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An. 1 Congr. Intern. Pedagogia Social Mar. 2006

 

A prática do pedagogo orientador educacional no ensino público do Distrito Federal: em rede social

 

 

Lúcia Maria de Oliveira Santis1

 

 


RESUMO

A investigação teve como objetivo identificar qual a prática do pedagogo orientador educacional na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Utilizou-se o referencial da pesquisa qualitativa, mais especificamente, os fundamentos da pesquisa oral. O universo do estudo envolveu pedagogas/ orientadoras educacionais que atuam na 1ª série a 4ª série, na 5ª série a 8ª série e no Ensino médio.
Entre outras conclusões, constatou-se que o pedagogo orientador educacional vem utilizando-se para as soluções dos problemas que se apresentam em seu cotidiano de uma rede social. Evidenciou-se que as soluções dos problemas que se apresentam na sua prática educacional, por serem de natureza diversa, fogem da competência apenas da escola, portanto tem sido necessário o tecimento de uma rede social de ajuda mútua, que envolve várias instituições e profissionais de diferentes áreas. A busca de soluções e/ou possíveis caminhos, move a vontade coletiva, e, é o fio condutor que liga e dirige a rede. A formação e o perfil do pedagogo orientador educacional são determinantes na partilha e complementação de serviços dentro de uma rede social.

Palavras-chave: Educação; pedagogo orientador educacional; pesquisa oral.


 

 

Apresentação

O presente relato tem como objetivo apresentar a investigação a respeito da prática do pedagogo orientador educacional no contexto da Escola Pública do Distrito Federal, realizada por profissionais da própria orientação educacional, ou seja, foi feito por e com orientadores. Portanto, aqui estaremos relatando da prática da Orientação e, não sobre esta. O fato de se investigar a própria prática demandou a necessidade de um distanciamento que favorecesse entender de forma mais sistemática e criteriosa o próprio trabalho.

As questões que impulsionaram o objeto de investigação e análise situam-se em torno de problemas comuns do fazer, da complexidade peculiar do trabalho do pedagogo orientador educacional, suas inquietações, a sua autonomia de trabalho, a sua formação inicial e continuada. A preocupação com a identidade do pedagogo orientador educacional, os posicionamentos voltados para a extinção da profissãoi, a busca de uma identidade profissional e reconhecimento - questão que advém desde a criação da profissão. Apesar destas questões e de algumas outras já terem sido objeto de estudo, não nos levaram a respostas satisfatórias, não contemplaram as nossas indagações.

Sendo assim, esta investigação surgiu da necessidade, do desejo de compreender e responder às questões recorrentes e significativas que permeiam a prática do pedagogo orientador educacional. A partir desta necessidade, cinco orientadoras se aproximaram com os mesmos questionamentos e, assim, resolveram realizar este estudo, tendo a sua própria prática como objeto do estudo, ou seja, cada uma inseriu-se como parte das e nas entrevistas.

Cada componente vivenciou a si mesmo como objeto de estudo e constatou-se que este exercício demandou uma leitura do passado e do cotidiano. Isto possibilitou uma radical desconstrução das imagens que cada um guardava de si e, nesse sentido, abriram-se para o vivenciar de um processo de reconstrução. Ao final, cada uma passou a reconhecer-se como artesão de si própria, não podendo mais separar o inteligível do fenomenal (MARTINAZZO, 2000:12). Esse olhar-se no espelho da prática profissional não ocorreu sem momentos de profundas angústias, mas também, de intensas (re)flexões e crescimento pessoal e profissional, propiciado pela ampliação da forma de olhar às contradições vividas no cotidiano da profissão.

O nosso referencial de investigação se volta para a abordagem da pesquisa qualitativa, tendo como universo uma amostragem de cinco orientadoras2. Duas profissionais atuam de 1ª a 4ª série, duas de 5ª a 8ª série e uma no Ensino médio. Porém, dentre estas, há as que tiveram experiências em outros espaços de escola não convencional3.

Este trabalho teve início com o depoimento oral de cinco orientadoras que compõem o grupo de investigação. O depoimento foi gravado e, depois de todo o material coletado, foi feita a transcrição das fitas para análise. A pergunta norteadora de todo o depoimento foi: O que faz o Orientador Educacional? Por meio dessa pergunta a entrevistada discorria sobre o seu fazer, sem interrupção. Após a conclusão dos depoimentos, as pesquisadoras realizavam questões que pudessem esclarecer o que havia sido dito, até mesmo para evitar interpretações descontextualizadas.

A pergunta inicial possibilitou, a cada uma das depoentes, a revelação de sua história profissional que em alguns momentos era tecida pela história pessoal. Essa reconstituição da trajetória, também, provocou um processo de seleção e interpretação do que estava guardado na memória e, conseqüentemente, um desnudar-se perante as outras (MARTINAZZO, 2000).

Do material coletado e com base na análise de discurso (ORLANDI, 1999), examinou-se os temas recorrentes a todos os depoimentos. Com estes dados sistematizados foi possível perceber quais os fundamentos teóricos necessários para as possibilidades de leituras e interpretações da prática descrita.

A perspectiva deste trabalho é contribuir, portanto, para o processo de (re)flexão em, pela e para a ação dos pedagogos orientadores educacionais.

 

A metodologia de pesquisa

A metodologia adotada para a investigação teve como referencial os fundamentos da pesquisa qualitativa, mais, especificamente, as bases da pesquisa oral (ALBERTI, 1990). Nesta, as entrevistas foram realizadas de forma aberta e não dirigida, isto é, sem questões rigidamente prefixadas, privilegiando o pesquisado. Nenhum roteiro foi seguido sistematicamente. O diálogo foi realizado no campo específico do informante e para isto ocorrer, formulou-se uma questão abrangente: O que faz o Orientador Educacional? Essa questão desencadeou, de maneira espontânea, o discurso articulado e encaminhou o depoimento dentro de uma ordem seqüencial que em grande parte foi dirigida pelas entrevistadas.

As entrevistadoras estavam cientes de que na pesquisa qualitativa, necessariamente, o pesquisador está implicado em toda sua estrutura social, assim como este implica os outros por meio do seu olhar e de sua ação singular no mundo. E, com a compreensão de que as ciências humanas são, essencialmente, ciências de interações entre o sujeito e o objeto de pesquisa, experienciaram este processo de forma dialética, no qual o tempo todo se fez presente a articulação entre a "implicação e o distanciamento, a afetividade e a racionalidade, o simbólico e o imaginário, a mediação e o desafio, a autoformação e a heteroformação, a ciência e a arte" (BARBIER, 2002:18).

A escolha das profissionais pesquisadas foi de fundamental importância, uma vez que naquela metodologia supõe-se que as informações recebidas terão valor irrefutável, não apenas porque as entrevistadas testemunham fatos e acontecimentos, mas também porque atestam relações implícitas, tensões, conflitos, sentimentos, ideologias que refletem com fidedignidade os traços de uma época e de uma prática profissional.

Todos os dados obtidos nas entrevistas foram relevantes. Às entrevistadoras coube dirigi-las, ao formar a pergunta inicial, com o cuidado de não induzi-la. A narrativa obtida se definiu por sua própria lógica.

O documento resultante é mais do que uma simples memória, é mais do que uma compilação de opiniões e dados informativos, porque revela o contexto da prática do pedagogo orientador educacional na época atual.

As investigadoras não usufruíram de imunidades profissionais preservadas, pois ocuparam uma posição que não foi nada cômoda; vivenciaram o movimento duplo de pesquisadora/pesquisada, o que provocou mais que (com)partilhar valores, conflitos e convicções (CAMARGO e NUNES, 1977). Também construíram um distanciamento/aproximação para entender de forma sistemática e criteriosa o próprio trabalho, com a finalidade de problematizar questões não antevistas, trazendo à discussão temas relegados em sua memória.

Ainda com relação àquelas, foram orientadas no sentido de evitar dispersões ou dissociações durante as entrevistas, assim como se responsabilizaram pela orientação das entrevistas e pelas decisões acerca da mudança quando as questões anteriores já tinham sido exaustiva e satisfatoriamente respondidas. Primou-se em não induzir declarações por parte das entrevistadas em sentido contrário aos seus desejos explícitos, por se acreditar que tal fato não é adequado neste tipo de pesquisa; além de se resguardarem do diálogo cruzado entre as pesquisadoras. Certas de que era muito mais importante o dizer do depoente do que a revelação por meio de terceiros, isto é, das entrevistadoras. O que não impediu que em alguns momentos se completasse o pensamento das depoentes.

A partir dos dados coletados, elaborou-se o estudo teórico e estabeleceu-se um diálogo entre as teorias e os dados. Este confronto teoria/prática revelou a multiplicidade da investigação a respeito do fazer do pedagogo(a)/orientador(a) educacional.

Durante todo o processo dessa pesquisa procurou-se manter o rigor científico, porém, se abriu mão da obsessão desse rigor que, com certeza, levar-nos-ia a perder de vista a "complexidade crescente do Potencial Humano" (BARBIER, 2002: 67) e à "ilusão de querer[mos] beber o oceano do real com o canudinho de um conceito"4.

 

Resultados da Investigação

Compreendeu-se que o exercício de uma profissão é feito de movimentos contraditórios, de avanços e recuos, na forma de concebê-la e, portanto, de exercê-la. Movimento que está diretamente implicado com as questões conjunturais e estruturais mais amplas da sociedade, desde os seus aspectos políticos, econômicos, sociais até as diferentes formas de conceber a própria ciência. Onde muitas vezes convive ao mesmo tempo formas completamente díspares de conceber e agir, não podendo se dizer que em determinado época só havia esta ou aquela forma. Pode-se afirmar apenas que dependendo do contexto havia a predominância de uma concepção e forma de ação entre os profissionais.

Constatou-se, também, vários pontos comuns de atuação deste profissional dentro do contexto escolar, manifestos de forma recorrentes no discurso das entrevistadas. Estes pontos evidenciaram os campos de ação predominante do pedagogo orientador educacional nas escolas da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal: o envolvimento com o projeto político-pedagógico; a participação nas coordenações pedagógica da escola; as questões envolvidas com as dificuldades de aprendizagens; as questões disciplinares; problemáticas emergentes dentro da escola (drogas, sexualidade, violência); a relação escola/família; a participação na construção da memória da escola por meio dos registros de suas ações; a participação nos movimentos sindicais e, sobretudo, a relação que o pedagogo orientador educacional exerce em sua prática ao tecer uma rede social com outras instituições, entidades, profissionais e, até mesmo, instituições formadoras desse profissional.

Nesse relato, especificamente, apresenta-se, dentre os pontos comuns da prática do profissional pedagogo orientador educacional, apenas aquele que consiste em seu agir por meio de uma rede social.

 

A prática do Pedagogo Orientador Educacional em Rede Social

O profissional da Pedagogia/Orientação Educacional, como qualquer outro profissional, atua dentro de um contexto sócio-político e científico. Na busca de um senso crítico frente a sua atuação, está sempre presente a busca da reflexão a respeito de sua práxis para, assim, encontrar outros sentidos, outras formas de ação. Nesse percurso percebe que para a solução de muitas questões que surgem em seu cotidiano, é necessária a co-construção de uma experiência coletiva que traga alternativas de transformação para a realidade.

Sendo assim, entre as profissionais pesquisadas, constatamos que sua prática vem cada vez mais evidenciando a clareza de que a educação é um meio fundamental para o desenvolvimento da consciência social dos cidadãos, para o (re)conhecimento e a (re)definição de seus direitos e deveres. Assim como o saber do conhecimento sobre os direitos e os deveres dos indivíduos na sociedade possibilita uma tomada de consciência que o leva a se organizar em grupo nas lutas pelos direitos sociais (GOHN, 1999).

Na certeza de que é impossível a construção de um mundo mais humano se escolhemos o isolamento social é que os profissionais da Orientação Educacional foram comprovando que a forma tradicional de se pensar o trabalho, seja ele educacional ou social – onde cada um ficava isolado no seu setor e/ou campo de ação, atuando como se fosse o único trabalho possível de se realizar - não produzia resultados que pudessem contribuir para uma vida em coletividade.

Assim, perceberam que, no contexto atual, as instituições já não contam com as condições de trabalho que tinham até alguns anos atrás, quando o assistencialismo e as medidas repressivas eram as principais estratégias para tentar conter os problemas sociais de fome e de pobreza e/ou educacionais. Pois, como afirma Ude (2002), trabalhar de forma interdisciplinar, em que se trocam saberes, crenças e experiências diferentes, não significa perder a própria identidade. Esta clareza se encontra na fala de uma profissional pesquisada, quando diz:

"Tem uma coisa que aprendi na outra escola que é fazer um teste elementar de ortóptica – essas crianças que têm troca de letras, dificuldade de concentração, muita dificuldade no cálculo lógico-matemático. Com todas essas crianças fui tentando fazer um teste – primeiro só com aquelas da aula de reforço e sempre explicava para os pais, apresentando uma entrevista da ortoptista, e de certa forma encaminhando-as. Aqueles que se interessavam, levaram os filhos lá. Tinha um fator que me ajudava muito nesse sentido, porque tem neto de professor na escola que já foi tratado nessa especialidade, tem filho da diretora, da vice-diretora, todos eles já conheciam essa profissional, e isso ajudou demais. Em função disso, claro, as crianças já estavam encaminhadas para a equipe de psicodiagnóstico. Eu participo dessas reuniões quando a professora é chamada, eu tento ir também. São reuniões muito produtivas" (Orientadora Educacional - entrevistada B)

Também identificamos que aquela consciência foi se dando à medida que no aprendizado do exercício da profissão vão adquirindo informações dispersas, que vão sendo agregadas e dando uma coesão, sobre como funciona outras especialidades profissionais, outras instituições, outros órgãos públicos etc. Porém, é neste movimento que o profissional identifica os interesses envolvidos e, com isso, cria estratégias e táticas na garantia dos direitos sociais dos alunos e seus familiares (Ude, 2002). Pois como afirma uma outra profissional pesquisada:

"Então, eu também fazia alguns trabalhos com alunos que tinham mais dificuldades, você tem alunos que de repente estão sofrendo abuso sexual, tem alunos que têm dificuldade de integração na escola e aí existe uma discriminação, uma dificuldade. Então eu comecei a dar início ao ensino especial, a aprender a cuidar desses casos também, numa dimensão mais individual, muito mais micro mesmo, e aí fazendo contatos com instituições como o SOS criança, por exemplo, buscando leituras que me fizessem fundamentar aquele trabalho, e aí eu fui percebendo que além da minha atuação na escola, tinha outras instituições que precisavam estar junto com a escola, como o SOS criança e a Vara da Infância e, assim comecei a ter contato com algumas famílias, conversar com os pais sobre esses alunos que, em geral, os professores colocam mesmo pelo amor de Deus me ajude porque eu não estou dando conta" (Orientadora Educacional - entrevistada C).

O exercício da prática cotidiana dos profissionais da orientação educacional com as questões sociais que adentram a escola possibilita a obtenção de um acúmulo de experiência, onde tem importância a vivência no passado e no presente para a construção do futuro (GOHN, 1999:18). Aprendem a não ter medo do que lhe foi inculcado como proibido e inacessível. Aprendem a decodificar o porquê das restrições e privações. Aprendem a acreditar no poder de fala e das idéias quando expressas em lugares e ocasiões adequadas. Aprendem a calar-se e a se resignar quando a situação é adversa. Aprendem a elaborar discursos e práticas segundo os cenários vivenciados. E aprendem, sobretudo, a não abrir mão de princípios que balizam determinados interesses como seus. Ou seja, elaboram estratégias de conformismo e resistência, passividade e rebelião, segundo os agentes com os quais se defrontam.

Isso tudo porque se tornam cientes do processo de velamento das diferenças sociais existentes e, conseqüentemente, conscientizam-se dos distintos interesses de classes presentes na sua cotidianidade de trabalho (op. cit. p. 19).

Aquele aprendizado é evidente na fala de uma entrevistada quando comenta a sua experiência nos primeiros tempos de exercício profissional na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, pelos anos de 1984 a 1986, quando participou da elaboração, implementação e implantação de um projeto educacional na cidade satélite do Gama, que envolvia órgãos como Unicef, Sesi, Unicamp, UnB, entre outros. Este projeto surgiu pela constatação do serviço de Orientação de que algo deveria ser feito com o coletivo dos profissionais da Escola para amenizar ou colaborar com possíveis mudanças na realidade dos alunos e de sua comunidade em geral que residiam ao redor da escola que ela trabalhava. Essa realidade, entre outras características, se apresentava com um estado de extrema pobreza, desemprego, violência etc. Na perspectiva de transformar minimamente a realidade, criaram um projeto que envolvia diversas oficinas de trabalho e artes, tanto para os alunos como para a comunidade. Tal projeto, encampado pelo grupo da escola, se evidenciou nacionalmente com seus resultados positivos para todos os envolvidos, porém, trouxe conflitos de interesses, como é por ela afirmado:

Eu queria até deixar claro para vocês que a nossa resistência não foi tão grande porque a comunidade que era a nosso favor começou a ser ameaçada por pessoas da administração e por pessoas rivais da liderança comunitária. Foi uma estratégia que eles usaram, como as pessoas eram muito pobres, muito necessitadas, elas ficaram amedrontadas e nós perdemos o aval da comunidade. É importante colocar que esse projeto não era um projeto de governo, era um projeto que tinha sido criado por uma escola com um determinado grupo de professores, financiado por instituições internacional e nacional, e, que teve repercussão fora do Distrito Federal cujas estrelas não eram pessoas do governo, nem tampouco da Fundação Educacional5. Isso mexeu com o ego das pessoas (Orientadora Educacional - entrevistada E).

Práticas como a daquela orientadora e de seu coletivo são frutos de idéias e práticas que fluem e refluem. As idéias persistem e se transformam, agregando elementos novos, ou negando velhos, segundo a conjuntura dos tempos históricos (GOHN, 1999:101).

Tal aprendizado possibilitou ao pedagogo orientador educacional ir adquirindo uma visão sistêmica do contexto escolar e, assim, perceber que as soluções dos problemas em educação não se encontram em um olhar linear, ou seja, nas causas e efeitos da relação do indivíduo com a sociedade.

Aprendeu a investir em uma compreensão circular e global, onde todos os atores são responsáveis pela ação, individual e coletiva, compreendendo que a atitude de um influencia a do outro. Essa forma de olhar a realidade fez com que o profissional reconhecesse e visse que o pedagógico é entremeado de um processo dinâmico e complexo no qual a interação e a comunicação exercem capital influência e que os educadores são auxiliares na transformação do indivíduo que aprende (BAPTISTA, 1998).

Sendo assim, ao olharem para os problemas de ensino, aprendizagem e comportamento etc., no contexto educacional (por ser desse contexto que tratamos, mas poderia ser outro), descobrem que para cada problema detectado na realidade há uma teia de relações que são intrinsecamente dinâmicas. Ao se definir um problema no cotidiano, toda nossa subjetividade se faz presente e esta ou aquela situação é parte de um processo que gera conhecimento. E constatam que ao buscar as soluções dos problemas educacionais, não será apenas a escola que as apresentará ou resolverá, para tanto é necessário tecer uma rede social de ajuda mútua, onde o objetivo comum será o fio condutor de ligação e direção da rede.

Isto evidencia que a vontade coletiva possibilita muita mais a encontrar possíveis caminhos e/ou soluções. Aprendem, também, que na construção dessa rede não se pode esquecer que descrever a realidade, seus problemas e soluções será sempre uma descrição aproximada, visto que não podemos dizer que este ou aquele tem a compreensão completa e definitiva da realidade (BAPTISTA, 1999; WHITAKER, 2003).

Numa rede social todos são iguais, todos têm iniciativa, todos são sujeitos de sua ação e co-responsáveis pela ação da rede, todos guardam sua liberdade. Mas pode haver uma distribuição de funções – é o elo básico das redes, como vimos. Mas ela não acontecerá de forma espontânea e desorganizada: ainda que necessária e vital, os integrantes de uma rede tem de saber a quem enviar informações e como as enviar, assim como, a quem pedir informações e como pedi-las (WHITAKER, 2003: 7/8). Tal ação se evidencia no depoimento de outra entrevistada:

"Busquei várias informações sobre este aluno, na escola que estudou, na justiça, onde tinha uma queixa de uma pessoa da direção que se sentiu ameaçada e, a justiça chamou e, na audiência, a escola colocou como condição que ele tivesse um acompanhamento psiquiátrico, percebi a importância de se trabalhar em rede e, que eu sozinha, não poderia nem compreender, nem contribuir nas questões do contexto, da família, e da escola. Então, assim não somos a pessoa que vai resolver, mas, buscar caminhos e diálogos com os sujeitos e instituições envolvidas, que vai convidar profissionais que possam falar sobre aquilo. Então, é muito mais para favorecer que o grupo entenda melhor, e, buscar outras instituições que precisam se comprometer também com aquela questão, que é individual e, que é social, também. Então, eu busquei os estudos de saúde mental, busquei as psicólogas da justiça que já tinha conversado com ele, li registros. Então, assim, busquei outras pessoas que poderiam ir lá como convidados pra discutir com os professores essa questão. Então, tudo isso, o tempo todo, fazendo essa trajetória, estudo, visitas, reunião, inclusive, das psicólogas com a mãe que nunca havia sido localizada, com a turma dele, da equipe e do aluno com a equipe" (Orientadora Educacional entrevistada C).

Trabalhar dentro de uma perspectiva de redes sociais implica tentar reconstruir nossa maneira de enxergar e compreender o mundo em que vivemos. Significa admitir que tudo está em relação com tudo e que não há como isolar uma parte sem considerar o todo e nem trabalhar o todo desconsiderando suas partes mais específicas, pois, na partícula mais minúscula do universo, encontramos a complexidade que o caracteriza. As tradicionais tentativas de isolar elementos de um sistema num ambiente totalmente imune são impossíveis e ilusórias para quem concebe o mundo funcionando em constante interação - ora passando por momentos mais regulados, ora por conflitos e contradições (UDE, 2002: 127). Adotar essa postura diante da vida representa assumir a busca de uma prática e de uma ciência mais ativas e mais conscientes (MORIN, 1996).

A construção de redes sociais – entendidas como estratégia de retomada de uma vida coletiva e solidária - possibilita, frente ao atual quadro social de altos índices de exclusão e de marginalização, o resgate dos vínculos sociais e da sociedade civil como um todo. Essa construção não se efetiva sem grandes desafios, pois contradiz a lógica do sistema dominante. No entanto, esse argumento não serve como justificativa para que seres humanos permaneçam desgarrados do nosso tecido social. Sendo assim, que se façam laços e se constituam muitos nós nas redes que podemos e devemos tecer (UDE, 2002:138). Assim manifesto em um depoimento:

"Fiquei com o papel de buscar informações sobre esse aluno, de ouvir a mãe, pessoas da secretaria de educação, do ensino especial, da UNB que estuda sobre super dotação e, assim, realmente buscar subsídios e apresentar pra que as pessoas tomassem uma decisão de forma mais consciente" (Orientador Educacional C entrevistada).

Portanto, é importante que os educadores devolvam aos sujeitos envolvidos em seu trabalho a competência que eles têm para pensar e entender seus próprios problemas e sofrimentos, evitando, assim, que fiquem submissos às perspectivas de um outro que, supostamente, teria a plena capacidade de definir suas vidas. Essa possibilidade só se efetiva em espaços de conversação, onde segredos e demandas sejam revelados e compartilhados por todos os participantes de uma maneira sincera e em um clima de confiança e de ética coletiva. Nesse contexto educativo, o educador e/ou trabalhador social se posiciona como um promotor de encontros, onde articula redes de apoio e ajuda mútua (UDE, 2002).

No entanto, segundo Ude (2002 apud Habermas6, 1989) aquele deve capacitar-se para escutar o não dito – aquilo que está por trás do aparente ou do manifesto, pois apresenta níveis mais profundos de compreensão. Com essa meta, busca-se compreender o outro para que ele se compreenda e, com isso, toda rede que participa do processo possa elaborar suas próprias reflexões críticas. Contudo, torna-se fundamental o desenvolvimento de uma perspicácia que habilite o educador social a formular boas perguntas com o intuito de estabelecer diálogos que provoquem novas construções, ou seja, propostas e ações que vão além do que já se conseguiu construir (UDE, 2002:131).

O pensar, o agir em rede possibilita aos sujeitos sociais produzirem intervenções nos mais variados espaços/tempos, pois estes percebem a realidade a partir das relações vividas a partir das produções sociais e de uma nova subjetividade coletiva. A complexidade do conhecimento comum deve permitir a permeabilidade a outros conhecimentos, deve estar aberta ao debate, não no sentido da disputa pura e simples de idéias, mas no sentido do ouvir o outro, de perceber a diferença, de notar a diversidade e aceitá-la (BASTOS, 2000).

Afirma-se, então, que não se quer crer que exista um conhecimento acabado, hermético e por isto superior. Todo conhecimento é produzido historicamente em uma perspectiva de superação das delimitações indicadas anteriormente por outra forma de apreensão da realidade. Sendo assim, o conhecimento é sempre provisório e está em processo contínuo de construção na relação direta do sujeito investigador/experimentador com o objeto experimentado/investigado, em um movimento contínuo de ida e volta entre ação/reflexão/ação (BASTOS, 2000: 24/25).

Perceber a construção do conhecimento em rede é admitir a não linearidade em seu processo, a possibilidade de seus múltiplos percursos e variáveis indeterminadas em que nenhum dos caminhos se sobrepõe em importância ou valor sobre os demais. A rede – para entendermos o conhecimento em seu processo de construção nos indica o entrelaçamento em seu processo de construção – nos indica o entrelaçamento de suas vias na constituição de nós, conexões e relações de reciprocidade, que impossibilitam pensarmos nos saberes como elementos estanques, compartimentados e isolados uns dos outros. Desta forma, em rede, o conhecimento deve ser pensado na interação de seus muitos caminhos – no dialogo entre eles, na consolidação de espaços/tempos de troca – que se dão na relação direta ou indireta dos fios/saberes da malha da vida (BASTOS, 2000).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como demonstramos, o pedagogo orientador educacional está encaminhando as soluções para os problemas que se apresentam em seu cotidiano por meio de uma rede social, porque não se coloca como o único que pode pesquisar possíveis soluções, ele tece um envolvimento com os familiares, os professores, as áreas de saúde, o serviço social, o judiciário, os conselhos tutelares, a vara de infância, as universidades etc. Isto resulta do seu aprendizado já que como profissional, sozinho não é capaz de compreender a complexidade do que acontece no cotidiano de uma escola, assim como nenhum outro profissional desta escola ou fora dela é capaz de tal tarefa só com a visão de sua área. Pois, como diz Garcia (1999:97), na complexidade de uma escola aqueles que se apresentam como portadores da verdade e das soluções! Ou, que pensam nunca errar e, que por isso não serão julgados, ou avaliados como eles mesmos gostam tanto de dizer, sem se incluírem no processo! Na realidade escondem por trás disso um desejo de onipotência, um grande corporativismo e muito medo.

Dessa forma, podemos tecer algumas considerações e (re)flexões a partir desse estudo de que o conceito de pedagogia/orientação educacional e, portanto, da sua prática, modificou-se com o tempo, mas não se modificou a essência da Orientação, que é ajudar o outro no seu projeto de vir-a-ser. Esse outro não é um indivíduo qualquer, mas uma pessoa, um ser humano real, concreto, histórico que se move na teia de relações que o sujeito e o pedagogo orientador educacional estão contextualizados, ou seja, a orientação educacional colabora com o individual, mas não deixando, em momento algum, de olhar para o individual inserido no coletivo, no político e no social. O pedagogo orientador educacional tem um compromisso explícito com os valores políticos da educação que buscam colocar o ser humano como o centro de toda medida onde a pessoa humana é definida não só nos discursos políticos, mas também, na ação das políticas, como o valor fonte da educação.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BARBIER, René. A pesquisa-ação. Brasília: Plano Editora, 2002.

BAPTISTA, Maria Cecília Veluk Dias. Família na Educação. Linhas críticas, v.4, n.7-8, jul./98 a jun./99. Revista da FE-UNB.

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CAMARGO, Aspásia A. e NUNES, e Márcia B. M. Como fazer uma entrevista? IN: Projeto de pesquisa: História Social da Ciência no Brasil. Grupo de Estudos sobre o Desenvolvimento da Ciência – GEDEC/Documento de trabalho nº. 12, CPDOC, 1977.

GARCIA, Regina Leite. Atravessando Fronteiras e descobrindo (mais uma vez) a complexidade do mundo. IN: O sentido da Escola/ Nilda Alves e Regina Leite Garcia (orgs.) – rio de janeiro: DP&A, p.81-110, 1999. (coleção o Sentido da Escola).

GOHN, Maria da Glória Marcondes. Movimentos Sociais e educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999.

MARTINAZZO, Celso José. Introdução. IN: História de vida de professores: formação, experiências e práticas. Org. Celso José Martinazzo. ---Ijuí: Ed. UNIJUÌ, 200. (coleção Educação).

MORAES, Marcílio e FARAH, Paulo C. Da linguagem oral à linguagem escrita. IN: Projeto de pesquisa: História Social da Ciência no Brasil. Grupo de Estudos sobre o Desenvolvimento da Ciência – GEDEC/Documento de trabalho nº. 12, CPDOC, 1977.

MORIN, Edgar. Ciência com Consciência. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1996.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos.—Campinas, SP: Pontes, 1999.

PIMENTA, Selma Garrido; GARRIDO, Elsa; MOURA, Manoel O. Pesquisa Colaborativa na escola facilitando o desenvolvimento profissional de professores. Texto apresentado na 24ª reunião da ANPED, 7 a 11 de set.. 2001, Caxambu - MG; http://WWW.anped.org.br(24)ts3.doc, em 24/10/2005.

UDE, Walter. Redes Sociais: possibilidade metodológica para uma prática inclusiva. In: CARVALHO, Alysson...[et al.]. (Org.). Políticas Públicas. Belo Horizonte: Editora UFMG; Proex, 2002.

WHITAKER, Francisco. Rede – uma estrutura alternativa de organização. Em 02/05/2003. endereço eletrônico: http://www.rbc.org.br/rede_alterna.htm

 

 

A formação do pedagogo(a)/orientador(a) educacional se dá, e/ou, ocorria, como uma habilitação dentro da pedagogia. Porém, com as discussões que passaram a ocorrer de forma sistemática a partir de 1979, a respeito da formação dos profissionais da educação, e, em especificidade do pedagogo, muitas mudanças têm ocorrido, entre elas a formação do orientador educacional como uma especialização da pós-graduação. Como afirma Fonseca (2005), nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais freqüente o apelo ao caráter multidimensional da pedagogia, como campo de conhecimento, e, por conseguinte, a reivindicação de seu alcance a diversas esferas da prática social. Com isso, cada vez mais ganha relevo o discurso que busca apontar e justificar a ampliação dos espaços de atuação profissional do pedagogo, para além do ambiente escolar e da chamada educação formal. Porém, alerta o autor (op. cit) que é necessário a reflexão a respeito deste alargamento do campo de exercício profissional do pedagogo, pois, quem sabe com isso não se esteja colaborando para uma redução teórico-conceitual da pedagogia que, limitada a uma dimensão meramente técnica e instrumental, coloca-se a serviço dos interesses do mercado e dos processos produtivos, esvaziando o seu sentido enquanto campo de reflexão sobre a formação humana, orientada para uma perspectiva de emancipação social. Tal suspeita, no dizer de Fonseca (op.cit), se evidencia na ocorrência de fenômenos que parecem contraditórios, como é o caso, por exemplo, da crescente expansão dos cursos de Pedagogia, mesmo diante da permanência dos impasses e indefinições em torno das Diretrizes Curriculares para o curso no âmbito do CNE, num prolongado processo de discussão que vem envolvendo diferentes instâncias que lidam com o curso de Pedagogia, desde instituições formadoras, entidades acadêmicas e científicas (ANFOPE, ANPED, CEDES, ANPAE, FORUMDIR), passando por comissões de especialistas no âmbito do CNE, sem que se alcance um consenso razoável.
FONSECA, Fábio do Nascimento, (06/07/2005). Acerca da ampliação dos espaços de atuação profissional do pedagogo: inquietações, ponderações e cautelas.
Site: http://www.fabiofonseca.siteonline.com.br/download.jsp; e/ou http://www.aulas-partic.com.br/BibliotecaRelatorio.asp?id_AssuntoBiblioteca=1409&seq_AssuntoBiblioteca=1; acessado em 30/01/2006.
1 É Mestre em Educação pela UNB/Brasília/DF, Pedagoga/Orientadora Educacional na Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SE/DF), e-mail: luciasantis@ig.com.br e coordenadora do grupo de pesquisa composto por: Marilene de Albuquerque Ramos, Mestre em Educação pela UNB/Brasília/DF, Pedagoga/Orientadora Educacional SE/DF, e-mail: lene.ramos@terra.com.br; Iliana da Silva Fonseca, Pedagoga/Orientadora Educacional SE/DF, e-mail: ilianafonseca@pop.com.br; Luciana de Faria Leite M. Viera, Pedagoga/Orientadora Educacional SE/DF, e-mail: lulli32@hotmail.com.br e Rosa Magnólia Lira, Pedagoga/Orientadora Educacional SE/DF, e-mail: rosamlira@bol.com.br.
2 Esclarecemos que o grupo investigado era composto de cinco profissionais do sexo feminino.
3 Espaço escolar não convencional se refere aos projetos educacionais desenvolvidos pelo Governo do Distrito Federal com meninos e meninas de rua em ambientes fora da escola formal, como por exemplo, num Circo ao lado da Rodoviária do DF e na Ação Social do Planalto-ASP.
4 (Barbier apud Morin, 2002:86).
MORIN, Edgar. Entretien (diálogo). Sociétes, Approches méthodologiques, Paris, n. 42, p.335-349, 1993.
5 A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal tinha em sua estrutura administrativa uma Fundação, denominada Fundação Educacional do Distrito Federal, que foi extinta na reforma administrativa do Governo do Distrito Federal em 2001.
6 HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989.