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An. 1 Simp. Internacional do Adolescente Mayo. 2005

 

Psicanálise e educação: um diálogo possível

 

 

Silvia Maia Bracco

Mestre em psicologia clínica pela PUCSP; Analista da SBPSP; Diretora do Instituto Therapon Adolescência; Professora na Fundação Escola de Sociologia e Política - SP

 

 

Através de intervenções realizadas por psicanalistas com professores e alunos da rede pública de ensino, este trabalho discute as dificuldades enfrentadas na relação professor–aluno, levando-se em conta o papel complexo destinado à escola na atualidade.

O olhar psicanalítico na escola, não é o olhar do psicanalista clínico aplicado à situação escolar. A escuta psicanalítica, nesta situação, não busca compreender a problemática individual subjacente a certo tipo de comportamento, mas o que os fenômenos observados podem significar, que lógica inconsciente está movendo o que está sendo expresso. Uma escuta ampliada que se contrapõe à lógica cotidiana, incluindo novos sentidos, aquilo que Herrmann (2001) denomina de uma escuta descentrada. Diz que cabe ao analista colocar em contato e muitas vezes em choque, sentidos diferentes do discurso do paciente, escutados fora do tema proposto por ele. A escuta tem que alcançar algo que está além da história oficial, para identificar movimentos e provocar o surgimento de outras versões.

As relações sociais sofrem conseqüência direta diante das transformações que se debate o mundo hoje, e imprimem mudanças na construção da subjetividade. Estamos diante de uma sociedade em crise, que tem seus valores de certo modo relativizados, uma organização social que convive com a transgressão de normas elementares, abuso, corrupção, enfraquecimento da lei, da autoridade paterna, da família.

Ao entrarmos em contato com as questões relacionadas à educação na atualidade, nos deparamos com um universo complexo: professores insatisfeitos, trabalhando em condições precárias e diante de situações que fogem ao seu campo de ação, como por exemplo, a falência social que não ampara o cidadão em suas necessidades básicas. Inseridos nesse contexto estão os jovens que se defrontam com uma realidade que dificulta a construção de ideais de futuro e são premidos pelo tempo e pela desesperança. Nessas circunstâncias o trabalho do psicanalista é árduo e a tendência é aderir ao discurso centrado na questão do sintoma. O analista, em um primeiro momento, é visto como mais um "especialista" alguém que veio para escutar, mas não pode fazer muito diante do abandono em que se encontra a rede pública educacional. Como se descolar dessa imagem e descristalizar sintomas, permitindo a circulação de idéias que podem aportar em novas representações que abram possibilidades para um agir criativo é o maior desafio que enfrentamos num trabalho de intervenção como este.

Normalmente a demanda das escolas gira em torno de auxiliarmos os professores a lidar com alunos difíceis, agressivos, que desafiam a autoridade e não se interessam por aprender. Na atualidade, diversas questões se superpõem quando o assunto é educação. A família é um bom lugar para iniciarmos uma reflexão. É ela que fornece as paredes da vida psíquica para o sujeito. Não é o quê se fala, mas o quê se transmite nos gestos, ações, postura, etc. e oferece à criança repertório para tornar-se parte de uma realidade compartilhada, permitindo a construção de sua relação com o campo cultural. Esse lugar de referência está sofrendo uma degradação na sua função. A desintegração dos papéis tradicionais e como conseqüência uma grande desorientação nas novas gerações.

O olhar da psicanálise hoje, não pode se restringir ao mundo intrapsíquico, tem que olhar para fora, considerar quais elementos doentes da cultura que o indivíduo assume como seu. Safra (1999) coloca que:

"Tendo a clareza de que o self acontece em um meio ambiente, é evidente que as fragmentações culturais favorecem o aparecimento de fendas na constituição do si-mesmo."(p.150)

O sujeito tenta alcançar visibilidade através do olhar de um outro, que significa suas ações e permite ir construindo seu estar no mundo. Winnicott ensina que se o bebê cria o mundo a partir dele próprio e necessita de alguém, normalmente sua mãe, para dar sentido as suas experiências, essas experiências estão inseridas em um mundo que já está lá, num campo cultural, na mãe, no pai, nos seus antepassados, num mito familiar. Safra (1999) diz que é o reconhecimento de um outro que possibilita a existência enquanto ser. O self acontece no encontro humano e ganha morada no tempo, no espaço, no gesto e no campo sócio-cultural. Ocupar um lugar no mundo é ocupar um lugar na vida de um outro. Somente a partir desta experiência é que o olhar poderá se voltar para o mundo com curiosidade e desejo. De posse de um corpo que foi significado pela presença de um outro, a criança dispõe de vida imaginativa, que lhe possibilita ocupar o vazio da ausência do outro com a sua capacidade de sonhar.

Como pensar estas questões e simultaneamente estarmos diante de uma sociedade em que estar invisível é um sentimento generalizado. Esses elementos tem que compor a escuta do psicanalista quando intervém no complexo papel destinado à escola e ao educador. Winnicott (1957) em um artigo sobre educação, discute como lidar com distintas necessidades emocionais de crianças e jovens que freqüentam as escolas. Ele diz que crianças provindas de lares satisfatórios, que alcançam um desenvolvimento adequado, vão a escola para que se adicione algo à sua vida, querem aprender. Há crianças porém, que vão a escola com outros propósitos, talvez a escola lhes forneça o que o lar não pode propiciar."Não vão a escola para aprender, mas para encontrar um lar fora do lar".(p.234) Buscam uma situação emocional, um grupo que possam pertencer, que possa ser testado por sua capacidade para enfrentar a agressão e tolerar as idéias agressivas. Esperam da escola as qualidades essenciais que faltaram em suas casas. O que vale ser discutido são dois aspectos: como suprir carências do ambiente familiar e da comunidade que influem diretamente na capacidade de aprender e qual o significado das manifestações de agressão observadas no ambiente escolar.

Na possibilidade de oferecer um sentido para estas questões, encontro em Winnicott (1946) uma alternativa para entender as manifestações de agressividade do ser humano. Muitas vezes, estas expressões indicam saídas para lidar com experiências que remetem a um fracasso do ambiente. Fala de situações que envolveram privação num estágio muito precoce em termos de desenvolvimento infantil, indivíduos que experimentaram a falta de algo essencial nas primeiras relações com o mundo e reconhecem o fracasso provindo do ambiente. Crianças que desenvolveram de forma precária a capacidade de se preocupar (concern), pois não contaram com alguém que se prestasse a ser alvo de seus ataques impulsivos, sobrevivendo a eles. O sujeito que teve a chance de estabelecer relações de confiança com as figuras parentais, irá experimentar toda uma gama de sentimentos que visam testar se os pais são capazes de suportar tudo que ele faz no sentido de provocar desorganização.

"Quando o ambiente familiar é confiável, a criança o põe à prova permanentemente: reclama, exige, destrói para experimentar todas as possibilidades e a consistência do meio. É interessante observar que antes de jogar tranqüila, a criança deve por à prova a fortaleza do meio familiar, para se sentir, ao mesmo tempo, livre e segura."(Abadi,1998,p.153)

A criança necessita de referências claras e sólidas para sentir-se livre e expressar-se com criatividade. Sem estas referências não pode experimentar a liberdade, torna-se angustiada e se conseguir preservar algum sentimento de esperança, busca estas referências em outro lugar. Segundo Winnicott (1946):

"A criança cujo lar não lhe ofereceu um sentimento de segurança busca fora de casa as quatro paredes."(p.121)

O ambiente escolar pode estar sendo usado para suprir determinadas faltas, como observado por Winnicott, impondo ao professor atribuições que vão além do ensinar, sendo testados na sua capacidade de suportar a agressividade. Poder distinguir entre manifestações conscientes de se testar autoridade e situações onde estão em jogo questões muito mais profundas é uma tarefa complexa. O psicanalista, aliado ao professor, pode contribuir com um outro sentido que o auxilia a encontrar formas de atuação.

Operando nesse sentido, é que a intervenção do psicanalista na escola é uma das frentes de trabalho desenvolvida pelo Instituto Therapon Adolescência. O Therapon é uma ONG fundada em 1999 com o objetivo de produzir modos de intervenção para a promoção da saúde mental do adolescente atuando em diversas frentes clínico-institucionais. Através de parcerias, realiza intervenções em instituições, tais como escolas, hospitais, postos de saúde etc. além de contar com um hospital-dia para adolescentes com graves problemas emocionais.

Como diretora desta instituição, e junto a uma das equipes1, realizamos um trabalho com professores da rede municipal de ensino em duas escolas localizadas na zona norte da cidade de São Paulo. Essa intervenção teve várias etapas, um encontro na escola, além de um workshop com 16 horas de duração com um grupo de aproximadamente 60 professores na sede do nosso instituto que, posteriormente, foram divididos em quatro grupos de supervisão, onde discutimos questões sobre alunos problema, limites, dificuldade de aprendizagem, sexualidade, drogas, violência, etc.

Descrever todo o desenvolvimento do trabalho não é meu intuito, no entanto, quero destacar algumas situações ilustrativas. No primeiro encontro onde nos reunimos com os professores de ambas as escolas tínhamos como objetivo identificar a demanda do grupo. Quais as questões mobilizadoras, quais as dificuldades, o que gostariam de discutir, enfim a tentativa era conhecer o grupo, saber quem seriam nossos interlocutores. Nesse primeiro contato ocorreu uma situação muito significativa, que só poderíamos entender seu alcance a posteriori. Quando foram convidados a falar, o grupo se calou e, assim como se fosse um representante oficial, um só professor expôs todos os problemas. C. começou a falar sobre as dificuldades do sistema educacional na atualidade, traz um mar de queixas, num discurso legítimo e inflamado, mostrava a desvalorização do professor, as péssimas condições de trabalho, estrutura, etc. Falou sem interrupção durante bastante tempo, todos permaneceram calados pois, ele era ali o porta-voz de um grupo, desestimulado e de certa forma paralisado diante de uma situação que nenhum de nós tinha poder de modificar. Num certo momento uma das psicanalistas diz que aquilo tudo era importante, porém, não podíamos modificar certas coisas e que então poderíamos usar aquele espaço pensar em situações passíveis de mudanças. C. fica incomodado com a fala da analista e, agressivamente, manifesta seu descontentamento. Foi um encontro tumultuado, prenunciando o tipo de relacionamento que se estabeleceria entre nós. Um grupo de difícil acesso, que não estava disposto a escutar.

O trabalho continuou se desenvolvendo, através de um workshop, cuja duração foi de dois dias. No primeiro dia, tivemos uma aula sobre adolescência e o relato de uma experiência anterior, realizada pelo Therapon, em uma escola com alunos e professores. No segundo dia de trabalho a proposta girou em torno de várias atividades que buscavam explorar a identidade do professor, seus recursos, etc. Ao longo dos dois dias, identificávamos um mal-estar, um clima de desconfiança, uma agressividade velada, presente em comentários carregados de ironia e certa resistência às atividades propostas. Tivemos alguns bons momentos, onde se encontraram mais descontraídos, mas o balanço era de um grupo reticente ao trabalho proposto. Ao final do segundo dia foi feita uma avaliação do encontro realizado e novamente através de alguns poucos professores, o grupo atacou duramente as psicanalistas e o trabalho realizado. Diziam nunca terem entendido o que era uma oficina de sensibilização, para que servia aquilo, o que de fato essa conversa adiantava. Mencionaram que não sabíamos do que estávamos falando, não conhecíamos de fato com que tipo de realidade eles lidavam. Reduziram nosso trabalho a um falatório teórico, inócuo e inoperante. Um discurso carregado de ressentimentos revelando, mais uma vez, a situação em que se encontram na escola e absolutamente fechados para qualquer possibilidade de diálogo. Ao final resgatamos as questões que surgiram ao longo dos dois dias, e sugerimos como continuidade do trabalho grupos de supervisões que aconteceriam nas escolas.

Nossa relação estava atravessada pelo descrédito e claramente nos identificavam a um lugar de poder, associado a diretoria da escola que nos convidou a realizar o trabalho, e que sempre os criticava e os responsabilizava pelo que não dava certo. A situação era de difícil manejo, ficava evidente a falta de confiança e a predominância de sentimentos paranóides. Sentimo-nos atacadas na função de psicanalistas, sob o impacto de uma situação violenta, e preocupadas em como daríamos continuidade ao trabalho. Era fundamental pensar como um espaço de supervisão, que exige uma relação de troca, poderia ocorrer naquelas circunstâncias. Na semana seguinte ao workshop, cada psicanalista, iniciou um trabalho de supervisão com um determinado grupo. Não terei aqui condições para expor todos os trabalhos e vou me concentrar no grupo em que estavam presentes os "professores problema" fazendo uma alusão direta à tão conhecida expressão "alunos problema".

A psicanalista que trabalhou com esse grupo, numa tentativa de processar o acontecido, resolveu escrever uma carta contando como se sentiu, suas associações, e principalmente como cada um deles havia lhe tocado. Quando entrou na sala de trabalho o clima era tenso e ela logo foi dizendo que tinha escrito algo que gostaria de compartilhar. A força da carta escrita pela psicanalista foi transmitindo a cada um deles aquilo que ela havia escutado de singular, num discurso que facilmente, poderia ser entendido apenas como um manifesto de um grupo oprimido por péssimas condições de trabalho. Foi recuperando falas. O grupo foi ganhando integrantes, nomes, falas distintas, reconhecendo potencialidades sem desconsiderar ou banalizar as dificuldades. A idéia básica que estava implícita era a do reconhecimento de um outro, fazendo com que, cada um, enquanto indivíduo, alcançasse existência, não precisando mais se entrincheirar como grupo. Singularizados, ganharam identidade, lugar.

A carta: "Pensei tanto em vocês, em especial depois de encerrada a primeira fase do trabalho na sexta última – sai do therapon e peguei uma forte chuva no caminho de casa. Na vila madalena, onde moro, as ruas são como num morro, cheias de subidas e descidas e logo se formam rios nas baixadas e meu carro por duas vezes quase chegou a morrer. Alguns de vocês talvez estivessem na mesma situação que eu, outros sob esta chuva enorme dentro dos ônibus, outros talvez ainda tivessem que ir trabalhar. Mas vocês habitaram meus sonhos do final de semana, minhas preocupações, minha impotência e minhas esperanças. Foram razão de relatos durante o jantar de sábado.

Respondo a vocês em poucas linhas o que talvez não tenha conseguido fazer nos dois dias que estivemos juntos. O que queríamos com aquela linha no chão? (se referia a uma dinâmica utilizada) O que queríamos com os relatos das memórias de vocês?

Um pouco de brincadeira e de conhecermos vocês e principalmente, que através dos próprios relatos vocês pudessem se entreolhar e buscarem em um e outro os educadores existentes e muitas vezes adormecidos em cada um.

O que a Marta pode viver em forma de reconhecimento talvez tenha feito sentido em sua trajetória. A Neucy, que pôde agradecer a Maria Helena sua ajuda a um "aluno" para ela muito especial. As histórias traziam sempre vocês em meio a alguma dificuldade, e o maneira como conseguiram driblá-las ou superá-las.

Os alunos especiais, os alunos gagos, os alunos difíceis...

Os professores reconhecidos nas ruas pelos antigos alunos e garantidos em seus lugares de importância, como nas falas do Clóvis, Laís, Fátima...e assim foi nomeando cada um, como os havia escutado.

Falei das marcas que deixaram em mim, do desassossêgo que me causaram. O grupo, que foi enfático ao se dizer unido, talvez, tal como uma turma de adolescentes, tenha um poder duplo: de intimidar, e de construir"2.

Suportar e legitimar as queixas e ataques, sobrevivendo a eles, pôde abrir um espaço para outras conversas. Surgiu um agir criativo, a partir do lugar privilegiado de contato direto com o aluno foram relatando suas dificuldades e recursos, aquilo que fazem e não podem reconhecer como competências.

O que observamos era que nossa comunicação estava truncada, estávamos usando linguagens distintas. Nesse sentido, a carta escrita pela psicanalista, abriu um canal de comunicação interessante, ela subverteu a sua função de psicanalista, foi pouco convencional, o que de certa forma é exigido em muitas situações de difícil manejo, porém teve um efeito interpretativo, provocou uma ruptura de um determinado funcionamento que possibilitou um outro nível de comunicação. Suportou os ataques, sobreviveu a eles e pode encontrar seu lugar no grupo.

Foi possível dimensionar a importância de duas posições: a dos professores, de quebrar determinados pressupostos de que são insuficientes e que falar disso é expor essa ferida ao outro e a posição das psicanalistas que podem oferecer um determinado saber que irá preencher o que está faltando. O que ficou explicitado é que são saberes diferentes que podem ser somados ao conhecimento, numa tentativa de oferecer uma leitura que amplie e ofereça novas possibilidades de atuação.

Porém é interessante destacar que nós funcionamos defensivamente quando preparamos uma aula para nosso primeiro dia de workshop. Chegamos com um saber pronto, como se quiséssemos dizer-lhes: "vejam como temos coisas para oferecer a vocês". Sem percebermos, estávamos apresentando nossa potência, o que já sabíamos sobre o assunto. Eles, por outro lado, precisavam rejeitar tudo que oferecíamos, mesmos que em alguns momentos estivessem claramente desfrutando do encontro, tal qual um grupo de alunos que não admitem que o que aprendem na escola pode ter utilidade em suas vidas.

Gostaria de fazer um paralelo entre a situação vivida pelas psicanalistas no trabalho com os professores e a situação que estes vivem com os alunos na escola. Muitos alunos usam a sala de aula para tratar de insuficiências básicas que são anteriores àquele momento. Entender como se constrói a subjetividade humana, e mais especificamente, as questões relativas à adolescência e aos aspectos impulsivos e agressivos que são potencializados nesta etapa do desenvolvimento é fundamental para poder se destacar da situação e lançar um olhar reflexivo sobre ela, que alcance outros sentidos. A reação impulsiva, agressiva, contestadora pode não ser dirigida a pessoa do professor, porém em determinados momentos servem de alvo para os ataques, ocupam um lugar que foi faltante no desenvolvimento de muitos destes jovens. O professor lida com situações complexas que remetem a aspectos primitivos do humano. Encontrar outros sentidos abre possibilidades de lidar com os problemas, articulam-se questões, abre-se espaço para novos pensamentos e ações.

Nada na sociedade atual incentiva o aluno ao estudo, as normas que regem o convívio social e escolar estão frouxas e difusas e, o despreparo cada vez maior atribuído ao aluno não pode ser somente responsabilidade da escola e do professor. É preciso discutir sobre os comportamentos de crianças e adolescentes que se defrontam com um universo que dificulta a construção de ideais de futuro, e com poucas chances de transformar a realidade em que vivem. O mais frequente são reações de alienação, impotência ou em contrapartida maiores possibilidades de passagem ao ato, através de comportamentos agressivos. É fundamental compreender os sentidos que determinam essas ações.

No trabalho com adolescentes, são observados movimentos, por exemplo, em salas de aula, em que os professores podem ocupar um lugar no grupo, transformado-se, transferencialmente, em adversários concretos e visíveis. Os jovens, além de se recusarem a lhes escutar, os tomam como alvo de ataques. Observamos, pelo discurso de adolescentes, que alguns interlocutores podem facilitar a eclosão da raiva. Por exemplo, professores que, por características pessoais, simbolizam a dominação e a violência. Qualquer situação em que tenham de submeter-se à lei, a ordem, pode ser vivida, por estes adolescentes, como dominação. Quando interpretam sua situação desta maneira, a insubmissão dos adolescentes se torna legítima a seus próprios olhos.

Quantos são os lugares que podemos ocupar, muitas vezes desavisadamente, preenchendo espaços que deveriam ser supridos por outrem, pela família, pela comunidade, etc.Isso pode ser observado em várias ocasiões em que estive trabalhando com jovens, seja em manifestações de agressividade, em uma espécie de abolição da lei, ou em falas esvaziadas de esperança. Como despertar no aluno a necessidade de conhecer, aprender se por vezes até nós duvidamos se aquilo que oferecemos é de fato algo que vai imprimir mudanças na vida do sujeito diante de uma situação social tão complexa. Nós, psicanalistas, ocupamos um lugar semelhante quando estávamos diante do grupo de professores, porém se tivéssemos nos paralisado, nosso trabalho perderia de fato o sentido que buscava. Nossa escuta tem que justapor estes elementos, identificar nos comportamentos desorganizados outras facetas e significados: "...buscar a comunicação humana que possa por em marcha a criatividade do sujeito, condição essencial para qualquer gesto transformador."(Safra)

 

Referências Bibliográficas

Abadi, S. (1998) Transições: O Modelo Terapêutico de D. W. Winnicott. São Paulo, Casa do Psicólogo.

Herrmann,F. (2001) Introdução a Teoria dos Campos. São Paulo, Casa do Psicólogo.

Safra, G. (1999) A Face Estética do Self: Teoria e Clínica. São Paulo, Unimarco.

Winnicott, D. W. (1946) Alguns Aspectos Psicológicos da Delinqüência Juvenil. In: Privação e Delinqüência. São Paulo, Martins Fontes, 1995.

Winnicott, D. W.(1957) A Criança e o seu Mundo. Rio de Janeiro, Zahar Editores.    

 

 

Silvia Maia Bracco
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1 Therapon Comunidade: Ana Cristina Cintra Camargo, Maria Cecília Pereira da Silva, Sonia Terepins.
2Material cedido por Ana Cristina Camargo.