezerra.garcia@bol.com.br

 

 


RESUMO

Este estudo trata da relevância da Educação em Saúde inserida na prática profissional da Enfermagem. Tem como objetivo identificar as opiniões dos usuários acerca das atividades educativas desenvolvidas em salas de espera numa Unidade Básica de Saúde. Trata-se de um estudo exploratório com abordagem qualitativa. Os sujeitos da pesquisa foram quarenta usuários de um Centro Municipal de Saúde da cidade do Rio de Janeiro. Aos participantes das atividades desenvolvidas junto aos acadêmicos foram distribuídos questionários dos quais realizamos a análise, baseada nas respostas. Os usuários afirmam ser essas atividades, de grande importância por ser tratar de uma oportunidade de aprender, recebendo diversas informações. Diante das respostas, emergiram duas categorias: 1) Ser informado para informar; 2) Ser informado para cuidar. Percebemos assim a validação dessas atividades enquanto acadêmicos de enfermagem e a necessidade de uma real articulação entre processo de assistir com processos de educar.

Palavras-chave: enfermagem, saúde, educação


ABSTRACT

This research deals with the relevance of Health Education inserted in professional Nursing practice and aims to identify users' opinion about educational activities developed in waiting rooms at a Basic Health Unit. This is an exploratory study from a qualitative approach. Research subjects were forty users at a Municipal Health Center in Rio de Janeiro. Questionnaires were distributed among the participants in the activities developed together with the students, of which we analyzed the answers. Users affirm that these activities are very important since they offer a learning opportunity, receiving various kinds of information. Two categories emerged from the answers: 1) to be informed in order to inform; 2) to be informed in order to care. Thus, being nursing students, we noticed the validation of these activities and the need for a real articulation between care and education processes.

Key words: education, nursing, health


 

 

INTRODUÇÃO

Entendemos que a educação é um processo vital de troca, baseada pelas ações conscientes do educador e pela vontade livre do educando. Ela cria novos meios para atender ao desafio da capacidade humana em permanente mudança. Investir em educação é investir no próprio homem que é o "causador" e "para quem" é dirigido o aprendizado, assim educar é intervir no mundo.

Portanto é importante para o enfermeiro, na diversidade das situações em seu contexto profissional, ter bem clara a compreensão do que vem a ser o processo ensino-aprendizagem. Para tanto os seguintes aspectos devem ser levados em consideração:

Saúde é qualidade de vida, logo não deve ser analisada a partir de uma forma particularizada e sim de um olhar totalizante que englobe aspectos sócio-econômicos, histórico-culturais, físicos e psicológicos. Muitas vezes os profissionais de saúde em suas práticas diárias perdem de vista essa fundamentação, ao se limitarem basicamente à condição individual, buscando encontrar um distúrbio/doença e a sua "cura" através da intervenção/medicalização, não entendendo os indivíduos inseridos num contexto maior. Com isso, perde-se a possibilidade de entender e promover saúde em suas conexões com as esferas mais gerais da realidade de nossa sociedade e as práticas educativas acabam não saindo do campo das idéias, ou se saem, não são tão abrangentes como deveriam.

Para nos aprofundarmos no entendimento do processo saúde-doença e sua relação com a Enfermagem, consideramos que doença não pode ser vista apenas como um distúrbio orgânico, mas também como um produto direto ou indireto das condições gerais em que se desenvolve a sociedade. Para Egry (1996, p.60,61) esse processo:

"... não se expressa numa progressão linear, mecânica, que vai de um pólo (saúde) a outro (doença), mas sim através de um constante vaivém em espiral o que evidencia o caráter dinâmico de permanente alteração dos fatos/fenômenos vinculados à saúde-doença. O processo saúde-doença não é um processo individual (exclusivamente, de origem e fim), tampouco se refere exclusivamente à dimensão biológica do homem. É um pouco particular de uma sociedade que expressa no nível individual as condições coletivas de vida..."

Mas como entender essa nova visão da saúde se não compreendermos o papel da Cidadania na busca de uma melhor qualidade de vida? A compreensão de saúde como um direito deve ir penetrando na consciência dos cidadãos brasileiros, à medida que se vejam como atores sociais que desempenham papéis relevantes na conquista da saúde como um serviço e um direito social. É preciso estarmos comprometidos e empenhados em facilitar a abertura de novos horizontes a fim de que os indivíduos se tornem cidadãos conscientes e capazes de decidirem sobre o seu próprio destino.

É dentro dessas concepções de Educação, Saúde e Cidadania que acreditamos que cabe ao profissional de saúde, e aí incluído o enfermeiro, o papel de "defensores-facilitadores" (VALLA; STOTZ, 1993, p.21) para os grupos sociais com os quais interagem, que necessitam e reivindicam mudanças sociais.

Educação em Saúde pressupõe uma combinação de oportunidades que favoreçam a promoção e a manutenção da saúde. Sendo assim, não podemos entendê-la somente como a transmissão de conteúdos, comportamentos e hábitos de higiene do corpo e do ambiente, mas também como a adoção de práticas educativas que busquem "... uma melhor compreensão sobre as relações entre as condições de vida e de trabalho e a saúde e a doença, e do ponto de vista da ação social, apontar os meios para pressionar os governos a aplicar os recursos públicos mais de acordo com as necessidades da população trabalhadora." Valla e Stotz (1994, p.13). E onde a enfermagem se insere neste processo?

Entendemos assim como Smeltzer e Bare (1998, p.35) que:

"Um dos maiores desafios que a enfermagem tem hoje é atender às necessidades de educação para saúde da população(...). Assim, a educação para saúde é considerada uma função independente na prática da enfermagem e a principal responsabilidade da profissão de enfermagem. Educação para saúde é componente essencial do cuidado de enfermagem,..."

Educar para a saúde tornou-se uma das atribuições que o enfermeiro desempenha em toda sua área de atuação e, portanto perpassa todos os níveis de assistência à saúde, a saber, promoção, proteção e recuperação.

Dessa forma, torna-se pertinente considerar que o enfermeiro em sua prática profissional competente seja capaz de desenvolver ações educativas adequadas às reais necessidades dos indivíduos e/ou grupos sociais, que permitam a transformação consciente da realidade. Para que ações educativas sejam factuais e tragam verdadeiras contribuições para a sociedade, um compromisso de ambos os atores sociais – profissionais de saúde e população – se faz imprescindível. Como se trata de uma construção conjunta, dinâmica, pressupõe disponibilidade dos mesmos para reflexão, onde o processo de comunicação não se concretize num sentido único, mas sim baseado numa troca mútua entre os sujeitos.

Uma das barreiras limitantes para que a comunicação se processe dessa forma é a visão equivocada dos profissionais de saúde ao se verem como "donos do saber" que transmitem os "seus" conhecimentos as pessoas leigas e ignorantes. Minayo (1986, p.22,25) afirma que:

" ... passamos a idéia de que as pessoas não têm saúde porque não querem, porque não se esforçam, porque não tem vontade de ter saúde... as pessoas que trabalham com educação em saúde muitas vezes acham que uma grande parte da população tem problemas porque é ignorante..."

Essa forma de ver e trabalhar educação em saúde acaba "culpabilizando a vítima" (VALLA; STOTZ, 1993) não permitindo uma verdadeira transformação da realidade (mudanças de comportamentos individuais e coletivos). Convém ressaltar o que Valla e Stotz (1993, p.22) nos alerta: "Obviamente, os profissionais de saúde, quando se relacionam com pessoas "leigas" e "comuns" não são professores a escrever num livro de páginas em branco".

Cursando a disciplina de Atenção à Saúde Materno Infantil, contida no 4º período do currículo de graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, no 2º semestre/2000, fomos apresentadas durante o transcorrer do bloco teórico, a uma nova visão do processo de trabalho da enfermagem. É importante destacar que até então tínhamos uma pálida idéia da educação em saúde inserida na prática de enfermagem. Frente a nossa curta vivência com a clientela de um Centro Municipal de Saúde do Município do Rio de Janeiro, muitas reflexões foram surgindo, que nos conduziram a alguns questionamentos, dentre os quais destacamos:

  • O que vem a ser, realmente, esse processo de Educação em Saúde? 

  • Qual o impacto das nossas atividades educativas desenvolvidas com os usuários de uma Unidade Básica de Saúde? 

  • Qual a opinião dos usuários acerca dessas atividades educativas?

  • Frente a esses questionamentos identificamos que é importante buscar respostas fundamentadas em uma metodologia, que permita refletir a prática, desenvolvendo uma atitude crítica acerca da assistência que prestamos articulada às ações educativas que visam à promoção da saúde nas suas dimensões individual e coletiva. É nosso anseio que as respostas que buscamos revertam os conhecimentos apreendidos em uma prática mais fundamentada e contextualizada. Nesse sentido, temos como objetivo desse estudo: Identificar a opinião dos usuários acerca das atividades educativas desenvolvidas em Salas de Espera numa Unidade Básica de Saúde. O presente estudo torna-se relevante na medida em que possibilita um repensar sobre o que vem a ser realmente esse processo de educação em saúde, na tentativa de aplicá-lo de maneira factual, buscando a otimização do trabalho educativo do enfermeiro. É importante destacar que esse repensar não nos traz subsídios apenas para uma prática profissional competente no futuro, mas deve ser aplicado desde já no nosso presente, nesse processo de aprendizagem na Academia.

     

    METODOLOGIA

    Trata-se de um estudo exploratório, no qual a abordagem qualitativa constituiu a modalidade metodológica. Foram desenvolvidas atividades educativas, denominadas "Salas de Espera" juntamente com os usuários que aguardavam pela consulta numa Unidade Básica de Saúde, localizada na Cidade do Rio de Janeiro. As atividades educativas eram baseadas nos programas do Ministério da Saúde que foram abordados durante o bloco teórico. Os assuntos discutidos com a clientela foram:

    Os recursos didáticos utilizados foram cartazes e folder’s, além de mamas sintéticas e um álbum seriado de DST. Como instrumento para coleta de dados elaboramos um questionário (anexo 1), visando obter as opiniões dos sujeitos da pesquisa, sendo distribuído aos usuários que haviam participado das atividades educativas em Salas de Espera. Atendendo as questões éticas e legais vinculadas à pesquisa os sujeitos foram esclarecidos quanto ao seu anonimato e sua participação voluntária. Obtivemos 40 questionários, a partir dos quais realizamos a análise baseada nas respostas dos usuários. Na apresentação dos dados, as respostas dos usuários foram identificadas através de pseudônimos, atribuindo-lhes nomes de flores.

     

    RESULTADOS E ANÁLISE DOS DADOS

    Quanto à participação dos usuários em atividades educativas numa unidade básica de saúde, verificamos que a maioria (27) relata não haver tido contato com essas reuniões. Porém demonstraram ser gratificante essa experiência que compartilharam com os acadêmicos de enfermagem, afirmando serem de grande importância por se tratar de uma oportunidade de aprender e trocar diversas informações. A partir das respostas obtidas emergiram as seguintes categorias:

    Os usuários demonstraram apreciar essas atividades, pois relataram ter ficado mais informados, e, além disso, poderiam passar os conhecimentos apreendidos para outras pessoas, como os seus familiares:

    "... porque a gente, às vezes, é desinformado, sabe as coisas de um jeito totalmente diferente e depois disso a gente fica sabendo melhor." (Margarida)

    "... porque posso passar o que aprendi para outras pessoas." (Rosa)

    "... é sempre bom estar bem informada, realça novas informações ou simplesmente relembra." (Dália)

    "... porque nos orienta, esclarece dúvidas e permite a aprendizagem de coisas importantes com o esclarecimento dos assuntos, pois é sempre bom estar informado."(Cravo)

    "... porque há coisas que só o esclarecimento pode prevenir e até mesmo solucionar" (Bromélia)

    "... muito importante. Porque a gente aprende mais coisas e pode passar para outras pessoas" (Violeta)

    Diante destas respostas é possível observar a valorização da aquisição de conhecimentos pelos usuários, todavia, sabemos que não é simplesmente a informação que fará mudanças reais na vida desses indivíduos, mas dentro de um contexto maior ela dará subsídios para a busca de sua autonomia, enquanto cidadãos. Outro fato notável nas respostas é a possibilidade de apropriar-se da informação para transmiti-la à outros indivíduos, o que os torna multiplicadores do conhecimento apreendido.

    Os usuários afirmam que essas atividades possibilitam que as pessoas cuidem não só de si, mas de toda sua família, como observamos nessas opiniões:

    "... pois abre mais a mente, ficamos mais preocupadas em cuidar da melhor forma das nossas crianças e da gente." (Cravo)

    "... como mãe eu gosto muito de cuidar da saúde dos meus filhos." (Rosa)

    " ... porque todos vão ser mais zelosos com sua família." (Crisântemo)

    "... as pessoas terão mais informações para se cuidar." (Lírio)

    " ...posso ajudar a mim mesmo e outras pessoas" (Dália)

    "... ajuda a cuidar melhor de nossa saúde e da saúde da família" (Girassol)

    O cuidado se mostra como uma preocupação primordial na vida dos indivíduos, para tanto a inter-relação entre o saber popular e o saber científico devem estar presentes nas práticas educativas de modo a promover a saúde e estimular o auto-cuidado.

     

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Ao desenvolver as atividades educativas propostas pela disciplina percebemos que ainda havia um enfoque preventivo que não abrangia a totalidade das necessidades dos indivíduos, foi apenas uma fagulha nesse campo vasto da educação em saúde. Hoje sabemos que é importante buscar e contextualizar a realidade dos indivíduos com quem iremos atuar. Assim sugerimos que acadêmicos e profissionais de enfermagem façam uma reflexão prévia, e busquem a realidade e as necessidades sentidas dos usuários, visando uma maior validação das suas atividades educativas. E assim esse processo de Educação em Saúde terá uma maior articulação com a Enfermagem. Face a esta compreensão encontramos nas palavras de Vargas e Soares (1997, p.57,58) um grande reforço: "... Repensar o conteúdo significa confirmá-lo, atualizá-lo partindo da vivência dos próprios participantes, dentro de uma visão de educação que os perceba enquanto sujeitos no processo de aprendizagem...".

    Precisamos, de imediato, refazer nossos valores e além de competência técnica estarmos imbuídos de compromisso social, dessa forma poderemos efetivamente contribuir com a melhoria das condições de vida e de saúde dos diferentes grupos sociais. Devemos estar prontos para sonhar e enfrentar os desafios de maneira criativa e determinada. Mas, para isso, precisamos estar continuamente Repensando educação em saúde a fim de concretizá-la em nossas práticas.

     

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    EGRY, E.Y. Saúde coletiva: construindo um novo método em enfermagem. São Paulo: Ícone, 1996.

    FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

    MINAYO, M. C.de S. (org.). A saúde em estado de choque. 3.ed. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1986.

    SMELTZER, S. C.; BARE, B. G. Brunner & Sthurdart/Tratado de enfermagem médico- cirúrgica. 8.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998.

    VALLA, V. V.; STOTZ, E. N.(orgs.). Educação, saúde e cidadania. 2.ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1994.

    ______________________________.Participação popular, educação e saúde: teoria e prática. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.

    VARGAS, M. N.; SOARES, L. T. R. O trabalho educativo em saúde nas comunidades rurais: as experiências da enfermagem no Brasil e no Peru. Rio de Janeiro: Rev. de Enf. Esc. Anna Nery, v.1, n.2, p. 57-59, dezembro 1997.

     

     

    ANEXO 1