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ISBN 2236-7381 versão impressa

3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

Povos indígenas como atores da governança global

 

 

João Nackle Urt

 

 


RESUMO

Para compreender os povos indígenas como atores da política global, discute-se sua natureza como atores políticos, por meio de aproximações com conceitos como grupos étnicos, nações e comunidades. Discute-se ainda a natureza do movimento indígena transnacional e das organizações não-governamentais que promovem interesses indígenas. Ao abordar o movimento indígena transnacional, observa-se que o campo de ação histórica onde esse movimento opera é a globalização, para a qual os atores indígenas têm uma proposta contra-hegemônica de fundo comunitarista. Ao mesmo tempo, a própria dinâmica da governança global põe em relevo os povos indígenas quando enfatiza a participação de stakeholders e estruturas locais. De diversas formas, conclui-se, é crescente a presença dos povos indígenas em determinados setores da governança global.

Palavras-chave: Atores - Povos indígenas - Movimento indígena transnacional - Globalização - Governança global


ABSTRACT

In order to understand the indigenous peoples as actors of global politics, I assess their nature as political actors, by approaching concepts such as ethnic groups, nations and communities. I also discuss the nature of the transnational indigenous movement and of the non-governmental organizations that promote indigenous interests. While approaching the transnational indigenous movement, I observe that the field of historical action where the movement operates is the globalization, for which the indigenous actors have a counter-hegemonic proposal, of a communitarian background. At the same time, the very global governance dynamics bring about a prominence of the indigenous peoples when emphasizing the participation of stakeholders and local structures. In various ways, I conclude, the indigenous peoples have a growing presence in certain sectors of global governance.

Keywords: Actors - Indigenous peoples - Transnational indigenous movement - Globalization - Global governance


 

 

Povos indígenas como atores da governança global

A governança global tem sido caracterizada como um conjunto de regulações políticas dotado de efetividade, independentemente da natureza estatal ou não dos atores envolvidos no processo (Rosenau, 2000). Segundo Smouts (2004), o conceito de governança pretendeu atenuar as falhas da teoria dos regimes, a qual, por ser demasiado estatista e compartimentada por áreas-tema, era insuficiente para lidar com a incerteza e as temporalidades cruzadas oriundas da globalização. Nesse contexto, os povos indígenas ganham relevância como atores da política global. Trata-se de atores subnacionais, cuja inserção territorial nem sempre coincide com as fronteiras estatais e cujos interesses políticos são multisetoriais, principalmente voltados para questões relacionadas com o desenvolvimento, os direitos humanos e o meio ambiente.

A emergência dos povos indígenas como atores da política global ainda não foi bem compreendida. Anteriormente, procurei mapear o processo histórico que conduziu ao aumento de seus recursos de poder, materiais e simbólicos. Observei que as condições para o fortalecimento dos povos indígenas e o aumento de sua visibilidade perante a opinião pública mundial começaram a surgir a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, conforme o quadro sinótico abaixo (Urt, 2011):

 

 

O objetivo do presente artigo não é tanto propor um conceito de "povos indígenas", mas principalmente procurar compreender sua natureza enquanto ator político e as características de sua inserção internacional (real ou potencial). Diante da observação dos contextos e sentidos referidos aos povos indígenas, nota-se que se trata de uma ideia com muitas dimensões. A expressão "povos indígenas" tem sido usada indistintamente para fazer referência ao movimento indígena internacional, às organizações não-governamentais que representam os povos indígenas, às lideranças indígenas e às comunidades indígenas. Também têm incidência a ideia de nações indígenas e a possibilidade de que venham a desenvolver estratégias secessionistas a fim de se constituir como Estados indígenas.

Para elucidar esse conceito, no primeiro tópico parte-se de um diálogo das Relações Internacionais com textos de Antropologia e Sociologia. Frederik Barth (1969), com seu conceito de grupos étnicos, tem sido uma importante voz no debate antropológico contemporâneo, seguido de perto pelo brasileiro Roberto Cardoso de Oliveira (1976, 2005). Sobre a ideia de se constituírem como nações, agrega-se as obras de Ronald Niezen (2003), para quem interesses secessionistas não fazem parte das ambições dos povos indígenas; Eric Hobsbawm (1990), com sua caracterização da ideia de nação; Pierre Clastres (2003), para quem os povos indígenas são sociedades sem Estado; Michael J. Shapiro (2004) e Alison Brysk (2000), em cuja opinião os povos indígenas são nações desnacionalizadas.

No segundo tópico, vai-se propor uma reflexão sobre o movimento indígena transnacional, partindo-se de uma definição extraída de Brysk (2000), seguida de uma análise do movimento sob a lente teórica sociológica de Alain Touraine (1994), enriquecida com os insights de Zygmunt Bauman (1998) e Will Kymlicka (2006) sobre as correntes políticas em confronto no mundo contemporâneo. Soma-se aí a reflexão de Friedrich Kratochwill (2011) sobre a governança global, além da contribuição da antropóloga brasileira Maria Barroso Hoffmann (2009) sobre a atuação das ONGs no movimento indígena transnacional.

 

1. Povos indígenas: nações, grupos étnicos, comunidades

Barth (1969) é o autor mais citado no Brasil em questões de etnicidade. Com base em suas ideias, Cardoso de Oliveira (1976) e outros promoveram a passagem do paradigma culturalista de Darcy Ribeiro para o paradigma etnicista, atualmente vigente. Segundo Barth, grupos étnicos são uma forma de organização social, cujo traço fundamental é "a característica da auto-atribuição ou da atribuição por outros a uma categoria étnica" (p. 193), ou seja, "[n ]a medida em que os atores usam identidades étnicas para categorizar a si mesmos e outros, com objetivos de interação, eles formam grupos étnicos neste sentido organizacional" (p. 194). Com isso, Barth quer enfatizar que a cultura não é o traço principal que caracteriza o grupo étnico.

os elementos da cultura presente de um grupo étnico não surgem do conjunto particular que constituiu a cultura do grupo em um período anterior, embora o grupo tenha uma existência organizacional contínua, com fronteiras (critérios de pertença) que, apesar das modificações, nunca deixaram de delimitar uma unidade contínua. (p. 227)

Em outras palavras: a cultura muda; os grupos étnicos, como realidades organizacionais, persistem. A mudança cultural é consequência normal diante de processos de interação étnica e pode até ser utilizada como estratégia de sobrevivência, conforme ensina Cardoso de Oliveira (1976).

[...] nos termos de uma teoria das relações interétnicas, fenômenos como as 'flutuações' da identidade étnica - graças às possibilidades abertas à sua manipulação - e o exercício da identificação (étnica), devem ser interpretados como o esforço muitas vezes dramático do indivíduo e do grupo para lograrem sua sobrevivência social (p. 25).

As ideias de Barth demonstram que o critério cultural não é suficiente e, por vezes, não é adequado para se definir os povos indígenas. A essência da expressão "povos indígenas" está em seu sentido de "grupos étnicos", isto é, grupos que fazem uso da cultura como marcador social. É a etnicidade, segundo Manuela Carneiro da Cunha, que "se vale de objetos culturais para produzir distinções dentro das sociedades em que vigora" (1994, p. 122). A cultura é instrumento do grupo étnico e só pode ser entendida como realidade em constante mutação.

Alguns setores das sociedades brasileira e internacional expressam a preocupação de que os povos indígenas possam desejar se reconhecidos como nações e, sucessivamente, que a expressão "povo" venha a ser tomada como sinônimo de "nação" e que o princípio da autodeterminação dos povos seja invocado como argumento em processos separatistas. Tal preocupação, segundo Niezen (2003), tem se esvanecido. Segundo esse autor, tem aumentado o número de Estados que reconhecem os direitos indígenas à autodeterminação, ao mesmo tempo em que tem diminuído a resistência a compartilhar o poder político com os povos indígenas, "especialmente quando [esse compartilhamento ] é desenvolvido por meio de arranjos construtivos com os estados-nação" (Niezen, 2003, p. 219).

A diminuição dessa preocupação pode ser compreendida, primeiramente, porque os instrumentos jurídicos internacionais rejeitam expressamente a possibilidade de que o direito à autodeterminação atribuído aos povos indígenas venha a originar protestos por soberania1. Em segundo lugar, entendo que a ideia de nação não é teoricamente apropriada aos povos indígenas.

O trabalho de Eric Hobsbawm é esclarecedor sobre esse tema. O historiador britânico resume sua posição sobre o conceito de nação em quatro pontos: 1) nacionalismo é o princípio de que a unidade política e a unidade nacional devem ser congruentes; 2) a nação refere-se a um período historicamente recente e constitui uma unidade social apenas no que se relaciona com uma certa forma de estado territorial moderno, o "estado-nação"; 3) nações são fenômenos tanto políticos, quanto tecnológicos e econômicos, ligados à capacidade de projetar "em escala nacional" as expressões culturais da unidade política; e 4) a nação é principalmente um projeto construído de cima para baixo; existe também como uma realidade social, dita "de baixo para cima"; mas ambas não são idênticas (1990, p. 9-10).

A principal diferença entre o grupo étnico, de Barth, e a nação, de Hobsbawm, parece ser que, na nação, é o Estado quem se apropria da cultura para fins políticos, ao passo que, no grupo étnico, a organização social e política é descentralizada, bem como seus reflexos culturais. As ideias do antropólogo francês Pierre Clastres parecem confirmar essa suposição.

Para Clastres, "a história só nos oferece, de fato, dois tipos de sociedade absolutamente irredutíveis um ao outro [...]. Existem por um lado as sociedades primitivas, ou sociedades sem Estado; e por outro lado, as sociedades com Estado" (2003, p. 217). Penso que o modelo de organização social das sociedades sem Estado no mundo contemporâneo é o grupo étnico.

Para melhor compreender a ideia de sociedades sem Estado, convém analisar as características do chefe indígena, segundo Clastres: "a tribo não possui um rei, mas um chefe que não é chefe de Estado". Isso significa que o chefe não possui nenhuma autoridade, nenhum poder de coerção. "O espaço da chefia não é o lugar do poder". Apenas em função de sua competência técnica - "dons oratórios, habilidade como caçador, capacidade de coordenar as atividades guerreiras" - um homem é digno de exercer a liderança. E a sociedade indígena não deixa a superioridade técnica do chefe transformar-se em autoridade política (Clastres, 2003, p. 222-224). O líder indígena é mais um servidor da sociedade do que seu déspota. Sua liderança pode encontrar, e frequentemente encontra, oposição aberta.

Assim, por serem os povos indígenas - com exceções2 - sociedades sem Estado, essas coletividades podem ser melhor compreendidas sob o modelo barthiano de grupos étnicos, haja vista que o modelo nacional pressupõe a existência não apenas de um Estado, mas sobretudo a presença do Estado-moderno, equipado com suficientes recursos técnicos e econômicos para promover a unidade por meio do apelo ao sentimento nacional.

Não obstante, observa-se que setores do movimento indígena internacional e da academia utilizam frequentemente a expressão "nações indígenas". Shapiro fala em "nações indígenas", a meu ver com o objetivo de deixar marcada no discurso a igualdade política desses povos em relação aos povos ocidentais. Sua proposta é declaradamente normativa: busca um modelo de justiça que não discrimine em bases raciais, modelo esse que, segundo o autor, depende do "afastamento dos privilégios que resultaram da racialização de vários povos e nações, à medida que os estados buscaram impor nações culturalmente unitárias" (2004, p. 21). Brysk (2000) ressalta que "as comunidades indígenas foram enquadradas, redesenhadas e etnicizadas pelo contato europeu", isto é, a colonização foi a responsável pela conversão dessas "nações" em "etnias". Por isso, a autora afirma: "Ativistas indígenas não buscam o reconhecimento de seu status apenas como nações, mas como 'primeiras nações'". De forma semelhante a Shapiro, a autora enfatiza o uso da expressão "nações indígenas", com o objetivo de destacar a precedência moral de seus direitos. Entretanto, Brysk afirma que os índios "não pretendem retomar sua terra natal ou fundar um estado" (p. 40-41).

O que se observa acima é que a ideia de "nação", usada com referência aos povos indígenas, não contém os elementos caracterizadores da "nação" descrita por Hobsbawm. Niezen afirma que os povos indígenas usam a linguagem e a simbologia dos estados-nação não para reclamar uma estatalidade independente, mas para deixar claro para todos, mas principalmente para seus próprios cidadãos, a continuidade de seus protestos por autodeterminação (2003, p. 216). Dessa forma, a menos que se aceite o paradoxo de "nações sem Estado", o uso da expressão "nações indígenas" deve ser entendido como um indicador de opção ideológica pró-indígena, sempre que a adequação técnica vocabular for menos importante que a expressão do protesto político.

Outro conceito que deve ser melhor compreendido é o de comunidades indígenas. Segundo Manuela Carneiro da Cunha, "comunidades indígenas são aquelas 'que se consideram segmentos distintos da sociedade nacional em virtude de uma consciência de sua continuidade histórica com sociedades pré-colombianas'" (apud Barreto, 2008, p. 37). O que se observa é que a ideia de comunidade indígena é compatível com a ideia de grupo étnico, mas sua abrangência é menor. Na prática do uso dessa expressão, um grupo étnico pode ser composto por muitas comunidades indígenas, sendo estas as suas unidades organizacionais básicas, equivalentes às aldeias.

Existem também definições que utilizam indistintamente um conjunto de substantivos, destacando assim a multiplicidade de formas de organização sócio-política das populações indígenas. Por exemplo, a seguinte definição, referida por Niezen:

Comunidades, povos e nações indígenas são aqueles que, tendo uma continuidade histórica com sociedades pré-coloniais que se desenvolveram em seus territórios, consideram-se distintos de outros setores das sociedades atualmente predominantes nesses territórios ou em parte deles (Martínez Cobo, apud Niezen, 2003, p. 20).

Penso que o objetivo do uso combinado dessas expressões é incluir todas as manifestações concretas da indianidade, em respeito à proeminência da autorrepresentação na definição da identidade étnica.

 

2. O movimento indígena transnacional: os povos indígenas diante da globalização e da governança global

Para compreender melhor a inserção dos povos indígenas na governança global convém identificar suas relações com outros tipos de atores, sobretudo aqueles cuja atuação ocupa o mesmo nicho político ou busca objetivos semelhantes. Assim, vai-se refletir sobre a natureza do movimento indígena transnacional, sua inserção na globalização e na governança global, bem como sobre a relação entre os interesses indígenas e os interesses das ONGs que por vezes os representam.

O movimento indígena transnacional é definido por Brysk (2000) como:
.
[o conjunto ] de organizações indígenas, grupos de apoio não-indígenas e indivíduos (juristas, antropólogos, cientistas e religiosos) que se mobilizam a fim de promover avanços na situação, na autonomia e na participação dos índios em suas sociedades e no sistema internacional. (Brysk, 2000, p. 69)

Trata-se do tipo de ator que Pecequilo (2004, p. 53) classifica como "grupo ideológico", isto é, um grupo que busca "atender interesses específicos de cunho social", agregando, no caso do movimento indígena, o caráter eminentemente transnacional. É uma rede de atores não estatais, indígenas e não-indígenas, que combinam espaços de diálogo e sensibilização da opinião pública, a partir de diferentes plataformas, sejam as universidades, sejam as igrejas, sejam os próprios povos indígenas.

As teorias sociológicas dos movimentos sociais contribuem de forma significativa para a análise do movimento indígena transnacional. Segundo Touraine, todo movimento social "se define pelo confronto de interesses opostos para controlar forças de desenvolvimento e do campo de experiência histórica de uma sociedade". "Eis porque", prossegue o autor, "defino um movimento social como a combinação de um princípio de identidade, de um princípio de oposição e de um princípio de totalidade" (1994, p. 291).

O princípio de identidade é "a definição do ator por ele mesmo", a qual apenas ocorre conscientemente muito após a formação do movimento. Observando os discursos dos teóricos do movimento, penso que o princípio de identidade do movimento indígena global parte de dois elementos identitários centrais: 1) as narrativas históricas de sobrevivência em condições de opressão colonial; e 2) a conexão com a terra (Huhndorf, p. 360; Niezen, p. 23). O conflito que determina os atores do movimento indígena transnacional é ainda a colonização, cuja feição contemporânea é a continuação da assimilação homogeneizante do índio na cultura ocidental capitalista, em nome dos supostos benefícios de uma inserção na economia de mercado. Isso nos leva ao princípio de oposição.

"Só se pode falar de princípio de oposição", segundo Touraine, "se o ator se sente confrontado com uma força social geral num combate que coloca em causa orientações gerais da vida social" (1994, p. 292). Em poucas palavras, o princípio de oposição está na identificação, ainda que a posteriori, do adversário do movimento. Sob este aspecto, as circunstâncias têm sido diferentes em cada caso concreto e em cada período histórico. Nos Estados Unidos, o movimento dos povos indígenas tem origem no "momento mais baixo de todos os tempos para a existência tribal [...] quando o governo federal tentou adotar uma solução final para o 'problema indígena' dos Estados Unidos" (Blackhawk, 2007, p. 212). A ideia de uma "solução final" - o mesmo eufemismo usado pela Alemanha nazista para se referir ao projeto de extermínio do povo judeu - pôs em ação uma série de ondas de choque político entre as comunidades indígenas nos Estados Unidos. O apogeu da Modernidade e de sua perspectiva civilizacional, situado grosso modo no meio do século XX, teve reflexos parecidos para povos indígenas do mundo todo. Esse foi, provavelmente, o adversário original do movimento, um adversário sem face: o medo do extermínio.

À medida que a consolidação e a efetivação do regime internacional de direitos humanos foi tornando menos provável a consecução de qualquer modalidade direta de extermínio dos remanescentes indígenas, o princípio de oposição foi se transformando. Nos dias de hoje, penso que a principal oposição é a ameaça representada por uma modalidade ultraliberal de cosmopolitismo, que vê valor no avanço de uma versão da globalização que implica a negação das diferenças culturais, sempre em favor das culturas do Ocidente. Assim, em oposição a um individualismo radical, narrado como única alternativa para a realização dos valores morais da Modernidade, o movimento indígena global apresenta-se como representante sui generis da filosofia política do comunitarismo. Após todos os esforços (até aqui fracassados e, portanto, inconclusos) de unificação nacional promovidos pelos Estados-nação, as comunidades estão lutando para preservar seu caráter diferencial, para manter-se como comunidades ao longo de futuras gerações. Bauman observa que a manutenção da comunidade implica a limitação das escolhas dos indivíduos que as compõem, em nome da possibilidade de proporcionar-lhes tomar escolhas significativas, isto é, escolhas orientadas pelo contexto comunitário vivido por meio da língua e da tradição cultural de sua sociedade (Bauman, 1998, p. 236-237).

Kymlicka (2006, p. 1-3) afirma que o comunitarismo é uma corrente de filosofia contemporânea, como parte de um debate original, que não estava na pauta de discussões há vinte e cinco anos atrás. Para esse autor, os comunitaristas "acreditam que avaliar as instituições políticas não pode ser uma questão de julgá-las em confronto com certo padrão ahistórico independente". Assim, ainda que não se observe uma relação direta entre a emergência do comunitarismo e a emergência dos povos indígenas, pode-se dizer que o comunitarismo trabalha a favor dos povos indígenas e que os povos indígenas trabalham a favor do comunitarismo.

Por fim, "não existe movimento social que se defina unicamente pelo conflito. Todos possuem o que denomino um princípio de totalidade. [...] O princípio de totalidade nada mais é que o sistema de ação histórica cujos adversários, situados na dupla dialética das classes sociais, disputam entre si a dominação" (Touraine, 1994, p. 292). Cabe aí uma atualização, promovida pelo  próprio Touraine. O autor reconheceu que "os atores dos novos movimentos sociais não estariam limitados a conflitos de classe, gerados a partir do campo econômico", superando assim os excessos economicistas de seu modelo analítico (apud Aparício, p. 79). Basta dizer que o princípio de totalidade é o sistema de ação histórica disputado entre o movimento e seus adversários.

A meu ver, o sistema de ação histórica em que opera o movimento indígena transnacional é a própria globalização, por meio de sua face operacional, a governança global. Assim como no século XIX o movimento liberal e o movimento operário "não opõem de maneira alguma dois tipos de sociedade inteiramente diferente, mas duas versões conflituosas, opostas, do progresso" (Touraine, 1994, p. 291), no século XXI, o movimento liberal (ainda ele) e o movimento indígena transnacional não opõem dois tipos de sociedade inteiramente diferente - haja vista que o mundo indígena "inteiramente diferente", sem Estados, de sociedades de abundância convivendo sem comunicações ou transportes de longo alcance foi irreparavelmente destruído à medida que foi arrastado para dentro da sociedade global de Estados, e seria ingenuidade pretender promover seu retorno. Eles opõem, isto sim, duas versões conflituosas, opostas, da globalização e da governança global.

O campo de ação histórica do movimento indígena transnacional é a globalização. E, para Touraine, "o objeto da análise sociológica nunca pode ser o próprio movimento social; deve ser o campo de ação histórica" (1994, p. 298).

Segundo Kratochwill, o discurso da globalização nas últimas duas décadas experimentou uma virada decisiva, da noção de um "processo abrangente que, como ondas de ressaca, arrasta tudo que se encontra em seu caminho" para outra noção que enfatiza novamente a possibilidade de escolha e cujo termo de referência dominante passa a ser a "governança". Esse autor afirma o surgimento de um novo papel para os grupos sociais na governança global. "Em vez da antiga 'resistência' à globalização por grupos sociais e ONGs, seu novo papel como criadores de normas e provedores de serviços está mais em foco agora" (2011, p. 266). Essa percepção de Kratochwill vem bem a calhar com a hipótese ora em construção sobre a natureza do movimento indígena transnacional, como propositor de normas e provedor de serviços na governança global.

A governança global, conforme as elaborações de James Rosenau, presume a existência de funções que precisam ser executadas para dar viabilidade ao sistema internacional, "mesmo que o sistema não tenha produzido organizações e instituições incumbidas explicitamente de exercê-las" (2000, p. 14). Entre essas funções necessárias, o autor exemplifica mencionand.

a de interagir com os desafios externos que ocorrem em qualquer sistema; evitar que os conflitos entre os membros ou facções provoquem uma destruição irreparável; buscar recursos para a preservação e o bem-estar do sistema; definir objetivos e condutas destinadas a alcançá-los (Rosenau, 2000, p. 14)

Essas funções são comumente desempenhadas pelos governos, mas o mundo contemporâneo tem observado um crescente compartilhamento dessas competências com setores da sociedade civil organizada. Esse é um traço distintivo da ordem internacional contemporânea.

Assim, a ideia de governança é, por um lado, uma reação à crença na inevitabilidade da globalização, aliada à inclusão de atores não estatais no jogo político. Abordagens mais refinadas têm afirmado que "escolhas e decisões ainda estão disponíveis e têm de ser feitas, ainda que, curiosamente, a arena não esteja mais restrita aos estados-nações" (Kratochwill, 2011, p. 267). Por outro lado, "governança" significa a disciplina imposta às instituições estatais, mas também o sistema alternativo de serviços e bens públicos que emerge "se as estruturas estatais pararem de funcionar", sobretudo nos estados falidos do Sul e nos ex-estados soviéticos. Esse sistema alternativo de serviços e bens públicos está fundado no papel das ONGs e das redes internacionais de apoio organizado (p. 268). Kratochwill parece acreditar que a governança transformou-se na feição contemporânea do desenvolvimentismo. "A governança é reformista num sentido muito mais amplo que as tentativas prévias de estabelecer um 'estado desenvolvimentista' funcional" (p. 268). Segundo Paris:

Ainda que os peace-builders modernos tenham em grande parte abandonado a linguagem arcaica de civilizados contra não civilizados, eles parecem continuar a agir com base na crença de que um modelo de governança doméstica - democracia liberal de mercado - é superior a todos os outros (Paris, 2002, p. 638).

O comunitarismo implícito nas demandas do movimento indígena transnacional rejeita qualquer modelo de governança que passe por cima de seu direito à autodeterminação que, em última análise, é a única garantia de sua preservação como comunidades culturalmente diferenciadas.

Por outro lado, a governança, como instância técnica, supostamente neutra, distanciada da política, não é capaz de resolver sozinha os problemas da "transição", tanto de Estados falidos como ex-comunistas, "porque a viabilidade das estruturas locais é decisiva". O conhecimento local torna-se mais importante que a expertise técnica ou a familiaridade com os procedimentos da "ajuda" internacional. A falência do planejamento estatal desenvolvimentista, baseado na ortodoxia econômica, "levaram o Banco Mundial a reconsiderar alguns de seus programas, incluir a redução da pobreza como um objetivo importante e institucionalizar alguma forma de diálogo com grupos locais e ativistas de redes transnacionais" (Kratochwill, 2011, p. 269). A participação de atores locais e transnacionais, tanto no nível do planejamento quanto no da implementação, passou a ser aceita como condição necessária - ainda que não suficiente - para o sucesso da cooperação para o desenvolvimento.

Essa nova ortodoxia do combate à pobreza, institucionalizada na relação com as principais instituições financeiras globais e associada ao direito internacionalmente reconhecido aos povos indígenas de serem consultados sobre quaisquer ações públicas que os afetem, é um dos fundamentos do acréscimo de poder dos povos indígenas na gestão de setores específicos da governança global, notadamente os setores da promoção do desenvolvimento, do meio ambiente, da mudança climática.

Outro aspecto importante é a rediscussão da própria ideia de desenvolvimento. Autores como Paul J. Nelson (2007) afirmam a primazia da efetivação dos direitos humanos como variável indicadora de melhoria no nível de desenvolvimento de uma sociedade, em detrimento das definições ortodoxas com foco no incremento do produto econômico bruto. "Boa governança", para o Banco Mundial, inclui o respeito aos direitos humanos, além da presença de estruturas socias e institucionais pluralistas, com a descentralização da administração e a participação de ONGs locais e transnacionais. Esses são aspectos positivos para os povos indígenas, seja como grupos étnicos, seja como movimento indígena transnacional, identificados como stakeholders na governança global.

O ponto negativo, sentido igualmente por povos indígenas e sociedades não-indígenas, é uma espécie de privatização indireta dos serviços públicos, ao deixar sua prestação sob responsabilidade de iniciativas da sociedade civil, discursivamente justificada pela necessidade de reduzir o funcionalismo público e manter a disciplina orçamentária. Kratochwill alerta aí para  os perigos oriundos dessa transferência de responsabilidades para a sociedade civil, em razão do risco de que as ONGs sejam afetadas pela introdução da lógica de mercado no provimento de serviços públicos. Há também o problema dos "múltiplos diretores", em razão das múltiplas fontes financiadoras das ONGs (2011, p. 270).

A análise de Hoffmann (2009) sobre as ONGs mostra-se em consonância com esse alerta. Para a autora, o crescimento do fenômeno das ONGs dificulta a localização ideológica dos grupos e das correntes políticas, em razão da possibilidade de "nomear diferentes atores sob uma mesma rubrica". A incorporação do uso da categoria ONGs, segundo a autora, foi "um processo de anulação de diferenças no terreno discursivo que produziu um efeito de despolitização das questões", bem como dos atores. O termo ONG passou a "encobrir um leque extremamente variado de organizações", religiosas e laicas, oriundas do Norte ou do Sul, e encobre até mesmo a fronteira entre o governamental e o não-governamental, "pois em muitos casos elas exercem funções de Estado [...] ou são financiadas pelo Estado (Hoffmann, 2009, p. 339-340).

Dessa forma, apenas é possível atribuir o adjetivo "indígena" a uma ONG quando essa organização realmente tem membros indígenas, não apenas entre seus componentes mas principalmente entre as lideranças envolvidas diretamente no processo de tomada de decisões da organização. Demais disso, é possível conceber a presença de ONGs não-indígenas dentro do movimento indígena global, como parceiras e prestadoras de serviços aos povos indígenas, nessa empreitada de projeção global de suas demandas. O fato de que tais ONGs possam veicular objetivos ou valores que são estranhos aos povos indígenas e, assim, possam ser instrumentos de continuação de um colonialismo que agora se apresenta com outras vestes, não deve ser desprezado. Tampouco se deve desprezar a capacidade dos povos indígenas de julgar a conveniência e a adequação dos serviços oferecidos por essas organizações. Negar-lhes a capacidade de compreender os desafios e oportunidades oriundos dessas relações equivale a insistir no paternalismo que tem pautado as relações interétnicas há tanto tempo.

Outro perigo da governança, que vai contra o argumento de que os povos indígenas têm experimentado um acréscimo de poder global, é o de que a sociedade civil tenha um papel meramente decorativo na nova ordem. Kratochwill expõe o temor de que a governança funcione apartando as instituições onde as decisões são efetivamente tomadas, insulando-as do escrutínio público por meio da criação de fóruns da sociedade civil para intermináveis debates e argumentação, sem real possibilidade de participação ou influência nas decisões e sem qualquer controle efetivo sobre os reais detentores do poder (2011, p. 274). Essa crítica é significativa para que se evite um idealismo ingênuo quanto às possibilidades dos povos indígenas enquanto atores da governança global, notadamente nas questões conhecidas como de high politics - segurança coletiva, sistema financeiro internacional, etc.

Não obstante, deve-se reconhecer que os povos indígenas são mais que simples stakeholders. Eles são stakeholders que detém vínculos territoriais sobrepostos às soberanias estatais. Na diversidade das situações empíricas dos dias de hoje, os povos indígenas apresentam diferentes graus de disponibilidade territorial e de autonomia sobre seus territórios. Alguns povos indígenas detém status de autonomia ou semiautonomia sobre parcelas significativas de território, como os esquimós (ou Inuit) no Canadá, detentores de um território semiautônomo de cerca de 2 milhões de km2, (cerca de 20% do território total do Canadá, em área contínua) (Cunha, p. 127), os Yanomami no Brasil e na Venezuela, detentores de um território autônomo de 192.000 km2, além de outros povos da Amazônia com posse e autonomia sobre porções significativas de terras (totalizando cerca de 10% do território do Brasil em terras indígenas). A porção de autonomia que esses povos detém sobre territórios estrategicamente significativos muda sua relação com a governança global. Suas terras tornam-se espaços territoriais de governança indígena local, com potencialidades e implicações globais, sobretudo em termos de meio ambiente, mudança climática, promoção do desenvolvimento e garantia dos direitos humanos.

À guisa de conclusão: uma reflexão sobre os povos indígenas na governança global

Segundo Niezen, uma definição rigorosa do termo "indígena", "que desejasse fechar fronteiras intelectuais que ainda são porosas, seria prematuro e, em última análise, fútil". Para o autor, "os debates sobre o problema da definição são mais interessantes que qualquer definição em si própria" (2003, p. 19). É segundo esse espírito que se propôs o presente artigo, mais com o interesse de compreender a natureza dos povos indígenas enquanto atores políticos e as características de sua inserção na governança global.

Os próprios povos indígenas utilizam expressões diversas para se definirem, e suas autodefinições devem ser situadas no topo de qualquer escala de utilidade e adequação de nomenclaturas, em respeito à sua autonomia. A expressão "povos indígenas" tem sido usada como uma convenção, convalidada nos principais tratados internacionais sobre o assunto. Demais disso, procurou-se verificar a adequação teórica dos tipos definidos na literatura de Ciências Sociais e Humanidades às coletividades que temos tratado como "povos indígenas".

Com base no que se discutiu no presente trabalho, entendo que os povos indígenas são grupos étnicos, isto é, atores que usam identidades étnicas para categorizar a si mesmos e aos outros, com vistas a delimitar fronteiras sociais. Entendo também que não devem ser vistos como nações, seja porque não possuem os traços caracterizadores da "nação" (notadamente, a coexistência de um Estado-nação), seja porque os povos indígenas, em regra, não têm demonstrado interesse de se constituírem como Estados-nação.

Outro ator abordado no presente trabalho é o movimento indígena transnacional, definido como o conjunto de povos indígenas, organizações indígenas e não-indígenas, grupos de apoio e indivíduos associados com o objetivo de avançar os interesses dos povos indígenas na política global. Seu princípio de identidade encontra pontos de contato com a filosofia política do comunitarismo, em oposição a um cosmopolitismo liberal radical. Seu princípio de totalidade, ou o sistema de ação histórica onde opera o movimento, é a globalização. Agindo no confronto entre projetos opostos para o futuro da globalização, os povos indígenas e o movimento indígena transnacional se posicionam como atores da governança global.

A ideia de governança global tem posto em relevo os povos indígenas. Ao enfatizar a participação dos stakeholders, a governança põe em foco os atores locais de cuja colaboração depende sua viabilidade. O crescente reconhecimento de da autonomia indígena sobre significativas porções de território é outro fator que favorece a atuação dos povos indígenas em assuntos globais. Em futuros estudos, cabe detalhar as normas e instituições contemporâneas que demandam a participação dos povos indígenas, notadamente em três setores-chaves interdependentes: o meio ambiente e a mudança climática, a promoção do desenvolvimento e a promoção dos direitos humanos.

 

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1. A Convenção n.º 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais afirma no seu Art. 1º, inciso 3 que "A utilização do termo "povos" na presente Convenção não deverá ser interpretada no sentido de ter implicação alguma no que se refere aos direitos que possam ser conferidos a esse termo no direito internacional".
2. O próprio Clastres afirma que o Império Inca era um exemplo de sociedade pré-colombiana com Estado. Dentro da multiplicidade de povos abrigados sob a classificação jurídica de povos indígenas ou tribais, fornecida pela Convenção n.º 169 da OIT, é provável que haja mais casos de povos que seriam melhor descritos como sociedades com Estado.