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An. 8. Simp. Bras. Comun. Enferm. May. 2002

 

Revelação sobre diagnóstico e prognóstico graves: a questão sob a ótica de enfermeiros da Suécia e do Brasil

 

Disclosing serious diagnosis and prognosis from the perspective of swedish and brazilian nurses

 

 

Isabel Amélia Costa MendesI; Margareta AnderssonII; Miyeko HayashidaIII; Maria Auxiliadora TrevizanI

IProfessora Titular, Departamento de Enfermagem Geral e Especializada de Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Centro Colaborador da OMS para o desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, Pesquisadora 1A CNPq, Brasil. Avenida Bandeirantes, 3900 14040-902 Ribeirão Preto-SP iamendes@eerp.usp.br
IISenior Lecturer - Ersta Sköndal University College, Departament of Health Care Sciences, Suécia
IIIEnfermeira, Doutora em Enfermagem, Especialista em Laboratório–EERP/USP miyeko@eerp.usp.br

 

 


RESUMO

Trata-se de estudo exploratório acerca de algumas questões éticas ao revelar o diagnóstico/prognóstico grave à familia e paciente, quanto à sua ocorrência e freqüência nas realidades brasileira e sueca, do ponto de vista de enfermeiros pós-granduandos de ambos os países. A amostra de brasileiros é composta por 62 e a sueca por 55 enfermeiros. A maioria dos brasileiros afirmou que revelar o diagnóstico (85,5%) e prognóstico (75,8%) ao paciente é um problema freqüente ou muito freqüente, sendo minimizado quando a revelação é para a família. Mas, esta situação nunca ou raramente (58,2 a 63,7%) é vista como problema para a maioria dos enfermeiros suecos, seja para informar o diagnóstico ou prognóstico, à família ou ao paciente. Na Suécia, a maioria dos pacientes é informada sobre o diagnóstico (98,2%) e prognóstico (90,9%) mas a família não é informada quanto ao diagnóstico (94,6%) e prognóstico (85,5%) antes do consetimento do paciente. No Brasil, ocorre o inverso, a família é mais informada sobre o diagnóstico (50%) e prognóstico (56,5%) do que quando se trata de revelar diretamente ao paciente.

Palavras-chave: ética, enfermagem, diagnóstico, revelação, humanização


ABSTRACT

This is an exploratory study concerning some ethical questions related to the disclosure of a serious diagnosis/prognosis to family and patient, with respect to its occurrence and frequency in the Brazilian and Swedish realities, from the viewpoint of graduate nursing students in both countries. The sample of Brazilian students comprised 62 nurses, whereas the Swedish group consisted of 55 professionals. Most of the Brazilians stated that disclosing the diagnosis (85.5%) and prognosis (75.8%) to the patient is a frequent or very frequent problem, which is minimized when the information is disclosed to the family. However, Swedish nurses never or rarely (58.2 to 63.7%) see this situation as a problem, neither when informing the diagnosis or prognosis to the family nor when informing the patient. In Sweden, most of the patients are informed about the diagnosis (98.2%) and prognosis (90.9%), but the family is not informed with regard to the diagnosis (94.6%) or prognosis (85.5%) before the patient's consent. In Brazil, the opposite occurs. The family is more frequently informed about the diagnosis (50%) and prognosis (56.5%) than the patient himself.

Key words: ethics, nursing, diagnosis, disclosure, humanization


 

 

INTRODUÇÃO

A promoção do cuidado respeitoso aos pacientes em final de vida tem sido um tema de grande interesse na literatura anglo-saxônica para profissionais de enfermagem e medicina durante as últimas três décadas. Uma questão fundamental tem sido se, quando e como o paciente e/ou sua família devem ser informados sobre um diagnóstico ou prognóstico grave.

Na literatura, a resposta é freqüentemente dada com referência a princípios éticos tais como dizer a verdade, beneficência, etc. Em outras palavras, como aquilo que é considerado ideal no mundo ocidental (ANDERSSON, 1996; MENDES et al., 1996; TREVIZAN, 1998). Na realidade, a resposta depende das tradições do sistema de saúde de cada país. As tradições, que às vezes são explícitas e transmitidas na forma de conhecimento e às vezes implícita na forma de crenças, atitudes ou comportamento não-verbal.

O estilo de comunicação, crenças sobre o individualismo e coletividade, assim como as abordagens à tomada de decisões se originam a partir da cultura (LEININGER, 1997). Os sistemas de saúde são, em grande parte, construtos culturais e as crenças sobre a saúde e doença são culturalmente determinadas. As experiências relacionadas à morte e doença devem ser compreendidas no âmbito da complexa teia de significados culturais. Para desenvolver a compreensão disso, estudos empíricos comparativos multiculturais são de grande importância.

No contexto do convênio de cooperação internacional entre as instituições representadas pelos autores deste estudo, encontra-se em desenvolvimento um projeto conjunto de pesquisas sobre questões éticas no cuidado com pacientes terminais.

O objetivo do presente estudo é analisar questões sobre o fornecimento de informações ao paciente e família sobre diagnóstico e prognóstico graves, sob a ótica de enfermeiros da Suécia e do Brasil.

 

METODOLOGIA

Os dados utilizados para fins deste estudo, coletados em instituições de ensino público, no curso de pós-graduação em enfermagem do Brasil e da Suécia, foram extraídos de uma base de dados ampla, obtida pelo preenchimento de um questionário adaptado do instrumento proposto por Konishi e Davis (1999), traduzido para o sueco e português, contendo perguntas abertas e fechadas acerca de questões éticas relacionadas à prática assistencial. Portanto, são dados parciais, extraídos desta base de dados, onde consideramos apenas os itens referentes aos dados de caracterização dos sujeitos e os que abordam o ponto de vista e a vivência dos enfermeiros nas questões éticas ao revelar o diagnóstico e o prognóstico, quando estes são graves, ao paciente e à sua família.

Os questionários foram entregues pessoalmente aos enfermeiros pós-graduandos brasileiros que estavam cursando disciplinas no segundo semestre de 2001. Foram entregues 103 questionários com devolução de 62. No caso da Suécia, os dados foram coletados no primeiro semestre de 2001, quando foram entregues 68 e devolvidos 55 questionários.

Assim, foram incluídos 55 enfermeiros da Suécia e 62 enfermeiros do Brasil, dos cursos de pós-graduação de ambos os países, que concordaram voluntariamente em participar do estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido após terem sido orientados quanto ao objetivo do estudo e a garantia do seu anonimato.

Os dados foram analisados e submetidos a tratamento estatístico descritivo, apresentados em tabelas com valores absolutos e percentuais.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização dos sujeitos

A amostra de enfermeiros brasileiros é composta por 57 (91,9%) mulheres e 5 (8,1%) homens; a de suecos por 48 (87,3%) mulheres e 7 (12,7%) homens, com idade entre 22 e 60 anos e predomínio da faixa etária de 36 a 40 anos (35,5%) para os enfermeiros brasileiros e 41 a 45 anos (36,4%) para os suecos. Com variação entre os anos de 1962 e 2000, a maioria dos enfermeiros brasileiros graduou-se na década de 80 (53,2%) e 90 (32,3%), e os enfermeiros suecos mais na década de 90 (41,8%) do que na de 80 (23,7%).

Quanto ao credo religioso, a grande maioria dos enfermeiros da Suécia informou ser protestante (83,6%), o restante era de outra religião (3,6%) ou não tinha religião ou não respondeu (12,8%); no Brasil, ficou entre católica (54,8%) e espírita (22,6%), os demais são de outra religião (12,9%) ou de nenhuma religião (9,7%).

Enquanto experiência de trabalho, um grande contingente de enfermeiros já prestou assistência ao paciente terminal, no passado ou no presente, seja do Brasil (82,3%) ou da Suécia (98,2%).

A prática da revelação de diagnóstico e prognóstico graves

Os dados referentes à prática da revelação sobre diagnóstico e prognóstico graves foram extraídos de questão respondida pelos enfermeiros, para a qual tomaram como base sua experiência e a realidade do respectivo país, e estão apresentados na Tabela 1.

Nas respostas dos enfermeiros brasileiros, quanto à formulação da questão se a maioria dos pacientes geralmente é informada sobre seu diagnóstico quando este é grave, houve uma divisão na opinião pois embora a maioria tenha negado (56,5%), a resposta afirmativa também foi expressiva (40,3%). Quando se trata de informar o prognóstico ao paciente, o percentual de respostas negativas (69,4%) foi bem maior do que para as afirmativas (25%).

Por outro lado, houve uma polarização visível nas respostas dos enfermeiros suecos, pois na sua grande maioria foi positiva tanto para informar o diagnóstico (98,2%) como para o prognóstico (90,9%) ao paciente. A homogeneidade destas respostas indica que, do ponto de vista dos enfermeiros, na realidade sueca o paciente geralmente é informado quanto ao seu diagnóstico ou prognóstico quando estes são graves.

A família do paciente geralmente é informada sobre o diagnóstico, na opinião da metade (50%) dos enfermeiros brasileiros mas, quanto ao prognóstico o percentual se eleva um pouco (56,5%). Assim, nesta questão a opinião dos brasileiros também se divide pois os percentuais para as respostas negativas tanto para revelar à família o diagnóstico (45,2%) como o prognóstico (45,2%) são consideráveis.

Quanto aos enfermeiros suecos, contrária a opinião deles que responderam afirmativamente ao se revelar o diagnóstico ou prognóstico ao paciente, quando se trata de revelar somente à família a resposta foi negativa também de forma homogênea, mais para o diagnóstico (94,6%) do que para o prognóstico (85,5%) Isto porque, na Suécia desde 1983 a legislação para profissionais da saúde (Health and Medical Care Act) estabelece que os mesmos têm a obrigação de informar ao paciente sobre sua doença e sobre o tratamento possível e de inclui-lo no processo de decisão sobre seu cuidado. A informação deve ser dada de maneira individualizada no contexto de um processo de comunicação. Ao paciente cabe o direito de decidir qual informação pode ser fornecida, e para quem.

Problemas de revelação de diagnóstico e prognóstico graves

Os dados referentes aos problemas de revelação de diagnóstico e prognóstico investigados neste estudo, que os enfermeiros responderam com base na sua experiência e na realidade de seu respectivo país, quanto à freqüência com que eles ocorrem, estão apresentados na Tabela 2.

Quando indagados acerca da freqüência (Tabela 2) com que os problemas éticos relacionados ao fornecimento de informações ao paciente sobre um diagnóstico grave ocorrem em seu país, as respostas ficaram entre freqüentemente (58,1%) e muito freqüentemente (27,4%) para a realidade brasileira e, para a sueca, a maioria indicou como raramente (52,7%) e freqüentemente (25,5%). Assim, este é um problema identificado pelos enfermeiros como muito mais freqüente para a realidade brasileira do que para a sueca.

Entretanto, quando se trata de revelar o prognóstico grave ao paciente, observa-se que aparentemente os enfermeiros brasileiros consideram como problema menos freqüente pois, embora a maioria tenha indicado ser um problema freqüente (56,5%), o percentual encontrado para a resposta raramente (21%) foi um pouco maior e equilibrado com a alternativa muito freqüentemente (19,3%) pois, para a questão anterior, referente ao diagnóstico, a resposta raramente obteve apenas 9,7%. Para a maioria dos enfermeiros suecos, raramente (54,5%) esta questão constitui-se em problema; por outro lado, pelo menos um quarto deles acredita que seja freqüentemente (25,5%) um problema.

Ao enfocar a questão sobre revelação do diagnóstico grave à família, os enfermeiros brasileiros apontaram também na sua maioria como um problema freqüentemente (54,9%) enfrentado, mas com percentual expressivo considerando-a raramente (33,9%) como problema. Em se tratando de revelar o prognóstico à família, parece ser um pouco mais fácil para os enfermeiros brasileiros pois um percentual ainda maior deles revelou como raramente (42,0%), embora mais da metade tenha referido como freqüentemente (51,6%).

No tocante à opinião dos enfermeiros suecos, de forma semelhante às questões anteriores que tratavam de revelar o diagnóstico grave ao paciente, também para a família é considerado como raramente enfrentado pela sua maioria (52,8%) e 21,8% assinalaram como freqüentemente. Para revelar à família o prognóstico grave do paciente, obteve-se o mesmo percentual de enfermeiros suecos apontando como um problema freqüente (21,8%) mas para a sua maioria é raro (54,6%).

 

CONCLUSÃO

Com base nos dados apresentados e restritos às questões investigadas, teceremos algumas conclusões:

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como foi demonstrado nos resultados apresentados, fatores culturais exercem um papel importante na prática da enfermagem e da medicina. Apesar disso, as questões éticas relacionadas ao cuidado à saúde e à assistência de enfermagem são freqüentemente discutidas em artigos e conferências internacionais sem a consideração explícita dos presunções culturais que influenciam nossas crenças em relação ao significado e relevância dos conceitos e princípios éticos (ANDERSSON et al., 2002).

As questões relacionadas à informação sobre diagnósticos e prognósticos graves estão intimamente ligadas a princípios éticos tais como respeito pela integridade, dignidade e autonomia do paciente (ANDERSSON, 1996). Considerando que tais princípios são fundamentais para a maioria das diretrizes éticas, é de extrema importância avaliar seriamente se as formas tradicionais de comunicar-se com pacientes em diferentes sistemas de atenção à saúde estão de acordo com tais princípios. Além disso, deve-se também considerar se esses princípios são universalizáveis e deveriam ser implementados em todos os lugares ou se diferenças culturais deveriam ser mantidas, o que exigiria maiores estudos empíricos e teóricos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDERSSON, M. Integritet som begrepp och princip. En studie av ett vårdetiskt ideal i utveckling. (Integrity as a Concept and as a Principle. A Study of a Health Care Ideal in Development). (2nd ed) Integretik, Knivsta. 1996.

ANDERSSON,M, MENDES IAC & TREVIZAN,M. 2002. Universal and Culturally Dependent Issues in Health Care Ethics. Medicine and Law. Volume 21, Number 1, p.77-85, 2002.

KONISHI, E.; DAVIS, A.J. Japanese nurses’ perceptions about disclosure of information at the patients’ end of life. Nursing and Health Sciences, n o.1, p.179-87, 1999.

MENDES IAC, TREVIZAN MA, NOGUEIRA MS, SAWADA NO. Humanizing nurse-patient communication: a challenge and a commitment. In: 11th World Congress on Medical Law. 1996; Proceedings, Vol 2: 41-49.

LEININGER, M. Transcultural Nursing:Concepts, Theories and Practice. John Wiley & Sons, New York. 1977.

TREVIZAN, M. A.; MENDES, I. A. C.; FERRAZ, C. A.; ÉVORA, Y. D. M. Struggling for fhe Establishment of a new Ethics to Nurses Managerial Work In. 12TH WORLD CONGRESS ON MEDICAL LAW, 1998, SIOFOK PROCEEDINGS, SIOFOK, HUNGRIA, 1998, p. 656-666.