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3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

A importância da organização internacional dos trabalhadores em empresas multinacionais (EMNs)2000 a 2010 o comitê mundial de trabalhadores (CMT) da Daimler AG*

 

 

Eduardo Magalhães Rodrigues

Mestrando em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas UNICAMP, PUC-SP E UNESP

 

 


RESUMO

O presente estudo pretende discutir a importância dos Comitês Mundiais de Trabalhadores (CMT), presentes em EMNs (Empresas Multinacionais).Para isso será analisada a atuação do Comitê Mundial de Trabalhadores da Daimler desde sua criação em 2002 até o ano de 2010.Da mesma forma serão investigadas, sumariamente, as principais conquistas obtidas - no campo do CMT - por meio dos AMIs (Acordo Marco Internacional) assinados em 2002 e 2006 pela direção mundial da Daimler, FITIM (Federação Internacional dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas) e CMT Daimler.O estudo espera ainda demonstrar a importância de entidade sindicais globais frente à globalização econômica, principalmente em relação ao gigantismo crescente das EMNs e o enfraquecimento dos Estados diante as corporações empresariais.Assim, objetivamos sugerir que há uma alternativa para a defesa dos direitos dos trabalhadores e que este caminho está em sua própria organização em nível internacional por empresa.

Palavras-chave: Organização internacional dos trabalhadores - organizações sindicais globais - comitê mundial de trabalhadores - Mercedes-Benz - Daimler - Sindicato dos Metalúrgicos do ABC - Acordos Marco Internacionais - estrutura sindical global


 

 

1. Introdução

O presente estudo pretende discutir a importância dos Comitês Mundiais de Trabalhadores (CMT), presentes em EMNs (Empresas Multinacionais).

Para isso será analisada a atuação do Comitê Mundial de Trabalhadores da Daimler desde sua criação em 2002 até o ano de 2010.

Da mesma forma serão investigadas, sumariamente, as principais conquistas obtidas - no campo do CMT - por meio dos AMIs (Acordo Marco Internacional) assinados em 2002 e 2006 pela direção mundial da Daimler, FITIM (Federação Internacional dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas) e CMT Daimler.

O estudo espera ainda demonstrar a importância de entidade sindicais globais frente à globalização econômica, principalmente em relação ao gigantismo crescente das EMNs e o enfraquecimento dos Estados diante as corporações empresariais.

Assim, objetivamos sugerir que há uma alternativa para a defesa dos direitos dos trabalhadores e que este caminho está em sua própria organização em nível internacional por empresa.

No segundo capítulo traçamos um perfil econômico da EMN Daimler, ressaltando o poder crescente das corporações multinacionais frente aos Estados-Nação.

Na terceira parte expomos a estrutura atual do movimento sindical internacional, destacando as Centrais Sindicais Mundiais (CSMs) e as Federações Sindicais Internacionais (FSIs).

No penúltimo capítulo, o quarto, investigamos os oito anos de funcionamento do CMT da Daimler. Sublinhamos a sua origem, estatuto, estrutura política e de representação, principais temas debatidos durante as reuniões e especialmente as conquistas e desafios alcançados no período.

Por fim, no quinto capítulo, enfatizamos os Acordos Marco Internacionais (AMIs) assinados entre a Daimler e os seus trabalhadores. Examinamos a origem global dos mesmos, os benefícios que podem possibilitar, os tipos de direitos garantidos e principalmente exploramos suas potencialidades e desafios, elaborando algumas sugestões para concluir.

 

2. A Daimler Mundial

Seus fundadores, Gottlieb Daimler e Carl Benz, inventaram o automóvel no ano de 1886 e dessa criação teve origem o grupo Daimler. Hoje a corporação está presente em 33 países e é composta pelas seguintes divisões: Carros Mercedes-Benz; Caminhões Daimler; Vans Mercedes-Benz; Ônibus Daimler e Serviços Financeiros Daimler1. Em 2010, o Grupo Daimler, cujas ações são negociadas nas bolsas de valores de Frankfurt e Sttutgart, vendeu 1,9 milhão de veículos e empregou mais de 260 mil pessoas. Sua receita foi de 97,8 bilhões de euros e seu ebtida de 7,3 bilhões. Segundo a Revista Forbes, o Grupo Daimler é a 43ª2 maior transnacional do mundo a partir de uma combinação de quatro fatores: vendas, lucro, patrimônio e valor de mercado. Analisando-se esses mesmos dados isoladamente a Daimler assume as seguintes posições:

 

 

Entre as fabricantes de caminhões e automóveis a Daimler é a segunda no mundo, sendo superada somente pela outra alemã Volkswagen.

 

 

2.1 Visão Geral do Grupo

Brevemente, apresentamos os dados mais significativos em relação à Daimler.

 

 

Não há assim, como negar, a enorme dimensão da Daimler. Os números dizem por si e a colocam na frente não só entre as maiores multinacionais do mundo, mas também entre a maioria dos Estados-Nação. Pode-se ainda alegar que, mesmo os Estados sendo, em grande parte, menores do que as mais importantes multinacionais, ainda são responsáveis pela elaboração e execução das leis que vão nortear e delimitar as ações das corporações. Tal argumento parece ser extremamente ingênuo, basta verificarmos - por exemplo - a relação existente entre financiamento de campanhas eleitorais e doações de multinacionais. Quem paga, manda. Sobre isso Joseph Stiglitz (Stiglitz, 2006) nos fornece dados muito interessantes. 41 EMNs, entre elas a General Electric, Microsoft . Disney doaram U$S 150 milhões para candidatos federais entre 1991 e 2001 nos Estados Unidos. Em um período de três anos tiveram U$S 55 bilhões em isenção de impostos. As empresas farmacêuticas gastaram U$S 759 milhões entre 1998 e 2004 para influenciar 1.400 congressistas. Aliás, empregam 3 mil lobistas. Ainda nos Estados Unidos, as cinco maiores empresas de contabilidade e auditoria contribuíram com U$S 29 milhões para candidatos federais entre 1989 e 2001. Outro fator que demonstra a fraqueza da importância normatizadora do Estado está simplesmente na alta capacidade das EMNs em deslocarem rapidamente a produção, para qualquer lugar do planeta, quando entraves legais prejudicam os seus interesses em determinado país.

Empresas como o Wall-Mart com receita de U$S 408,21 bilhões em 2010; a Shell com U$S 278,19 bilhões e a ExxonMobil com U$S 275,56 são maiores do que grande parte dos países basta uma simples comparação entre receitas das EMNs e PIBs nacionais. Para se ter uma ideia, as 500 maiores possuem um patrimônio de 23 trilhões de dólares. Toda riqueza mundial é de 61,9 trilhões. Ou seja, pelo menos 30% da riqueza mundial está nas mãos de um pequeno punhado de empresas. Dos 194 países existentes, apenas 25 (13%) são maiores do que qualquer multinacional. Isto é, os outros 169 países (87%) são menores do que alguma multinacional.

Por mais que os governantes, políticos e acadêmicos partidários da Teoria (Neo)Realista em Relações Internacionais afirmem e tentem demonstrar a prevalência do Estado enquanto principal ator do sistema internacional, diante dos números, somente podem estar falando de alguns pouquíssimos Estados e não da maior parte e muito menos de todos. Que jogo é esse, onde os indicados ou auto-proclamados principais jogadores não possuem efetiva capacidade de jogar?! Isso não significa, ao menos por enquanto, o fim do Estado, mas é necessário ter a consciência de que somente alguns poucos realmente têm poder. A grande maioria tem importância secundária e sem capacidade alguma de negociação em nível mundial. O Estado ainda não desapareceu, pois o Capital ainda não encontrou uma forma de substituí-lo plenamente. Dizemos plenamente porque de maneira parcial já se encontrou uma forma para a substituição parcial do Estado: são as ONGs3.

 

3. Estrutura Sindical Global

O internacionalisimo esteve presente na organização dos trabalhadores desde praticamente a origem do operariado moderno na segunda fase da Revolução Industrial. Em 1864, na cidade de Londres e tendo como figura dominante Karl Marx, foi fundada a AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores) conhecida principalmente como Primeira Internacional Socialista. Apesar dos graves revezes que lhe seguiram, os trabalhadores, a partir disso, começaram a se organizar em entidades sindicais mundiais.

Atualmente a estrutura sindical global está dividida em quatro níveis (Santos, 2005:27): mundial, regional, setorial e por empresa. Aqui abordaremos, mesmo que brevemente, o nível mundial, setorial e por empresa - na medida em que nos interessam mais proximamente. O nível mundial é composto pelas Centrais Sindicais Mundiais (CSMs), o setorial pelas Federações Sindicais Internacionais (FSIs) e o nível por empresa pelos Comitês Mundiais de Trabalhadores (CMTs). O nível regional é integrado basicamente pelos departamentos continentais das CSMs e pela CES (Confederação Europeia de Sindicatos), criada em 1973. Há também outros tipos de organizações sindicais e parasindicais globais: Comitê Consultivo da OCDE (TUAC), ao Global Compact da ONU. à GURN (The Global Union Research Network - Rede Global de Pesquisa Sindical), eà Global Unions Federarion (Federação Sindical Global).

3.1. As Centrais Sindicais Mundiais (CSMs)

As FSIs (Federações Sindicais Internacionais), das quais trataremos a seguir, são anteriores à existência das Centrais Sindicais Mundiais (CSMs). A mais antiga delas, a FITIM (Federação Internacional dos Trabalhadores na Indústria Metalúrgica) foi fundada em 1893, somente 29 anos depois da Primeira Internacional Socialista. Como veremos, a primeira CSM, a CISC4 (Confederação Internacional dos Sindicatos Cristãos) surgiu em 1920, portanto 27 depois da FITIM. Assim podemos constatar que as entidades sindicais por setor econômico surgiram antes das centrais sindicais mundiais (CSMs).

Hoje há duas CSMs: a CSI (Confederação Sindical Internacional - ITUC: International Trade Union Confederation) e a FSM (Federação Sindical Mundial - WFTU: World Federation of Trade Unions).

A FSM, fundada em 1945 e de orientação comunista, encontra-se fragilizada politicamente e em sua estrutura, mas continua resistindo. Possui escritórios regionais em Moscou, Oriente Médio, Europa, África, Ásia-Pacífico e América Latina.

A CSI é fruto de uma fusão, em 2006, da CIOSL (criada em 1949 e de orientação social-democrata - ICFTU: International Confederation of Free Trade Unions) e a CMT (criada em 1920 - WCL: World Confederation of Labour) e de orientação cristã. Formaram então a mais poderosa CSM com muito mais recursos, estrutura e filiados do que a FSM.

3.2. As Federações Sindicais Internacionais (FSIs)

Tanto a CSI como a FSM possuem FSIs filiadas ou de alguma forma a ela ligadas. As FSIs relacionadas à CSI possuem uma maior independência e autonomia, às vinculadas à FSM, na maior parte das vezes, funcionam mais como departamentos e não entidades sindicais independentes.

Nos últimos anos há uma tendência de fusão entre as FSIs cristãs ligadas à antiga CMT com as que estão próximas à ex-Ciosl. Um exemplo aconteceu em 2005 na cidade de Buenos Aires entre a FITICM (Federação Internacional dos Trabalhadores na Indústria da Construção e Madeira - BWI: International Federation of Building and Wood Workers - de orientação social-democrata) e a Federação Mundial dos Trabalhadores da Construção e Madeira (WFBW - World Federation of Building and Wood Workers: de orientação cristã), constituindo a ICM (Internacional dos Trabalhadores da Indústria da Construção e Madeira - BWI: Building and Wood Workers' International).

As FSIs ligadas à CSI são atualmente as seguintes: BWI (Building and Wood Workers' International). EI (Education International); IAEA (International Arts and Entertainment Alliance). ICEM (International Federation of Chemical, Energy, Mine and General Workers' Unions). IFJ (International Federation of Journalists). IMF (International Metalworkers' Federation). ITF (International Transport Workers' Federation). ITGLWF (International Textile, Garment and Leather Workers Federation). IUF (International Union of Food, Agricultural, Hotel, Restaurant, Catering, Tobacco and Allied Workers' Association) . PSI (Public Services International). Juntas representam mais de 135 milhões de trabalhadores(as) em todo o mundo espalhados por quase todos os países e em 1.230 sindicatos nacionais e locais.

As FSIs da FSM são: Trade Union of Public and Allied Employees (TUI); Trade Union International of Teachers' Union (FISE); Trade Union International of Workers in the Building, Wood, Building Materials and Allied Industries (UITBB); Trade Union International of Workers in Agriculture, Food, Commerce, Textiles and Allied Industries (UISTAACT); Trade Union International of Transport Workers; Trade Union International of Energy, Metal, Chemical, Oil and Allied Industries; Trade Union International of Workers in the Mining the Metallurgy and the Metal Industries. Sublinhamos que essas são organizações enfraquecidas política e economicamente, sem autonomia e por isso esvaziadas.

 

4. O Comitê Mundial dos Trabalhadores (CMT) da Daimler

A origem do CMT da Daimler é informal e teve início a partir da decisão da empresa se fundir com a Chrysler. Imediatamente após a união, em maio de 1998 o IG Metall5 e o Conselho Geral de Trabalhadores da Daimler (Daimler General Works Council) iniciaram uma série de reuniões com o UAW (Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos dos Estados Unidos). Dessas reuniões resultaram em 1999 a criação do Grupo de Trabalho Automotivo dos Representantes dos Trabalhadores e em 17 de julho de 2002 este formalmente se tornou o Comitê Mundial de Trabalhadores (CMT), presidido por Erich Klem, também presidente da maior Comissão de Fábrica da Daimler (planta de Sindelfingen) e do Daimler EWC (Conselho Europeu de Trabalhadores da Daimler). A vice-presidência coube a Nate Gooden, do UAW e também representante da Chrysler.

Para a elaboração de seu estatuto, o CMT se inspirou no correlato documento do Conselho Europeu de Trabalhadores da Daimler (EWC: European Works Council) acordado em 1996, apesar de que em bases mais simplificadas.

Segundo o seu estatuto, o CMT tem como objetivo:

"(...) permitir que os fóruns ou coletivos de representação dos trabalhadores em todo o mundo compartilhem informações e opiniões uns com os outros e também promovam o diálogo com a administração corporativa sobre importantes questões a respeito da empresa em nível global. O objetivo é melhorar a compreensão mútua, promover a boa vontade para a cooperação e ainda facilitar o processo de integração. Os aspectos econômicos e sociais são combinados para formar a base do futuro corporativo e das políticas de recursos humanos. O CMT trata das questões de grande importância para a cooperação internacional entre os empregados da Daimler. O CMT assume a responsabilidade por todos os empregados da Daimler.".

O documento não deixa dúvida sobre ser a organização essencialmente internacional e sindical. Também se propõe enquanto um espaço de troca de opiniões e informações entre os trabalhadores em nível global, em outras palavras, possibilitar a comunicação e organização transnacional entre os trabalhadores. Ainda de acordo com o estatuto do CMT os debates envolvem a situação atual e futura da empresa nas seguintes áreas: estrutura da Daimler; situação econômica e financeira; o desenvolvimento dos negócios, produção e vendas; a situação do emprego e suas tendências. O CMT elege um comitê executivo com mandato de quatro anos que consiste de um presidente e um vice. Também é importante sublinhar que o CMT não é deliberativo em relação às estratégias próprias da Daimler, apesar de poder assinar AMIs (Acordos Marco Internacionais) e outros acordos com a direção da empresa e de estes acordos poderem ter o seu cumprimento monitorado e cobrado. Os AMIs (dos quais trataremos na sequência) possibilitam, podemos afirmar, um salto por parte do CMT: de sua natureza simplesmente informativa, consultiva e de troca de experiências para uma situação um pouco mais deliberativa.

A legislação alemã foi o instrumento utilizado para a legalização do CMT, ou ainda, para a resolução de dúvidas provenientes da interpretação das cláusulas do estatuto. Dessa forma o CMT pôde ser institucionalizado apesar de não ter um caráter legal (Stevis, 2009).

As reuniões do CMT ocorrem anualmente e em parte dela participa a direção da Daimler. Durante as reuniões discutem-se temas relacionados aos trabalhadores em todo o mundo: implantação dos AMIs, questões relacionadas à administração e negócios, demissões, contratações; investimentos, lucros, prejuízos, estratégias da produção entre outras previstas no estatuto. Normalmente, a pauta é composta pela apresentação de um relatório pelo presidente do CMT; relatório dos países e relatório da FITIM, que participa como observadora e se convidada. Essa é a pauta "permanente". Os outros itens são selecionados conforme a necessidade da conjuntura. Fica assim, clara a apropriação de informações estratégicas por parte dos trabalhadores e que podem ser utilizadas no planejamento de suas ações não só em nível mundial, mas também nacional e local.

A formação original do CMT era de 13 membros, sendo que mudanças devem ser negociadas com a direção da Daimler AG e o número máximo não deve exceder 15. A composição inicial era: Alemanha: 6 representantes; EUA: 3; Canadá; Brasil; África do Sul e Espanha 1 para cada. Em 2011 a composição passou a ser: Alemanha: 6 representantes; EUA: 2; Brasil; África do Sul; Japão e Espanha 1 para cada.

4.1. Uma nova ferramenta para os trabalhadores: conquistas e desafios

Apesar de ainda ser bastante jovem, especialmente em comparação às centenárias EMNs e FSIs, o CMT da Daimler já acumula resultados positivos mais do que suficientes para torná-lo um instrumento extremamente importante de diálogo social internacional e organização dos trabalhadores. Alguns elementos justificam essa afirmação, dos quais destacamos os principais:

  • O potencial de aumento das conquistas é muito grande. O CMT da Daimler, por ter uma estrutura enxuta pode responder com maior rapidez frente às situações colocadas, movendo-se rapidamente em relação às outras estruturas sindicais internacionais, cuja burocracia pode dificultar retornos mais ágeis. Outra vantagem do CMT é a sua especificidade. Uma entidade sindical como a FITIM, por exemplo, deve atender a uma gama de assuntos bastante ampla. O CMT da Daimler responde somente às demandas dos trabalhadores de alguma forma vinculados a uma única empresa. Isso facilita o foco e possibilita maior atenção. Além disso, há o fortalecimento da legitimidade do CMT na medida em que é reconhecido não só pelos trabalhadores, mas também pela empresa.
  • Outra vitória proporcionada aos trabalhadores pela existência do CMT está no acesso a informações importantes referentes à empresa e que dificilmente poderiam ser apropriadas pelos trabalhadores para assim serem consideradas na elaboração das estratégias definidas pelos sindicatos.
  • A participação direta de trabalhadores de outros países é também um avanço para a organização.
  • 4.2. Desafios

  • As estratégias das EMNs estão altamente globalizadas, inclusive em relação ao seu imenso poder de comunicação junto aos trabalhadores e à sociedade. Entretanto o alcance da comunicação sobre as ações do CMT são muito limitadas. Em suas resoluções, o VI Congresso dos Metalúrgicos do ABC realizado em 2009, constata "(...) a pouca comunicação existente entre membros dos Comitês Mundiais de diferentes empresas. A ação de cada Comitê continua sendo feita de forma isolada, não existindo na base dos metalúrgicos do ABC um fórum onde essas experiências possam ser socializadas e difundidas, de forma mais ampla, na categoria.". No sentido de melhorar o processo de comunicação, sugerimos algumas ações:
    Divulgar as conquistas e discussões básicas do CMT. Por exemplo, é importante difundir ao maior número possível de trabalhadores da Daimler o essencial da situação em cada país; sempre apresentadas e discutidas nas reuniões ordinárias anuais do CMT.
    Criar um website do CMT disponível ao menos nos idiomas alemão, francês, espanhol, português, inglês e também mandarim.
  • É necessário que haja mecanismos práticos e formais para a realização de denúncias por parte de dirigentes sindicais locais e até mesmo por trabalhadores diretamente contratados pela Daimler, terceiros e por trabalhadores das empresas pertencentes à extensa cadeia produtiva de fornecedores6. Atualmente a origem das denúncias está restrita aos sindicatos locais nos países; membros do CMT; FITIM e IGMetal. O próprio CMT reconhece que a Daimler é altamente dependente dos fornecedores e vendedores da Daimler, daí a força para se garantir direitos dos trabalhadores (terceirizados, cadeia de fornecedores e vendedores).
  • Constituição de mecanismos formais para garantir a aplicação dos AMIs também junto aos trabalhadores terceirizados e pertencentes à cadeia produtiva dos diversos níveis de fornecedores. Entre eles, a inclusão nos contratos de compra assinados entre as empresas do Grupo Daimler e o primeiro nível de fornecedores da exigência de cumprimento das normas sociais.
  • O Grupo Daimler desenvolve sua produção em 33 países, no entanto, somente 6 possuem representação no CMT. O ideal, obviamente, seria a representação direta de cada país. Entretanto, inicialmente uma maior representação por região seria um avanço. Por exemplo, uma maior representação da Ásia devido o grande número de países desse continente com atividades da Daimler, entre eles a China, é urgente; bem como uma representação da Oceania. O número limite de 15 membros para compor o CMT, proposto desde o início é um obstáculo para se obter uma maior democratização do fórum. Não se pode alegar a dificuldade de custos para uma maior representação, pois mesmo se os gastos com deslocamento, hospedagem etc para a participação em reuniões fossem realmente significativos, há somente uma reunião por ano do CMT, o restante das articulações e encaminhamentos são realizadas a distância (os modernos e baratos meios de comunicação atuais facilitam o trabalho internacional) ou localmente. Outra necessidade para uma maior democratização do CMT é a representação da cadeia produtiva e terceirizados. Tendo atualmente o CMT 12 membros e os estatutos permitindo 15, por que não se inclui 1 membro a mais para a Ásia, 1 para a Oceania e 1 representando os trabalhadores terceirizados e da cadeia produtiva? Segundo Stevis,2009 e os dados fornecidos pela própria Daimler, o número de trabalhadores em países sem representação no CMT tem crescido e continuará aumentando7.
  • Outra polêmica é a ausência de critérios mais objetivos para a inclusão e exclusão de membros no CMT. Indicações claras e específicas seriam saudáveis.
  •  

    5. Os Acordos Marco Internacionais (AMIs) da Daimler

    O surgimento dos AMIs remonta aos anos 80, especificamente a 1988, quando foi assinado o primeiro entre a Danone e a UITA (União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação). Entretanto, seu maior uso começa a partir dos anos 2000 e atualmente há 53 AMIs assinados. São, hoje, não só a melhor alternativa de luta global por parte dos CMTs para garantir direitos dos trabalhadores, mas na verdade a única forma de negociação entre sindicatos ou organizações de trabalhadores e EMNs em nível mundial (Stevis, 2009).

    Os AMIs podem garantir direitos aos trabalhadores onde a legislação seja inadequada ou se adequada, muitas vezes pouco respeitada. Podem ainda, temporariamente, substituir os sindicatos locais onde não existam ou sejam débeis ou subservientes ao capital.

    Em setembro de 2002 foi assinado o primeiro8 AMI entre a Daimler-Chrysler9 e o CMT/FITIM (Federação Internacional dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas). Antes disso, a única empresa automotiva com AMI assinado era a Volkswagen.

    Representando a Daimler, o AMI-2002 foi assinado pelo seu CEO Günter Fleig e pelo Diretor Mundial de RH, Jürgen E. Schrempp. Representando os trabalhadores assinaram Erich Lemm, presidente do CMT e Nate Gooden co-presidente e também representante da FITIM.

    Um dos motivos que estimularam a criação e a assinatura de um AMI em 2002 ocorreu primeiramente por uma iniciativa dos representantes dos trabalhadores da Alemanha que viram uma excelente oportunidade quando a direção mundial da Daimler anunciou uma estratégia na área de recursos humanos para os executivos da empresa. Os representantes dos trabalhadores refletiram e questionaram porque não poderia haver também um tratamento global padrozinado para os trabalhadores de outras estruturas (Stevis, 2009).

    Os temas abordados pelo AMI-2002 e sua estrutura são: Direitos Humanos (Trabalho Forçado, Trabalho Infantil, Igualdade de oportunidades, remuneração igual por trabalho de valor igual); Relação com funcionários e representantes trabalhistas; Condições de Trabalho (Proteção à saúde, Remuneração, Tempo de trabalho, Qualificação) e Fornecedores.

    Em 2004 a Cúpula dos Líderes do Global Compact da ONU acrescentou outro princípio ao modelo existente de AMIs, o décimo, que trata do combate à corrupção. Sendo assim, o CMT incorporou-o também no AMI da Daimler assinado em 2002.

    5.1. Avanços, necessidades e potencialidades dos AMIs da Daimler

    É impossível desvincular o CMT da Daimler dos AMIs assinados em 2002 (Princípios Sociais) e 2006 (Saúde e Segurança Ocupacional). Além do CMT ter sido um dos principais incentivadores e signatários dos AMIs, fazem permanentemente uso dos mesmos para a garantia de direitos dos trabalhadores em nível global. A aplicação e o monitoramento dos AMIs pertencem às metas e compõem a pauta das reuniões do CMT. Portanto, falar de um significa - na maior parte das vezes - referir-se ao outro direta ou indiretamente. Os progressos são reais e concretos, além de indicarem um crescimento de sua utilidade enquanto ferramenta para os trabalhadores. A seguir, destacamos avanços conquistados e fazemos sugestões de mudanças no sentido de aumentar os benefícios.

    • Desde 2002, 23 violações, em diversos países, foram reportadas ao CMT, sendo a maior parte resolvidas.
    • Da mesma maneira que o CMT, os AMIs estão focados diretamente em uma mesma empresa, independentemente da quantidade de plantas, países e trabalhadores pertencentes àquela corporação. Isso certamente produz maiores resultados com melhor aproveitamento das energias envolvidas.
    • Impacta positivamente a cadeia produtiva das empresas fornecedoras. Cria-se um "efeito dominó" onde a pressão exercida sobre as fornecedoras diretas das EMNs é transmitida para as fornecedoras das fornecedoras e assim sucessivamente aos outros níveis.
    • O AMI-2002 da Daimler foi incorporado pelo Código de Integridade da empresa, segundo documento mais importante da Daimler

    5.2. Sugestões

    • É importante que sejam construídos indicadores que possam ser usados como critério para se dizer se uma cláusula que beneficia o trabalhador está ou não sendo cumprida, inclusive fontes de verificação onde se possa apurar os indicadores. Caso contrário, o critério passa a ser demasiadamente subjetivo e assim, a decisão pelo seu cumprimento ou não, eventualmente arbitrária.
    • Incluir diretamente e de maneira clara nos AMIs cláusulas pertinentes à questão ambiental. Atualmente não há nada nesse sentido.
    • Os AMIs não fazem referência direta a nenhuma cláusula da OIT (Stevis, 2009). Seria muito importante fazê-lo.

     

    6. Bibliografia

    CASTELLS. Manuel. A Sociedade em Rede. 9 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

    CHESNAIS. François. A Mundialização do Capital. 1 ed. São Paulo: Xamã, 1996.

    DAIMLER. Daimler at a Glance - Fiscal Year 2010. Stuttgart, Germany, 2011.

    HOLDCROFT, Jenny. International Framework Agreements: A Progress Report. Metal World, 2006.

    INTERNATIONAL METALWORKERS' FEDERATION. Strategies for na alternative globalisation. Geneva.

    INTERNATIONAL METALWORKERS' FEDERATION. The Power of Framework Agreements. Geneva.

    MÜLLER, Torsten; PLATZER, Hans-Wolfgang; RÜB, Stefan. Global Company Strategies - Global Employee Interest Representation? The Cases of Volkswagen and DaimlerChrysler.

    SANTOS. Boaventura de Sousa (org). Trabalhar o Mundo. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.

    SINDICATO DOS METALÚRGICOS DO ABC. VI Congresso dos Metalúrgicos do ABC - Caderno de Resoluções. São Bernardo do Campo, 2009.

    STEVIS. Dimitris. International Framework Agreements and Global Social Dialogue: Lessons from Daimler case. 1 ed. Geneva: ILO, 2009.

    STIGLITZ, Joseph. Making Globalization Work. 1 ed. London: Penguin Books, 2007.

    VIEIRA. Liszt. Os argonautas da cidadania: A sociedade civil na globalização. 1 ed. Rio de Janeiro: Record Editora, 2001.

     

     

    * 3º ENCONTRO NACIONAL DA ABRI Associação Brasileira de Relações Internacionais e Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo Governança Global e Novos Atores 20, 21 e 22 de julho de 2011.
    1. Essa divisão oferece, aos clientes do Grupo Daimler, um amplo conjunto de serviços financeiros automotivos incluindo financiamento, leasing, seguro e gestão de frota.
    2. As 10 maiores, nesta lista, são por ordem: JPMorgan Chase, HSBC, GE, ExxonMobil, Shell, PetroChina, ICBC, Petrobrás, Berkshire Hathaway e Citigroup.
    3. Parte das ONGs efetivamente estão preocupadas em executar políticas sociais que sirvam como modelos para as políticas públicas dos Estados e estimular a participação da sociedade civil na elaboração de políticas públicas. No entanto, outra parte, objetiva mesmo substituir o Estado, decretando sua "incompetência" e "ineficiência", promovendo assim, a privatização do setor público.
    4. A antiga CISC anos depois transformou-se na CMT (Confederação Mundial do Trabalho).
    5. É o sindicato metalúrgico alemão.
    6. Até o início de 2009, o Grupo Daimler contava com 24 mil fornecedores em todo o mundo.
    7. Em 28 de junho de 2011 a Daimler, em parceria com a chinesa BAIC, assinou acordo para investimento de 2 bilhões de euros com o objetivo de expandir as atividades na China.
    8. Em 2006 foi assinado novo AMI sobre Saúde e Segurança.
    9. A fusão entre a Daimler e a Chrysler vigorou entre 1998 a 2007.