3, v.1A privatização da força e os novos desafios para a segurança internacional: empresas militares privadas no Afeganistão e IraquePolíticas econômicas dos países emergentes na crise de 2008: uma análise sobre coordenação e o papel da governança global índice de autoresíndice de materiabúsqueda de trabajos
Home Pagelista alfabética de eventos  




ISBN 2236-7381 versión impresa

3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

A convenção do milênio e sua efetividade como fonte de uma ordem mais justa e democrática no Brasil*

 

 

Ariadne Celinne de Souza SilvaI; Celeida Maria C. S SilvaII

IAcadêmica do 4º ano de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. E-mail: ariadnecelinne@uol.com.br
IIDoutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas e docente da Universidade Católica Dom Bosco. E-mail: celeidams@uol.com.br

 

 


Com o fim da Segunda Guerra Mundial, além da mudança no equilíbrio geopolítico, iniciou-se também a valorização do princípio da dignidade da pessoa humana. Entretanto, neste mundo regido pelas correntes econômicas, muitas vezes são esquecidos os direitos e valores propagados pela Declaração dos Direitos do Homem de 1948. Os Tratados Internacionais de Direitos Humanos representam a luta pela integração mundial em prol da efetivação destes direitos. A Declaração do Milênio é um destes tratados, seu texto sintetiza o esforço pelo desenvolvimento socioeconômico igualitário mundial. Devemos utilizar da globalização, ou seja, da extinção de fronteiras e interdependência estabelecida entre os povos para atingir as metas estabelecidas pelos Objetivos do Milênio (ODM), e este é o principal desafio, pois existem grandes diferenças econômicas e sociais entre os países. Como as metas se resumem ao ano de 2015, já é sabido que muitos países não vão efetivá-las. Acreditamos que os ODM devem ser adaptados e analisados a partir de um estudo da situação de cada país, suas regiões e estados. E este é o ponto do nosso trabalho: analisar como esses objetivos estão sendo trabalhados no Brasil, em especial no Estado de Mato Grosso do Sul.

Palavras-chave: Direito Internacional dos Direitos Humanos, Declaração do Milênio, Equidade e Efetivação dos Direitos Humanos


 

 

Direitos Humanos

As metas vislumbradas pelos Objetivos do Milênio são consequência de anos de luta pela afirmação e reconhecimento dos direitos fundamentais do homem, dos direitos humanos. Muitas declarações como a Declaração de Vírgínia (1776), Bill of Rights Norte-Americana (1791), A Declaração do Homem e do Cidadão (1789) foram necessárias para que estes direitos fossem reconhecidos, temos como a mais expressiva e universal destas a Declaração Universal Sobre os Direitos do Homem aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948.

Esta declaração foi resultado do pós-guerra, fruto da destruição que permeou a realidade mundial durante os anos da Segunda Guerra Mundial. Vivenciamos perseguições a determinadas etnias, o genocídio, além da explosão de duas bombas atômicas no Japão, durante os últimos meses do conflito. Claramente, um modo de explicitar o poder de fogo da potência "vencedora" da guerra.

Temos a proteção e proclamação da igualdade por esta declaração, a igualdade de ser, de possuir propriedade, de ser igualmente protegido pela lei, de ser livre, de ser humano. Enfim, de ter resguardada a dignidade da pessoa humana.

O artigo 7º da Declaração Universal Sobre os Direitos do Homem já diz:

Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Atingir essa igualdade de fato, em relação a condições de vida, educação, acesso ao direito, à propriedade e a oportunidades, é a busca dos objetivos do milênio.

Os tratados internacionais firmam acordos entre os países, e obviamente, não se restringem às fronteiras. O compromisso estabelecido por estes é permanente.Os Objetivos do Milênio foram estabelecidos pela Declaração do Milênio assinada por 189 líderes mundiais durante a Cúpula do Milênio das Nações Unidas em setembro de 2000. Esta declaração fundamenta valores fundamentais para o século XXI: a liberdade, a igualdade, a solidariedade e a tolerância.

Os líderes mundiais assinaram um pacto com: a paz, o respeito, defesa da dignidade humana e equidade. Atingir os objetivos do milênio significa consolidar os direitos humanos e suas diretrizes no sistema mundial. O desenvolvimento de políticas sociais para que todos tenham acesso ao Direito é uma das prerrogativas para a execução dos Objetivos do Milênio.

Já diz a Declaração Universal dos Direitos Humanos em seu artigo 1º que "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade."

Apesar dos direitos humanos serem universais, a visão destes pelos diversos Estados ainda não é equivalente. Isto se deve as diferenças regionais de desenvolvimento que temos tanto na escala mundial quanto local.

Como diz Norberto Bobbio em A Era dos Direitos, o problema maior dos direitos humanos não é a aceitação destes, mas sim a proteção, a efetividade, a passagem destes de um mundo filosófico e distante para uma real aplicação na sociedade.

 

Convenção do Milênio

O texto da Declaração do Milênio trata da responsabilidade comum dos signatários para lutar pelo desenvolvimento socioeconômico igualitário mundial. Os países devem se utilizar da globalização, ou seja, da extinção de fronteiras e interdependência estabelecida entre os povos, em benefício da igualdade e da redução da injustiça social em âmbito mundial.

Os signatários se comprometeram a estabelecer metas governamentais e de desenvolvimento encaminhando seus países para atingir tais objetivos que incluem: erradicação da extrema pobreza, reduzindo-a pela metade; atingir o ensino básico fundamental; promover a igualdade entre os sexos e autonomia das mulheres; reduzir a mortalidade infantil e melhorar a saúde materna; combater o HIV invertendo a propagação dessa e de outras doenças (como a malária); garantir a sustentabilidade ambiental e estabelecer parceria mundial para o desenvolvimento.

A grande dificuldade está na operacionalização dos Objetivos do Milênio (ODM), principalmente pelas grandes diferenças econômicas e sociais presentes entre os países. Sabemos que muitos não vão se aproximar das metas até 2015. Por isso, pesquisadores discutem as maneiras pelas quais os ODM podem ser interpretados.

Sakiko Fukuda-Parr1 cita três formas dos ODM serem visualizados: como objetivos normativos definidores de visões a longo termo; como um nível de qualidade para avaliar o progresso; plano de objetivos determinantes para as prioridades políticas e para a distribuição de recursos.

Para o autor determinar a forma pela qual se instrumentalizará os ODM é fundamental para a implementação destes e a indefinição presente em relação a se classificarem como metas globais ou locais dificulta esta avaliação.

Sakiko Fukuda-Parr vê como necessária e fundamental a delimitação dos ODM de maneira local, porque cabe a estes estabelecerem as áreas prioritárias de investimento nos governos. E se tem percebido que estas áreas apesar de muitas vezes serem ligadas aos ODM, acabam não sendo comprometidas com estes.

Esta inconsistência também é destacada Jan Vandermoortele2 que questiona se as metas dos ODM são ou não mal compreendidas. Afirma que as metas ao serem estabelecidas consideraram o progresso global entre 1970 e 1980, portanto, não seguiram as tendências históricas de cada região ou país.

Para o autor as metas do milênio não devem ser compreendidas de maneira rígida, pelo contrário, devem ser adaptadas à realidade local de cada região.  Afinal, baseando-se somente em dados estatísticos quantitativos, muitas melhorias não foram e não serão consideradas. Ou seja, para ele os ODM não devem ser utilizados como uma medida uniforme para medir o desenvolvimento global.

Vandermoortele estabelece quatro passos para que um país aplique os ODM de maneira adequada: estabelecimento de metas adequadas à realidade local, mesmo que essas sejam menos ambiciosas que as dos ODM globais; ligação dos ODM às agendas políticas dos governos no poder através de metas intermediárias; propostas concretizáveis e reformas devem ser formuladas para que possam acompanhar o progresso, mantendo em vista os objetivos acordados a longo prazo; o curso destas ações e reformas devem ser estimadas fazendo parte do orçamento nacional.

Acreditamos que os ODM devem ser adaptados e analisados a partir de um estudo da situação de cada país, suas regiões e estados, para que dessa forma os ODM sejam instrumentos em direção ao desenvolvimento. O foco destes objetivos é a redução da pobreza e a eliminação desta para a promoção da igualdade e redução das diferenças. Entretanto, muitos autores discutem a real eficácia destes objetivos, por acreditarem que não estabelecem direitos e sim, simples estatísticas momentâneas.

Paul Nelson3 segue essa linha e estabelece uma comparação entre duas estratégias de redução da pobreza: uma possibilidade seria através das metas dos objetivos (goals) e a segunda via seria através de metas baseadas em direitos humanos (rights-based aproaches), não considera que os ODM sejam utilizados para a criação e fomentação de direitos. Pelo contrário, expõe diferenças nas estratégias de redução da pobreza entre uma aproximação pelos ODM e pelas "Rights-based aproaches", ou seja, estratégias baseadas em princípios dos Direitos Humanos.

Enfim, trata as metas (goals) e os direitos (rights) como duas correntes divergentes. Para o autor, os ODM distanciam-se dos direitos humanos, pois se tratam de metas numéricas; já os direitos humanos teriam um apelo normativo, por dotarem a população de direitos. Para ele, as metas pertencem a instituições internacionais, enquanto os direitos e deveres cabem aos indivíduos.

Sustenta que os ODM por serem metas de rápido impacto, não focam nas razões de existência dos problemas e somente na alteração estatística, enquanto os Direitos Humanos focam na origem dos problemas.  Para ele, a ausência deste foco social está presente na exclusão de direitos como acesso a terra, o trabalho, crédito, das metas dos ODM.   Em sua visão, os ODM são ótimos para mobilizar doadores e fundos mundiais, mas, não tem eficácia para o estabelecimento do Direito.

Verificamos diante destas correntes expostas que a implantação dos ODM varia conforme a corrente de interpretação utilizada. Podendo ser vistos como um modo de se atingir os direitos humanos ou como simples alcance de metas estatísticas.

 

Objetivos do Milênio no Brasil

O Brasil tem presente na sua norma suprema a valorização dos Direitos Humanos, inclusive estabelecendo em seu artigo primeiro que a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, CF) é o fundamento do Estado Democrático de Direito presente no país.

Além disso, a norma constitucional estatui como objetivos fundamentais do Estado brasileiro: garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (Art. 3º,II, III, IV, CF). A Constituição Federal também determina a prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais (Art. 4º, II).

Pela Constituição Federal de 1988, portanto, aferimos que o comprometimento do Estado Brasileiro com os direitos humanos e com a promoção da igualdade vai além dos Objetivos do Milênio, estando enraizado nos princípios que devem guiar o país, suas normas e estrutura.

É coerente a assinatura da Convenção do Milênio pelo Brasil e seu comprometimento com o projeto, pois, infelizmente muitos dos direitos assegurados pela norma constitucional são descumpridos rotineiramente. A desigualdade está presente no país e como vimos, o combate a esta é um dos princípios do Estado Democrático de Direito estabelecido no país.

A desigualdade dificulta o acesso ao direito, à educação e faz com que muitos dos direitos invocados pela nossa Constituição sejam um vir a ser, transformando-se numa luta da sociedade para o estabelecimento destes.

Os ODM invocam a luta e participação do país e de sua população.  Servem como um guia social, para que as metas quando alcançadas possam representar a redução da desigualdade, da pobreza e o estabelecimento de fato de princípios já vigentes nas nossas normas, mas não tão eficazes quanto deveriam ser na sociedade.

Instituições de pesquisa brasileiras têm desenvolvido estudos de acompanhamento dos objetivos do milênio, assim como o governo federal publica planos nacionais nas mais diversas áreas. De maneira exemplificativa podemos citar: o Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres, Política Nacional de Assistência Social, Plano de Desenvolvimento da Educação e o Plano Nacional de Direitos Humanos.  Estes Planos Nacionais estabelecem os pontos a serem priorizados pelo governo federal, além de servirem como orientação para os Estados e Municípios.

O Plano Nacional de Direitos Humanos merece um destaque especial, pois além de ter sido muito discutido na mídia devido a algumas polêmicas relativas à liberdade de imprensa, ele apresenta uma programação muito ampla em relação aos direitos humanos. Caso estas metas sejam desenvolvidas de maneira e forma expostas pelo relatório do programa, o país continuará no caminho certo rumo à democratização do acesso aos direitos humanos.

O Programa tem como ponto principal a orientação do desenvolvimento pelos direitos humanos e grande parte destas diretrizes se atingidas representariam um forte impacto nos Objetivos do Milênio. Para exemplificar, podemos citar as seguintes diretrizes4:

A garantia da participação e do controle social das políticas públicas em Direitos Humanos através de um diálogo plural e transversal entre os vários atores sociais; promoção dos direitos humanos como princípios orientadores das políticas públicas e das relações internacionais; a garantia de Desenvolvimento de mecanismos de controle social das políticas públicas de Direitos Humanos, garantido o monitoramento e a transparência das ações governamentais; a efetivação do modelo de desenvolvimento sustentável, com inclusão social e econômica, ambientalmente equilibrado e tecnologicamente responsável, cultural e regionalmente diverso, participativo e não discriminativo; implementação de políticas públicas de desenvolvimento com inclusão social; afirmação dos princípios da dignidade humana e da equidade como fundamentos do processo de desenvolvimento nacional; e a valorização da pessoa humana como sujeito central do processo de desenvolvimento.

A Política Nacional de Assistência Social5 também pode ser utilizada como fonte para se determinar os rumos do Brasil em relação aos Objetivos do Milênio, visto que retrata a exclusão social como um processo para o combate da desigualdade e da pobreza. A Política tem como objetivo potencializar a família como unidade de referência, procura oferecer um conjunto de serviços locais para a promoção da integração comunitária e do mercado de trabalho.

Como podemos ver, o estudo dos Objetivos do Milênio exige uma visão ampla da sociedade e uma ação abrangente dos governos para que possam ser atingidos. Dessa forma, é necessário estudar quais programas e projetos relacionados com as áreas abrangidas pelos Objetivos do Milênio estão sendo colocados em prática e qual a eficácia destes perante a sociedade. Os projetos não são voltados especificamente para os Objetivos do Milênio, mas dividem com estes a vontade de reduzir a desigualdade no país.

 

Objetivos do Milênio em Mato Grosso do Sul

No Brasil existem vários estudos que têm como objetivo verificar o andamento dos Objetivos do Milênio no território nacional. Um destes estudos foi publicado em março de 2010, o 4º Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos do Milênio6. O relatório é resultado de um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e coordenado pela Casa Civil.

Como não temos um estudo específico da evolução do Estado de Mato Grosso do Sul perante os Objetivos do Milênio, utilizaremos de uma comparação sistemática de um relatório7 do centro-oeste8 datado de 2004, o último relatório desenvolvido pelo governo federal sobre os ODM e uma comparação entre os projetos do governo federal e dos governos estaduais.

Segundo o 4º relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos do Milênio, o Brasil já alcançou integralmente o primeiro objetivo do milênio, atingindo as metas nacionais9 e internacionais de redução da extrema pobreza e da fome. Reduziu-se o número de brasileiros abaixo da linha de pobreza (determinada pelo Banco Mundial), a percentagem de brasileiros com renda domiciliar per capita abaixo da linha da pobreza era de 25,6% e encontra-se em 4,8%.

A desnutrição também foi afetada, a porcentagem de crianças desnutridas já é menor do que o tolerável segundo a Organização Mundial de Saúde. Todavia, apesar das melhorias em relação à pobreza, à desnutrição e à fome, ainda é notável a diferença de desenvolvimento entre as regiões brasileiras, o próprio relatório diz que os números do país muitas vezes mascaram a realidade de muitas regiões que ainda não alcançaram determinados patamares de desenvolvimento.

Dados de 2004 demonstram que a renda per capita domiciliar no Mato Grosso do Sul (MS) não superou a média nacional.  Comparando-se o Brasil e a região do país em relação ao número de pessoas e o rendimento mensal, apresenta-se a preocupante desigualdade econômica no país, esta refletindo na região Centro-Oeste e no estado de Mato Grosso do Sul. A maior parte da população do MS vive com uma remuneração entre um e dois salários mínimos e essa média segue proporcionalmente a situação nacional.

Por números recentes do Estado de Mato Grosso do Sul, podemos perceber que a distribuição de renda de fato ainda está distante da nossa realidade. O relatório do Centro-Oeste apresenta uma estimativa de que em 2015 a proporção de pobres no Mato Grosso do Sul será de 16,7%.

Lembremos que é impossível falar em redução da pobreza sem melhorias nas taxas de educação, e as deficiências nestes pontos estão diretamente ligadas aos outros objetivos, como a promoção da igualdade e de melhoria nas condições de moradia e saúde da população.

O segundo objetivo do milênio apresentou melhorias no Brasil: a taxa líquida de escolarização, no ano de 2008, entre 7 a 14 anos passou os 93% em todas as regiões do país, porém, ainda permanece um número bem inferior quando a faixa etária é de 15 a 17 anos (o menor índice é de 36,4% no Nordeste e o maior é de 61,9% no Sudeste).

O relatório aponta para uma redução nas desigualdades de acesso ao ensino fundamental considerando-se parâmetros como o gênero, cor/raça e localização geográfica (rural/urbana).

Destaca-se a ampliação na taxa de conclusão do ensino fundamental e a virtual erradicação do analfabetismo entre os jovens nas regiões sul, sudeste e centro-oeste.  Houve também um aumento da adequação idade-ano escolar e uma ampliação na oferta de vagas para o acesso à escola na faixa etária de 4 a 17 anos de idade. Apesar das melhorias, continuamos a verificar uma grande diferença entre as regiões do país, além de grande defasagem na presença de alunos no ensino médio. No Mato Grosso do Sul, mais de 90% da população de pessoas de 5 anos ou mais é alfabetizada.

O terceiro objetivo do milênio trata da igualdade de gênero que no Brasil não pode ser resumida ao número de mulheres presentes nas escolas, já que no país as mulheres são maioria nas escolas, chegando ao ensino superior com uma presença 30% maior do que os homens. Entretanto, esses números não representam a realidade em todos os contextos, reproduzindo somente a média alcançada pela população brasileira, variando estatisticamente conforme a localização geográfica, poder econômico, idade e identidade étnica. O Mato Grosso do Sul segue a linha do Brasil em relação a esse Objetivo do Milênio.

O relatório aponta, inclusive, para uma segmentação de conhecimento, ou seja, para a tendência das mulheres em ocupar determinadas profissões mais desvalorizadas economicamente. As mulheres mantêm-se em desvantagem perante o mercado de trabalho, tendo uma menor participação e recebendo menos, ocupando postos com menor posição social.

Contudo, aumentou a percentagem de mulheres economicamente ativas (52,8% em 1998 e 57,6% em 2008) e a taxa dos homens economicamente ativos (82% em 1998 e 80,5% em 2008) reduziu. Muito destas diferenças são resultado das atribuições de atividades domésticas às mulheres e o desenvolvimento de outras atividades não remuneradas ou para o próprio consumo que não são acrescentadas às estatísticas.

Quanto à presença das mulheres no espaço de poder, ainda há uma grande ausência nos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, tanto no nível federal, quanto nos níveis estaduais e municipais.

A violência doméstica é um dos pontos de combate dos ODM no Brasil, as mulheres ainda são grandes vítimas de violência, por isso, pesquisas para conhecer a real dimensão do problema têm sido realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Ministério da Justiça.  As denúncias de violência contra a mulher aumentaram perante as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, em virtude de progressos na conscientização e visibilidade, consequentes também da promulgação da Lei Maria da Penha.

O Mato Grosso do Sul segue a orientação do Plano Nacional de Políticas para as mulheres para produzir políticas públicas objetivando as mulheres, não tendo, portanto uma ligação direta com os Objetivos do Milênio, mas uma abordagem ainda mais ampla do que a dada pelos objetivos.

O quarto objetivo pode ser atingido antes do prazo, a mortalidade na infância (menores de cinco anos) reduziu em 58% entre 1990 e 2008. O relatório estima que se a tendência de redução da mortalidade infantil na infância for mantida, a taxa que no momento é de 22,8 por mil nascidos vivos pode atingir o objetivo de 17,9 por mil nascidos vivos até 2013.

Houve redução no número de mortes de menores de cinco anos também no Mato Grosso do Sul, em 2000 o número de mortes no estado para menores de um ano de idade era de 943 e em 2007 o número foi de 719. Na faixa etária de 01 a 04 anos, os óbitos atingiam o número de 198 em 2000 e 155 em 2007.

Já a mortalidade materna, que estima a frequência de óbitos femininos ocorridos até 42 dias após o término da gravidez, reduziu em 46% entre 1990 e 2008, a taxa está em 75 óbitos por mil nascidos vivos, para o quinto objetivo ser cumprido o número de óbitos tem que ser reduzido para 35 a cada mil nascidos vivos.

Este objetivo tem grandes desafios para os próximos cinco anos, o relatório aponta para estes: melhora na investigação dos óbitos de mulheres em idade fértil, a redução no número de partos cesáreos e melhorias na qualidade da assistência pré-natal, assim como no parto e no pós-parto.

A meta de estabilização da epidemia da AIDS, uma das metas do sexto objetivo do milênio, foi atingida. As taxas de incidência crescentes até o ano de 2000 estão estabilizadas desde então. Além da AIDS, também foi reduzido o número de pessoas contagiadas pela malária e tuberculose.

O Brasil se impôs a meta de erradicação de hanseníase até 2010, essa meta não foi alcançada.  Em 2008, foram registrados 39.047 casos. Os coeficientes de detecção estão estáveis, mas se apresentam altos nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste.  Caso ocorra redução do coeficiente de casos novos com grau 2 de incapacidade pode significar a diminuição da endemia oculta e facilitar o tratamento da doença. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que esse coeficiente seja reduzido em 35% entre 2010 e 2015, contudo, o Brasil se propôs a redução de 13% para o período devido às dificuldades em atingir essa meta no país, o país foi o único das Américas a não atingir a meta de eliminação proposta pela OMS para o ano de 2000.

O relatório aponta muitas ações a serem tomadas como a ampliação da cobertura de teste do HIV no pré-natal e a utilização de preservativos; a diminuição da propagação da Tuberculose que tem maior incidência nas regiões Sudeste e Nordeste; investimentos na prevenção e controle da malária; e a maior dificuldade encontrada está na integração do diagnóstico e tratamento da hanseníase na atenção básica, porque o diagnóstico precoce é fundamental para o tratamento da doença.

O sétimo objetivo visa à garantia da sustentabilidade ambiental, por meio da inclusão da integração dos princípios do desenvolvimento sustentável nas políticas e programas nacionais e da reversão da perda dos recursos ambientais, tem como meta também a redução pela metade da proporção de população sem acesso permanente e sustentável a água potável e esgotamento sanitário até o ano de 2015, e até o ano de 2020 de se ter alcançado uma melhor significativa na vida de pelo menos 100 milhões de habitantes de assentamentos precários.

São muitos pontos abordados por esse objetivo, resumidamente nos encontramos na menor taxa de desmatamento na Amazônia Legal Brasileira em 21 anos de monitoramento, entretanto essa taxa sofreu um leve aumento no ano de 2007. O desmatamento estimado para o ano de 2009 é de 7.008 km²/ano enquanto em 2007 era de 12.911 km²/ano.

O Brasil alcançou a meta de redução à metade da proporção da população urbana sem acesso à água potável, entretanto nas áreas rurais a cobertura é mais baixa. Em 2008, 91,6% da população urbana já tinha acesso à água canalizada interna de rede geral, enquanto a taxa da população rural encontrava-se em 27,4%. Quanto ao acesso aos serviços de esgoto adequados a percentagem situava-se em 80,4% da população urbana e 23,1% da população rural.

As taxas de condições de moradia adequada estavam em 65,7% para a população urbana, no entanto, as taxas são desiguais quanto à etnia, sendo 73,8% para os brancos, 65,7% para os pretos e pardos.

O oitavo objetivo do milênio refere-se ao estabelecimento de uma parceria mundial para o desenvolvimento. O Brasil tem assumido grande importância no cenário internacional, consolidando parcerias com países mais pobres para incentivar o desenvolvimento destes, perdoando e dando desconto em dividas. Além de prestar ajuda estrutural e monetária, em situações de crises pelo mundo.

O Brasil assumiu uma postura de compartilhamento de conhecimentos e experiências bem sucedidas de desenvolvimento por meio de discussões nos principais órgãos e fóruns internacionais. O país tem se posicionado como líder dos países em desenvolvimento, afinal, apesar dos problemas estruturais de desigualdade apresenta-se como uma das maiores economias do mundo.

Considerando os dados que ora apresentamos a cerca do caminho percorrido até hoje pelo Brasil e no Mato Grosso do Sul em direção aos ODM é relevante dizer que há necessidade de continuar a investigar e de conhecer a real eficácia dos programas, projetos e orientações governamentais. Desse modo, uma visão mais cautelosa, abrangendo as mais diversas realidades das regiões e até mesmo estados do país, é o grande desafio.

Os dados a respeito do Estado de Mato Grosso do Sul, ainda são incipientes, levando-se em conta a ausência de documentação referente à evolução dos Objetivos do Milênio no Estado. Há uma rápida exposição de dados alusiva aos municípios, sem análise, presente no Portal dos Objetivos do Milênio na Internet.10

 

O caminho para os objetivos do milênio

O estado de Mato Grosso do Sul não possui um projeto exclusivo para os Objetivos do Milênio. Durante nossas pesquisas verificamos inúmeras metas e projetos relacionados a atividades destacadas pelos ODM, entretanto, não são exclusivas para estas.

Dessa forma, fica claro a necessidade de um projeto a longo prazo de desenvolvimento, que não se limite a permanência dos governos. O Mato Grosso do Sul possuía um projeto "MS 2020" que previa cenários e estratégias de longo prazo para Mato Grosso do Sul, pelo menos aparentemente este projeto continuou com as mudanças na administração pública.

A preocupação do governo em relação ao desenvolvimento social é presente em suas secretarias, principalmente na Secretaria de Estado e Governo, na Secretaria de Estado de Educação e na Secretaria de Estado de Trabalho Assistência Social e Economia Solidária (SETASS).

Em visita a SETASS, tivemos conhecimento do Plano Estadual de Direitos Humanos, Plano Estadual pela Erradicação do Subregistro Civil de Nascimento e ampliação do acesso à Documentação Básica de uma Unidade de Prevenção e Combate à Discriminação Étnico-social, unidade estadual antidrogas, unidade estadual de concessão do título de Utilidade Pública e de Regularidade de Situação, Programa de combate à Homofobia.  Além de programas relacionados ao desenvolvimento social, como o Programa Vale Universidade, Programa Vale Universidade Indígena, Programa Vale Renda, o Projovem Urbano, Projovem Adolescente, Centro de Referência em Direitos Humanos e Combate a Homofobia (CENTRHO), assim como a administração da casa de assistência social e cidadania.

Já ao irmos a coordenaria especial de políticas públicas para a mulher, tivemos conhecimento há um amplo programa estadual de promoção da igualdade, tendo como alvo a mulher. O programa abarca questões de enfrentamento à violência; saúde da mulher; direitos sexuais e reprodutivos; participação das mulheres nos espaços de poder; geração de trabalho, emprego e renda; valorização da produção cultural das mulheres sul-mato-grossenses.

Dessa maneira, podemos perceber que mesmo não havendo um programa estadual referente aos ODM muito dos programas são determinantes para que os objetivos possam ser alcançados.

Este modelo adotado pelo Mato Grosso do Sul, é reflexo das medidas adotadas pelo Governo Federal. Muitos dos projetos e programas implantados no estado são de natureza nacional, recebendo recursos e orientações do governo federal para sua implantação.

É possível exemplificar pelos projetos: bem me quer (age no fortalecimento dos vínculos familiares por meio do acompanhamento dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e Centros de Referência Especializados de Assistência Social (CREAS); projeto caminho pra casa; projeto na medida certa; sem contar os carros chefes: Fome Zero, Bolsa Família, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Brasil Sorridente, Farmácia Popular, Qualisus, Brasil Alfabetizado, Programa Universidade Para todos (PROUNI).

São inúmeros os projetos desenvolvidos pelo governo federal, inclusive, sendo divididos conforme os Objetivos do Milênio que integram no 4º Relatório Nacional dos Objetivos do Milênio. Esta lista é meramente exemplificativa, até mesmo porque seriam necessários muitos artigos para análise dos objetivos e da real eficácia destes projetos perante a realidade nacional e estadual.

Verificamos, portanto, que estamos no caminho certo para alcançar os objetivos do milênio, entretanto ainda há muito a ser desenvolvido. É impossível não sermos contaminados pelas perspectivas positivas decorrentes do nosso crescimento econômico, estes afetando diretamente números e estatísticas.

No Brasil, ainda vemos uma participação da iniciativa privada muito tímida, quando não inexistente, em relação às metas mundiais, muito dos movimentos em relação aos objetivos resumem-se às atitudes governamentais, quando a população em si, como principal interessada não tem conhecimento da existência destes.

Devemos lembrar que os objetivos representam a busca da autonomia da pessoa humana, da independência, dos direitos. As metas quando atingidas representarão a liberdade de escolha de uma população ainda excluída, devem representar acima de tudo, o acesso ao direito.

 

Referências Bibliográficas

A cinco anos do ODM, Brasil cumpre poucas metas - www.pnud.org.br. Acessado em 25/03/2010.

BOBBIO, Norberto. A Era do Direitos. Rio de Janeiro, Elsevier, 2004.

BRANDT, Danielle. A cinco anos dos ODM, Brasil cumpre poucas metas - www.pnud.org.br -  Acessado em 25/03/2010

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm.

Declaração Universal dos Direitos e do Homem e Cidadão - http://www.mj.gov.br/…/ddh_bib_inter_universal.htm.

Educação: objetivo 2: atingir o ensino básico universal / Coleção de Estudos Temáticos sobre os Objetivos do Milênio [organização] PUC Minas / IDHS, PNUD - Belo Horizonte: PUC Minas/ IDHS, 2004

FUKUDA-PARR, Sakiko - Are the MDG's priority in development strategies and aid programmes? Only few are! Working Paper: 2008 - Disponível em http://www.ipc-undp.org/pub/IPCWorkingPaper48.pdf. - acessado em 21 de março de 2010.

IPEA - Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - Relatório Nacional de Acompanhamento - Brasília: Ipea,2010. http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/100408_relatorio_odm.pdf - Acessado em 08/04/2010  .

NELSON, Paul - Goals, Norms and Pledges: The Millennium Development Goals and Human Rights- Disponível em www.allacademic.com - Acessado em 25 de março de 2010.

Política Nacional de Assistência Social - Disponível em http://www.social.rj.gov.br/familiar/pdf/pnas.pdf acessado em 15 de março de 2010

Políticas Sociais: Acompanhamento e Análise. Vinte anos de Constituição Federal - V. 2 - IPEA - Disponível em http://www.ipea.gov.br

Projeto do Milênio das Nações Unidas 2005. Investindo no Desenvolvimento: Um plano prático para atingir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Visão Geral. Disponível em http://www.pnud.org.br/milenio/arquivos/ResumodoProjeto.pdf acessado em 24 de setembro de 2009.

Projeto "Capacitando para o Enfrentamento à Violência Contra a Mulher". Coordenadoria Especial de Políticas Públicas para a Mulher/ SEGOV. Governo do Estado de Mato Grosso do Sul. Campo Grande, 2009.

Relatório Anual 2009 que tinha como período de execução janeiro a dezembro de 2009. Órgão Gestor: Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social. Superintendência da Política de Direitos Humanos

Região Centro Oeste - Coleção de Estudos Regionais sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio / [organização] PNUD, IDHS/PUC Minas, UnB. - Belo Horizonte: PUC Minas Virtual, 2007. Disponível em www.pnud.org.br

SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA. Departamento Regional do Paraná. Objetivos do milênio: estratégia para o desenvolvimento local / Observatório regional Base de Indicadores de Sustentabilidade. Curitiba, 2009.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivado. São Paulo, Malheiros Editores, 2010.

Sínteses Estaduais: Objetivos de Desenvolvimento do Milênio 2010 - Observatório Regional Base de Indicadores de Sustentabilidade - ORBIS - www.portalodm.com.br

VANDEMOORTELE, JAN. ODM: Metas Mal Compreendidas?, www.undp-povertycentre.org  2008, Fevereiro. Número 28. -  Acessado em 15 de fevereiro de 2010.

II Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Brasília: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2008.

http://www.educar.ms.gov.br/controle/ShowFile.php?id=1092 acessado em 10 de junho de 2010.

http://www.pnud.org.br/pobreza_desigualdade/reportagens/index.php?id01=3326&lay=pde acessado em 29 de abril de 2010.

http://www1.semac.ms.gov.br/bdeweb/

http://www.nospodemosms.com.br

http://objetivosdomilenio.org.br

http://www.sed.ms.gov.br

 

 

* Área Temática: Política Externa
1. Are the MDG's priority in development strategies and aid programmes? Only few are! - www.undp-povertycentry.org. - acessado em 21 de março de 2010.
2. Jan Vandemoortele, 2008, Fevereiro. Número 28.  ODM: Metas Mal Compreendidas?, www.undp-povertycentre.org- acessado em 15 de fevereiro de 2010.
3. Goals, Norms and Pledges: The Millennium Development Goals and Human Rights- www.allacademic.com Acessado em 25 de março de 2010.
4. Seleção realizada a partir de Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) / Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República - - ed. rev. - - Brasília : SEDH/PR, 2010 - disponível em http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/ acessado em 15 de janeiro de 2010.
5. www.mds.gov.br/.../pnas-2013-politica-nacional-de-assistencia-social. Acessado em 01/03/2010
6. Acessado em http://agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/100408_relatorio_odm.pdf em 08/04/2010
7. Região Centro Oeste / [organização] PNUD, IDHS/PUC Minas, UnB. - Belo Horizonte: PUC Minas Virtual, 2007.
8. Para tentar ampliar o alcance dos estudos dos Objetivos do Milênio, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) formou uma rede de laboratórios acadêmicos para acompanhamento dos ODM com representantes das seguintes instituições: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, PUC Minas, Universidade de Brasília, Universidade Federal de Pernambuco e Universidade Federal do Pará. A intenção foi fazer com que os objetivos fossem discutidos e estudados em todas as regiões do país. Cada localidade focou em uma área dos objetivos e estes estudos originaram cinco relatórios dos ODM, cada um destes retratando uma região do país.
9. Para a pobreza extrema tínhamos como meta a redução à um quarto do nível de 1990, enquanto a meta dos ODM era de reduzir à metade. Segundo o relatório a meta foi alcançada em 2007 e superada em 2008.
10. www.portalodm.com.br