An. 2. Seminário Música, Ciência e Tecnologia 2005
DVD-ROM didático de instrumentação e orquestração: usos e recursos multimídias no estudo musical
João Victor Bota; Claudiney Rodrigues Carrasco
Instituto de Artes (IA), Departamento de Música – Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). R. Sérgio Buarque de Holanda – Cidade Universitária Zerefino Vaz – CEP13081-970 – Barão Geraldo – Campinas – SP – Brasil. jvbota@ig.com.br, carrasco@iar.unicamp.br
RESUMO
Este artigo aponta alguns caminhos possíveis de exploração de recursos multimídia no estudo musical. Também descreve o caminho específico trilhado no desenvolvimento de um DVD-ROM didático de instrumentação e orquestração.
Palavras-chave: Instrumentação , Orquestração , Ensino Musical
ABSTRACT
This paper presents a few important steps for the use of multimedia resources in musical studies. It also describes specific ways for the development of a pedagogical DVD-ROM for the study of instrumentation and orchestration.
Key-words: Instrumentation , Orchestration , Musical Education
O Estudo da Instrumentação e Orquestração Segundo o Paradigma Tradicional e as Novas Abordagens Multimidiáticas
O estudante de instrumentação e orquestração tem como meta adquirir familiaridade com os instrumentos musicais, mais comumente os presentes em uma orquestra sinfônica, e também adquirir um leque de conhecimentos a respeito das possibilidades de como os instrumentos interagem ao tocar em conjunto. Para tanto, é necessário o conhecimento das particularidades de cada um dos tipos de instrumentos musicais, em questões que envolvem natureza física (material com o qual é construído, formato, potência sonora, etc.) e aspectos como a escrita idiomática, que é o conjunto de formas de uso que cada tipo de instrumento assume dentro de determinados estilos e períodos.
É fundamental para o estudante de orquestração ter elencadas várias possibilidades de usos de cada tipo de instrumento musical no que se refere à escrita idiomática - conforme foi definido acima - para poder compreender o repertório produzido segundo tais parâmetros e guiá-lo na compreensão do repertório que se soma, contrapõe ou de alguma forma sempre dialoga com a tradição musical. Desta maneira, a investigação de novas possibilidades ou compreensão do repertório já existente, de usos dos instrumentos musicais, depende da análise do rico legado da orquestração na música ocidental, observável dentro das mais diversificadas correntes estéticas, como a barroca, clássica, romântica, moderna, etc.
O paradigma tradicional do estudo de instrumentação e orquestração é normalmente baseado nos tratados tradicionais, em formato de livros teóricos, que são um tipo de comunicação que não permite ouvir e ver os exemplos musicais. Poucas fontes trazem além dos textos explicativos e partituras também gravações - cito como exemplo relevante apenas o tratado de ADLER (2000) que vem acompanhado de CDs com as gravações dos exemplos musicais citados.
QUÉAU (1998) nos lembra que “os meios técnicos para se criar uma biblioteca virtual do mundo (scanners de baixo custo, conexões Internet, CD-ROMs, DVD-ROMs) encontram-se disponíveis. Mas o que mais falta são os conteúdos.” Pertinente aos mundos virtuais são os links, as palavras-chave, os hipertextos carregados de sons e imagens, os simuladores e todos recursos aptos a construir novos paradigmas de construção do saber, nos quais o usuário é co-autor do conhecimento.
Enfatizamos, portanto, que a criação de um DVD-ROM está ligada principalmente a idéia de se criar uma linguagem própria, pertinente ao contexto da Multimídia. Ou seja, não se trata de transcrever trechos de tratados de orquestração tradicionais para dentro de um DVD, no nosso caso específico, mas sim explorar os recursos não-lineares “criando um modo particular de contar a história, conforme o interesse que cada usuário tenha no assunto” (PAIVA 2002) e, “ora, se o objeto se dá a representar de diferentes formas, já que ele é um campo de possibilidades, então cada forma de representação dá um viés diferente do objeto” (ZAMPRONHA 2000).
A Confecção
O projeto inicial sugeria a criação de um CD-ROM. Optamos pela formatação como DVD-ROM pois, após poucas sessões de filmagens, deparamo-nos com uma quantidade imensa de material que dificilmente seria acomodada no limitado espaço de uma mídia de CD-ROM.Outra decisão importante foi a de dividir o DVD em três volumes (“DVD1: Madeiras”, “DVD2: Metais e Percussão”, “DVD3: Cordas”) Para justificar esta decisão, recorremos aos números: O vídeo de trombone (por exemplo) ocupa, sozinho, já editado e com os textos e partituras correspondentes, cerca de 700MB, ou seja, um sexto de uma mídia DVD. Levando em consideração que este espaço equivale a uma média do espaço ocupado por cada um dos demais instrumentos, não conseguiríamos acomodar tamanha quantidade de informação em um único volume.
A pesquisa demonstrou que seria melhor desenvolvida se num primeiro momento delimitássemos as filmagens a apenas um representante de cada naipe da orquestra, portanto concentramo-nos nas questões mais diretamente ligadas à instrumentação. As filmagens e elaboração de material contendo naipes completos e famílias está programada para acontecer na seqüência da presente pesquisa. Com a presença de naipes e famílias será necessária uma também maior produção de vídeos que tragam diversas possibilidades de combinações dos instrumentos envolvidos, para que o usuário do DVD-ROM tenha em mãos ampla gama de simulações de sonoridades e efeitos.
Dentre os músicos filmados, figuram músicos que fazem parte do corpo docente do IA - UNICAMP, alunos avançados, ou instrumentistas da comunidade de Campinas. A participação dos mesmos foi gratuita. Todos foram conscientizados de que o DVD-ROM desenvolvido é sem fins lucrativos, para distribuição gratuita em Universidades e instituições de ensino de música.
Elaboramos listas com sugestões de exemplos a serem filmados que foram entregues aos músicos colaboradores com alguns dias de antecedência da respectiva filmagem, para o músico poder estudar previamente os exemplos técnicos e trechos musicais pedidos. Combinamos com os músicos que eles poderiam elaborar suas próprias listas com sugestões que pudessem complementar as nossas, e eventualmente substituir alguns itens, em caso de necessidade. Optamos por filmar a maior quantidade possível de exemplos e posteriormente selecionar os mais significativos, tendo como base a consulta aos tratados usados como bibliografia, sempre levando em conta as sugestões dos músicos colaboradores.
Também foi pedido aos músicos que eles tocassem uma pequena melodia de autoria de um dos pesquisadores, intitulada “Melodia de Confronto”. Trata-se de uma melodia de aproximadamente 1 minuto de duração, que foi adaptada à tessitura de cada um dos instrumentos estudados. A melodia exige ampla variação de dinâmica, tessitura, articulação. Com tal item, o DVD-ROM didático pode oferecer ao usuário a chance de ouvir uma mesma melodia tocada por instrumentos diferentes, com isso proporcionando a possibilidade de comparação de timbres, tessituras, etc. Alguns instrumentos ainda tiveram mais que uma versão da Melodia de Confronto, para ser possível ao usuário comparar diferentes registros do mesmo instrumento ou técnicas de execução. A viola, por exemplo, tocou a Melodia uma vez com o arco, outra em pizzicato convencional e uma última empizzicato à la guitarre (com o instrumento no colo do instrumentista).
Para uma maior praticidade, houve a concentração de determinados tipos de exemplos técnicos para um determinado instrumento tocar e que são válidos para toda a família do mesmo instrumento, sem nenhum prejuízo à qualidade do conteúdo do DVDROM. Cito dois casos. O violino foi eleito como instrumento representante da família das cordas e por isso executou toda a gama de golpes de arco que são válidos para toda a família. Com isso ganhou-se tempo se reconhecermos que filmar os mesmos golpes de arcos em todos os demais instrumentos de corda seria redundante. É claro que as nuances existentes entre tais instrumentos continuará sendo evidente se nos lembramos que existem dezenas de exemplos técnicos e excertos ilustrativos, estes sim tocados por cada um dos instrumentos em questão. O segundo caso tratado de forma semelhante foi o da percussão. Os chamados rudimentos – que são as diferentes formas de combinar a batida das baquetas num instrumento de percussão, alternando-se ou repetindo as mãos direita e esquerda (cada mão segurando uma baqueta), e alterando força e velocidade das mais variadas maneiras – puderam ser mostradas usando a caixa clara, que inclusive é o instrumento tradicionalmente eleito pelos músicos para este tipo de exercício musical, enquanto os demais instrumentos de percussão apenas ilustrariam casos mais específicos de seu próprio repertório e demonstrando outros tipos de baquetas, etc.
Além de dezenas vídeos de cada instrumento, o DVD-ROM didático de instrumentação e orquestração contém partituras digitalizadas e breves textos explicativos que trazem informações técnicas sobre os instrumentos (dentre elas destaco as nomenclaturas em seis idiomas) e obras musicais, bem como a respeito das gravações realizadas na sua confecção.
2. Referências Bibliográficas
ADLER, Samuel (2000). Study of Orchestration. 9th edition. New York: WW Norton.
BERLIOZ, Hector & STRAUSS, Richard (1991). Treatise on Instrumentation. New York: Dover.
BLATTER, Alfred (1997). Instrumentation and Orchestration. New York: Longman
KEENAN, Kent Wheeler (1996). The Technique of Orchestration. 5th edition. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall.
PAIVA, José Eduardo Ribeiro de (2002). Técnicas e Tecnologias específicas para a música digital. Tese de doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Multimeios da Universidade Estadual de Campinas. Campinas: Unicamp.
PISTON, Walter (1995). Orchestration. New York: W.W. Norton.
QUÉAU, Philippe. (1998). “Cibercultura e info-ética”. IN: MORIN, Edgar (1998). A Religação dos Saberes: o desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
RISMSK-KORSAKOV, Nicolas (1946). Principios de Orquestración. Buenos Aires: Ricordi Americana.
ZAMPRONHA, Edson S. (2000). Notação, Representação e Composição: um novo paradigma da escritura musical. São Paulo: Anablume: Fapesp.