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Print ISBN 978-85-62480-96-6

Sem. de Saúde do Trabalhador de Franca Sep. 2010

 

MUNDO DO TRABALHO E REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

 

Mundo do trabalho: a particularidade dos trabalhadores de Franca/SP

 

 

Patrícia Soraya Mustafa

Assistente Social, Profa. Dra. do Departamento de Serviço Social da UNESP/Franca. Endereço eletrônico: patimustafa@gmail.com

 

 


RESUMO

No trabalho que ora apresentamos evidenciamos parte dos dados de uma pesquisa realizada no município de Franca/SP, referentes à inserção dos trabalhadores, do setor mais vulnerabilizado do espaço urbano de Franca, no mercado de trabalho, bem como as suas reais condições de trabalho, fundamentais para o entendimento das condições de vida desta população.  O intuito é trazer uma breve reflexão da particularização do mundo do trabalho na população francana, contribuindo desta forma, no desvelamento da realidade social.

Palavras-chave: Trabalho. Trabalho Formal e Informal. Condições de trabalho.


 

 

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta parte dos resultados de uma pesquisa1 conduzida no interior do Grupo de Estudos e Pesquisa Arranjos Produtivos Locais para Inclusão Social (APLIS),2 cujo intuito foi realizar diagnóstico do município de Franca de modo a caracterizar os domicílios existentes nas áreas mais pobres deste município, assim como os seus moradores de 15 anos e mais, em termos demográficos, socioeconômicos, educacionais e de inserção no mercado de trabalho, com vistas a oferecer subsídios para a implementação de políticas públicas, sobretudo, políticas voltadas à geração de trabalho e renda. Demonstraremos, aqui, os dados relacionados às condições de trabalho da população de 15 anos ou mais, localizada na área de maior vulnerabilidade do município de Franca/SP, segundo a Fundação SEADE3.

Entendemos ser de fundamental importância compreender as condições de trabalho das pessoas, principalmente as mais empobrecidas, pelo fato do trabalho consistir-se na mediação essencial para a satisfação das necessidades humanas4. Desta maneira, elucidaremos do total de 615 pessoas (considerados casos válidos para esta informação, uma vez que o total de indivíduos pesquisados foi 1.468), quantas se encontram trabalhando, se no setor formal ou informal, qual a atividade predominante, enfim, dados que possibilitem a caracterização das condições de trabalho da população de dez bairros5 de Franca, compreendendo 401 domicílios.

Para realização desta investigação seguimos algumas etapas metodológicas - a saber: discussão do projeto com a equipe, de modo a aprofundar e afinar sua base teórico-metodológica; a escolha do lócus da pesquisa, neste caso a região considerada de maior vulnerabilidade pelos parâmetros do SEADE;6 reconhecimento do universo de pesquisa e delimitação da amostra - que foi elaborada com cerca de 10% da população de interesse da pesquisa; a quarta etapa consistiu na preparação do instrumento de coleta de dados e pré-teste; logo após realizamos o treinamento da equipe de campo, seguida da aplicação da pesquisa propriamente dita; depois os dados foram codificados e implantados em planilhas do programa Statistical Package for the Social Sciences - SSPS, para posterior elaboração de tabelas e gráficos. E, por fim, realizamos a Análise dos dados e elaboração do relatório final.

 

2 DESENVOLVIMENTO

A partir da compreensão de que o trabalho constitui elemento central na fundação da sociabilidade humana é atividade vital da humanidade na produção da própria vida - buscamos verificar e entender as relações de trabalho de parte da população francana, pois pensamos que através da análise deste elemento fulcral na vida dos indivíduos poderíamos compreender suas condições de vida.

Sabemos que o trabalho, sob a égide do capital, não possibilita aos homens à sua humanização ou o alcance do humano genérico:

O capital forja uma forma específica de sociabilidade humana em que o sujeito criativo entra numa relação de estranhamento com aquilo que produz através de suas objetivações. O indivíduo subordina-se à produção do capital na medida em que o trabalho alienado, aliena do homem, primeiro a natureza e segundo a si mesmo, a sua função ativa própria, a sua atividade vital, aliena do homem o gênero, passando o trabalho a ser somente um meio de satisfazer as necessidades, o que vai na contramão da realização do homem enquanto ser genérico, do caráter dessa atividade, enquanto ser consciente livre, de acordo com o que nos dizia Marx (MUSTAFA; BENATTI, 2010, p. 12).

Longe de possibilitar o desenvolvimento das potencialidades humanas, o trabalho, na atualidade, cada vez mais, precariza a vida humana, na medida em que se instauram níveis altíssimos de desemprego7 associados ao aumento significativo da informalidade, com tudo que esta encerra - desproteção total do trabalhador sujeito a todas as intempéries relacionadas à atividade que exerce, degradação do humano (se pensarmos no trabalho nos lixões, por exemplo), tempo da vida destinado ao trabalho excessivo (praticamente, se vive para conseguir a sobrevivência). Parece que vivemos um tempo de retorno, se é que de fato um dia saímos dessas condições, da barbárie dos primórdios da Revolução Industrial, que bem atesta Marx, quando nos fala do surgimento do pauperismo:

O pauperismo constitui o asilo para inválidos do exército ativo de trabalhadores e o peso morto do exército industrial de reserva. Sua produção está incluída na produção da superpopulação relativa, sua necessidade na necessidade dela, e ambos constituem uma condição de existência da produção capitalista e do desenvolvimento da riqueza (MARX, 1984, p. 209).

Feitas estas considerações, apontaremos, a partir de agora, as particularidades do trabalho de 615 trabalhadores, moradores de Franca.

 

A PESQUISA: AS PARTICULARIDADES DO TRABALHO EM FRANCA

O município de Franca destaca-se por ser um pólo de desenvolvimento na região, o que justifica que qualquer diagnóstico acerca dela se inicie por este mesmo município. As principais atividades econômicas (em destaque a indústria calçadista) desenvolvidas neste município passaram por momentos de dificuldades e de reestruturação. No entanto, o município continua a atrair trabalhadores que, apesar de residirem em municípios vizinhos, encontram em Franca seus postos de trabalho, especialmente no setor industrial e de comércio e serviços.

No período mais recente, registrou-se crescimento no setor de comércio do município, evitando a consolidação de um fluxo significativo de saída de recursos em direção a outros pólos de atração regional.

Os aspectos demográficos indicam a necessidade de geração de aproximadamente 4.600 novos empregos anuais, mantidas as atuais taxas de crescimento vegetativo, migração, ocupação e desemprego.

Os indicadores sociais do município, comparados com o Brasil e mesmo com o Estado de São Paulo, evidenciavam que Franca estava, no início dos anos 1990, em uma situação bastante favorável, com um grau de desenvolvimento humano que pode ser considerado elevado. Em termos positivos havia os indicadores de saúde e habitação; em termos negativos, havia os indicadores relativos às condições da infância. Os indicadores de educação estavam na média estadual, assim como os de renda. De 1991 para cá, as indicações mostram que as condições de saúde e de educação apresentaram melhora em termos absolutos. Quanto às condições de vida infantil, os problemas têm sido enfrentados pela sociedade local, com resultados positivos nos últimos tempos. As condições de renda, no entanto, aparentemente apresentaram evolução negativa.

O mercado de trabalho em Franca é bastante concentrado no setor industrial, especialmente nos setores associados à indústria calçadista. Apesar de o município possuir um nível médio de formalização, mais elevado que a média do interior do Estado, isto não indica que a questão não deva merecer a atenção das autoridades, pois esta média é enganosa, já que setorialmente a informalização é maior em quase todos os ramos da atividade econômica. Em termos de rendimento, a renda média do setor formal do município é menor que a renda média do Estado, tendo inclusive uma tendência declinante. Esta tendência desfavorável é explicada, em parte, pelas dificuldades que os principais setores econômicos do município atravessaram no período recente, que acarretaram uma precarização das condições do mercado de trabalho francano.

A indústria calçadista utilizou como formas de ajuste à crise do setor, tanto a dispensa de empregados quanto modificações no mercado de trabalho, sendo que ocorreu um importante movimento de terceirização, aumentando o chamado "trabalho doméstico" em etapas do processo produtivo da indústria de calçados. Deste modo, parte dos empregos formais perdidos acabou sendo recuperado no setor informal, fazendo com que os dados anteriores, referentes aos empregos informais, provavelmente devam ter aumentado ao longo da década de noventa. Outra indicação importante da precarização da mão-de-obra em Franca é o declínio dos empregos atribuídos aos níveis médios e altos de qualificação, enquanto que os postos de trabalho que exigem mão-de-obra menos qualificada cresceram.

Entretanto, a indústria, especialmente a ligada ao setor calçadista, continua sendo o setor mais relevante no município, assistindo na atual década uma dinâmica de reestruturação e de enfrentamento de vários problemas, especialmente relacionados às suas exportações. A indústria de calçados de Franca sofreu forte concorrência no mercado internacional nos anos 1990, e acabou por modificar o segmento de mercado onde atuava, dando menos atenção à linha popular para buscar uma linha de produtos de maior qualidade e maior preço. Por outro lado, a crise do setor calçadista, especialmente depois de 1994, pode também, em parte, ser explicada pelas dificuldades impostas ao setor exportador pela política econômica (valorização cambial etc.), que se aliaram às dificuldades de inserção da indústria brasileira no mercado externo. Por fim, pressões de relocalização industrial em direção a novas regiões (estados) produtores também afetaram o setor no município.

Esse cenário de reestruturação econômica pelo qual Franca tem passado nos últimos anos, aponta para uma série de problemas que têm acometido o município, o que mais salta aos olhos é a questão da geração e qualidade do emprego e, conseqüentemente, da renda, problema que tem afetado, fundamentalmente, as populações mais pobres do município.

No intuito de caracterizar a inserção no trabalho da população considerada mais pobre de Franca, passamos a demonstrar os dados da pesquisa propriamente dita.

Observamos dentre os indivíduos pesquisados que 67,2% dessas pessoas realizaram algum tipo de trabalho nos últimos sete dias, já 32, 8% afirmaram não o terem feito. Isso mostra que a maioria dos pesquisados estava trabalhando no momento da pesquisa. Mas, o contingente de indivíduos que não estavam trabalhando é significante, atestando um alto índice de desempregados, corroborando com os índices de desemprego atuais.

 

 

Ademais, há que se dizer que dentre os indivíduos que estavam trabalhando nos últimos sete dias, 33% não estavam inseridos no trabalho formal, e a maioria (67%) pertence ao grupo do trabalho protegido, formal, como demonstraremos no Gráfico 2. Percebemos que o mercado formal predomina sobre o informal, o que consideramos ser um dado positivo, se si compara com os dados nacionais em que há paridade entre formalidade e informalidade.

 

 

CARACTERIZAÇÃO DO TRABALHO FORMAL

Dentre os trabalhadores formais, detectados em nossa pesquisa, observa-se que a freqüência das mulheres é de 50,4% (com a presença de três grávidas), e 49,6% de homens. Portanto, não há diferença expressiva quanto ao sexo para os trabalhadores formais, neste caso.

Curiosamente, em termos raciais os negros predominam em nossa pesquisa quanto à freqüência de trabalho formal (55,2%), em seguida está à cor "branca" (43%), posteriormente, indígenas (1,1%) e amarelos (0,7%). Esse dado não corresponde às estatísticas nacionais em que os brancos abocanham a maior parte dos trabalhos formais.

Dos nossos trabalhadores formais, 62,5% advém do próprio estado de São Paulo, portanto, a maioria. Em segundo lugar do estado de Minas Gerais (26%), o que se explica pela proximidade deste Estado a Franca. Em terceiro lugar o estado do Paraná (3,3%), e, em quarto lugar a Bahia com 2,6%.

Também, buscamos compreender se os trabalhadores formais apresentavam algum problema de saúde e relacionamos este dado ao tipo de trabalho realizado pelos mesmos, no intuito de detectar se havia predominância de doenças em algum setor específico. Percebemos que majoritariamente não acusam nenhum problema de saúde, e, dentre os que acusam, relatam como principais problemas: os cardíacos, hipertensão e diabetes, em trabalhadores da indústria calçadista; depressão em um caso, também em trabalhador da indústria calçadista; e outras doenças pulverizadas em vinte e cinco trabalhadores de diversos setores. O que chama atenção aqui é que as doenças tidas como crônicas predominam em trabalhadores do setor calçadista, que é o setor de trabalho predominante dos sujeitos pesquisados. Infelizmente, a pesquisa não permite dizer se há relação direta entre adoecimento e trabalho. No entanto, sabemos por outras pesquisas e pela experiência de trabalho que tivemos na área da saúde que o tipo e as condições de trabalho influenciam diretamente no processo saúde-doença do trabalhador, e tem determinado muitos adoecimentos.

Quando olhamos para o tipo de atividade exercida detecta-se que 39,7% dos trabalhadores formais estão na indústria calçadista, portanto, a maioria, o que corresponde com a economia da cidade de Franca, a qual, ainda, tem no setor calçadista o motor de sua economia, ainda que, o setor de serviços tenha crescido nos últimos anos. Em segundo lugar aparecem atividades de comércio 16,9%, depois outras (12%), infelizmente não sabemos quais; com 9,7% atividades exercidas em residências, o que entendemos como trabalho doméstico. Numa freqüência de 8,6% estão atividades relacionadas a demais indústrias, não sabemos exatamente quais, mas temos dados de que a indústria de lingerie tem crescido em Franca; a construção civil e prestação de serviços estão empatadas em 6% cada uma, portanto, vemos que, embora, o setor de serviços tenha crescido em Franca, parece que não atinge, ao menos em grande escala, estes trabalhadores. E, por fim com 1,1% aparecem às atividades gerais.

 

 

Em consonância com o dado anterior percebemos que a maioria (40,8%) das ocupações exercidas relaciona-se com o setor calçadista, se consideramos a soma do pespontador de calçados com as demais ocupações da indústria calçadista e ocupações do setor coureiro, o que comprova a predominância deste setor em Franca. Depois aparecem outros serviços (38,5%); seguido dos serviços domésticos (9,6%), e os demais pulverizam-se em balconista, pintor/pedreiro, servente, vendedor autônomo.

Pois bem, quais são as condições de trabalho destes trabalhadores? No que concerne a carga horária de trabalho dos mesmos, chama-nos atenção que apenas 6,7% deles trabalham menos de 40 horas; os demais trabalham 40 horas (47,4%); de 41 a 48 horas (28,1%); e, mais de 48 horas 17,8%. Portanto, a jornada de trabalho predominante é de 40 horas, no entanto, os que destinam mais de 40 horas semanais do seu tempo ao trabalho representam um percentual significativo de 45,9%. Com este dado vemos o quanto o trabalho subtrai do trabalhador tempo de vida, refletindo no tempo para o lazer, arte, cultura, ou seja, outras mediações necessárias para a vida. Ademais, na produção capitalista maior jornada de trabalho não traduz-se em maiores salários e é necessária à acumulação capitalista8!

Uma vez que estes trabalhadores estão no mercado formal de trabalho, quais são os direitos trabalhistas que usufruem? Em primeiro lugar aparece a cesta básica (14,1%) dos casos; em segundo, auxílio alimentação (13,3%), em terceiro, vale transporte (12,2%); após, seguro de vida (11,1%); vale-refeição (6,3%); vale condução (5,9%); auxílio creche/material escolar (5,2%); vale supermercado (4,8%); transporte da empresa (3,3%); e por fim vale combustível (1,10%). Estes direitos precisam ser compreendidos na sua contraditoriedade, ou seja, por um lado constituem-se em conquistas históricas dos trabalhadores, e atuam na manutenção da vida dos mesmos, na forma de salário indireto, por outro lado, encobrem a relação conflituosa entre capital e trabalho, conformando os trabalhadores em relações perversas de trabalho.

 

CARACTERIZAÇÃO DO TRABALHO INFORMAL

Sobre aqueles que trabalham informalmente temos que 53,74% eram homens e 46,26% mulheres, portanto, no caso desta população não dá para dizer que esta condição de trabalho afeta de maneira distinta os diferentes sexos.

Quando tentamos entender se esta condição de trabalho afeta mais a uma faixa etária específica vemos que os jovens (de 15 a 30 anos) 41,8% predominam no trabalho informal, o que demonstra uma inserção precária dos jovens no mercado de trabalho.

No que se refere à raça/cor temos que 50,7% do total desta população se classifica como branca e 49,3% negros, o que não revela, neste caso, uma possível discriminação étnica, embora saibamos da presença deste fenômeno no mercado de trabalho brasileiro.

A pesquisa, também, nos mostrou que a maioria dos trabalhadores informais é proveniente do próprio estado de São Paulo, e, em segundo lugar de Minas Gerais, não caracterizando, desta forma, um trabalho próprio de imigrantes, como muitos acreditam.

No aspecto da saúde 4,5% destes trabalhadores afirmam serem pessoas com algum tipo de deficiência (na visão, mental e audição); e sobre as condições de saúde 80,9% não auferem nenhum problema, mas 19,1% dizem terem algum problema na saúde, dentre estes se destacam cardíacos e hipertensão.

Após caracterizar o indivíduo que trabalha 'sem carteira assinada', cabe a este diagnóstico retratar as condições em que este trabalho é desempenhado.

Símbolo da economia francana, a indústria calçadista é responsável por quase um terço dos empregos informais dos indivíduos que relataram que nos sete dias antes da entrevista haviam trabalhado sem 'carteira assinada' (Gráfico 4). E que pese este fato, outros setores têm destaque quando analisados isoladamente: o comércio, a prestação de serviços, a construção civil e o trabalho em residências, também, concentram parte dos entrevistados.

 

 

Dentre as ocupações exercidas, encontra-se com destaque o 'pespontador de calçado', Esta ocupação, exercida geralmente por laços informais estabelecidos entre as pessoas e a indústria de calçados, pode ser considerada símbolo do trabalho informal francano. Na maioria dos casos este trabalho de 'acabamento' do processo de produção, que é intensivo no uso da mão-de-obra, estabelece-se entre conhecidos, ex-funcionários ou 'amigo do amigo' do funcionário. É uma informalidade em cadeia, que expõe a fragilidade da economia do município. Durante a realização da pesquisa de campo era comum encontrar pessoas sentadas na calçada ou nas garagens pespontando sapatos, mesmo entre aqueles que não foram selecionados para entrevista. Além do pesponto de sapatos, as outras ocupações do setor coureiro-calçadista totalizam mais de 10% do trabalho informal.

Conforme já destacado, o Gráfico 5 retoma parcela das informações do Gráfico 4, destacando como ocupações informais a construção civil (ocupações de pintor, pedreiro ou servente) e o trabalho em residências (serviços domésticos) que corresponde, cada um, a cerca de 10% do trabalho informal relatado pelos entrevistados.

 

 

O indivíduo 'sem carteira assinada' trabalha tanto ou mais do que o empregado registrado. Quase metade dos entrevistados relatou que trabalha 40 horas ou menos na semana, enquanto a outra metade citou uma jornada de trabalho mais ampla. Mais de um terço dos trabalhadores pesquisados dedica-se além de 48 horas semanais à atividade laboral.

Também observamos que em 70% destes trabalhadores esta condição de trabalho não é temporária, pois, já estão há mais de um ano trabalhando informalmente.

 

3 CONCLUSÃO

Esta pesquisa buscou entender as particularidades das condições de trabalho das pessoas localizadas nas regiões mais vulneráveis de Franca/SP, no intuito de, a partir destes dados, pensar em conjunto com o poder público municipal e organizações da sociedade civil em propostas de trabalho e renda, ainda que, entendamos os limites deste tipo de proposta devido à forma como se configura o mundo do trabalho nos dias de hoje.

Pudemos observar as condições de trabalho dos trabalhadores pesquisados, tanto os inseridos no mercado formal, quanto os do mercado informal. Verificamos em ambos os casos que o tipo de atividade exercida é reflexo da economia da cidade baseada, quase que exclusivamente, na fabricação de calçados. Este setor emprega formalmente, mas também, e, significativamente, emprega informalmente muitos trabalhadores: homens, mulheres, e, inclusive crianças e adolescentes. Não só os dados da pesquisa mostram isso, como a observação feita enquanto realizávamos a investigação in locu: algumas localidades parecem "fábricas" a céu aberto: vêem-se, principalmente, mulheres e adolescentes costurando sapatos! Como se recebe pouco para a realização deste tipo de trabalho se destina muito tempo a esta atividade, pois, quanto mais se produz mais se ganha! Ainda que, nunca se ganha de fato o que se produz, uma vez que a produção excedente não é apropriada pelo trabalhador!

Ainda, temos que destacar o número de trabalhadores desempregados 32,8% de nossa amostra, perfazendo um total de 212 pessoas, em sua maioria jovem entre 15 e 30 anos na seqüência está o grupo de pessoas entre 31 e 45 anos, que representa um quarto de todos aqueles que estavam procurando emprego. Aqueles entre 46 e 60 anos representam cerca de 20% daqueles que procuram emprego e pessoas acima de 60 anos totalizam cerca de 10% da amostra. Dentre estes trabalhadores 65,5% deles estão a procura de trabalho num período que varia de um mês a um ano, 11,6% há mais de um ano, configurando longos períodos de desemprego, e, um pouco mais de um quinto buscam trabalho há menos de um mês.

Pensamos ser de fundamental importância evidenciar as condições de trabalho dos trabalhadores nas suas particularidades, no intuito de aproximar-se, decifrar e entender a realidade que se desenha cotidianamente. A ciência prescinde do mundo real e o Serviço Social como profissão que atua diretamente com os trabalhadores, também!

 

REFERÊNCIAS

FERREIRA, Maria P.; DINI, Nádia P. e FERREIRA, Sinésio P. Espaços e dimensões da pobreza nos municípios do estado de São Paulo: Índice Paulista de Vulnerabilidade Social IPVS. São Paulo em Perspectiva. São Paulo, v.20, n.1, jan-mar 2006.

KOGA, Dirce. Território e políticas públicas. In: Wanderley, M.B. e OLIVEIRA, I.M.C. (org.). Trabalhando com famílias. SP: IEE-PUC/SP, 2004.

MARANDOLA JR, Eduardo e HOGAN Daniel J. As dimensões da vulnerabilidade. São Paulo em Perspectiva. São Paulo, v.20, n.1, jan-mar., 2006.

MARX. K. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1983. v. 1. L. 1. t. 1. (Os economistas).

______. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1984. v. 1. L. 1. t. 2. (Os economistas).

______. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2004.

______; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

MUSTAFA, Patrícia Soraya.; LAISNER, Regina; PAVARINA, Paula Regina de J. P. Relatório final de pesquisa APLIS. Franca, 2010.

_____________;BENATTI, L. P. S. Trabalho e necessidades: há satisfação das necessidades humanas na era do capital? In: LOURENÇO, E. A. S.; NAVARRO, V. L.; BERTANI, I. F.; SILVA, J. F. S.; SANT'ANA, R. S.(Orgs.). O Avesso ao Trabalho II: Trabalho, Precarização e Saúde do Trabalhador. Franca: Expressão Popular/UNESP/FAPESP, 2010.

 

 

1 Pesquisa financiada pelo Edital CNPq nº 50/2006 - Seleção pública de projetos de pesquisa nas áreas de Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas - Processo nº 401983/2007-2. A pesquisa foi concluída em fevereiro de 2010. Os pesquisadores responsáveis por esta investigação foram: Profa. Dra. Regina Claudia Laisner, Profa. Dra. Patrícia Soraya Mustafa e Profa. Dra. Paula Regina de Jesus Pinsetta Pavarina.
2 Este grupo é vinculado a Unesp/ Franca, cadastrado no CNPq, com a coordenação da Profa. Dra. Regina Laisner.
3 A Fundação SEADE (estado de São Paulo) cria o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS) de todos os municípios do estado de São Paulo, índice demonstrado através de seis grupos que variam de nenhuma até alta vulnerabilidade, constituídos a partir de informações de renda, escolaridade, aliados a dados referentes ao ciclo de vida familiar, com base nas informações do censo do IBGE de 2000.
4 "[...] um primeiro pressuposto de toda a existência humana, e, portanto, de toda a história, ou seja, o de que todos os homens devem ter condições de viver para poder 'fazer a história'. Mas, para viver, é preciso antes de tudo beber, comer, morar, vestir-se e algumas outras coisas mais. O primeiro ato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam satisfazer essas necessidades, a produção da própria vida material [...]" (MARX; ENGELS, 2007, p. 21). No entanto, as necessidades humanas não se resumem na satisfação das necessidades corpóreas, pressupõe estas, mas as ultrapassa como nos mostra Schulz: "Um povo, para se cultivar [de forma] espiritualmente mais livre, não pode permanecer na escravidão de suas necessidades corpóreas, não pode continuar a ser servo do corpo. Acima de tudo, tem de lhe restar tempo para poder também criar espiritualmente e fruir espiritualmente". (SCHULZ apud MARX, 2004, p. 31-32).
5 Os bairros pesquisados foram: Jardim Aeroporto II, III e IV, Santa Bárbara, City Petrópolis, Miramontes, Jd. Brasil, Jd. Centenário, São Luis e Jd. Paineiras.
6 Para a consecução desta pesquisa precisávamos de um parâmetro para a definição do lócus e sujeitos da mesma, e, neste sentido, o SEADE, nos possibilitou identificar no mapa de Franca as áreas mais vulneráveis, segundo sua metodologia, que, inclusive, a nosso ver é limitada para expressar situações de pobreza (devido ao limite dos gradientes que utiliza), entretanto, não contávamos com nenhum outro dado secundário que pudesse nos auxiliar nesta fase da pesquisa.
7 Marx em "O Capital" já dizia que "[...] uma população trabalhadora excedente é produto necessário da acumulação ou do desenvolvimento da riqueza com base no capitalismo, essa superpopulação torna-se, por sua vez, a alavanca da acumulação capitalista, até uma condição de existência do modo de produção capitalista. Ela constitui um exército de industrial de reserva disponível, que pertence ao capital de maneira tão absoluta, como se ele o tivesse criado à sua própria custa" (MARX, 1984, p. 200).
8 "O capital é trabalho morto, que apenas se reanima, à maneira dos vampiros, chupando trabalho vivo e que vive tanto mais quanto mais trabalho vivo chupa. O tempo durante o qual o trabalhador trabalha é o tempo durante o qual o capitalista consome a força de trabalho que comprou. Se o trabalhador consome seu tempo disponível para si, então rouba ao capitalista" (MARX, 1983, p. 189 Vol. I).