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An. 1 Congr. Intern. Pedagogia Social Mar. 2006

 

Sociodramas familiares: em busca de novas conexões afetivas

 

 

Fatima Cristina Costa Fontes1

 

 


RESUMO

Este trabalho, apresenta a intervenção Psicossocial desenvolvida pela autora para uma ação terapêutica com famílias, mais especificamente com famílias em contexto infracional, amplia, entretanto, esse espectro e apresenta também uma ação mediada por Sociogenodramas com equipes técnicas de Unidades de Atendimento Social. Desenvolveu a autora, um trabalho Sociodramático com famílias e seus adolescentes que cumpriam a medida sócio educativa da Liberdade Assistida. A partir das mudanças evidenciadas nesses interrelacionamentos familiares e das novas conexões afetivas explicitadas, foi possível ampliar esse raio de ação sócio-terapêutica para outras frentes de trabalhos sócio-educacionais. Objetiva apresentar, de forma teórico-vivencial, experiências Sociodramáticas com foco nas relações familiares. Será utilizada a Metodologia Sociodramática, criada e desenvolvida por Jacob Lévy Moreno e que se caracteriza por seu enfoque nas relações sociais intergrupais e por um enquadre em três contextos: social, grupal e dramático e por realizar suas ações em três etapas: aquecimento, dramatização e comentários, com os seguintes elementos: Diretor (Coordenador do Trabalho); egos-auxiliares; palco; sócio-protagonista e platéia. Face aos vários trabalhos realizados com esta metodologia Sociodramática, torna-se evidente a força transformadora contida neste instrumento de intervenção psicossocial.

Palavras-chave: intervenção psicossocial; sociogenograma; genograma; sociodrama.


 

 

Introdução

Ser e ter família, desafio tremendo, ontem, hoje e amanhã.

Desafio "não menor" também é o de ser um Coordenador de intervenções com famílias.

Pode-se até dizer que se trata de uma enorme ousadia, pois se nos aprofundamos nas emaranhadas teias familiares, logo descobrimos como os fios desta trama, são sutilmente tecidos, numa sincrônica e autorizada complementariedade.

Somente delicadas, preparadas e hábeis mãos, poderão adentrar nessa teia, e junto com os fios, auxiliá-los em seus delicados nós e impossibilidades.

Por se tratarem de teias alheias, a manutenção de sua forma de organização, precisa ser respeitada pelos que delas cuidam, e quaisquer mudança aí ocorridas, precisam ser desejadas e confeccionadas pelos fios que a compõe.

Fundamental, portanto, que desenvolvamos a delicadeza e humildade neste serviço, que nos inclui, mas não é nosso.

Maior desafio ainda se torna trabalhar com famílias em contextos de fragilidade e risco, como por exemplo a família em contexto de infração e a família com filhos em situação de internação em Unidades de Atendimento Social.

Lamentavelmente adicionaremos um ingrediente a esta família em contextos de fragilidade: até hoje, em nosso país, as famílias cujos filhos são indiciados em processos de infração, pertencem, em sua quase totalidade, aos estratos empobrecidos da sociedade brasileira. De igual forma, as famílias que face à uma cadeia de eventos, que culminam com a situação de internação de seus filhos em Unidades de Atendimento Social, experimentam essa dolorosa realidade, também se encontram nos estratos empobrecidos de nossa sociedade.

Há que se desenvolver estratégias que estejam atentas e fujam dos padrões "idealizados" e "padronizados" de ações familiares das camadas médias da sociedade brasileira. E que se possa respeitar e promover a ampliação perceptual dessas famílias de seu potencial de resolutividade, para suas especificidades sócio-familiares.

Com todos esses desafios e prontidão, buscou então, desenvolver a autora, ancorada na proposta de J. L. Moreno dos Sociodramas, uma maneira de estar com essas famílias e de auxiliá-las a "desatarem" certos nós, da trama interrelacional, a partir da troca interrelacional com outras famílias, ou seja procurou desenvolver uma estratégia psicossocial para multifamílias, a qual deu o nome de Sociodramas Tematizados para as Famílias.

Diante da efetividade da proposta, confirmada pela ampliação perceptual dos participantes dos Sociodramas, foi possível acoplar essa linha de intervenção com e sobre a família, para espaços aonde a família fosse a temática em foco, como foi o caso da utilização dos Sociodramas sobre as famílias de origem de crianças em situação de internação em Unidades de Atendimento Social, realizados a partir dos Genogramas2 de algumas crianças e de alguns responsáveis técnicos de Unidades de Atendimento Social participante de um programa de Encontros com Equipes Técnicas de Unidades de Atendimento Social, desenvolvido pela Faculdade de Educação da USP. Esses Sociodramas foram designados pela autora de Sociogenodramas, pois emergiram de questões contidas em Genogramas, que graficamente contam as histórias das famílias ao longo de três gerações.

Este trabalho apresentará um pouco dessas duas experiências. Antes, porém, faz-se necessário o embasamento teórico/metodológico do Sociodrama.

 

Sobre a ação transformadora dos Sociodramas em J. L. Moreno/Teoria Socionômica

" E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei
no lugar dos meus; e arrancarei meus olhos para colocar no lugar
dos teus; então ver-te-ei com os teus olhos e tu ver-me-ás com os
meus." ( MORENO, 1946-1978,p.9)

Antes de apresentar a proposta Sociodramática propriamente dita, convém inseri-la no bojo da produção científica de seu criador Jacob Lévy Moreno.

Percorrendo um pouco o trajeto biográfico de Moreno, ele era médico romeno (viveu em Viena, desde os cinco anos de idade), era judeu, religioso (pertencia ao Hassidismo Judaico) e Dramaturgo, constatamos, ainda, que sua produção científica se assentou também nos movimentos sociais de sua época.

Aliado aos movimentos sociais, sobretudo aos trabalhos feitos pela classe trabalhadora de La Salle e Marx, inclusive no que concernia aos efeitos das realizações éticas vividas por esse grupo, surgiu em Moreno o desejo de fazer algo similar com as prostitutas de Viena.

Ele acreditava que, ainda que essas prostitutas tivessem sido estigmatizadas como pecadoras desprezíveis e pessoas indignas por muito tempo em nossa civilização, e elas próprias tivessem aceitado tal fato como imutável, era possível fazer algo por elas.

Daquilo que se processou nesse auxílio, que demonstrou toda a força terapêutica que uma pessoa pode ter sobre a outra, nasceu na mente de Moreno todo o potencial de uma psicoterapia de grupo, e com isso os quatro princípios básicos da Psicoterapia de grupo. E mais tarde tornou-se base para todas as formas de psicoterapia grupais e trabalhos terapêuticos grupais.

Ele nomeou esses princípios como :
I - a autonomia do grupo;
II - a existência de uma estrutura de grupo e a necessidade de se saber mais sobre ela;
III – o conhecimento da ordem coletiva e seus padrões de comportamento, papéis e costumes que dinamizam a situação, independente de participantes individuais e grupos locais;
IV – o problema do anonimato: nos trabalhos grupais há a tendência para o anonimato dos membros, as fronteiras entre os egos se esmaecem e o grupo como um todo, torna-se mais importante.

De seu envolvimento como dramaturgo, criou o Teatro Espontâneo, que diferia do Teatro Tradicional da época, que tinha novos impulsos nesse momento a partir do Teatro Experimentação de Stanislawski, do Teatro do absurdo de Pirandello, e do Teatro pobre de Grotowski.

Nesse seu Teatro Espontâneo, que depois se converteu no Teatro Terapêutico, havia como ponto de referência, três fatores: o "status nascendi", o "locus" e a matriz.

Moreno compreendia que:

" O lugar primário da experiência, o lugar de nascimento, é o ‘locus nascendi’ do teatro.
O momento primário de criação é o ‘status nascendi’... A representação espontânea
de papéis dá a prova metaprática de um reino de liberdade em que a ilusão é
estritamente separada da realidade. Mas existe um teatro em que a realidade ou o
ser são demonstrados através da ilusão, em que se restaura a unidade original entre
as duas metazonas - mediante um processo de auto-reflexão humorística; no
teatro terapêutico, realidade e ilusão são uma só coisa". (MORENO,1946-1978, p.76).

Foi pela criação deste Teatro Terapêutico, que Moreno concebeu a possibilidade das pessoas poderem expor suas realidades e assim reexperimentá-las como autênticos "donos".

Ao criar mais adiante o Psicodrama Terapêutico, Moreno acreditou que a partir das três etapas de uma sessão de Psicodrama, - aquecimento, dramatização e comentários -; e utilizando-se dos cincos instrumentos da sessão: diretor, ego-auxiliar, palco, protagonista, e público; seria possível propiciar a cada indivíduo de um dado grupo a possibilidade de encenar seu próprio drama.

Passou então Moreno a uma longa e exaustiva integração conceitual entre o Teatro Terapêutico, a Sociologia e a Psicologia Social; e a Psicologia Dinâmica que redundou na criação de uma ciência a qual nomeou de Ciência Socionômica.

Esta nova ciência das relações interpessoais se ramifica em três grandes áreas:

Sociodramas são, pois, sessões abertas de Psicodrama, focadas nas relações sociais, intergrupais, e pertencem ao ramo da Sociatria da Ciência Socionômica.

A proposta de Moreno (1946-1978, p.413) para os Sociodramas é a seguinte:

"o verdadeiro sujeito de um Sociodrama é o grupo... o Sociodrama, baseia-se
no pressuposta tácito, de que o grupo formado pelo público já está organizado
pelos papéis sociais e culturais de que, em certo grau, todos os portadores da
cultura partilham...
É o grupo como um todo, que tem de ser colocado no palco para resolver os
seus problemas, mas como o grupo é apenas uma metáfora e não existe
per si, o seu conteúdo real, são as pessoas interrelacionadas que o compõe,
não como indivíduos privados, mas como representantes da mesma cultura.
O Sociodrama, portanto, para tornar-se eficaz, deve ensaiar a difícil
tarefa de desenvolver métodos de ação profunda, em que os instrumentos
operacionais sejam tipos representativos de uma dada cultura e não indivíduos
privados."

Acreditava Moreno, no valor exploratório, do ponto de vista da investigação científica, tanto quanto no valor "curador", modificador de atitudes, da proposta Sociodramática. Essa modificação ocorreria, para Moreno, pela ampliação perceptual e, conseqüente, tomada de consciência por essas pessoas, de suas trocas afetivas e de seus papéis vividos, a partir de suas representações no palco Psicodramático. Encenar o drama significa poder trazer para um novo "locus", e em um novo "status nascendi" (o palco e o momento em que a ação dramática se desenrola), todos os elementos que remeteriam aos papéis sociais e psicodramáticos anteriormente estabelecidos e jogados.

Com essa "nova" condição de jogar esses papéis, que a maioria das vezes é pré-fixada (pelos que compunham a matriz de identidade, sobretudo por seu ambiente familiar), nasce a grande possibilidade do salto qualitativo, da catarse da integração.E por esse salto qualitativo e por essa catarse de integração, entende-se a capacidade a partir da ação dramática, do indivíduo conectado com sua própria história relacional, o mais das vezes velada e oculta em seus mais cruciais elementos até esse momento, de se posicionar frente aos seus próprios anseios, suas possibilidades de ação e de transformação.

Ação essa que poderá libertar o "homem espontâneo" que já não precisará ser tragado pela conserva cultural e será capaz de se utilizar dela, como um dos referenciais de realidade, mas poderá também ir além.

Os Sociodramas são coordenados por um terapeuta, nomeado por Moreno de Diretor, que desempenhará seu papel tal qual um diretor teatral, agindo como um produtor de cenas, como terapeuta e como analista social. E como produtor, segundo Moreno (1978, p.308), "é um engenheiro de coordenação e produção". Como não é o "autor do enredo" a ser dramatizado, diferentemente do autor teatral, deverá procurar inicialmente encontrar-se primeiro com seu público e os seus personagens, extraindo deles o material para um roteiro de cena.

Como terapeuta, esse diretor é responsável pelo enquadre terapêutico. É sobre ele que cai a responsabilidade final pelo valor terapêutico da produção total, como nos assegura Moreno (MORENO, 1978, p. 309). Portanto, a atenção, o preparo e sobretudo o reconhecimento dos fenômenos grupais que ocorrem a cada encontro, são pontos vitais na atuação do diretor. Além disso, como analista social, o diretor atuará em conjunto com os demais participantes, processando na perspectiva social, a partir das múltiplas percepções dos envolvidos, o que ocorreu a cada encontro.

O Sociodrama segue as três etapas propostas por Moreno para qualquer intervenção Socionômica, ou seja :o aquecimento, a dramatização e os comentários.

É muito rica a alusão de Moreno acerca do processo de aquecimento, pois dela dependerá o sucesso das outras etapas de uma intervenção socionômica. Para ele, todos os estados espontâneos são gerados a partir de um processo de aquecimento preparatório (warming-up process) (MORENO, 1978 , p.280).

Cabe ao diretor a cada Sociodrama, aquecer o grupo e seus participantes, usando para isso recursos que auxiliem esse "corpo" a viver os "estados espontâneos" que colaborarão para a etapa seguinte: a da Dramatização.

A partir do surgimento dos papéis sociodramáticos, inicia-se a etapa da Dramatização. Nessa etapa, o grupo é levado a viver a experiência dramática coletiva, quando emergem os conflitos interculturais desse grupo, que serão devidamente cuidados por técnicas ativas, a fim de serem concretizados e instalados em seus contextos, a partir de um campo terapêutico.

Na última etapa do Sociodrama ou etapa dos comentários, o grupo é convidado a retornar a seus papéis reais e a elaborar mentalmente tudo o que se passou durante este encontro. Ao diretor, nessa etapa , cumpre a missão de estimular o grupo no sentido a que articulem o que experimentaram, com a realidade objetiva desse grupo, e com o tema proposto para cada encontro.

 

Apresentando os Sociodramas com famílias em contexto infracional

No projeto dos Sociodramas Tematizados, os encontros propostos para pais e filhos conjuntamente, seguiram a Metodologia Sociodramática, já explicitada anteriormente. O número de participantes foi muito flutuante, mas a média era de cerca de vinte participante, havendo contudo, alguns que superaram a marca de quarenta participantes.

Há uma total liberdade nesse método, para que o diretor/coordenador da atividade sociodramática, crie o "como" elaborará cada etapa, ele é, portanto, livre para criar.

Esses encontros foram tematizados e elaborados, procurando se incluir neles, as questões mais freqüentes observadas nas trocas familiares, e que muitas vezes se constituíam fonte de conflito nessas relações.

Ressalta-se, então, o fato de que todos os procedimentos realizados nesses Sociodramas, foram uma criação original desta autora, baseados em sua trajetória pessoal (sobretudo os jogos dramáticos, visto que a autora, teve uma infância privilegiadamente repleta de folguedos e brincadeiras de criança) e sua prática profissional com grupos e famílias.

Serão relatados, em seqüência, o tema e objetivo de cada Sociodrama:

Primeiro Sociodrama
Tema:
A família que somos, a família que desejamos ser
Objetivo do encontro: Auxiliar as famílias no processo de "desidealização" de suas interrelações.

Segundo Sociodrama
Tema:
A família produzindo afeto e respeito
Objetivo do encontro: Auxiliar as famílias em seu processo de serem produtoras de afeto e respeito em seus vínculos.

Terceiro Sociodrama
Tema:
A família que cuida estabelecendo limites
Objetivo do encontro: Auxiliar as famílias na árdua tarefa de estabelecer os limites.

Quarto Sociodrama
Tema:
A família que cuida, acolhendo as diferenças individuais
Objetivo do encontro: Auxiliar as famílias na questão do respeito, aceitação e valorização das individualidades em sua experiência interrelacional.

Quinto Sociodrama
Tema:
A família que cuida, aprendendo com as outras famílias
Objetivo do encontro: Auxiliar as famílias na percepção de seu próprio potencial de recursos de enfrentamento de suas dificuldades.

Sexto Sociodrama
Tema:
A família que cuida, ensinando valores que edificam
Objetivo do encontro: Instrumentar as famílias a que possam ter elementos para fazer uma crítica aos atuais valores que circundam as famílias, e que se possa refletir sobre valores éticos que edificam as relações.

Ao final desses encontros, era possível tangenciar em vários indicadores de novas conexões afetivas, tanto para os pais, quanto para os filhos. Como exemplificares disto pode-se mencionar:

Seguramente, essas novas conexões, apresentavam-se ainda muito iniciais e frágeis, sendo necessário uma continuidade desses encontros, que poderiam eleger os temas em função das realidades dos vários participantes, como forma de acompanhar a solidificação das mudanças já iniciadas.

 

Apresentando os Sociogenodramas com Equipes Técnicas de Unidades de Atendimento Social

Face ao desejo de melhor conhecer e manejar a ferramenta do Genograma, propôs a autora a realização de Sociodramas que permitisse a intimidade com a ferramenta, mediada contudo, pela experiência interrelacional que faria emergir as grandes questões e dilemas do grupo face à técnica de se conhecer as histórias das famílias.

A este uso do Sociodrama, nomeou a autora de Sociogenodramas. Comentar-se-á, a seguir quatro Sociogenodramas, que foram realizados numa primeira etapa de "Encontros de Equipes Técnicas de Unidades de Atendimento Social", da qual participaram três grandes Unidades de Atendimento Social, da cidade de São Paulo, perfazendo uma freqüência média de vinte participantes por encontro. Os Sociogenodramas tiveram seus temas escolhidos a partir do aquecimento do grupo participante.

Primeiro Sociogenodrama
Tema emergente:
O que queremos com a ferramenta do Genograma?
Objetivo alcançado: Cada participante teve a chance de refletir, mais profundamente, sobre as possibilidades, limites e riscos do uso do Genograma em crianças em situação de permanência em Unidades de Atendimento Social.

Segundo Sociogenodrama
Tema emergente
: Como distinguir os afeto, sobretudos os de tristeza que se imbricam entre os Genogramas dos Responsáveis Técnicos das Unidades de Atendimento Social e os Genogramas das crianças que permanecem nessas Unidades?
Objetivo alcançado: Cada participante pode, através da sócio-protagonização de um dos membros do grupo, dimensionar a importância de se conhecer a própria história da família de origem do responsável técnico de Unidades de Atendimento Social , como caminho de melhor desenvolver uma percepção mais "funcional", mais próxima do real, experimentado pelas crianças que ali permanecem e de suas famílias.

Terceiro Sociogenodrama
Tema emergente:
Como montar um Genograma de crianças de quem quase nada se sabe acerca de suas histórias familiares?
Objetivo alcançado: A partir da narrativa da situação de uma criança que estava numa Unidade de Atendimento Social, e a complexidade e gravidade de sua situação emocional, relacional (dois irmãos menores também estavam na Unidade) e da quase nenhuma informação de sua história familiar, foi possível aos participantes do grupo, perceberem alguns de seus pré-conceitos com as famílias que colocam seus filhos em Unidades de Atendimento Social.

Quarto Sociogenodrama
Tema Emergente:
Será mesmo que o Genograma pode vir a ser um instrumento que contribua para a reinserção dessas crianças em seus vínculos familiares? Ou reforçará a situação de destituição parental destas crianças?
Objetivo alcançado: Após uma rica seqüência de "cenas dramáticas", envolvendo atitudes dos técnicos responsáveis, em situação de luta ou de resignação, face a sentenças de destituição de pátrio poder de uma mãe de uma criança em situação de permanência numa Unidade de Atendimento Social, foi possível aos participantes aprofundarem ainda mais as limitações e possibilidades do uso do Genograma nas crianças institucionalizadas nas Unidades de Atendimento Social e a urgente necessidade de se prosseguir ainda mais na discussão e aperfeiçoamento desta ferramenta para este fim.

Mais uma vez constatou-se a efetividade da metodologia sociodramática, desta vez, com um cunho sócio-pedagógico, que possibilitou a ampliação e o aprofundamento na discussão do uso de uma ferramenta metodológica, que caso não se possa ter a questão de seu uso esmiuçada em várias direções, pode funcionar com um coadjuvante ainda mais culpabilizante da sofrida família que tem suas crianças em situação de internação em Unidades de Atendimento Social.

 

Conclusão

"A capacidade de sonho fecunda o real, reembaralha as cartas do provável
e subverte as fronteiras do possível." Eduardo Gianetti3

Na intensa luta, já iniciada há muitos anos, de contribuir para uma melhoria no padrão interrelacional de seu semelhante, sente-se a autora mais uma vez confirmada em seu sonho/ação transformador.

Tanto os Sociodramas com as famílias, quanto aqueles que tiveram como público alvo os que com as famílias lidam, ou deveriam lidar, aqui relatados, serviram de paisagem na direção da construção de metodologias de intervenções psicossociais que possam servir para minorar as "mazelas interrelacionais" tão freqüentemente verificadas em nossa "líquida modernidade", que "espalha" e "dilui" nossa condição de seres vinculares por excelência, como nos anuncia o sociólogo polonês Zygmunt Bauman(2004), nos alertando para a fragilidade atual dos laços humanos.

Além de desejar estar contribuindo para o fim do "familismo" no qual tem se convertido o atual cenário de políticas públicas e privadas e de intervenções para e com as famílias empobrecidas em situação de risco social, que se caracteriza por fazer destas famílias, ainda mais culpabilizadas pela situação em que se encontram. Continua a luta desta autora, que engrossa a fileira daqueles que também lutam e insistem na verdade de que essas famílias só serão protetivas, se forem tratadas com a dignidade e particularidade às quais têm direito.

 

Referências Bibliográficas

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1 Psicóloga, Psicodramatista, Professora do Instituto Sedes Sapientieae SP, Terapeuta Familiar, Associada à APTF/ABRATEF, Mestre em Psicologia Social da PUC/SP, Doutoranda em Serviço Social PUC/SP, Pesquisadora do NCA - Núcleo de Estudos e Pesquisa da Criança e do Adolescente PUC/SP, Pesquisadora do NEMESS – Núcleo de Estudos e Pesquisa em Metodologias do Serviço Social PUC/SP
2 Genograma "é um mapa que oferece uma imagem gráfica da estrutura familiar ao longo de várias gerações, esquematiza as grandes etapas do ciclo vital, além dos movimentos emocionais a ele associado."(MIERMONT,1994, p. 291)
3 Trecho extraído do livro: "O valor do amanhã", de Eduardo Gianetti, São Paulo: Companhia das Letras, 2005, pp.277.