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An. 1 Congr. Intern. Pedagogia Social Mar. 2006

 

Pedagogia social: impasses, desafios e perspectivas em construção

 

 

Profª Drª Maria Stela Santos Graciani1

 

 


RESUMO

Este é um texto elaborado especialmente para o I Congresso Internacional de Pedagogia Social, sabiamente organizado por Roberto da Silva, e que coloca a Universidade de São Paulo no centro de uma discussão absolutamente necessária no Brasil. Neste texto, vou fazer algumas homenagens, relembrar alguns dos percalços pelo qual passou a Pedagogia Social de Rua, construída na PUC de São Paulo, historiar o embate entre Educação e Serviço Social e apontar algumas questões que acho importantes para a construção de um campo de saber denominado Pedagogia Social. Tanto quanto possível, vou apresentar minhas contribuições à fundamentação teórica e metodológica das Pedagogia Social, baseado na experiência que acumulei ao longo destes anos trabalhando as questões sociais no Brasil.

Palavras-chave: pedagogia social; pedagogia social de rua; mapa da exclusão social; fundamentos da educação


 

 

"Reparai (...) entre o semeador e o que semeia há muita diferença (...) o semeador é o pregador é o nome; o que é o que prega é a ação; a as ações são as que dão o ser ao pregador. Ter o nome pregador, ou ser pregador de nome, não basta importa nada; as ações, a vida o exemplo, as obras, são as que convertem o mundo. (...) hoje pregam-se palavras e pensamentos; antigamente negava-se palavras e obras. Palavras sem obras são tiros sem balas: retroam, mas não ferem o pregar que é falar, faz-se com a boca; o pregar que é semear faz-se com a mão. Para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração, são necessários obras"

Pe. Antonio Vieira

Há 30 anos atrás, as questões proeminentes que preocupavam os cientistas sociais, educadores, eram temas ligados ao desenvolvimento econômico, a modernização, a participação política, a democracia ou a mobilidade social ligadas direta ou indiretamente a educação. Hoje a pobreza e a exclusão social, são temas dominantes, que requerem imediatamente atenção e definição de foco, no âmago da totalidade socio-econômica das que geram pobreza, desigualdade social e injustiças para a maioria da população excluída da sociedade. Sem dúvida, nunca estes temários estiveram ausentes da discussão e do debate social, no entanto, hoje se colocam em primeiro plano, no que se referem às perspectivas paradigmáticas e conceituais, ligadas diretamente a políticas públicas concretas e emergentes, além de necessárias e urgentes.

O quadro ou o cenário da realidade é profundamente complexo, em relação aos acontecimentos históricos, aos valores, interesses econômicos contraditórios, as causas e efeitos geradores da exclusão social que requerem e exigem uma reconstrução histórica profunda com identificação refeita e redimensionada de concepções reconstruídas e reconceitualizadas do ponto de vista holístico, heurístico e interdisciplinar.

Neste amplo cenário sócio-econômico-cultural, reaparece a educação, cuja má qualidade, a falta de formação de seus agentes, a pouca infra-estrutura onde ocorre, dentre outros inúmeros fatores, também é responsável pela pobreza, pela desigualdade e exclusão social, não só no Brasil, mas em todas as regiões latino-americanas, reafirmadas em estudos e pesquisas que comprovam esta relação, seja por falta de recursos, instrumentos e ou mecanismos para a melhora de qualidade da educação e o plena êxito do aprendiz no que se refere ao seu espírito crítico, criativo e participativo, a partir de uma aprendizagem competente e conseqüente, ampla e inquietante, questionadora e discernida. Há um movimento em marcha, na sociedade global, onde as manifestações da sociedade civil, se propõe, a novas crenças e capacidades de organizar-se, mobilizar-se e conquistar, por si própria, aquilo que os setores públicos não conseguem proporcionar, frente a pobreza e a exclusão.

No artigo 7° da Constituição Brasileira de 1988, há uma listagem de 34 itens que consagram a noção de que, além dos direitos políticos, os cidadãos brasileiros também tem obrigatoriamente direitos sociais, que vão desde o direito ao emprego e a educação até o direito ao atendimento, pelo setor público, de suas necessidades de saúde, lazer, seguro social, dentre outros. Parece óbvio, a execução destes direitos, mas ainda estamos muito longe de começar a concretizar esta jornada.

Na sociedade brasileira, portanto os processos de exclusão passam por acesso a emprego, renda e benefícios do desenvolvimento econômico restrito a determinados segmentes da sociedade. A economia brasileira se situa entre as mais desenvolvidas da região, mas socialmente geram níveis de exclusão e desigualdade entre os países piores do mundo, muitas pesquisas apontam, de os pobres vivem com até US$ 1 por dia por mês. A pobreza é urbana localizada nas periferias das grandes cidades e constituída por pessoas em grande parte oriundas do campo, ou de regiões pauperizadas do Brasil, como é o nordeste.

Há uma análise geral feita por especialistas de que não só a desigualdade da renda no país são determinantes, mas incluem a diferença de educação. Com a escassez da educação, relacionada a pobreza, há necessidade de reverter e alterar substantivamente esta situação: com aumentos significativos de custos, programas focalizados nas necessidades, com políticas redistributivas2.

O conceito de exclusão, portanto se liga aos diagnósticos da pobreza e da desigualdade, por não propiciarem efetivação da cidadania, apesar da legislação social e do esforço das políticas públicas, assim não pertencem a comunidade política e social, uma vez que não tem acesso ao consumo dos bens e serviços de cidadania.

Portanto a concepção de exclusão social, é inseparável do conceito de cidadania e se refere aos direitos que as pessoas têm de participar da sociedade e usufruir dos benefícios e bens produzidos por ela. Sejam os direitos civis, políticos e sociais definidos como: aqueles que protegem o cidadão contra o arbítrio do Estado, facultando direito de ir e vir, se expressar com liberdade; enquanto os direitos políticos facultam o papel do cidadão na organização política de sua comunidade, votar, ser votado, etc.; enquanto direitos sociais se vinculam a vida digna e a convivência social, educação, saúde, trabalho dentre outros.

Reafirma-se outras formas de inclusão social cidadã quando se concebe e se preenche ausências de mecanismos de participação e contrôle como conselhos paritários – Estado e Sociedade Civil – orçamentos participativos e a implementação de organizações não governamentais e movimentos sociais que emponderam as políticas públicas.

As contribuições positivas da educação para a sociedade destacam-se duas: a reorganização da cidadania, pela criação de uma ordem mais justa, fraterna e o desenvolvimento da habilidades, competências para a vida, que permitam menos exclusão e desigualdades sociais e econômicas, levando-se em conta a diversidade e o multiculturalismo, com valorização de valores cívicos, culturais, sociais e morais, com ênfase no meio ambiente e na ética, além da pluralidade cultural balizadas pelo conhecimento científico, técnico e humanista na formação dos aprendizes. A educação é uma atividade para vida, que ocorre na família, na rua, na igreja, no trabalho, na escola e em todos os espaços sociais.

 

Pedagogia Social: uma obra em construção

"A mão estendida é o início do abraço, esta é a nossa intenção, o ponto de partida, o marco inaugural do longo processo de busca da justiça, da liberdade, da igualdade... nossa utopia. Vamos ampliar os limites de nossas fronteiras na composição do novo. Vamos ousar... invadir o interior das pessoas... causar uma reviravolta... revelando e revisando desejos, prazeres, paixões. Junte-se a nós."

Pe. Antonio Vieira

Ao escrever pensando este texto, vivencio um dos momentos mais íntimos e significativos de meu trabalho no âmago de minha vida. É por ele que vivi, refleti, estudei agi e construi em todos os domínios da educação, e que creio, e que edifico e o que espraio nas ações educativas que desempenho. É no seio de todos os espaços que elabora, crio e recrio, que nascem as palavras e as ações que dão sentido ao ato que executamos diante da comunidade de educadores que nos cercam, em todos os lugares onde ocupamos qualquer território: escola, família, rua, igreja, comunidade. São momentos perenes onde o diálogo rompe o silêncio dando espaço para a conversa, circulando o ato de aprender e de ensinar simultaneamente3.

Foi a pedagogia freireana, que possibilitou esta reflexão e ação junto aos mais pobres e excluídos da sociedade. Foi esta relação social educativa que permitiu aos pobres tornarem-se sujeitos políticos, pois para Paulo Freire, toda educação é um ato político. Os excluídos contribuíram com sua pedagogia própria, suas crenças, valores e principalmente histórias de migração, de subsistência e sobrevivência em territórios áridos, propiciou que produzissem, não discursos abstratos e sem consistência empírica concreta, mas um discurso vivo, plástico, estético e poético baseado na vida. Discursos plenos e transbordantes de metáforas, onde não escrevem ou moldam conceitos, mas denunciam fatos acontecimentos existenciais, carregados de emoção, profundidade e dignidade ética. Lêem o mundo, através dos sentidos, quando apreciam um quadro, quando vêem uma multidão se manifestando, quando dizem poesias de cordel, criadas no íntimo do coração dilacerado ou retratam um folguedo infantil; ou ouvem o anúncio de um sino que badala ou os acordes da viola; tudo isto se refere a cultura popular. Frei Beto, na contra capa da Pedagogia da Autonomia afirma:

"O que existe são culturas paralelas, distintas e socialmente complementares. (...) o pobre sabe, mas nem sempre sabe que sabe. E quando aprende é capaz de expressões como esta que ouvi da boca de um senhor alfabetizado aos 60 anos: "agora sei quanta coisa não sei""

A pedagogia freireana, há quatro décadas propiciou transformações incríveis, não só em educadores, mas também em educandos, que saíram de sua ingenuidade para esfera crítica, da passividade para a militância em movimentos sociais, sindicais e populares, da descrença para a esperança de que as coisas possam mudar e da resignação para a utopia, convencidos de que são sujeitos históricos capazes de ocupar a vida política do brasileiro, indignados com a pobreza, com a exclusão e a desigualdade social.

Estas representações sociais, são tomadas como denúncias das condições de pobreza que ocorrem na sociedade, marcada por desigualdades de oportunidades nos diversos segmentos sociais excluídos. Entendemos por, representação social, como a forma intercalada e assimilada de todas as coisas que entramos em contato, seja com o corpo – relações concretas vividas – seja com o pensamento – relações imaginárias – as quais aprendemos a significar ou valorizar.

A pedagogia social caracteriza-se pois, como um projeto radical de transformação política e social, uma vez que:

a. propõe inicialmente criar uma teoria renovada de relação homem, sociedade e cultura, com uma ação pedagógica que pretende fundar, a partir do exercício em todos os níveis e modalidades da pratica social, uma educação libertadora;

b. realiza-se no domínio específico da prática social com classes sociais populares, a partir de um trabalho político educacional de libertação popular, com o intuito de ser conscientizador com sujeitos, grupos e movimentos das camadas excluídas;

c. concretiza-se como ação educativa com agentes e sujeitos comprometidos, onde se estabelece através da relação dialógica, um sistemático processo de intercâmbio de conhecimento e saberes, onde a troca de experiências é primordial;

d. orienta-se pela pedagogia libertadora protagônica baseada fundamentalmente na memória histórica na identidade coletiva, na dinâmica cultural, na possibilidade entre a capacidade lógica de compreender os liames capitalistas e a valorização da participação comunitária e, auto-estima, auto-valorização, autoconfiança e autodeterminação de sujeitos que tentam construir uma nova ordem social, econômica e cultural.

Para efetivar uma pedagogia social competente e conseqüente historicamente, é imprescindível: de um lado, buscar conhecer a sabedoria popular, expressa em seus códigos, dramaturgia, religiosidade, produtos culturais e senso comum, base fundamental que deve servir de plataforma para ele (indivíduo, grupo, classe popular) e os intelectuais orgânicos possam chegar à hegemonia da sociedade civil no processo concomitante de sua libertação social, econômica e política; de outro, entender que o povo não se apresenta como uma entidade única, como conceitua Gramsci:

"O próprio povo não é uma coletividade homogênea, mas apresenta numerosas estratificações culturais, variadamente combinadas; estratificações que em sua pureza, nem sempre podem ser identificadas em determinadas coletividades populares históricas, sendo certo, porém, que o grau maior ou menor de isolamento histórico de tais coletividades fornece a possibilidade de uma certa identificação.4"

Além disso, os agentes da pedagogia social, que efetuaram a animação popular5, precisam buscar e caracterizar os componentes ideológicos das classes populares, expressar organizar, com estímulos diferenciados, as ideologias dominadas em suas múltiplas formas de manifestação, empregando estratégias (técnicas e métodos) criativas de comunicação com o povo e utilizando meios e instrumentos ajustados à melhor divulgação dessas ideologias para o conjunto da sociedade civil, ganhando amplitude paulatinamente e conquistando aliados.

É nesse sentido que os intelectuais ligados a essa área produzem conhecimentos reconstituindo o real, buscando explicação e previsão, aplicando conceitos e categorias de interpretação de dados por suas teorias e modelos, trabalhando para estruturá-los e hierarquizá-los em conformidade com as variações históricas, ou redefinindo os já existentes, ou criando novos, sempre como conseqüência da interação teórico-prática.

Como Luiz Wanderley coloca:

"Uma condição relativa ao trabalho dos intelectuais com o povo reporta-se a determinadas qualidades pessoais e coletivas que esses intelectuais devem ter nas atitudes e comportamentos da sua prática efetiva junto ao trabalho de libertação das classes populares. Ou seja é necessária sua identificação pela consciência e pela prática com as classes populares, o que implica a obtenção de novas adesões para a hegemonia das classes a que se quer vincular organicamente. Para ganhar a confiança e o respeito mútuo do povo, principalmente para vencer a desconfiança das palavras inúteis e das falsas promessas a que os trabalhadores em geral se acostumaram, exige-se dos intelectuais um esforço permanente de sobrepujar modos de agir e de pensar adquiridos historicamente em nosso país, configurados no que se tem cognominado de uma ‘filosofia tutelar’ – exemplificada, entre outras, pelas características de autoritarismo, de paternalismo, de clientelismo, de individualismo e de elitismo -, que impede a solidariedade fundamental para a comunhão de interesses e tem servido para atrasar a história irreparavelmente.6"

Há que se preocupar também com outro aspecto profundamente importante na prática de pedagogia social, que diz respeito ao uso de manipulação e massificação ante os grupos trabalhados e às alianças e compromissos típicos do jogo político, que dessa experiência emanam, ligados à luta e à disputa pelo poder.

 

Desafios Metodológicos da prática social transformadora ou teorizar a prática social para transformá-la

Acreditamos que a definição da metodologia dialética da pedagogia social não se restringe a técnicas, métodos ou estratégias de trabalho, mas se funda num processo de construção de conhecimentos que se apropria criticamente da realidade para poder transformá-la.

Nossa intenção é apontar alguns critérios sobre a metodologia dialética que fundamenta a prática social no bojo da concepção da pedagogia social.

A ação educativa nesse âmbito constitui-se num processo de criação e recriação do conhecimento que parte de uma determinada teoria dialética do conhecimento, pois parte da prática, teoriza sobre ela e volta à prática para transformá-la, ou seja, parte do concreto, realiza um processo de abstração e regressa ao concreto, num movimento reflexivo crítico e sistematizador – ação/reflexão/ação. Essa abstração busca penetrar nas raízes da realidade concreta, descobrir seu movimento interno, suas causas e suas leis, buscando desvelar suas contradições, para lucidamente poder transformá-la.

Marx diz a respeito desse método dialético de análise crítica:

"O concreto é concreto, já que constitui a síntese de múltiplas determinações, ou seja, a unidade da diversidade. É para nós o ponto de partida da realidade e, portanto, da intuição e da representação (...) as noções abstratas permitem reproduzir o concreto pela via do pensamento (...) o método que consiste em elevar do abstrato ao concreto é, para o pensamento, a maneira de apropriar-se do concreto, ou seja, de reproduzi-lo pela forma do concreto pensado.7 "

O processo de construção do conhecimento tem como ponto de partida sempre a prática, que nos dá os dados sensoriais, via percepção da realidade objetiva, e a abstração nos permite realizar um ordenamento lógico dessas percepções, relacionando-as entre si, até formularmos conceitos. Com o descobrimento das contradições internas da realidade social, podemos elaborar deduções e juízos próprios, passando do conhecimento empírico a um conhecimento racional teórico. Nesse sentido, a prática social será a fonte dos conhecimentos e o critério de sua verdade possível. Para teorizar, é preciso uma reflexão significativa que leve em conta os seguintes pontos: realizar um processo ordenado de abstração por meio de aproximações sucessivas, com muita coerência, e há que se ter uma visão totalizadora da realidade captada na articulação dinâmica e conjunta. Essa unidade complexa e contraditória constitui a realidade concreta. Trata-se de compreender cada fenômeno particular dentro do movimento que o relaciona com a totalidade social em um movimento histórico concreto dado.

Como afirma Kosik:

"...cada fenômeno pode ser compreendido como elemento do todo num fenômeno social e um fato histórico, que se examina como elemento de um determinado conjunto e cumpre portanto um duplo papel que converte efetivamente um fato histórico: de um lado define-se a si mesmo, de outro lado, define-se no conjunto: ser simultaneamente produtor e produto, ser determinante e determinado, ser revelador e ao mesmo tempo decifrar-se a si mesmo, adquirir seu próprio significado e conferir sentido a algo distinto. Esta interdependência e mediação da parte e do todo significa ao mesmo tempo que os fatos isolados são abstrações, elementos artificiosamente separados do conjunto correspondente adquirem veracidade e concretização (...) a concretização dialética da totalidade não somente significa que as partes se ligam em uma interação e conexão externa com o todo, senão também que o todo não pode ser petrificado a uma abstração situada por cima das partes, já que o todo se cria a si mesmo em interação destas.8"

Há que se possuir também uma visão crítica e criadora da prática social, ou seja, uma atitude questionadora sobre o processo, sobre as causas e sobre a dinâmica interna do processo, sempre aprofundar, ampliar e atualizar o conhecimento sobre os fatos e acontecimentos da ação educativa, para reelaborar seus elementos e interpretá-los à luz da teoria e adequá-los a novas situações e circunstâncias. A teoria e o conhecimento teórico convertem-se num instrumento da crítica nas mãos de seus protagonistas, das classes populares, e lhes permitirá agir na história, conforme seus interesses.

Antonio Gramsci contribui substantivamente, nesse ponto, afirmando que a intervenção ativa elucida as classes populares:

"Não somente faz com que compreendam as contradições, senão que as colocam como elementos da contradição, elevam este elemento a princípio do conhecimento e, portanto, à ação.9"

O processo de formação teórico-prático deve levar seus protagonistas a adquirir a capacidade de pensar por si mesmos, assumindo convicções próprias, analisando os acontecimentos com categorias teóricas para a interpretação e a transformação da realidade em que vivem.

Segundo Oscar Jara:

"... a concepção metodológica dialética da pedagogia social põe sua atenção nas situações concretas que surgem da prática para analisá-las, fazer deduções, confrontá-las com outras experiências, conceitualizando-as, emitindo juízos críticos etc., para assim orientar eficazmente as ações de classe sobre estas mesmas situações. (...) leva-nos a pensar dialeticamente para poder assim enfrentar novas e distintas situações que a própria prática nos irá exigindo conhecer para transformar.10"

A pedagogia social exige um processo permanente de teorização sobre a prática, para o avanço histórico do movimento popular no qual se insere. A criação e recriação dos fundamentos metodológicos favorece a formação sólida e consistente da postura do educador social, principalmente transformando-o em um agente multiplicador, ou seja, formador de formadores, na prática social, junto aos setores populares. Os momentos de reflexão e de sistematização coletiva favorecem o crescimento, a autonômia e a independência dos educadores sociais, bem como a autocrítica e a auto-revisão constante de seu processo como agente de mudança, também do grupo com o qual partilha sua ação educativa.

 

A praxis como essência da metodologia dialética

O objetivo estratégico de todo processo político-educativo é o desenvolvimento das capacidades e dos potenciais de cada educando / educador para sentir, pensar e agir de forma autônoma no contexto dos grupos sociais em que vive. Essa é a essência da praxis, na perspectiva da metodologia dialética.

No fundamento desse objetivo, estão contidas diversas concepções cruciais que emanam de um processo educativo político-pedagógico – que não é neutro – traduzido pelos seguintes princípios: o conhecimento humano sempre em construção; a prática social, refletida pelos próprios sujeitos em todas as dimensões, articulações e inter-relações, é fonte privilegiada, sem ser única, do novo conhecimento; o educando, como sujeito do processo político-pedagógico, só aprenderá a sentir, sentindo; a agir, agindo; a perceber percebendo. Nesse sentido, o educador social é não mais que um animador mediador nesse processo, um guia, um apoio do descobrimento permanente dos próprios sujeitos da aprendizagem. Seu maior desafio é tornar-se sujeito entre os sujeitos, na dinâmica do trabalho coletivo. Tais noções deveriam perpassar e referir-se a qualquer educação, e não somente à pedagogia social.

Há dois pressupostos essenciais, sem os quais essa almejada ação não poderá ocorrer. Na verdade, a metodologia da práxis nos permite olhar o educando não como uma abstração (seja ele o analfabeto, o trabalhador ou menino(a) de rua), mas sim no concreto da sua existência histórica, que contém um acervo de experiências , valores, medos, expectativas e conhecimentos que eles trazem para o contexto educativo. Esse deve influir necessariamente na definição, pelo educador, de onde deve ou pode partir para desencadear o processo educativo. O segundo pressuposto, no caso específico da pedagogia social (de rua), é que as crianças os adolescentes e os excluídos têm como prioridade na vida cotidiana a luta pela sobrevivência e subsistência, que é encontrada no trabalho e não no "estudo", uma vez que já foram expulsos da escola formal.

Segundo Marcos Arruda, que sempre trabalhou no mundo sindical, para se atingir o objetivo estratégico, há três tarefas fundamentais:

a. Auxiliar na apropriação pelos educandos de todo conhecimento científico, histórico, político, cultural acumulado pela humanidade ao longo da história e que possa servir às suas necessidades e objetivos específicos;

b. Auxiliar na apropriação dos instrumentos de avaliação crítica daqueles conhecimentos, de modo que os educandos possam identificar seu caráter histórico-cultural e se proponham a renová-lo, atualizá-lo e mesmo recriá-lo; e

c. O mais importante, auxiliar na apropriação pelos educandos dos instrumentos adequados para a teorização da própria prática e, mais ainda, nas suas diversas dimensões, quer dizer, para a criação de novos conhecimentos, adequados aos seus objetivos de transformação da realidade, do mundo, de si próprios.11

Como se percebe, essas três tarefas, ainda que de diferentes níveis, são profundamente interligadas, e favorecem o educando a se instrumentalizar e, consequentemente, a obter a desenvolver a capacidade do pleno exercício da participação democrática, princípio fundamental da pedagogia social.

Essa proposta se contrapõe radicalmente à educação domesticadora, bancária e fragmentada, criticada amplamente por Paulo Freire, como já afirmamos, pois reduz o educando a receptáculo do saber, mero cumpridor de ordens vindas de cima, coibindo a sua livre expressão e participação e bloqueando sua visão integral sobre o processo de construção de conhecimentos. Como afirma Manacorda:

"...a exigência da recuperação da unidade da sociedade humana no seu complexo e da omnilateralidade do homem singular numa perspectiva que una (...) os fins individuais e os fins sociais, homem e sociedade.12"

A proposta político pedagógica da práxis se refere portanto, a uma educação omnilateral13 e omnidimensional14, que abarca e abrange todos os campos essenciais da realidade humana e natural e todas as dimensões existenciais do ser humano. Introduzir, junto aos meninos (as) de rua, o conceito integral de conhecimento e nessa práxis integral de aprender e apreender, numa sociedade fragmentada, além de ser uma ousadia pedagógica, significa a tentativa de subverter o monopólio das minorias – da divisão social do trabalho -, que são as únicas a terem a possibilidade e os recursos para estudar 20 anos. Por esta razão, pensam que são os únicos a poder saber, pensar e decidir os rumos da sociedade, gerando nos setores excluídos uma autodesvalorização e descrença de si e dos outros semelhantes, uma alienação multidimensional de sua própria integridade como pessoa.

A práxis político-educativa integral rebela-se contra todas as divisões – de classe, do trabalho, do saber, etc.- e propõe-se a desvendar e a desvelar com o educando os mecânismos e a lógica desse processo alienador e divisor, como ponto de partida para a criação de uma nova lógica integradora, autônoma do educando – sujeito da sua própria existência e de sua própria história individual e coletiva. Essa prática propicia a expansão da consciência, a capacidade de abranger dimensões cada vez mais profundas e complexas do universo, da natureza, da cultura e da história e do próprio ser humano nesses contextos, como totalidade e de suas múltiplas transformações, a partir da análise-crítica da interação e da conexão de todos os elementos que a compõem, vez que a realidade apresenta, ao mesmo tempo, momentos estáveis e outros instáveis, com mudanças constantes de: conceitos, definições, paradigmas e da própria linguagem que os seres humanos têm criado para compreendê-la e que necessitam ser mudados ou recriados ao longo da história.

Arruda afirma:

"... eis por que está sendo questionada a própria noção de "ciência" e de um "conhecimento científico" rígidos e definidos, ou concebidos como algo que é verdadeiro apenas porque quando pode ser comprovado pelos cinco sentidos ou pela "experimentação objetiva".15"

E acrescenta que a Filosofia da Práxis:

"nos desafia a ampliarmos sempre mais as nossas múltiplas faculdades de apreensão do real na sua integralidade, em vez de nos conformarmos em reduzir o Real a nossa atual capacidade de apreendê-lo.16"

Portanto, os avanços da ciência e da consciência têm revelado, com força crescente, no mundo moderno, por um lado, que certas dimensões do real estão além dos limites da razão humana, e, por outro, que o ser humano possui faculdades de conhecimento além da razão, que precisam ser trabalhadas, desenvolvidas, ensinadas afim de permitir-lhe, no plano da prática social e no plano da consciência, uma aproximação crescente da totalidade do real, como já afirmamos anteriormente.

É, pois, fundamental, no trabalho popular, informar, estimular e orientar o descobrimento do educando, sujeito a se apropriar dos conhecimentos, tanto no seu aspecto específico e local (por exemplo, levar as crianças e os adolescentes a criarem um novo projeto de vida) quanto no âmbito mais geral e global (por exemplo, levá-los a perceber como as políticas públicas básicas têm-se preocupado ou não com as crianças e adolescentes de rua). Ao mesmo tempo, deve-se levá-los a se apropriar dos conhecimentos relativos a seu corpo, à saúde individual e ambiental, preventiva e curativa, ao estilo de vida que levam, ao trabalho de cada um, a um universo psicológico, intuitivo, perceptivo, além dos conhecimentos relativos à sua cultura, linguagem, ludicidade e luta. É mediante essa aprendizagem prático-teórica que o educador de rua irá estimular os meninos(as) de rua a expandirem sempre mais suas faculdades de conhecimento, de percepção, de descobrimento da totalidade do real e de si mesmos, ganhando espaço e emancipação.

A pedagogia social, com característica libertadora, vai emancipando cada vez mais o sujeito, e sua possibilidade de exploração e construção de conhecimentos, por meio de pensamento. Pensa a sua prática, o seu saber individual e coletivo, aprende o que foi teorizado por outros pensadores que escreveram sobre seu pensado, por meio de artigos, livros e teses. De posse de suas elaborações e outras teorias, pode comparar, associar, problematizar, questionar pontos convergentes e divergentes, contraditórios ou antagônicos entre os diferentes saberes, visando confirmá-los, verificá-los ou utilizá-los em circunstâncias variadas da vida.

Criticar radicalmente significa ir a raiz das questões e buscar suas causas e seus múltiplos efeitos, para poder superar, mudar ou para recriar o próprio conhecimento ou a sociedade na qual se vive.

Nesse sentido, o exercício crítico de pensar exige que desenvolvamos, por um lado, uma postura ativa na construção de nossa própria consciência individual e coletiva e, por outro, que estejamos sempre abertos a mudá-la, não a partir de uma visão doutrinária-dogmática diante da realidade que nos circunda, mas reconhecendo que ela é que é complexa, tem um movimento, um processo, que varia conforme a visão do observador, e que se constitui de maneira multidimensional, apresentando variadas dimensões, visíveis e invisíveis, captadas pelos sentidos ou mesmo fora do alcance da razão, mas com uma unidade imbricada nessa diversidade.

Marx define o concreto como a síntese de múltiplas determinações, ou seja, a unidade da diversidade. O concreto aparece no processo de pensar, mas não como um ponto de partida, embora o seja na realidade, porque ele faz uma distinção fundamental entre o concreto e o concreto pensado ou percebido pelo sujeito. O importante é reconstruir no plano do pensamento e/ ou da percepção a unidade do real e transformar essa compreensão em práxis, ou seja, em ação crítica e criativa, partindo do "concreto pensado".

Entendemos práxis como o resultado do duplo movimento de descobrir os determinantes do sentido em que se movimenta o real e mergulhar nele para conhecer suas entranhas, por uma ação crítica e criativa, ação que vai além das aparências e busca a essência (de dentro para fora e de fora para dentro). A práxis é, pois, esse processo de integrar-se sempre mais fundo e plenamente no real e ir encontrando as formas singulares e plurais de influir na sua estrutura e no sentido do seu movimento.

A metodologia da práxis é, por um lado, um conjunto de procedimentos gerais abstratos capazes de instrumentalizar o sujeito - individual ou coletivo - para realizar essa articulação no plano específico e, por outro, a visão de mundo, a filosofia e o projeto político de uma dada sociedade.

Portanto, "a visão de mundo da práxis é a que concebe um mundo em processo de construção por esses sujeitos, que estão também se construindo à medida que conhecem esse Mundo", como afirma Arruda.17

Concluindo, podemos sintetizar que a proposta da práxis implica, na pedagogia social (de rua), três processos fundamentais de apropriação: a do conhecimento universal já acumulado historicamente pela civilização sobre a realidade do mundo, da sociedade e do ser humano e de si próprio; a apropriação das faculdades e instrumentos teóricos adequados para a criticá-los e superá-lo, para ir além deles no plano da percepção e da compreensão; e finalmente, a apropriação das faculdades e instrumentos práticos adequados para reconstruir, recriar e transformar a história, a realidade e a sociedade.

Este aparato de possibilidades, por meio da práxis assim entendida e vivida, possibilitará, provavelmente, que os educandos-sujeitos capacitem-se para gerir sua própria história, num processo de autogestão, assim como o seu próprio processo educativo de construção do conhecimento, num processo de educação, e que almejem, constantemente, uma transformação da sociedade na qual se inserem, com justiça, igualdade e democracia integral.

Esperamos que nossa reflexão possa servir a todos aqueles que estão empenhados na busca de uma educação baseada na vida, que, de um lado, vise ser parte integrante da luta pela construção e edificação de uma democracia e que, de outro, já esteja empregnada da construção de uma nova humanidade.

 

O educador social um sujeito político inserido na prática educacional

O primeiro e fundamental passo do educador social, é efetivar um diagnóstico situacional local, nacional e internacional para executar sua ação educativa e controlar os resultados que pretende alcançar e os impactos de suas ações, caracterizando: os problemas e necessidades, estabelecendo prioridades, identificando as condições básicas para o enfrentamento, custos, recursos, infra-estrutura, para potencializar suas ações educativas. Este diagnóstico situação que não só capta as dimensões quantitativas, como as qualitativas, além dos elementos culturais e tenta obter informações subjetivas e objetivas da realidade circunscrita a sua ação. Tenta identificar não só os diferentes atores sociais como a relações de forças entre eles, numa análise de conjuntura que exige: os seguintes princípios básicos:

– Possuir uma visão crítica e consciente das causas geradoras do processo de exclusão das crianças e adolescentes: da pauperização, da marginalização e da injustiça social;

– Desenvolver ações conjuntas com participação de todos os envolvidos no processo educativo, quebrando as relações de poder hierárquico entre educador/educando;

– Propor uma ação organizada e orgânica entre poder governamental e organizações não governamentais, buscando nas forças comunitárias populares o apoio e o incremento da ação educativa;

– Valorizar e democratizar a cultura e socializar o saber popular, discutindo e sistematizando-o a partir das formas de expressão e comunicação das camadas populares;

– Acreditar que a construção do conhecimento gestado e elaborado pelo conjunto de participantes não somente é um processo de aprendizagem para o educando e o educador, mas também da sociedade no seu conjunto;

– Revigorar o estado de ânimo dos educadores, implementando suas condições objetivas de vida e trabalho, realimentando sua competência técnica e política pelos avanços significativos do conhecimento, não só na área de educação, como em áreas afins, restaurando a qualidade do ensino e, consequentemente, da aprendizagem, como formação e capacitação permanente por processos de ação/reflexão/ação crítica do processo educativo.

Diante desses pressupostos pedagógicos, criamos e descobrimos alguns passos metodológicos e novas estratégias para efetivação de nossa prática educativa, no que se refere à postura do educador, de forma que:

– o educador social precisa "desterritorializar-se" e partir para o encontro com os educandos e com eles elaborar o novo projeto educativo do cotidiano da aprendizagem, em que ambos são protagonistas e atores sociais fundamentais;

– o educador, antes de falar, precisa "ouvir". Transcendendo a fala, deve captar o mundo simbólico (signos, códigos), gestual (comunicação não-verbal) e mágico-lúdico do mundo infanto-juvenil, pois o ato de ouvir o "semblante" os sentimentos de nossas crianças sofridas e violentadas é um ato de profunda ternura e vigor permanente;

– o educador social precisa ter "consciência" do momento de cada criança e de cada adolescente que vive o mistério e plenitude de seus dramas e sonhos introspectivos e a cadenciada energia dinâmica implícita na sua corporeidade e saber respeitar o momento de sua individualidade metamorfoseada florescente;

– jamais os educadores sociais (de rua) poderão romper o "espaço vital" de seus educandos, violentar sua privacidade íntima, seus momentos únicos e singulares. A "paciência histórica"18 do educador proporcionar-lhe-á o momento oportuno do "estalo pedagógico"19 e as condições férteis da aprendizagem irão paulatinamente se constituindo;

– a identificação por parte do educador do que o educando "sabe" (a partir de sua experiência de vida) implementará sua prática educativa no que se refere à ampliação e sistematização do conhecimento universal;

– a base da interação pedagógica entre educador/educando seja uma relação dialógica, pois o direito de falar e escutar é que circunstancia a reciprocidade, a relação e o relacionamento entre ambos, num processo de comunicação;

– a ação educativa pressupunha a permanência de uma análise da ação/reflexão e para rever, redimensionar, reler e refazer o caminho da ação;

– a ação educativa propicie condições para que educandos descubram, construam e reconstruam conhecimentos, com autonomia e independência, a partir da problematização de eixos tematizadores próprios de cada instante ou fase da vida em desenvolvimento;

– é preciso ter clareza que o processo educativo não é linear, mas cheio de conflitos e contradições e, por isso, o educador precisa estar imbricado e envolvido com a pedagogia social de rua no que se refere a uma visão heurística, holistica, totalizadora e integradora.

Esse processo, portanto, requer a solidariedade em ato, a igualdade e a justiça em todo momento do agir, do pensar e do sentir o mundo que os rodeia. O cenário exige alegria, beleza, lazer como espaço socioeducativo (como preconiza o ECA) feito e refeito de um conjunto de ações locais, práticas educativas, culturais, políticas e recreativas, principalmente. A "gestão democrática" á a essência dessa relação ativa cuja crítica, criatividade e compromisso estimulam o processo de libertação cada vez mais amplo.

Muitas são as dimensões e vertentes do fazer educativo que atendem as necessidades básicas da aprendizagem; no entanto, as que privilegiam a vida, o ser humano como sujeito de sua própria história, a construção do conhecimento e da história social de sua comunidade e da sociedade como totalidade, são as que provavelmente contribuirão para uma prática educativa emancipadora e libertadora de nosso povo.

Partindo, pois, dos princípios e pressupostos pedagógicos e metodológicos mais amplos, fomos detectando, a partir da prática social da pedagogia social proposta, os principais aspectos do ato educativo junto às crianças e adolescentes de/e na rua, e, dentre eles, o processo de comunicação como condição primeira da abordagem.

Entendendo a comunicação20 como processo de criar e compartilhar significados por meio da transmissão e troca de signos21 entre os diferentes agentes do processo educativo, tivemos de convivenciar um verdadeiro procedimento arqueológico par compreender a linguagem dos excluídos.

Entendemos a linguagem de forma ampla para designar um sistema de códigos22 segundo os quais, de acordo com determinadas convenções, se organizam em signos para que haja um significado. A linguagem é a base de todo processo de organização da comunicação humana.

 

Considerações finais

A pedagogia social exige não só uma competência técnica especial do educador, mas também a solidariedade humana e o compromisso político com o educando, na medida em que remete sua prática social educativa ao resgate da cidadania plena, através de mecanismos e meios mediatizadores do ato político pedagógico, numa práxis efetiva, contrapondo-se as condições reparadoras, compulsórias, compensatórias ou repressivas herdadas do passado.

A pedagogia social privilegia, como eixo central, a descoberta dos matizes da matriz cultural dos sujeitos, para trocar delinear seus princípios pedagógicos o mais próximo da realidade do educando através da dialogissidade, considerando o seu saber, sua experiência, sua história, seus conflitos, seus sonhos, seus valores e crenças e aproveitando a oportunidade educativa para interpretar o mundo humanamente construído com elementos essenciais da cultura universal. Essa pedagogia concebe o homem como ser capaz de assumir-se como sujeito de sua história e da história, como agente de transformação de si, do outro e do mundo como fonte de criação, liberdade e construção dos projetos pessoais e sociais, numa dada sociedade, por uma prática social, crítica, criativa e participativa. Pressupõe-se que o mundo é, ao mesmo tempo produtor e produto do homem, e que, ao transformá-lo, engenha em si mesmo a sua própria transformação, num processo dialético contínuo e permanente.

Acreditamos que esta reflexão sobre a pedagogia social, tenha se constituído em subsídio para os educadores sociais comprometidos com a memória da qualidade de vida, proteção e desenvolvimento dos segmentos sociais excluídos da sociedade, e que com ela se restabeleça a cidadania plena para todos os cidadãos participantes ou não deste projeto de pessoas, de mundo e de sociedade.

 

 

1 Professora doutora em educação e administração escolar pela USP, professora de sociologia e pedagogia social da PUC-SP, e coordenadora do Núcleo de Trabalhos Comunitários – NTC PUC/SP2006 –
2 Schwartzman, Simon. As causas da pobreza. Ed. FGV – 2004 pg. 35[ STANDARDIZEDENDPARAG]
3 estou referindo ao trabalho que coordeno na PUC-SP a 25 anos, O Núcleo de Trabalhos Comunitários, que favorecem a construção do que hoje entendemos por Pedagogia Social, principalmente pela convivência com o mestre Paulo Freire.
4 Gramsci, A Literatura e vida nacional. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968, p. 23[ STANDARDIZEDENDPARAG]
5 Animação popular, neste trabalho, será entendido como no documento do Movimento de Educação de Base, o MEB em 5 anos, Rio de Janeiro, 1965, p. 26: "Animação popular é um processo de estruturação de comunidades e organização de grupos, progressivamente assumidos por seus próprios membros a partir de seus elementos de liderança. A comunidade organiza-se como conseqüência da descoberta de seus valores, recursos e suas necessidades em busca da superação de seus problemas sociais, econômicos, culturais, políticos e religiosos, no sentido da afirmação de seus membros como sujeitos".
6 Wanderley, L. E. Op. Cit. P.65
7 Marx, K. Fundamentos de la Crítica de la Economía Política, Habana, Instituto del Libro, 1970, Tomo I, p.38[ STANDARDIZEDENDPARAG]
8 Kosik, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1976[ STANDARDIZEDENDPARAG]
9 Gramsci, ª El Materialismo Histórico y la Filosofia de Benedetto Croce, Buenos Aires, Nueva Visión, 1973, p. 101.
10 Jara, º Op. Cit., p. 104
11 Arruda, M. Metodologia da práxis e formação dos trabalhadores, Rio de Janeiro, julho de 1988 (mimeo).
12 Manacorda, M. ª Marx e a pedagogia moderna. Lisboa, Iniciativas Editoriais, 1973, p. 28[ STANDARDIZEDENDPARAG]
13 Como Marcos Arruda, vamos entender por omnilateral campos da realidade que a humanidade conseguiu tornar acessível do seu conhecimento.
14 Entendemos omnidimensional a busca de envolver todos os modos e faculdades de conhecimento, os sentidos do corpo, a mente, e emoção, a intuição, a vontade, o sentido de unidade, e o espirito como ser humano integral.
15 Arruda, M. Op. Cit. P.6
16 Arruda, M. Op. Cit. P.6
17 Arruda, M. Op. Cit., P.10. Entendemos que a Metodologia da Práxis é um tipo de metodologia fundada na visão dialética e integradora de mundo, da realidade, de conhecimento, de história, de ser humano.
18 Paciência histórica: atitude do educador de respeito ao seu próprio processo de construção do conhecimento.
19 Estalo pedagógico: é momento específico vivido pelo educador/educando que descobre que descobriu, aprendeu algo.
20 Entendemos comunicação como o ato de tornar comum uma mensagem, um sentimento, um pensamento.
21 Entendemos signos como uma simples unidade de comunicação que contém um ou vários significados.
22 Entendemos código como um sistema de signos regidos por determinadas convenções.