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An. 1 Congr. Intern. Pedagogia Social Mar. 2006

 

As tramas do cárcere: 1979 -1992

 

 

Gutemberg Alexandrino Rodrigues1

 

 


RESUMO

Este trabalho tem como objetivo discutir como foram tecidas as tramas do cárcere, no período de 1979 a 1992, no sentido de se legitimar, produzir e classificar determinadas categorias sociais concebidas como delinqüentes desde tenra idade. Por meio do discurso de vários pareceristas (psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, juristas), assim como de outros funcionários de instituições totais, a saber, monitores da FEBEM e agentes penitenciários dos presídios, abordam os limites e as técnicas utilizadas para a composição dos prontuários da FEBEM/SP, Casa de Detenção Professor Flamínio Fávero e Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté. Atenta, por outro lado, para as especificidades do universo prisional, durante o período, no qual a violência caracterizava todos os indivíduos do mundo asilar. E, finalmente, como diversos códigos e uma moralidade interna fazia com que todos se tornassem peça atuante conflitiva no interior do cárcere.

Palavras-chave: Febem; Casa de Detenção; Casa de Custódia de Taubaté; delinqüência; instituições totais.


 

 

Objetivo

Este trabalho discute como são tecidas as tramas do cárcere no sentido de se legitimar, produzir e classificar determinadas categorias sociais concebidas como delinqüentes desde tenra idade. Por meio do discurso de vários pareceristas (psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, juristas), assim como de outros funcionários de instituições totais, a saber, monitores da FEBEM e agentes penitenciários dos presídios, aborda os limites e as técnicas utilizadas para a composição dos prontuários da FEBEM/SP, Casa de Detenção Professor Flamínio Fávero e Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté.

Atenta, por outro lado, para as especificidades do universo prisional no qual a violência caracteriza todos os indivíduos do mundo asilar. E, finalmente, como diversos códigos e uma moralidade interna faz com que todos se tornem peça atuante conflitiva no interior do cárcere.

 

Problema

Pensar como a figura do delinqüente é construída, e como a partir da criação desta imagem seres, desde tenra idade até a maioridade, são tratados no interior de diversos órgãos de coerção social.

 

Justificativa

Quando do início da realização de nossa pesquisa de doutoramento, entregue em dezembro de 2006, tínhamos como objetivo estudar os limites da institucionalização de crianças e adolescentes que em tenra idade passaram por alguma unidade da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor e que na fase adulta acabaram sendo detidas em algum presídio, como, por exemplo, a Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté e/ou a Casa de Detenção.

Após a consulta do material empírico (381 prontuários da FEBEM, 10 prontuários da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté e 1409 prontuários Casa de Detenção), percebemos que os diversos meandros que compõem o mundo do cárcere são fundamentais para entendermos se não completamente a institucionalização total dos internos de localidades como a FEBEM e dos detentos, no caso do presídio, parte deste mecanismo de poder existente. Nesta dimensão, a análise do universo prisional, a partir dos prontuários, e as diversas tramas nele existentes tornaram-se nosso objeto por excelência. Entender como da junção de diversos pareceres, incluindo as análises dos psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras, juristas, assim como dos monitores de instituições para crianças e adolescentes e agentes penitenciários, é composta a imagem que as instituições fazem de seus internos.

Por outro lado, a análise dos prontuários revela muito mais da instituição que o guarda do que exatamente do indivíduo que acredita falar. Podemos dizer que existe sim, o prontuário dos técnicos das instituições e não dos internos que quase nunca falam e quando se manifestam é por meio de cartas enviadas a um amigo, namorada, ou parente. Nas entrelinhas destas, marcadas de códigos, de não ditos, de silêncios e reticências, percebemos como o universo do cárcere é percebido pelos internos: quase sempre sob uma ótica de quanto menos se expor, melhor será para que acontecimentos desagradáveis não ocorram no futuro. Uma denúncia, uma delação envolvendo agentes institucionais ou companheiros, pode ter como conseqüência direta o prolongamento na instituição, deslocamento de localidade, geralmente para uma na qual a disciplina é mais rígida; ou ainda a apreensão de uma carta pode redundar na transferência para uma cela disciplinar. No caso, envolvendo companheiros, em muitos momentos, dependendo da situação e da denúncia, pode redundar na morte do denunciante.

Devemos indicar que o mundo do cárcere guarda seus códigos, sua moralidade e dinâmica interna cujas especificidades não aparecem em qualquer documento escrito. Se grande parte das informações escorre pelos prontuários, vistos enquanto documentos oficiais que têm como objetivo registrar a vida institucional dos internos sempre pela ótica dos pareceristas, podemos, dadas as devidas proporções, adentrar senão completamente neste mundo do silêncio, mas em parte de sua dinâmica. Para em seguida mapearmos como o mundo asilar exerce um enorme poder sobre seus internos. Quando se rebelam e enfrentam o universo prisional, mesmo assim tais atitudes serão analisadas pelos técnicos das referidas instituições sobre o crivo da potencialização da delinqüência manifesta, nunca como um ato de alguém que questiona os trâmites do mundo prisional.

Os prontuários são documentos nos quais observamos parte da trajetória da institucionalização da criança, do adolescente e do adulto, levando-nos à impressão de que nada escapa aos olhos atentos da instituição encarregada de acompanhar e determinar todo o seu percurso, cujo ponto de partida se faz ainda no ambiente familiar, passando a acompanhar, paulatinamente todos os atos, gestos identificadores de uma anormalidade a ser sanada. Segundo Michel Foucault, o anormal é o monstro banalizado do quotidiano.2

A partir destas situações, percebemos quão importante seria estudar as diversas tramas tecidas no mundo do cárcere, objeto por excelência desta tese. Pensar as diversas modalidades e possibilidades existentes para além dos muros da FEBEM, ou da Casa de Detenção, ou da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté equivale pensar a sociedade em que diversos seres estiveram enquadrados. Mergulhar no mundo do cárcere, por meio dos prontuários, nos dá, guardadas as devidas proporções, uma dimensão do universo analítico de saberes e poderes que envolvem estas instituições. Por outro lado, mostra-nos as intrincadas relações e modalidades de violência existentes no mundo asilar. Este, não obstante, os muros que o separa da cidade, apresenta uma certa especificidade, mas de modo algum situações que não se repetem no todo social no qual todos de alguma forma ou de outra, como ressalta Erving Goffman3, representam múltiplos papéis. Ainda acreditar que não exista um intercâmbio entre estes dois mundos é imputar para a vida quotidiana da prisão uma originalidade sui generis que não é respaldada quando a estudamos.

 

Embasamento teórico-metodológico

Parte das análises de nosso trabalho resultaram das observações de Michel Foucault e Paul Ricouer. Ambos, em suas devidas especificidades, procuram, por meio dos discursos, entender a gênese da sociedade em que tais discursos atuam. O discurso para Foucault, aparece como acontecimento, carregando as condições de produtividade e guardando em seu interior a potencialização dos dispositivos de vigilância4, o esquadrinhamento do corpo e da alma de determinados indivíduos. Cria-se por meio dos discursos inúmeros saberes que aplicados objetivamente sob o estatuto da ciência, da razão e da objetividade, leva ao confinamento dos loucos, dos presos e de todos os indivíduos considerados anormais e desviantes. Enfim, conseguem estabelecer a dicotomia normal/anormal/saudável/patológico.

Dentro do seu potencial analítico, Foucault se preocupa em investigar como e por que os discursos são produzidos, quais as formas de apropriação dos discursos, que indivíduos, que grupos, que classes têm acesso a determinados tipos de discursos e quais seus limites.5

Ao determinar as condições de produtividade o autor busca "tornar visível o que só é visível por estar demasiado na superfície das coisas".6 Encontramos nesta busca da superfície, às vezes confusa e contraditória, o óbvio, e como lembra Clarice Lispector, o óbvio é a verdade mais difícil de se enxergar.7

As contribuições de Foucault são importantes pois lembram que "o discurso não é lugar de uma tábula rasa onde se depositam passivamente certos objetos previamente constituídos, definindo-se pela capacidade de articulação de objetos heterogêneos".8

"Analisar formações discursivas, positividades, e o saber que lhes corresponde, não é assinar formas de cientificidade, é recorrer um campo de determinações históricas que deve dar conta, em sua aparição, sua permanência, sua transformação, e chegado o caso, seu eclipse".9

Para Ricouer o discurso é um produtor de evento, carregando as marcas da temporalidade, seus agentes e objetividades. O caráter de evento vincula-se à pessoa que fala. O discurso, como lembra o autor, é sempre discurso de algo, refere-se a um mundo que tenta exprimir e representar.

O discurso como produtor de eventos, congrega em si uma pluralidade de tempos históricos, tendo a eficácia da persuasão e determina o território pelo qual as personagens devem se posicionar.

"O discurso possui não somente o mundo, mas o outro, outra pessoa, um interlocutor ao qual se dirige: o evento é o fenômeno temporal da troca, o estabelecimento do diálogo, que pode travar-se, prolongar-se ou interromper-se".10

Sustenta Paul Ricouer, que todo texto manifesta um mundo permeado de tensões, rupturas e permanências, carregando sua temporalidade:

"Não há intenção oculta a ser procurada detrás do texto, mas um mundo a ser manifestado atrás dele. Ora, esse poder do texto de abrir uma dimensão da realidade comporta, em seu princípio mesmo um recurso contra a realidade dada e, dessa forma, a possibilidade de uma crítica real".11

A leitura documental permite confrontar inúmeros discursos, sua funcionalidade e aplicabilidade, pois dimensionam e determinam toda uma trajetória de centenas de milhares de internos e ex-internos da FEBEM-SP.

Autores como Jacques Le Goff afirmam que todo documento é um monumento e como tal nunca é puramente objetivo, na medida em que são previamente construídos, planejados e arquitetado com interesses de determinados grupos, apresentando paradoxos e antíteses. Dessa forma, deve ser analisado, descosturado e desmontado.12

Seguindo o raciocínio de Le Goff e tendo como pressuposto teórico as contribuições de Foucault13, podemos dizer que os discursos, produzidos por determinadas instituições, são monumentos, tendo disposição própria, condições de existência e atuações práticas.14

"O que importa mostrar é que não tem por um lado discursos inertes; e por outro lado a existência de um sujeito todo poderoso que os manipula, os transforma, os renova; sim, que os sujeitos que produzem discursos formam parte de um campo discursivo; que ali tem suas possibilidades e suas funções (possibilidades de mutação funcional). O discurso é um espaço de posições e posicionamentos diferenciados para os sujeitos".15

As dimensões dos discursos encontradas, explícitas e implicitamente nos registros da FEBEM e da Casa de Custódia e tratamento de Taubaté, ajudam, em parte, a recompor as condições de existência de uma grande parcela da população brasileira: como produtores de saberes e dando horizonte às suas análises, tais discursos funcionam como catalisadores da imagem conferida a sujeitos históricos que subitamente apareceram como Hércules Quasímodo, isto é, personagens monstruosas, disseminando o medo e a desconfiança. A estas personagens não faltaram no interior da própria sociedade, aqueles que defenderam o combate, e nos limites do possível a exterminação.

Os reformatórios para menores, os presídios e os manicômios são definidos por Erving Goffman, como instituições totais, pois exercem um controle absoluto sobre as pessoas a elas destinadas.16 Foucault por sua vez denomina tais instituições como completas e autoritárias, exercendo o máximo de controle e vigilância, disciplinando cada um de seus membros. Internamente, o poder encontra-se diluído pelo espaço, operando na transversalidade das relações: todos controlam os indivíduos a eles carregados, maximizando a eficácia do poder institucional. Se para Goffman "ocorre a mutilação do eu" diluindo a individualidade do interno, para Foucault ocorre o aparecimento dos corpos dóceis, controlados, vigiados e punidos.17

Entendemos a institucionalização como um conjunto de padrões que foram criados ao longo do tempo, abrangendo diversas instâncias discursivas: o olhar de quem fala, como fala e porque fala; a situação do interno que se torna objeto a ser analisado e enquadrado em localidades previamente construídas. Enquanto objeto, o interno não tem nenhum direito: cada gesto, cada ato, confirma a necessidade de sua exclusão social. No tecido social, a institucionalização delimita as fronteiras entre o normal e o patológico, o doente e o saudável.18

O mundo da disciplina, da vigilância encontrou em Foucault um de seus mais atentos estudiosos, cujo pensamento é extremamente relevante para a análise em curso. O autor em suas obras investiga a coisificação do homem frente a diversas práticas discursivas visualizadas em manicômios e presídios

Segundo Foucault, as relações de força agem em múltiplos sentidos, de tal modo que se irradiam do centro para a periferia, de baixo para cima, apresentando portando um caráter difuso, garantindo uma relação assimétrica entre os indivíduos.

Em Vigiar e Punir, demonstrou uma nítida preocupação em entender alguns dos processos de constituição do indivíduo, sendo que, dentre eles, o processo de tal constituição será analisado por meio do mapeamento da sociedade disciplinar. O autor apresenta uma listagem dos valores que a relação de força assumiu no decorrer do século XVIII, ou seja, a divisão do espaço, o ordenamento do tempo e finalmente a composição espaço-tempo.

A internação, o enquadramento são potencializados na sociedade disciplinar, no dizer de Foucault, enquanto relações de força circunscritas à divisão do espaço, da mesma forma que a subdivisão do tempo, a codificação dos atos, bem como a decomposição dos gestos, são atributos do ordenamento do tempo.

"Pode-se dizer que a disciplina produz, a partir dos corpos que controla, quatro tipos de individualidade, ou antes uma individualidade dotada de quatro características: é celular (pelo jogo de repartição espacial), é orgânica ( pela codificação das atividades), é genética (pela acumulação do tempo), é combinatória (pela composição das forças). E para tanto, utiliza quatro grandes técnicas: constrói quadros; prescreve manobras; impõe exercícios; enfim para realizar a combinação das forças, organiza táticas".19

Em outro momento, ocorre a articulação do espaço, quer seja do manicômio, quer seja da prisão e o ordenamento do tempo numa mesma potencialidade, cujo efeito será a visualização de uma mesma área de situação, por exemplo, procedimentos de diferenciação, hierarquização dos indivíduos a serem enquadrados, internados e corrigidos.

O espaço na perspectiva foucaultiana, tem como função fazer as coisas visíveis (questão da visibilidade), possibilitando uma localização do indivíduo (cada indivíduo tem o seu lugar e todos os lugares têm sua destinação), bem como uma vigilância constante sobre seu comportamento.

As teses de Foucault sobre o poder desenvolvem-se em três direções: o poder não é essencialmente repressivo- já que incita, suscita, produz; ele se exerce mais do que se possui; passa tanto pelos dominantes quanto pelos dominados, atuando por meio da violência ou da ideologia.

As análises de Foucault mostraram que o poder produz realidade, antes de reprimir. E também produz verdade, antes de ideologizar, antes de abstrair ou mascarar: um poder não procede por ideologia, mesmo quando se aplica sobre almas, ele não opera necessariamente por meio da violência e mesmo da repressão quando esta atinge os corpos. A violência, como sustenta, Deleuze, "exprime o efeito de uma força sobre qualquer coisa, objeto ou ser, mas não exprime uma relação de poder".20

Partindo destas premissas, podemos dizer que a análise de Foucault sobre o poder é ascendente, isto pé, parte de mecanismos infinitesimais que têm uma história, um caminho, técnicas, táticas e depois examina como estes mecanismos de poder foram e ainda são investidos, colonizados, subjugados, transformados, deslocados, desdobrados, por mecanismos cada vez mais gerais e por formas de dominação global.21

A riqueza dos prontuários permite visualizar várias etapas da institucionalização do interno, por exemplo, quem são os chamados menores abandonados, infratores e o adulto prisional; como foi realizado seu processo de institucionalização a partir diferentes instâncias discursivas, mas e sobretudo possibilitam o resgate de uma memória social esquecida, como sustenta Maria Odila Leite da Silva Dias ao estudar a vida quotidiana das mulheres pobres ao longo do século XIX:

"Histórias de vida que foram se perdendo antes por um esquecimento ideológico do que por ausência de documentação. È verdade que as informações se escondem, ralas e fragmentadas, nas entrelinhas dos documentos, onde pairam fora do corpus central do conteúdo explícito. Trata-se de reunir dados muito dispersos e de esmiuçar o implícito".22

Os prontuários são documentos nos quais observamos toda a trajetória da institucionalização da criança, do adolescente e do adulto, levando-nos à impressão de que nada escapa aos olhos atentos da instituição encarregada de acompanhar e determinar todo o seu percurso, cujo ponto de partida se faz ainda no ambiente familiar, passando acompanhar, paulatinamente todos os atos, gestos identificadores de uma patologia a ser sanada.

Segundo Maria Clementina Pereira da Cunha, os prontuários são excelentes documentos históricos, pois revelam os limites da ação institucional e apesar da monotonia na qual se reveste a história de vida de cada interno, permite-nos compreender a dinâmica e todo funcionamento de instituições asilares.

"A história de vida de cada interno só pode ser compreendida quando referenciada à experiência individual e também dessa maneira incorporada à problemática histórica. Resta considerar que os processos da institucionalização configuram evidentes formas de relação ao ambiente social e, nesta medida, falam sem cessar desta mundo que os condenou ao silêncio".23

 

Metodologia de pesquisa

A pesquisa realizada, durante o doutorado, ocorreu no Setor de Documentação da FEBEM, da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté e Arquivo da Casa de Detenção , localizado no antigo Presídio do Hipódromo (2003) e na Vila Formosa (2004).

Os dados obtidos nas referidas instituições foram devidamente armazenados em um banco de dados no qual consta todos os dados relativos aos internos das instituições pesquisadas. Várias tabelas referentes aos itens idade, cor, ocupação, grau de escolaridade, motivo de internação e tempo de institucionalização foram montadas com o objetivo de compor o perfil dos institucionalizados.

Num segundo momento, passamos a registrar, em outro banco de dados, os pareceres dos técnicos das unidades (assistentes sociais, pedagogos, psicólogos, psiquiatras e dos inspetores no caso da FEBEM) e Agentes de Segurança Penitenciários (no caso da Casa de Detenção), com o objetivo de pensarmos o limite discursivo de cada um destes pareceristas, bem como a forma pela qual, ao longo de 1979 a 1992, contribuíram sobremaneira para a construção da imagem de delinqüente daqueles que passaram desde tenra idade pelo mundo asilar.

 

Resultados

Ao longo da tese, procuramos demonstrar como o espaço prisional atua sobre seus detentos, enfatizando como a violência, a intolerância e o desrespeito passam do examinador para o examinado, dos funcionários para o detento, e vice e versa, e, finalmente, como os próprios detentos exercem relações de poder uns sobre os outros: a violência é apenas um. Os microdespotismos de poder, pensados no interior do cárcere e como etapa complementar do universo dos pareceres, igualmente despótico, nos leva para fora do presídio indicando como a sociedade em que vivemos é pautada pelo autoritarismo, pela exclusão e intolerância de todos os lados.

 

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1 É doutor pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, orientado pela Profa. Dra. Maria Aparecida de Aquino. E-mail: galexarg@yahoo.com.br
2 FOUCAULT, Michel. Os anormais. São Paulo, Martins Fontes, 2001.
3 GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Rio de Janeiro, Vozes, 1995.
4 FOUCAULT, Michel. El discurso del poder. México, Fólios, 1983, p. 39.
5 Idem, p. 33.
6 Idem, p.16.
7 Lispector, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. Rio de Janeiro,
8 Foucault, Michel. El discurso del poder. México. Folios, p. 28.
9 Idem, p. 117.
10 Ricouer, Paul. Interpretação e ideologias. Rio de Janeiro. Francisco Alves, p. . 46.
11 Idem. P. 138.
12 LE GOFF, Jacques. História e memória. São Paulo. Ed. UNICAMP, 1994, p. 30.
13 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Rio de Janeiro, Vozes, 1977; Microfísica do poder. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979; História da loucura. São Paulo, Perspectiva, 1975; Os anormais. São Paulo, Martins Fontes, 2001; El discurso del Poder. México, Filois Ediciones, 1983.
14 Foucault, op. Cit, p. 74.
15 Idem, p. 71.
16 GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos, São Perspectiva, 1999, p. 27
17 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Rio de Janeiro, Vozes, 1977, p. 31.
18 RODRIGUES, Gutemberg Alexandrino. Os filhos do mundo: a face oculta da menoridade (1964-1969). São Paulo, ICCRIM, 2001.
19 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir, Rio de Janeiro, Vozes, 1977, p. 150.
20 DELEUZE, G. Foucault. São Paulo, Brasiliense, 1988, p. 47.
21 FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro Graal, 1985, p. 149-150.
22 DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. São Paulo, Brasiliense, 1995, p. 14.
23 CUNHA, Maria Clementina Pereira da. O espelho do mundo: Juquery a história de um hospício. Rio de Janeiro,Vozes,1988, p. 114.