3, v.1Segurança e soberania no contexto chinêsA interação entre a política interna e a política externa: a teoria dos jogos de dois níveis e os temas sociais na política externa brasileira author indexsubject indexsearch form
Home Pagealphabetic event listing  




Print ISBN 2236-7381

3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

Tráfico de mulheres, feminismo e relações internacionais: uma abordagem histórica

 

 

Alexandre de Oliveira Kappaun

Mestrando em Relações Internacionais PPGRI-UERJ. Bolsista Capes

 

 


RESUMO

O tráfico de mulheres para fins de exploração sexual é um sério atentado aos direitos humanos das mulheres no contexto internacional e que demanda sérios estudos a fim de se conseguir combater efetivamente este criminoso ilícito internacional. Tal questão, no entanto, tem sido tratada marginalmente pelos estudiosos do mainstream das Relações Internacionais, desde a década de 1990, quando o assunto passou a ser examinado dentro do escopo dos supostos "novos temas globais" da disciplina. O trabalho aqui proposto defenderá o argumento de que, ao invés de ser um novo tema, o tráfico de mulheres, anteriormente conhecido como "trafico de brancas", é um problema que tem foi debatido e acompanhou a história das Relações Internacionais, desde o final do século XIX até meados do século XX, quando a questão praticamente desapareceu dos debates no interior da disciplina, com o advento da Guerra Fria. O trabalho terá, portanto, o objetivo de resgatar a história da relação entre o fenômeno do tráfico de mulheres e a história das relações internacionais, a fim de que tal história não fique perdida em alguma espécie de limbo histórico, acessível somente a alguns especialistas e estudiosos, mas possa contribuir para análise do tráfico e o seu combate.

Palavras-chave: Tráfico de Mulheres; Feminismo; Relações Internacionais


 

 

Em 5 de março de 2009, em Viena, durante a cerimônia de premiação das mulheres que se destacaram na luta por um mundo melhor, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC, em inglês) lançou sua Campanha do Coração Azul contra o Tráfico de Pessoas. No mês anterior, o UNODC divulgara o seu Global Report on Trafficking in Persons. Segundo o relatório, um dos maiores obstáculos ao combate do tráfico humano é o fato de que muitos Estados, ou ainda estão cegos para o problema, ou estão mal preparados para combatê-lo. O resultado disso é que, nos anos de 2007 e 2008, de cada cinco países cobertos pelo relatório, dois não apresentaram sequer uma única condenação por tráfico de pessoas (UNODC, 2009, p. 6). Na verdade, a questão é que, em termos jurídicos, o tráfico humano envolve uma gama tão variada de atividades, ou crimes, que, para muitas legislações, é difícil sua tipificação criminal. O tráfico de mulheres para fins de exploração sexual, por exemplo, envolve desde questões ligadas às migrações internacionais a questões ligadas à indústria do turismo sexual. Da migrante que se vê compelida a deixar o seu próprio país, em busca de melhores oportunidades, ao cliente que paga para usufruir de alguns momentos de prazer ao lado uma prostituta, diversas atividades estão envolvidas no que se procura classificar como tráfico de pessoas. Haveria, inclusive, uma suposta diferença entre tráfico humano e contrabando humano:

No contrabando humano, o imigrante paga ao contrabandista pela travessia. No caso do tráfico, o traficante decide, coage o imigrante e o vende como mão de obra. Muitos imigrantes voluntariamente contrabandeados contraem dívidas exorbitantes e arbitrárias que os levam a aceitar trabalhos aviltantes e condições de trabalho indignas, convenientemente "arranjados" pelos contrabandistas. (NAÍM, 2006, p. 85).

Ou seja, estas duas atividades - o contrabando e o tráfico humanos - acabam por se mesclar, tornando-se, em muitos casos, duas faces "de uma vasta nova indústria que prospera graças às aspirações daqueles que buscam uma vida melhor em algum lugar e aos obstáculos que os governos colocam no seu caminho" (NAÍM, 2006, p. 86).

Ao lançar o relatório e a Campanha do Coração Azul contra o Tráfico de Pessoas, a ONU, por meio do UNODC, prossegue em sua luta de combate ao contrabando e ao tráfico de pessoas, iniciada. Em sua fase atual,1 a partir de 2000, quando a Assembleia Geral da ONU aprovou a Convenção contra o Crime Organizado Internacional, também conhecida como Convenção de Palermo, e dois de seus documentos adicionais: o Protocolo Contra o Contrabando de Imigrantes por Terra, Mar e Ar e o Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças. Este último apresenta a seguinte definição:

"Tráfico de pessoas" deve significar o recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de pessoas, por meio de ameaças ou uso da força ou outras formas de coerção, de rapto, de fraude, de engano, do abuso de poder ou de uma posição de vulnerabilidade ou de dar ou receber pagamentos ou benefícios para obter o consentimento para uma pessoa ter controle sobre outra pessoa, para propósito de exploração. Exploração inclui, no mínimo, a exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual, trabalho ou serviços forçados, escravidão ou práticas análogas à escravidão, servidão, ou a remoção de órgãos. (JESUS, 2003, p. 8).

Essa é, segundo os especialistas, uma definição ampla, que busca garantir que a vítima do tráfico de pessoas não seja tratada como criminosa, ao mesmo tempo em que responsabiliza, penalmente, os traficantes (Idem, p. 9). O mais importante é que, ao aderir ao protocolo e internalizar suas disposições, os diferentes Estados, de maneira geral, passam a incorporar em suas leis a tipificação do crime de tráfico de pessoas, tirando-o da invisibilidade. Ademais, como este é um crime que não respeita fronteiras, envolvendo poderosas organizações criminosas transnacionais que funcionam em rede, não apenas a negociação e a assinatura do protocolo foram frutos de um processo de cooperação internacional, mas também a sua adesão e internalização são um estímulo à continuidade dessa cooperação na luta diária contra o tráfico de pessoas.

Não obstante todo esse esforço, os dados fornecidos pelos 155 países que participaram do relatório são estarrecedores. Em 2006, de um total de dois milhões de possíveis vítimas de tráfico, somente 21.400 pessoas (homens e mulheres) foram resgatadas. Isso representa menos de 1% do total de vítimas. De acordo com o documento, "a forma mais comum de tráfico humano (79%) é a exploração sexual"2 (UNODC, 2009, p. 6, tradução nossa), que afeta principalmente mulheres, meninas, transgêneros e travestis. Constata-se, no relatório, que as "mulheres estão envolvidas no tráfico humano, não apenas como vítimas (o que já sabíamos), mas também como traficantes (documentado pela primeira vez aqui)"3 (UNODC, 2009, p. 6, tradução nossa). De certa forma, é curiosa esta afirmação de que foi a primeira vez que se documentou a participação de mulheres como traficantes. No início do século XX, apareceram muitas mulheres implicadas nos crimes de aliciamento, tráfico e prostituição de mulheres. Porém, parece que toda a história anterior do tráfico de mulheres foi "esquecida".

No leste europeu e na Ásia Central, por exemplo, 60% das pessoas condenadas por tráfico humano são mulheres (UNODC, 2009). Uma das razões que talvez pudesse explicar a elevação destes números é o fato de que muitos Estados, ao aderirem ao protocolo acerca do tráfico de pessoas, chamaram a atenção para o crime do tráfico de pessoas, passando a registrar os dados relativos à sua ocorrência. Mas não deve ser só isso. Segundo estimativas reunidas por Moisés Naim, o tráfico e o contrabando humanos afetam "ao menos quatro milhões de indivíduos todos os anos, movimentando de sete a 10 bilhões de dólares" (NAIM, 2006, p. 85).

São projeções como essas que levam o autor a poder afirmar categoricamente que "o tráfico humano ainda não é o comércio ilícito mais rentável [...], mas é muito provavelmente o que mais rapidamente cresceu" (Idem, p. 85). É importante que tais conclusões, frutos de uma análise econômica do tráfico de pessoas, sejam continuamente aprimoradas e incorporadas pelos diversos órgãos responsáveis pelo combate ao tráfico humano, para que se possa ter uma correta dimensão do inimigo contra quem se está lutando e dos meios que devem ser empregados nessa luta.

Um breve histórico do tráfico de mulheres

No final do século XIX e início do XX, as capitais de países como o Brasil e a Argentina, Rio de Janeiro e Buenos Aires, respectivamente, viveram um vertiginoso processo de modernização e ocidentalização de suas áreas urbanas. Tal processo deve ser visto como resultado da expansão do sistema-mundo capitalista europeu e de uma consequente europeização dessas sociedades. Junto com supostos avanços, como o fim do tráfico negreiro e da escravidão e uma primeira onda de urbanização e industrialização dessas sociedades, vieram muitas das características negativas do sistema capitalista ocidental. Um dos aspectos mais perversos de todo esse processo é a coisificação do ser humano. Conforme coloca Menezes (1996, p. 153-155):

Neste contexto, a mulher, transformada em simples mercadoria, vendida através de fotos estampadas em cartões de visitas, tornou-se um dos produtos que a Europa exportou para os outros continentes à época do imperialismo: um novo tráfico de escravos que desafiava os valores tornados sagrados pela ordem capitalista, explicitando todo um mundo de contradições.

O tráfico de mulheres, ou "tráfico das brancas", como era conhecido então, tornou-se um dos maiores escândalos internacionais do período. Junto com os mercados ditos lícitos, expandiam-se os ilícitos ou marginais, como esse do tráfico internacional de mulheres para fins de exploração sexual. O Rio de Janeiro passou a ser "um dos principais mercados no circuito internacional, acompanhando todas as superposições e substituições de rotas que, da Europa, debruçavam-se sobre a América e o resto do mundo" (MENEZES, 1996, p. 152). O mesmo acontecia em Buenos Aires, onde:

Já em 1890, quando a Argentina começou a receber grandes ondas de imigração, um comércio de escravas brancas em grande escala começou a importar mulheres da Polônia e Hungria. Estas mulheres, conhecidas como polacas eram bem diferentes de outras prostitutas estrangeiras que chegavam "à Argentina, em um fluxo constante e de todos os cantos da Europa" (Goldar, 48). "Polaca" era o termo genérico aplicado a todas as prostitutas judias na Argentina. Violações da lei, amplamente toleradas por oficiais de alfândega corruptos, facilitavam sua entrada ilegal no país e a sua difusão por toda cidade de Buenos Aires. (GLICKMAN, 2000, p. 5, tradução nossa).4

Na verdade, na capital Argentina, as coisas pareciam ainda piores. Segundo Menezes (2006: 64), "Buenos Aires tornara-se o polo organizador do transbordo para toda a América do Sul". Na cidade, havia representantes das principais organizações europeias responsáveis pelo "tráfico de brancas". Era o famoso "caminho de Buenos Aires", uma das principais e mais lucrativas rotas do tráfico, na ocasião.

Em ambos os casos, tanto no Brasil quanto na Argentina, o tráfico e a exploração sexual de mulheres envolviam a participação de grandes organizações criminosas internacionais, como a temida e poderosa Zwig Migdal5 (MENEZES, 1996; MENEZES, 2006; GLICKMAN, 2000; LARGMAN, 2007). Tais organizações possuíam poderio econômico e estrutura capazes de corromper e cooptar oficiais de alfândega, delegados de polícia e outras autoridades públicas, permitindo que suas atividades criminosas se espalhassem e prosperassem.

Se, no início, Brasil e Argentina eram países receptores na geoeconomia do tráfico internacional de mulheres para fins de exploração sexual, tal quadro vai se transformando, ao longo do século XX, até que, a partir dos anos 1970, países desenvolvidos, como os da Europa Ocidental, os Estados Unidos e o Japão cristalizam sua posição como países receptores na economia política do tráfico.

O jornalista canadense, Victor Malarek, ao narrar a história recente do tráfico, divide o mesmo em grandes "ondas". A primeira onda teria acontecido, segundo ele, durante a década de 1970, quando mulheres asiáticas, sobretudo filipinas e tailandesas, eram "exportadas" para os países industrializados ricos. A segunda onda teria começado no início dos anos 1980, quando mulheres africanas, sobretudo ganenses e nigerianas, passaram a ser o "produto" exportado. A terceira onda, já a partir de meados dos anos 1980, teria como ponto de partida a América Latina e as mulheres "exportadas" provinham, em sua grande maioria, da Colômbia, Brasil e República Dominicana (MALAREK, 2004, p. 6). Haveria, ainda, uma quarta onda, proveniente dos países do leste europeu e da antiga União Soviética, que teria se iniciado com o fim do socialismo real na Europa centro-oriental e o colapso da União Soviética, a partir do final dos anos 1980. É importante ressaltar que essas ondas se sobrepõem e que o início de uma nova onda não representa o fim das anteriores.

Além dessas grandes rotas internacionais, têm-se, ainda, as domésticas e as regionais. Chega-se, portanto, à infeliz conclusão de que o negócio do tráfico humano, incluindo aí o tráfico de mulheres, floresce como nunca antes na história. Segundo Naim (2006, p. 85),

O tráfico através de fronteiras, que é apenas uma parte de todo esse quadro, transporta aproximadamente de 700 mil a dois milhões de pessoas por ano. (A compra e venda de seres humanos dentro dos países aumenta ainda mais essa conta.) É difícil estabelecer os números exatos, principalmente quando se trata de comércio ilícito. Mas os governos, organizações internacionais e grupos ativistas que rastreiam esses fluxos concordam em um ponto: o número de pessoas que cruzam ilegalmente as fronteiras hoje em dia, geralmente em condições coercitivas, não tem precedentes na história.

Outros, contrariando prognósticos como os de Naim, dizem que o tráfico seria a indústria ilícita mais rentável da atualidade, mais lucrativa até do que a indústria da droga, visto que esta precisaria ser cultivada, colhida, refinada e embalada, antes de ser vendida, ao passo que o corpo feminino não precisaria passar por nenhum processo desse tipo, podendo ser vendido e revendido muitas e muitas vezes (KARA, 2009).

A economia política do tráfico de mulheres

Como, nos casos dos tráficos de drogas e armamentos, é muito difícil elucidar alguns dos elementos que compõem o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual e classificá-los como parte da demanda ou da oferta, já que estariam presentes em ambos os lados da economia política do tráfico de mulheres.

Grosso modo, pode-se dizer que as indústrias do turismo sexual, da prostituição e da pornografia estariam entre os principais fatores que alimentam a demanda pelo tráfico. A feminista lésbica Sheila Jeffreys (2009)6 mostra como a indústria de prostituição e do sexo transformou-se em um mercado multibilionário, que afeta tanto a economia de muitos países isoladamente, como a economia global como um todo. Fazem parte dessa indústria atividades como a pornografia, que hoje já tem um alcance global (JEFFREYS, 2009, p. 62-85); o "comércio adulto", que incluiria sex-shops, strip clubs e agências de acompanhantes (Idem, p. 86-106); o casamento por encomenda (Idem, p. 38-61); o turismo sexual (Idem, p. 129-151); e o tráfico de mulheres (Idem, p. 152-172). Esses seriam, portanto, os principais fatores que determinariam a demanda do tráfico de mulheres para fins de exploração sexual.

No caso da oferta, ou seja, do que garante o suprimento de mulheres e até mesmo de crianças que serão traficadas para serem exploradas sexualmente, esta está ligada ao fenômeno mais geral das migrações internacionais, conforme tem ressaltado Menezes (2007b) em seus estudos sobre migrações e tráfico de mulheres. Um dos tipos de imigrantes seriam os alvos do tráfico internacional de seres humanos: indivíduos deslocados de seus países de origem por força ou coerção, com vistas à sua exploração no estrangeiro. Cada vez mais lucrativa, os

alvos principais são mulheres e crianças, fazendo reviver, em pleno século XXI, a tragédia da escravidão. De acordo com estimativas do U.S. Justice Department, referentes a 2001, entre 700.000 e 2.000.000 mulheres e crianças foram vítimas de tráfico. (MENEZES, 2007b, p. 208-217).

Na maioria das vezes, as mesmas questões que levam uma pessoa a querer emigrar, ou seja, sobretudo questões econômicas e políticas, tornariam determinadas mulheres mais suscetíveis a caírem (ou a se deixarem cair, ou, ainda, a serem jogadas) nas malhas do tráfico internacional de pessoas. São muitos os dramas e histórias pessoais de cada uma das "vítimas" do tráfico de mulheres para fins de exploração sexual. Algumas se viram enganadas, outras coagidas e outras foram voluntariamente. O denominador comum a todas essas narrativas talvez seja o desejo por melhores condições de vida, em um mundo onde, para muitos, talvez o pior não seja simplesmente a pobreza, mas a pobreza relativa, que leva muitos a terem tão pouco e a poucos a terem quase tudo. O fenômeno da globalização e a porosidade das fronteiras nacionais são catalisadores, nesse processo, contribuindo para que o tráfico humano venha se tornando uma dura e perversa realidade no mundo atual.

Por trás de todos esses fatores, que afetam a demanda e a oferta do tráfico de mulheres, encontram-se questões culturais mais profundas, relacionadas à sociedade consumista em que se vive atualmente, onde os seres humanos são coisificados e as relações pessoais são comodificadas. Ademais, esta é uma cultura que ainda mantém características de uma superestrutura altamente patriarcal e, em alguns casos, profundamente misógina, mesmo nos países mais avançados e progressistas. O patriarcado serve para explicar a sujeição e a discriminação das mulheres que se tornam, desta forma, presas potenciais para as redes criminosas responsáveis pelo tráfico e pela exploração sexual de mulheres. Sob a influência do patriarcado, são construídos socialmente os gêneros feminino e masculino, a partir de papéis e expectativas sociais e valores que contribuem para a cristalização, na prática, da sujeição da mulher, o que reforça a sua comodificação.

 

O campo da disciplina das Relações Internacionais

A conclusão a que se pode chegar, a partir da análise dos dados apresentados sobre o tráfico de mulheres, é que este é, hoje, um flagelo que atinge praticamente todos os países e regiões do planeta, configurando-se um problema mundial, ou seja, um tema a ser debatida no âmbito das Relações Internacionais. Conforme foi visto, o tráfico, na verdade, faz parte de toda uma estrutura que envolve organizações criminosas transnacionais, muitas vezes com o conluio de policiais e autoridades, turismo sexual, prostituição, questões ligadas à pobreza e à migração internacional e, sobretudo, desrespeito aos direitos humanos das mulheres. Dada a forma como o histórico das Relações Internacionais foi construído pelo mainstream da disciplina, no entanto, parece que o tráfico, juntamente com outras questões ligadas às diferentes formas de migração internacional, não foi, durante muito tempo, debatido ou, quando muito, ficou relevado às margens da disciplina (MENEZES, 2007c, p. 200-201).

Os dois principais corpos teóricos do mainstream das Relações Internacionais, a saber, o realismo (incluindo em seu bojo o neorrealismo) e o liberalismo (herdeiro do antigo idealismo), só, marginalmente, abordam questões ligadas às migrações internacionais e ao tráfico de pessoas.7 Com o chamado Terceiro Debate,8 essas questões começaram a ganhar algum destaque nas discussões do campo. Foi quando as correntes pós-positivistas (construtivismo, teoria crítica, sociologia histórica, pós-modernismo, pós-colonialismo e as diversas correntes feministas) passaram a questionar os cânones e a influenciar mais fortemente as diversas ciências sociais, incluindo as Relações Internacionais. De acordo com Samuel Alves Soares et al. (2009, p. 221),

No início da década de 1980, com o chamado Terceiro Debate, emergiram formas mais reflexivas de investigação teórica nas teorias das relações internacionais que submeteram as abordagens ortodoxas - realismo, liberalismo e marxismo - a um minucioso exame crítico.

Tais correntes teóricas, no entanto, ainda lutam para conquistar o seu espaço e a aceitação no interior das Relações Internacionais. Muitos acadêmicos veem com suspeita e descrença a fragmentação teórica acarretada pelo terceiro debate e não o consideram como consequência do amadurecimento teórico da disciplina (POSSAS; REIS, 2009, p. 229). Isso faz com que os esforços dos pós-positivistas não se voltem apenas para a demonstração dos seus pressupostos teóricos e o desenvolvimento dos seus argumentos, mas, também, muitas e muitas vezes, para a afirmação e a reafirmação das falhas e das limitações dos debates entre realistas e liberais.

A verdade, contudo, é que as teorias que hoje ocupam o mainstream da disciplina criaram um mito fundacional para o campo acadêmico, que acabou por encobrir muitos dos debates e das preocupações originais das Relações Internacionais. Pode-se afirmar que a narrativa que acabou figurando como a "história oficial" da disciplina, por ser apresentada na grande maioria dos manuais de Relações Internacionais, é a que constrói o campo de estudos da disciplina como sendo resultado da oposição entre as teorias do mainstream acadêmico em um relato quase que teleológico rumo a uma ciência cada vez mais positivista. Essa suposta evolução teria sido quebrada, de maneira quase que inexplicável, com o surgimento do Terceiro Debate.

Isso faz com que algumas dos temas e das discussões que começaram a (re)aparecer com o Terceiro Debate pareçam marginais, ou até mesmo alheios, a um suposto núcleo duro da disciplina. É importante resgatar discussões como as que dizem respeito ao tráfico de mulheres e a outras questões relacionadas aos direitos humanos e temas afins para o centro da discussão no interior do campo da disciplina.

Por uma história alternativa das Relações Internacionais

Segundo o professor da Relações Internacionais Craig N. Murphy (2001, p. 63), dois dos principais fundadores do campo da disciplina foram o economista inglês John A. Hobson, na Grã-Bretanha, e a pacifista, escritora e professora universitária norte-americana Emily Greene Balch,9 nos Estados Unidos. Ambos, além de intelectuais e acadêmicos foram ativistas que lutaram contra os imperialismos britânico e estadunidense e a favor dos trabalhadores industriais. Balch defendia, ainda, os interesses das mulheres e dos imigrantes e foi uma ativa participante da Liga Internacional das Mulheres para a Paz e a Liberdade, o que a levou a ter sido agraciada com o Prêmio Nobel da Paz, em 1946, juntamente com John Mott.

Tanto Hobson quanto Balch procuraram compreender a política internacional, com o objetivo de trazê-la para o âmbito do debate público, contrariando os argumentos realistas dos diplomatas e generais, de sua época, que defendiam que os assuntos de Estado, dentre estes a diplomacia e as relações internacionais deveriam permanecer secretos e confinados aos especialistas. Essa é a origem do impulso democrático que tem permanecido presente, em maior ou menor grau, no desenrolar da história das Relações Internacionais. Muitos dos acadêmicos de Relações Internacionais da geração entre guerras defenderam, não apenas "a influência pacífica da opinião pública sobre a política externa".10 Também foram "ardentes críticos do isolacionismo dos Estados Unidos e alguns dos mais apaixonados defensores da Liga das Nações."11 E,

no início dos anos 1930, quando a maioria das agências da Liga começaram a passar por crises financeiras crônicas, alguns acadêmicos estiverem dispostos a se mudarem para Genebra e trabalharem em troca de pouco ou nenhum pagamento a fim de fazer parte da equipe das instituições sitiadas (antecipando uma prática que tem sido típica no interior da ONU, desde meado da década de 1980, quando os Estados Unidos pararam de pagar o valor total de sua contribuição). Outros permaneceram na academia, trabalhando com o intuito de divisar novos e mais eficazes sistemas de governo internacional e para convencer a nova geração de membros da elite a aceitarem a legitimidade destes (MURPHY, 2001, p. 65-66, tradução nossa).12

Até mesmo no interior do realismo do pós-guerra, o ímpeto democrático se fez presente. Alguns dos primeiros teóricos realistas, como por exemplo Carr, Reinhold Niebuhr em sua primeira fase e Karl Polanyi, também procuraram escrever para o público em geral, defendendo o debate público dos assuntos ligados às relações internacionais (MURPHY, 2001, p. 66). Foi só depois, durante a Guerra Fria, que o realismo deu sua guinada para a direita, que o caracteriza atualmente, incorporando em suas fileiras acadêmicos e policy makers como George Kennan, o Niebuhr mais velho e Henry Kissinger, dentre tantos outros.

O mesmo aconteceu no interior do movimento behaviorista, dentro do qual teóricas como Elise Boulding, considerada a matriarca dos estudos sobre a paz e conflito. Aliás, um dos principais objetivos dos cientistas behavioristas dedicados a estudar a paz era o de trazer esta discussão para o público em geral, ao invés de deixá-la restrita aos políticos, diplomatas, militares e os seus asseclas na academia. Este é o mesmo impulso democrático que tem animado a grande maioria dos teóricos pós-positivistas, a partir dos anos 1980 e até os dias de hoje.

Como se pode ver, a "história oficial" da disciplina das Relações Internacionais peca por suas simplificações, lacunas e pelo seu suposto caráter teleológico rumo a um inexorável progresso científico. Ao menos até o momento em que surge o Terceiro Debate e as suas inúmeras dúvidas e incertezas a abalar a supostamente sólida construção do campo das Relações Internacionais pelos teóricos positivistas. O professor de Relações Internacionais Robert Keohane (1988, p. 381, tradução nossa), por exemplo, declarou que o que ele chama de "abordagens reflexivistas" ou "sociológicas" "não têm nem a coerência, nem a autoconfiança dos racionalistas",13 que são os teóricos positivistas. Ainda de acordo com Keohane (Idem), "o programa de pesquisas racionalista é tão poderoso, em termos heurísticos, justamente por não aceitar, de forma tão fácil, relatos baseados em observações post hoc de valores ou de ideologias".14

Tentando inutilmente lançar uma última pá de cal sobre as pretensões dos pós-positivistas, Keohane (Idem, p. 392) chega à seguinte conclusão:

De fato, a maior fraqueza da escola reflexivista não se encontra na deficiência de seus argumentos críticos, mas na ausência de um claro programa de pesquisa reflexivista que possa ser usado pelos estudiosos da política mundial. O neorrealismo waltziano possui tal programa de pesquisa; assim como o institucionalismo neoliberal [...]. Até que os acadêmicos reflexivistas ou outros simpáticos aos seus argumentos tenham esboçado tal programa de pesquisa e demonstrado, em estudos específicos, que pode esclarecer questões importantes em política mundial, eles permanecerão confinados às margens do campo da disciplina, largamente invisíveis ante a preponderância dos pesquisadores empíricos, a maioria dos quais aceitam, explícita ou implicitamente, uma ou outra versão das premissas racionalistas.15

Não obstante o pensamento desejoso de acadêmicos do mainstream das Relações Internacionais, a previsão de Keohane não se concretizou. As "teorias tradicionais" em Relações Internacionais sofreram um forte abalo, ao não conseguirem antever o colapso do socialismo real na Europa centro-oriental, o desmantelamento da União Soviética e o final pacífico da Guerra Fria, no final da década de 1980 e início da década seguinte, o que acabou lançando fortes dúvidas sobre as metodologias positivistas e os seus programas de pesquisa. Concomitantemente, as diferentes correntes de pensamento pós-positivistas não permaneceram "confinadas às margens do campo da disciplina". Ao contrário, atualmente, muitos pesquisadores empíricos aceitam, explícita ou implicitamente, muitas das críticas dos assim chamados "reflexivistas" às premissas racionalistas.

Pode-se dizer, portanto, que os pós-positivistas, com o seu pluralismo metodológico e a sua abordagem interpretativa das relações internacionais, não representam nenhuma ruptura ou degenerescência do campo acadêmico da disciplina. São, na verdade, uma continuação, com ímpeto renovado, do impulso democrático, há muito presente e hoje já parte da tradição, na disciplina das Relações Internacionais.

 

O tráfico de mulheres na história das Relações Internacionais

O "tráfico das brancas" era uma das consequências da expansão do capitalismo e do imperialismo por todo o mundo, a partir da segunda metade do século XIX. Havia, de um lado, a transformação de todos os aspectos da vida humana, inclusive o ser humano, em mercadorias - commodities - a serem compradas e vendidas. Do outro, o patriarcado - estrutura muito anterior ao próprio capitalismo - e a cultura dele resultante, que contaminavam todas as esferas da sociedade, eram responsáveis pela sujeição da mulher ao homem, fato que muito contribuiu para que muitas mulheres se tornassem presas fáceis para as garras das redes criminosas associadas ao tráfico. A europeização do mundo, sinônimo de modernidade na época, fazia com que a mulher branca europeia se transformasse em artigo a ser cobiçado. Segundo Menezes (2006, p. 62),

havia uma outra face da chamada Belle Époque nos países de capitalismo dependente, nos quais as meretrizes estrangeiras representavam, em certa medida, a chegada da modernidade, ou, pelo menos, a europeização dos costumes.

Os tentáculos do tráfico, portanto, atingiam dimensões colossais, ligando o antigo continente ao novo mundo. Dos cantos mais pobres da Europa, incluindo sobretudo a Europa Oriental e a Europa Mediterrânea, vinham as pobres vítimas do tráfico. Este, porém, não se restringia à periferia europeia, havendo casos de mulheres traficadas provenientes da Europa Ocidental. Na Europa Oriental, Odessa, na Ucrânia, era o principal entreposto e centro de distribuição de mulheres traficadas. Já Marselha, na França, era o ponto de distribuição para a América do Sul (MENEZES, 2006, p. 64). E Buenos Aires, como já foi dito, era o polo distribuidor do tráfico para toda a América do Sul.

É claro, que uma indústria criminosa deste porte contava com a conivência de autoridades corruptas em consulados, alfândegas e delegacias de polícia, "além do auxílio operacional de empregados do porto e de marinheiros em trânsito (MENEZES, 2006, p. 64)". A já mencionada Zwig Migdal e outras tantas organizações dedicadas ao tráfico de mulheres e à sua prostituição faziam do lenocínio e do caftismo fontes dos seus grandes lucros. As suas garras estendiam-se da Europa à América, desde a captação de vítimas à sua exploração sexual do outro lado do oceano. A exploração feminina e o sucesso da empresa do tráfico defendiam, sobretudo, de sua dimensão internacional. O fato de levarem as suas vítimas para serem exploradas sexualmente em um país estranho, com uma língua estranha e sem as redes de proteção social que contavam em suas próprias sociedades, a indústria do tráfico conseguia submeter e explorar suas vítimas com muito mais facilidade.

Todos esses fatores, em conjunto, fizeram com que o "tráfico das brancas" se tornasse um problema em evidência no cenário internacional, o que levou à negociação e à assinatura dos seguintes tratados internacionais. Em 18 de maio de 1904, era concluído, em Paris, o primeiro documento internacional dedicado ao combate ao tráfico, o Acordo Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas. O acordo foi assinado, sobretudo, por países europeus, os "exportadores" de mulheres. Em 4 de maio de 1910, de novo em Paris, era concluída a Convenção Internacional Relativa à Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas. Desta vez, o documento foi assinado por países de todos os continentes, e não apenas europeus. Depois da Primeira Guerra Mundial, já no âmbito da Liga das Nações, foi assinado em Genebra, no dia 30 de setembro de 1921, a Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres e de Crianças. Mais uma vez, a convenção foi assinada por países de todos os continentes. Em 11 de outubro de 1933, em Genebra, foi assinada a Convenção Internacional Relativa à Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores. Já no escopo da ONU, em 21 de março de 1950 foi concluída, em Nova Iorque, a Convenção para a Repressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio (MENEZES, 2006, p. 54-55).

Se todos esses acordos e convenções internacionais servem para provar, de um lado, que o "tráfico de brancas" era uma questão que atraía a atenção da comunidade internacional, a assinatura de diversos tratados internacionais com o mesmo objetivo, de outro, comprova que o tráfico era (e ainda é) um problema de difícil solução. Na maioria dos casos, os diferentes acordos ou convenções apenas repetiam, com mais pormenorização, artigos e itens de documentos anteriores. Não eram apenas os políticos e diplomatas, através dos canais oficiais, porém, que lutavam contra o tráfico. A opinião pública de diversos países sensibilizava-se diante de tão grave problema. Organizações não governamentais internacionais que lutavam pelos direitos das mulheres, como a Federação Abolicionista Internacional, fundada pela feminista holandesa Josephine Butler promoviam campanhas e lutavam contra a prostituição e o tráfico de mulheres e crianças (HAAN, 1999).

Neste ponto, é importante ressaltar a importância dessas organizações e de como elas conseguiam atingir a opinião pública, fazendo com que esta pressionasse os seus políticos e diplomatas a adotarem certas posições no cenário internacional, no que diz respeito ao combate ao tráfico e à prostituição. Ou seja, qualquer análise em Relações Internacionais que queira dar conta desse problema precisa levar em conta não apenas os atores estatais, como defendem muitos realistas, mas também os não estatais, como as ONGs, as organizações criminosas transnacionais e diversos outros grupos de pressão, religiosos ou seculares, que desempenhem papéis relevantes no cenário em questão.

Com a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria, o tráfico de mulheres parece ter diminuído e adquirido uma certa invisibilidade. Já a partir dos anos 1990, com o fim do socialismo real no leste europeu e o colapso da União Soviética o tráfico de mulheres ganhou novo impulso e voltou a ser assunto de discussão no cenário internacional. Depois da Conferência Mundial dos Direitos Humanos (1993), em 1996, a ONU lança o Programa de Ação da Comissão de Direitos Humanos para a Prevenção do Tráfico de Pessoas e a Exploração da Prostituição e, em 2000, o Protocolo Adicional da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, mais conhecido como Protocolo de Palermo, inclui em seu artigo terceiro o tráfico de pessoas, incluindo o de mulheres e crianças, como parte do crime organizado transnacional (CASTILHO, 2007, p. 12-13). Hoje, o tráfico de mulheres continua sendo uma grave afronta aos direitos humanos das mulheres.

Há muito em comum entre o tráfico de brancas do final do século XIX e início do XX e o tráfico sexual dos dias de hoje. Em ambos os casos, há fortes componentes estruturais, seja na constituição das relações internacionais, seja na predominância de uma cultura patriarcal de sujeição da mulher, que servem para explicar o fenômeno do tráfico. É óbvio que existem, também, especificidades e particularidades associadas a cada um dos períodos históricos.

O mais importante é que se procure, a partir de tais semelhanças e diferenças, compreender o fenômeno do tráfico em todas as suas dimensões e aspectos. Só com tal compreensão é que se conseguirá combater, com sucesso, este criminoso atentado aos direitos humanos que faz com que mulheres, em pleno século XXI, se vejam exploradas sexualmente e reduzidas a uma situação análoga à escravidão. Para tal fim, as Relações Internacionais e as teorias feministas fornecem um ferramental indispensável e que pode (e deve) ser associado à contribuição das demais ciências sociais, no combate ao tráfico internacional de mulheres para fins de exploração sexual.

 

REFERÊNCIAS

CASTILHO, Ela Wiecko V. de. Tráfico de Pessoas: Da Convenção de Genebra ao Protocolo de Palermo. In: Ministério da Justiça, Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Brasília: Ministério da Justiça, 2007.

GLICKMAN, Nora. The Jewish White Slave Trade and The Untold Story of Raquel Liberman. Nova York: Garland Publishing, 2000.

HAAN, Francisca de. The Rise of Caring Power: Elizabeth Fry and Josephine Butler in Britain and the Netherlands. Amsterdam: Amsterdam University Press, 1999.

JEFFREYS, Sheila. The Industrial Vagina: The political economy of the global sex trade. Oxon: Routledge, 2009.

JESUS, Damásio de. Tráfico internacional de mulheres e crianças - Brasil: aspectos regionais e nacionais. São Paulo: Saraiva, 2003.

KARA, Siddharth. Sex Trafficking: Inside the business of modern slavery. Nova York: Columbia University Press, 2009.

KEOHANE, Robert O. International Institutions: Two approaches. International Studies Quarterly, vol. 32, nº 4, 1988.

LARGMAN, Esther. Jovens Polacas: Da miséria na Europa à prostituição no Brasil. Rio de Janeiro: Best Bolso, 2008.

MALAREK, Victor. The Natashas: the new global sex trade. Toronto: Penguin Canada, 2004.

MENEZES, Lená Medeiros de. Os Indesejáveis: Desclassificados da modernidade. Protesto, crime e expulsão na Capital Federal (1890-1930). Rio de Janeiro: EdUERJ, 1996.

MENEZES, Lená Medeiros de. Violência de Gênero: O tráfico de mulheres como estudo de caso. In: LEMOS, Maria Teresa Toríbio Brittes (org.). Religião, Violência e Exclusão. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006.

MENEZES, Lená Medeiros de. Um Outro Olhar sobre a Diplomacia e as Relações Internacionais: o tráfico de mulheres como estudo de caso. In: Célia Ap. Tolentino; Lídia M. Vianna Passos; Rodrigo Alves Correia (org.). Idéia e Cultura nas Relações Internacionais. Marília: Oficina Universitária, 2007ª, pp. 75-84.

MENEZES, Lená Medeiros de. Movimentos Migratórios e Direitos Humanos. In: Silene de Moraes Freire (org.). Direitos Humanos. Violência e pobreza na América Latina contemporânea. Rio de Janeiro: Letra e Imagem, 2007b, pp. 208-217.

MENEZES, Lená Medeiros de. Movimentos Migratórios: resgate necessário nas Relações Internacionais. In: LESSA, Mônica Leite; GONÇALVES, Williams da Silva (org.). História das Relações Internacionais: teoria e processos. Rio de Janeiro: EdUerj, 2007c.

MURPHY, Craig N. Critical Theory and the Democratic Impulse: Understanding a century-old tradition. In: WYN JONES, Richard (ed.). Critical Theory & World Politics. Boulder: Lynne Rienner Publishers, 2001.

NAÍM, Moisés. Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e do tráfico à economia global. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.

POSSAS, Lídia Maria Vianna; REIS, Sarah de Freitas. Reflexões Feministas acerca das Relações Internacionais. In: MATHIAS, Suzeley Kalil (org.), Sob o Signo de Atena: Gênero na diplomacia e nas forças armadas. São Paulo: Editora Unesp, 2009.

SARFATI, Gilberto. Teoria de Relações Internacionais. São Paulo: Saraiva, 2005.

SOARES, Samuel Alves; SÉLIS, Lara Martim Rodrigues; COSTA, Juliana Alves da. De Afrodite a Melíade? O feminismo nos estudos de segurança. In: MATHIAS, Suzeley Kalil (org.), Sob o Signo de Atena: Gênero na diplomacia e nas forças armadas. São Paulo: Editora Unesp, 2009

UNODC. Global Report on Trafficking in Persons. Viena: UNODC, 2009.

 

 

1. Com esse itálico quis chamar atenção para o fato de que, embora alguns autores (NAÍM, 2005; MALAREK, 2004) pareçam nos deixar a impressão de que o tráfico de pessoas é um tema "novo" (a exceção do tráfico negreiro, é claro) para as relações internacionais, na verdade, a discussão já vem de há muito tempo. De acordo com a historiadora Lená Medeiros de Menezes e como veremos ao longo deste artigo, ao menos no que diz respeito ao tráfico de mulheres, o debate remonta ao início do século XX, quando foi firmado o primeiro acordo internacional de Repressão do Tráfico de Mulheres Brancas (Paris, 1902). Desde então vários acordos, convenções ou emendas foram estabelecidos (MENEZES, 2007a, p. 82-83).
2. O texto em língua estrangeira é: "sexual exploitation is by far the most commonly identified form of human trafficking (79%)".
3. O texto em língua estrangeira é: "a disproportionate number of women are involved in human trafficking, not only as victims (which we knew), but also as traffickers (first documented here)."
4. O texto em língua estrangeira é: "As early as 1890, when Argentina began to receive large waves of immigration, a large scale commerce of white slaves began to import women from Poland and Hungary. These women, known as polacas were very different from other foreign prostitutes who arrived "in a constant flow from all corners of Europe to Argentina" (Goldar, 48). "Polaca" was the generic name applied to all Jewish prostitutes in Argentina. Violations of the law, widely tolerated by corrupt officials in the customs office, facilitated their illegal entry into the country, and their spreading throughout the city of Buenos Aires."
5. Conforme coloca Menezes, a partir da declaração de um delegado de polícia da época: "Com estrutura semelhante à Maçonaria, a Zwig Migdal possuía organização piramidal e distribuía títulos honoríficos. Como aquela, caracterizava-se pelo silêncio, pela cumplicidade e solidariedade entre seus membros, definindo-se como uma verdadeira sociedade secreta tradicional" (MENEZES, 1996, p. 173).
6. O feminismo lésbico é uma das espécies de feminismos. O movimento, que teve o seu período de maior popularidade nos anos 1970 e no início da década de 1980, procurar questionar a posição das mulheres, sobretudo das lésbicas na sociedade.
7. Há, ainda, um terceiro corpo teórico, o marxismo Porém, a sua posição, dentro do mainstream da disciplina possui um menor peso.
8. De acordo Gilberto Sarfati: "O primeiro debate de Relações Internacionais foi a polêmica entre o Idealismo versus o Realismo entre as décadas de 1920 e de 1940. Já o segundo debate se deu nas décadas de 1950 e 1960, associado à discussão história versus ciências. O terceiro debate, conforme enunciado por Yosef Lapid, diz respeito ao positivismo versus o pós-positivismo" (SARFATI, 2005, p. 301).
9. Com o propósito de lutar contra a invisibilidade das mulheres nas Relações Internacionais, procuramos, nesta seção, demonstrar que as mulheres sempre estiveram presentes - apesar de, muitas vezes terem sido silenciadas, em prol de uma suposta, mas mentirosa, neutralidade de gênero no campo da disciplina -, ao resgatar, sempre que possível, o nome de pioneiras no campo acadêmico, como Emily Greene Balch e Elise Boulding.
10. O texto em língua estrangeira é: "the pacific influence of public opinion over foreign policy".
11. O texto em língua estrangeira é: "ardent critics of U.S. isolationism and some of the most impassioned advocates of the League of Nations".
12. O texto em língua estrangeira é: "By the early 1930s, when most League agencies began to experience chronic financial crises, some scholars were willing to move to Geneva and work with little or no pay to staff the beleaguered institutions (anticipating a practice that has been typical within the UN since the mid-1980s, when the United States stopped paying its full assessments). Others stayed in the academy, working to design new, more effective systems of international government and to convince the next generation of elites to accept their legitimacy".
13. O texto em língua estrangeira é: "have neither the coherence nor the self-confidence of the rationalists".
14. O texto em língua estrangeira é: "the rationalistic program is heuristically so powerful precisely because it does not easily accepts accounts based on post hoc observation of values of ideology".
15. O texto em língua estrangeira é: "Indeed, the greatest weakness of the reflective school lies not in deficiencies in their critical arguments but in the lack of a clear reflective research program that could be employed by students of world politics. Waltzian neorealism has such a research program; so does neoliberal institutionalism [...]. Until the reflective scholars or others sympathetic to their arguments have delineated such a research program and shown in particular studies that it can illuminate important issues in world politics, they will remain on the margins of the field, largely invisible to the preponderance of the empirical researchers, most of whom explicitly or implicitly accept one or another version of rationalistic premises".