8, v.2Facing communication difficulties: the hospitalization experience of japanese immigrantsThe communicative expression of the meaning of work as used by undergraduate nursing students índice de autoresíndice de materiabúsqueda de trabajos
Home Pagelista alfabética de eventos  





An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. Mayo. 2002

 

A construção de um sistema de informação para a rede de centros de atenção psicossocial (CAPS) no município do rio de janeiro -um relato de experiência

 

The construction of an information system for the day-care unit network of rio de janeiro – an experience report

 

 

Rosâne MelloI; Sueli Soldati AbranchesII

IDoutoranda da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP, Programa de Enfermagem Psiquiátrica e Saúde Mental
IICoordenadora do Curso de Enfermagem de Barra Mansa/RJ do Centro Universitário de Barra Mansa-UBM. Doutoranda da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP, Programa de Enfermagem Fundamental

 

 


RESUMO

O presente estudo tem como objetivo relatar a experiência de construção de um sistema de informações adequado às especificidades das novas modalidades assistenciais em saúde mental, em especial os Centros de Atenção Psicossocial. O estudo é do tipo qualitativo e utiliza o relato de vida como instrumento de coleta de dados, relatando a construção deste sistema, que ocorreu em 1999 e está sendo utilizado até os dias de hoje. O resultado desta experiência foi à elaboração de um instrumento que abrange informações de ordem quantitativa e qualitativa, fornecendo dados clínicos e sociais de cada cliente, bem como a freqüência de utilização do serviço por clientes e familiares. A partir deste estudo podemos inferir que tal instrumento é de extrema importância, pois, através dele surge a possibilidade de otimização do fluxo de informações e da avaliação do serviço. Faz-se necessário destacar que esta construção foi feita por equipe transdisciplinar, o que possibilitou uma abrangência maior ao instrumento.

Palavras-chave: sistema de informação, saúde mental


ABSTRACT

The present study aims to report the experience of constructing an adequate information system for the specific characteristics of new mental health care modalities, especially for the Day-Care Units. This is a qualitative study that uses life history as an instrument for collecting data, reporting on the construction of this system in 1999, which is used until today. This experience resulted in the elaboration of an instrument that includes quantitative and qualitative information, supplying clinical and social data about each client, as well as clients and family members’ frequency of using the service. On the basis of this study, it may be inferred that this instrument is extremely important, since it gives rise to the possibility for optimizing the information flow and service evaluation. It needs to be highlighted that this construction was realized by a transdisciplinary team, which resulted in a broader instrument.

Key words: information system, mental health


 

 

A QUESTÃO DA COMUNICAÇÃO E A IMPORTÂNCIA DO SISTEMA DE INFORMAÇÕES ORGANIZACIONAIS

O estabelecimento da comunicação e a normatização de um sistema de informações são essencialmente importantes para o desenvolvimento de uma assistência integral de saúde, desde o seu planejamento até a sua execução propriamente dita.

Segundo Bordenave (1992) a comunicação é utilizada para que os indivíduos compartilhem experiências, idéias e sentimentos, influenciem-se e transformem a si mesmos e a realidade que os rodeiam. O referido autor afirma ainda que a linguagem oral é limitada quanto a sua permanência e tem pouco alcance, o que levou o homem a criar métodos de fixação dos signos e maneiras de transmiti-los à distância.

Para Rego (1988) a comunicação ocorre primeiramente dentro do indivíduo, depois se dá entre as pessoas, em um terceiro momento estende-se ao grupo do qual ela faz parte e por último ocorre na coletividade. Fazendo uma analogia com o cotidiano institucional podemos dizer que em um primeiro momento é necessário que cada profissional se proponha a refletir sobre sua prática e depois trocar idéias e emoções sobre a instituição com seus pares, para que em um terceiro momento ocorra uma discussão mais ampla entre todos os membros deste grupo. Em um quarto momento, este processo se estenderia à comunidade da qual instituição faz parte.

Rego (1988) afirma que quanto mais conhecida é a linguagem usada, maior será o engajamento da instituição com seus pares e maior será sua visibilidade, pois o sucesso de uma organização se daria em primeira instância pelo grau de visibilidade que ela possui externamente. O autor adverte que as organizações que não obtiverem uma boa visibilidade perante a comunidade externa correrá o risco de ser sufocada. Rego ressalta ainda que a meta da comunicação de uma organização deveria ser a redução da distância que separa os objetivos administrativos dos objetivos de seus usuários.

Takahashi (1991) define comunicação como sendo o processo de transmissão de informações, com o objetivo de gerar conhecimentos e sistema de informações como sendo um instrumento utilizado no processo de planejamento, aperfeiçoamento e tomada de decisão de uma organização e gerência de um serviço de saúde. O sistema de informação tem no processo de comunicação seu principal componente. Segundo a referida autora, o sistema de informação é o elo que une as informações necessárias, o planejamento e o processo de tomada de decisão.

 

O MOVIMENTO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

O movimento intitulado Reforma Psiquiátrica vem trazendo modificações em todo o contexto da assistência em saúde mental desde a década de 50. Os novos paradigmas trazidos pela Reforma psiquiátrica precisam ser percebidos de forma ampla pois, geram conseqüências em todos os aspectos relacionados mais diretamente ao cuidar. Iremos neste estudo abordar a necessidade de normatização do sistema de informações que irão apontar indicadores de saúde mais adequados à referida modalidade terapêutica.

Especificamente no município do Rio de Janeiro, a saúde mental começou a tomar novos rumos em 1995 e acreditamos que como marco referencial podemos citar o "Censo dos Internos nos Hospitais Psiquiátricos", que alcançou um universo de 3235 clientes internados e teve como objetivo delinear o perfil clínico e sócio-econômico dos clientes que estavam internados nos hospitais psiquiátricos do referido município.

O Censo foi utilizado como suporte e norteou os rumos que foram posteriormente traçados para o desenvolvimento de uma política de saúde mental mais adequada para a população do Rio de Janeiro. Como resultado imediato do Censo, tivemos em 1996 a inauguração do primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Rubens Corrêa, gerido pela Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro.

Para dar suporte à esta nova proposta assistencial utilizou-se a Portaria nº 224, de 29 de janeiro de 1992 do Ministério da Saúde que trata da normatização destes serviços. Dentre os pontos principais desta portaria podemos citar as seguintes diretrizes:

A partir destas premissas a Gerência de Saúde Mental vem norteando os Centros de Atenção Psicossocial de forma que estes ofereçam uma gama de métodos e técnicas terapêuticas bem diversificadas, como por exemplo os atendimentos em grupo e/ou individual, as oficinas terapêuticas (autocuidado, expressiva, reciclagem, medicação, culinária, jornal, entre outras) e apoio aos familiares. Estas oficinas vem sendo desenvolvidas por diversos técnicos, como por exemplo enfermeiros, terapeutas ocupacionais, psicólogos, assistentes sociais, médicos e outros.

Atualmente temos a ciência de que não basta apenas modificar os locais de atendimento se não forem modificados os conceitos que técnicos, familiares e comunidade possuem sobre a loucura, através de um movimento político-social que dissocie a pessoa com doença mental da violência e da incapacidade de articulação social e de uma vida produtiva. A reabilitação vista através do prisma da Reforma Psiquiátrica, precisa ser compreendida como um movimento social que não pode estar fechado em si mesmo. Este movimento prescinde de articulação nos vários setores da sociedade, assim como na área legislativa, jurídica, administrativa e cultural. Oliveira (2000) afirma que, possivelmente, através de uma prática social coletiva e integrada se consiga transformar a relação entre a sociedade e a loucura. Seria de extrema importância que os profissionais que prestam assistência na área de saúde mental trouxessem junto à sua prática ideais de liberdade, cidadania e a percepção da necessidade da participação social no cotidiano do seu cenário de trabalho.

Saraceno (1999) fala ainda que a ruptura com o que se entendia como psiquiatria não pode ser feita apenas com a mudança de referenciais, mas precisará ser desenvolvida através das pesquisas prático-teóricos que tratem das possibilidades do cuidar no cotidiano das instituições e revelem uma miríade de fontes de recursos e modos de operar que contribuam para a reconstrução da cidadania.

 

OBJETIVO

Este estudo tem como objetivo relatar a experiência de construção de um instrumento norteador do sistema de informações adequado às especificidades das novas modalidades assistenciais em saúde mental, em especial os Centros de Atenção Psicossocial.

 

METODOLOGIA

O estudo é do tipo qualitativo e utiliza o relato de vida como instrumento de coleta de dados. Chizzotti afirma que "… relato de vida pode ter a forma autobiográfica, onde o autor relata suas percepções pessoais, os sentimento íntimos que marcaram a sua experiência ou os acontecimentos vividos no contexto da sua trajetória de vida".

Este trabalho relata o processo de elaboração de um instrumento de forma que o sistema de informações gerado pelos Centros de Atenção Psicossocial fossem organizados e originassem documentos baseados em princípios semelhantes e característicos destes novos serviços. As discussões ocorreram ao longo do ano de 1999 e participaram representantes da Gerência de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, da Organização Não Governamental Instituto Franco Basaglia e as coordenadoras dos Centros de Atenção Psicossocial gerenciados pela Secretaria de Saúde do referido município. No momento em que ocorreu a elaboração deste sistema de informação havia cinco Centros de Atenção Psicossocial administrados pela Prefeitura do Rio de Janeiro: Rubens Corrêa em Irajá; Pedro Pellegrino em Campo Grande; Simão Bacamarte em Santa Cruz; Ernesto Nazareth na Ilha do Governador; e Bispo do Rosário em Jacarepaguá.

 

A REDE DE CENTROS DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL E A ESPECIFICIDADE DE SEU SISTEMA DE INFORMAÇÃO

Os Centros de Atenção Psicossocial (que surgiram a partir do Movimento da Reforma Psiquiátrica) são unidades que se destinam a oferecer uma assistência mais intensiva que o ambulatório e que não desvinculem o cliente de sua comunidade, mantendo e fortalecendo os vínculos sociais. Estes serviços se propõem a atender o cliente durante o dia, disponibilizando vários espaços terapêuticos interdisciplinares. Esses espaços são desenvolvidos em grupo e/ou individualmente, atendendo tanto o cliente como sua família e oferecendo três refeições diárias.

Como já foi dito anteriormente, a elaboração de um sistema de informação é essencial para o funcionamento de qualquer organização. Esta necessidade se deu em primeiro lugar dentro das próprias unidades pois, precisávamos observar o fluxo de clientes/dia bem como as atividades que estes clientes estavam utilizando neste espaço terapêutico e que clientes não estava comparecendo à unidade. Então, começaram a surgir questões de como disponibilizar informações quantitativas e qualitativas acerca da participação do cliente e de seus familiares no serviço. Cada CAPS iniciou a elaboração de um instrumento próprio, o que gerava para a Gerência de Saúde Mental informações diferentes de cada unidade.

Em 1998 houve por parte desta Gerência de Saúde Mental uma tentativa de organizar as informações, através de dados mínimos que cada coordenadora de unidade enviaria anualmente. Neste primeiro momento foram enviados relatórios que continham informações como o número de clientes que chegaram, foram triados e estavam freqüentando o serviço, o perfil da clientela (sexo, idade, número de dias que utilizavam o serviço semanalmente, número de internações antes e após freqüentar o serviço, tempo de uso do serviço e escolaridade) e outras informações como o número de abandonos, altas, transferências e de pessoas na fila de espera, caso houvesse. No que diz respeito aos dados qualitativos, referentes à reinserção social dos usuários, eram relatados o número de usuários que haviam voltado a trabalhar, estudar ou de alguma forma tinha ampliado o seu vínculo com o meio social. O que foi observado durante as reuniões de coordenação, que ocorriam mensalmente, foi que cada serviço percebia e contabilizava as informações de forma diferente.

A elaboração deste sistema de informações teve início no ano de 1999, através da iniciativa da Gerência da Saúde Mental da Prefeitura do Rio de Janeiro, apoiada pela Organização Não Governamental Instituto Franco Basaglia (IFB). Participaram ativamente desta elaboração representantes da Gerência de Saúde Mental, do Instituto Franco Basaglia e as coordenadoras dos Centros de Atenção Psicossocial do referido município. As discussões tiveram como base o instrumento elaborado por cada serviço individualmente e principalmente pelo CAPS Pedro Pelegrino.

O instrumento precisaria ser de fácil manuseio, fornecer dados quantitativos e qualitativos, oferecer e rapidamente um perfil da clientela e a maneira que cada cliente utilizava o serviço. De modo que ao final do mês a elaboração de um relatório geral que seria enviado à Gerência, via IFB, fosse facilitada.

A partir de vários encontros em reuniões de coordenação e com cada equipe individualmente ao longo do ano conseguimos elaborar um instrumento único, chamado "Atividade Semanais dos Cientes Matriculados". Este instrumento foi elaborado graças a dedicação de cada funcionário da rede CAPS, da Gerência de Saúde Mental e do convênio da Prefeitura do Rio de Janeiro com o Instituto Franco Basaglia. O IFB foi o responsável pela organização gráfica do instrumento, pela compilação dos dados fornecidos pelos coordenadores e pelo envio do resultado final para a Gerência de Saúde Mental. É possível inferir que a qualidade final deste instrumento deu-se em razão do desejo e do investimento pessoal de todos os técnicos comprometidos neste processo, pois, foram vários meses de discussão dentro e fora dos serviços, envolvendo vários profissionais.

 

CONCLUSÕES

A partir da construção e da compilação destes dados torna-se mais fácil construir e aperfeiçoar indicadores das condições de saúde da clientela que utiliza os Centros de Atenção Psicossocial. Finkelman (2001) afirma que os indicadores de saúde demandam especial atenção, pois são elementos essenciais para a alocação de recursos, auxiliam nas tomadas de decisão e no desenvolvimento de conhecimento. O autor supra citado afirma que a Organização Mundial da Saúde considera o sistema de informação em saúde um aspecto estratégico da cooperação técnica entre países.

Faz-se importante destacar que o sistema de atendimento em Centros de Atenção Psicossocial é ainda muito recente no Rio de Janeiro e requer avaliação quanto a abrangência de sua eficácia e do impacto causado na qualidade de vida das pessoas que o utilizam. Sendo então imprescindível que haja um grande investimento na elaboração e no aperfeiçoamento das vias que possibilitam a avaliação continuada destes serviços.

 

Referências bibliográficas

BORDENAVE, J. E. D. O que é comunicação. 14ª ed. São Paulo: Braziliense, 1992.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1998.

FAGUNDES, H. M., LIBÉRIO, M. A. A reestruturação da assistência na cidade do Rio de Janeiro: Estratégias de construção e desconstrução. Saúde em foco. Saúde Mental a ética do cuidar. Rio de Janeiro: Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, n.16. 1997.

FINKELMAN,J. O aperfeiçoamento e o uso de indicadores das condições de saúde. Saúde e previdência social. Desafios para a gestão no próximo milênio. São Paulo: Makron Books, 2001.

OLIVEIRA, Francisca B. Reabilitação psicossocial no contexto da desinstitucionalização: utopias e incertezas. In: Saúde mental: da prática asilar ao terceiro milênio. São Paulo: Lemos, 2000.

REGO, Francisco G. T.. A comunicação em organizações normativas. In: Anais do primeiro simpósio brasileiro de comunicação em enfermagem - SIBRACEn , São Paulo: USP, p.37 a 52. 1988

SARACENO, Benedetto. Libertando identidades. Da reabilitação psicossocial à cidadania possível. TeCorá: Belo Horizonte, 1999.

TAKAHASHI, R. T.. Sistema de informação em enfermagem. In: Administração em enfermagem. São Paulo: E.P.U., 1991.

 

 

ANEXO