Print ISBN 2236-7381
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3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011
A China como hegemon em potencial e as implicações para a segurança nacional americana
Kelly Ferreira
Mestranda em Relações Internacionais (Programa de Pós Graduação em Relações internacionais "San Tiago Dantas" - UNICAMP/UNESP/PUC-SP)
RESUMO
Em 2001 Mearsheimer desenha dois possíveis cenários para o Nordeste Asiático. E dentre eles classifica como mais perigoso aos Estados Unidos, o cenário no qual a China emerge como grande poder e hegemon em potencial e esboça brevemente as implicações que isto teria para os Estados Unidos. Uma década após a publicação deste livro, notamos que o cenário descrito por Mearsheimer, não é muito diferente da realidade. A curto prazo, a China não se tornará a próxima potência mundial, entretanto é vista por alguns como um hegemon em potencial e busca vorazmente a liderança regional. Ao contrário do que foi colocado por Mearsheimer há dez anos atrás, a China não mais está longe da corrida pela liderança regional. Como bem foi apresentado por Mearsheimer, isto trouxe conseqüências á política de segurança nacional americana. Este artigo visa mostrar um panorama sobre a China e esboçar algumas considerações sobre como a China potência regional torna-se uma ameaça aos Estados Unidos.
Palavras Chaves: China; Estados Unidos; Ascensão Pacífica, potência regional
O despertar do dragão
Poucos países no mundo despertam tamanha curiosidade e interesse quanto a China. A longa história chinesa embora traga exemplos de períodos de grandeza e imponência, nunca antes mostrou algo semelhante ao que observamos hoje: uma China que em pouco mais de duas décadas se reinventou; retirou a população de uma situação de miséria, em 1978, 60% da população vivia com menos de 1 dólar por dia (STORY, 2004, p. 113), para finalmente ter, pelo menos, o mínimo de conforto. E sua economia pujante dá sinais que ainda crescerá muito nos anos seguintes.
Este crescimento econômico que impulsionou todos os demais setores começou com reformas iniciadas no governo Deng.
Mao esteve frente a presidência da China entre 1943 a 1976, período conturbado, não só pelo pelos anos de guerra, mas também por medidas econômicas e políticas mal sucedidas que assombram
uma população que ainda se lembra do desastroso Grande Passo á Frente, quando trinta milhões de pessoas morreram na fome fabricada gerada pelo esforço de Mao para acelerar a industrialização da China, no período 1959 -1961. A ela, sucedeu-se a Revolução Cultural, que durou de 1966 a 1976, quando Mao, tentou transformar a cultura da China e arrancá-la de suas amarrações históricas. Pelo menos um milhão de pessoas morreram durante seus excessos, além de milhões de crianças em idade escolar que perderam em termos educacionais. (STORY, 2004, p.40).
A utopia econômica proposta por Mao buscava a abolição do mercado, confisco da propriedade em nome do povo, monopólio do Partido Comunista Chinês e modernização da China por meio de empréstimos e de adaptações com ciência e tecnologias ocidentais (STORY, 2004).
Tendo estes objetivos em mente, Mao orquestrou algumas mudanças como: a abolição dos direitos de propriedade (para expropriar os excedentes agrícolas e eliminar classes), centralização econômica, criação de novas regulamentações que abrangem todo o país e vão desde fundos de investimento, insumos físicos até fixação de preços e salários; e por fim o comércio exterior que era limitado á produtos que não produziam internamente.
Em 1978 quando Deng assume o poder, a China está em ruínas. Em Dezembro de 1978, durante a plenária do 11º Congresso do Partido Comunista Chinês é anunciado que o novo foco do governo será o desenvolvimento econômico e não mais a luta de classes.
Assim a China em 1978 começou a se abrir lentamente para o mercado e adotou o que foi chamado de "empirismo conservador". O monopólio do Estado sob o comércio foi abandonado, e para estimular o comércio internacional a moeda foi lentamente desvalorizada até 1994; isso atraiu investidores que buscavam se resguardar dos altos encargos salariais de seus países.
Em pouco tempo já foi possível ver algumas mudanças, em 1984 o número de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza na China caiu de 250 milhões para menos de 100 milhões (STORY, 2004, p. 177).
Embora a situação da população tenha melhorado outros problemas surgiram: aumento no número de empréstimos, assim como a elevação inflação. A corrupção saltou aos olhos da população, que começou a demandar a democratização; protestos que culminaram no acontecimento da Praça Tiananmen em Junho de 1989.
Entretanto as reformas lideradas por Deng surgiram efeito anos depois, impulsionando o crescimento visto a partir de meados da década de 90. A OECD estimou que no período 1995-2020 a China crescerá cerca de 5,6%, se manter este ritmo será a maior economia mundial por volta de 2050.
A efervescência da indústria ocorreu devido ao despertar da economia que ao tornar-se um pouco mais dinâmica, causou impactos diretos nos hábitos de consumo da população. Segundo Davidovic, esta classe média tem maior probabilidade de trabalhar em um escritório que em uma fabrica e tem mais dinheiro sobrando para gastar em bens de consumo e serviços. (DAVIDOVIC, 2008, p.6). Esta posição é reafirmada por Kiesow agora a população já pode adquirir bens de consumo que demandam maior quantidade de energia como carros, aparelhos elétricos como ar condicionado, refrigeradores e aquecedores (KIESOW, 2005, p.13).
Esse comportamento da nova classe média também reflete na frota de veículos. O relatório para o congresso de 2004 prevê que a frota chinesa aumentará na próxima década em cem bilhões de veículos, isto é, a metade da atual frota americana de carros e caminhões. No documentário de Billon e Pitten (2008), o conselheiro em assuntos de petróleo do governo Bush, Matt Simmons, declara que na primeira vez que foi a China em 1997, o trafego chinês era basicamente de bicicletas, com pouquíssimos carros, todo o sistema de transportes como as estradas e aeroportos ainda estavam em construção, quando retornou à China, sete anos depois, ele já encontrou uma situação completamente diferente como engarrafamentos de carros; inimagináveis em 1997. Observação similar também é feita por Nutall e Manz (2008).
Desde 1995, o número de carro na China tem quase triplicado e é esperado que terão mais 50 milhões de carros na China em 2010. O alto consumo está levando a China a buscar produções de petróleo além das suas fronteiras no Oriente Médio, Rússia e África (NUTALL e MANZ, 2008, p. 1253).
Além do aumento da frota de veículos, outro ponto é o setor de engenharia civil, disse-se que o desafio atual da China é suprir a demanda energética para continuar construindo prédios, shoppings e estradas; e que o desafio futuro será prover energia para aquecer, esfriar e iluminar todos esses ambientes.
A China está modernizando cerca de 170 cidades, cada uma com mais de 1 milhão de habitantes, certamente isso aumentará o número de empregos, que por sua vez aumentará a renda, que aumenta a procura por bens de consumo, que assim a aumenta a necessidade de energia nas indústrias e movimentará ainda mais a economia.
A China possui um território 9.596.961 km apenas ligeiramente menos que os Estados Unidos, com uma localização privilegiada no centro Ásia1 a China torna-se um líder natural para a região asiática. (SUTTER, 2003-2004).
Os chineses desempenham uma política pragmática para se projetar internacionalmente e exercer sua influência. A razão disto se deve á necessidade de manter a estabilidade com seus vizinhos (a China tem 22.117 km de fronteiras, 14.500km de costa e faz fronteira com 14 países), e para se abastecer de recursos naturais, por exemplo petróleo, atualmente a China consome 75.543.000 barris2 de petróleo refinado por dia3 e produz apenas 38.021.0004, todo o restante é importado principalmente do Oriente Médio, cerca de 50% do total das importações de petróleo, sendo os principais provedores Arábia Saudita e Irã, respectivamente.5
Ainda que procure construir na Ásia, sua área de influência, a China procura fazê-lo de forma a não criar nenhum tipo de situação que se caracterize explicitamente, como um estado de disputa. Especialmente com Estados Unidos e seus aliados (Índia e Japão), assim procura se aproximar exercendo uma política multivetorial, que por ser mais branda, preza pelo pragmatismo econômico e comercial, exigindo poucas informações dos países com os quais se relaciona.
Segundo Sutter (2003-2004) a China busca a longo prazo: um ambiente estável para a sua política externa, ao mesmo tempo que o governo chinês se foca em um desenvolvimento econômico sustentável e estabilidade interna, assim como acalmar os vizinhos quanto ao que a China fará com seu poder e influência recém adquiridos; aumentar seu poder e influência regional e global; isolar Taiwan internacionalmente; assegurar um fluxo de armas avançadas e tecnologia militar. E é esta trajetória que a China planeja executar que desperta um sinal de alerta nos Estados Unidos.
Observe-se, no entanto, que o crescimento da importância internacional da China está ancorado não só no seu rápido e genuíno crescimento conforme afirmado anteriormente, não se trata em negar ou menosprezar tal explanação, consoante a tal raciocínio notamos que seu crescimento internacional, se deve também a estratégia chinesa de não utilizar a força ou a ameaça do uso da força substituir por confiança mutua, mútuos benefícios, igualdade e coordenação multilateral. (ATAL, 2005, p.102).
Segundo Sutter (2003-2004) a China é o quarto maior parceiro comercial dos Estados Unidos e é:
a fonte do maior déficit comercial dos Estados Unidos (mais de 100 bilhões de dólares em 2002). A economia da China é importante até para os Estados Unidos. Os importadores estão crescentemente dependentes da China, com quase 11% das importações dos Estados Unidos vindos da China. Em 2002 as importações chinesas cresceram mais rápido que as importações dos Estados Unidos no geral, a uma taxa de crescimento de 22% (SUTTER, 2003-2004, p.78).
Porquanto a China tornou-se não só uma grande economia, que aumenta seu poder e torna-se (involuntariamente) concorrente a liderança, mas também uma peça imprescindível á economia americana.
Estados Unidos e China: Amigos e Rivais
Como se pode perceber a China colocada em números é surpreendentemente grande mesmo para um país como os Estados Unidos. É interessante, lembrar que nos últimos anos os Estados Unidos vem enfrentando algumas dificuldades desconhecidas ás últimas gerações: como crises econômicas, aumentos vultosos dos gastos militares em guerras não bem sucedidas que ajudaram a aumentar o déficit público e notórias complicações em políticas domésticas como desemprego e saúde pública. A fim de amenizar os cofres públicos, títulos da dívida americana foram disponibilizados para leilão e aproximadamente 20% deste títulos agora se encontram em posse da China.
Assim parece interessante centralizar a atenção, por ora, no crescimento chinês, a fim de destacar que, foi este o incentivo para os Estados Unidos temer quanto ao seu próprio status no sistema internacional.
Segundo Mearsheimer (2001) os Estados se preocupam com a riqueza relativa porque o poder econômico é a fundação do poder militar. (MEARSHEIMER, 2001, p. 143). A dinâmica econômica permite que os Estados aumentem seu bem estar, e também desenvolvam uma vantagem militar sobre outros Estados. Assim, Estados como a China, que estão trilhando caminhos econômicos prósperos são recebidos como ameaça, independente ter ou não uma capacidade militar aguçada.
Como se vê, a modernização a China faz do seu Exercito Popular de Libertação, despertou preocupações nos Estados Unidos. Segundo o Report to Congress - U.S.-China Economic and Security Review Commission:
O rápido crescimento da China e a abrangente transformação de suas forças armadas está afetando o equilíbrio militar regional e causa implicações além da região Ásia-Pacífico. Uma preocupação particular é que alguns elementos da modernização militar chinesa desafia nossa liberdade de ação na região. (Report to Congress - U.S.-China Economic and Security Review Commission, 2010, p.73).
Os Estados Unidos sente-se ameaçado uma vez que a China em um futuro próximo pode ser uma ameaça á segurança dos interesses americanos na região do Pacífico (GARRETT, 2005) causa uma diluição de seu poder e influência americana na região Diluir o poder regional americano ao ponto que a pequena influência americana virá a precisar de China regional e dominante como seu aliado e eventualmente como uma China global e poderosa como aliada (BRZEZINSKI, 1997, p.172).
Esta diluição nas relações Estados Unidos - Ásia é tratada por Brzezinski (1997) e Buzan (2004 e 2008). Brzezinski aduz a ascensão chinesa como parte do cenário geoestratégico da Eurásia, de forma pacifica e sem a intenção de ser global, como Deng Xiaoping expressa muito bem ao aconselhar que a política externa chinesa deve Observar calmamente, assegurar sua posição, lidar com os assuntos calmamente, esconder suas capacidades e aguardar o momento certo, ser bom em manter um "low-profile" e nunca reivindicar liderança (FRIEDBERG, 2006, p.12). Neste tocante, o discurso oficial chinês procura evitar medidas agressivas, ou que possam parecer agressivas aos Estados Unidos. Esta posição evoca as raízes históricas chinesas, que a China deve pensar a si própria como uma potência intermediária6.
Buzan (2008) aduz que o crescimento chinês sempre será visto por Washington como uma ameaça, independente desta ascensão ser pacífica ou não, apesar de toda a tentativa da China em manter esta política ao longo dos anos. Todavia, este sentimento de ameaça sentido pelos Estados Unidos,resquício do temor da ascensão japonesa algumas décadas atrás, segundo Brzezinski, pode não ser compartilhado pelos demais países.
Se o ascensão pacífica da China continuar as percepções dos Estados Unidos da China ser uma ameaça pode não ser compartilhada por todos. Aquelas vozes que estão constantemente em oposição a hegemonia dos Estados Unidos, e falando da necessidade de uma ordem mundial multipolar, provavelmente darão boas vindas a ascensão da China. (BUZAN, 2008, p.561).
Com isso, o controle das rotas marítimas e das regiões produtoras de matérias-primas são necessárias para os Estados Unidos manter sua presença de forma efusiva, e principalmente para evitar que a China perca todos os laços de dependência com os americanos.
Evidentemente, tal apreensão torna a presença do exército e marinha americana uma ferramenta necessárias, á tentativa dos Estados Unidos de manter um domínio do equilíbrio de poder terrestre: Grandes poderes concentram esforços para dominar o equilíbrio de poder terrestre, porque este é o melhor caminho para maximizar sua parte de poder militar. (MEARSHEIMER, 2001, p.145).
Importante salientar, que as buscas por recursos naturais, com destaque para matrizes energéticas afetam toda a grande estratégia chinesa (FRIEDBERG, 2006). A crescente dependencia de importações cada vez mais distantes, implica que a China se lance cada vez mais ao Ocidente, e esse crescente impulsionamento dos mercados domésticos da RPC fornece aos estrategistas chineses possibilidades para exercer influência onde, até recentemente, eles tinham muito pouca (FRIEDBERG, 2006, p.7). Assim, nota-se uma tencionamentos nas relações do "grande jogo da Ásia".
Interações com países como o Irã levam os Estados Unidos a enrigecerem a postura com a China. Em declaração em uma visita a Beijing, o Secretário de Estado Americano Robert Zoellick disse: a China estará crescentemente em conflito com os Estados Unidos se continuar a perseguir relações e acordos energéticos com países que os Estados Unidos acreditam ser problemáticos (KIESOW, 2005, p. 14).
Conquanto os Estados Unidos proclamem e vejam a China como uma ameaça, esta se mantém firme ao discurso de ascensão pacífica, Desenvolver trocas com os Estados Unidos para assegurar a paz e a estabilidade na região do Pacífico e no resto do mundo. A China ser o parceiro dos Estados Unidos na promoção da paz mundial7 este foi o modo que Jiang Zemin, presidente da China, expressou seu desejo de aproximação dos Estados Unidos.
Houve variações no discurso para ascensão pacífica, mas em todos permeiam a preocupação em apenas manter o desenvolvimento da economia chinesa, se bem que estas preocupações resultem em conseqüências principalmente em seus vizinhos asiáticos, muitos dos quais desejam um sistema mais multipolar de poder.
Esta visão é compartilhada tanto por países pequenos, como também por grandes como Rússia, que embora defenda um sistema multipolar por outras razões, aceita a ascensão chinesa (MARKETOS, 2009).
Paralelamente há uma dicotomia na relação entre Estados Unidos e China, ao mesmo tempo que os Estados Unidos podem ser definidos como um amigo da China, este também é seu rival regional. Com essas duas marcas observam-se alguns descompassos em suas relações. Entretanto há três áreas aonde existe uma ambivalência: Relações no nordeste da Ásia, Energia e relações Econômicas (ZABOROWSKI, 2006).
Mesmo ao fim da Guerra Fria, os Estados Unidos, se manteve presente no nordeste asiático, cultivando relações estreitas com Coréia do Sul e principalmente com o Japão, sendo este último totalmente dependente dos Estados Unidos para sua defesa, o que faz o Japão um exemplo muito conveniente da máxima de Carl Schmitt Protego ergo obligo8, apesar que as hostilidades entre Japão e China, são anteriores á qualquer influência americana na região. Contudo, são as relações entre Estados Unidos e Taiwan que mais preocupam os chineses, Os Estados Unidos além de terem claramente assumido a posição de protetores da ilha. Em 2001 George W. Bush deixou ainda mais explícita esta postura ao declarar que os Estados Unidos fariam tudo o que fosse necessário para ajudar Taiwan á se defender (ZABOROWSKI, 2006, p. 87)Vale reiterar, que apesar de todo o esforço chinês para isolar Taiwan, os Estados Unidos continuam a vender armamentos á ilha, satisfazendo não só as necessidades de Taiwan, mas também de sua própria indústria armamentista.
Dessa maneira, um segundo problema emerge: o das "Coréias". Enquanto a Coréia do Norte recebe todo o apoio da China, a Coréia do Sul tem como respaldo os Estados Unidos; com o qual firmou um acordo em 1952 e que se mantém até os dias de hoje, 37.000 soldados americanos em solo sul coreano9.
De todo modo, o interesse chinês é manter a estabilidade da península coreana para evitar um aumento no número de refugiados (A China possui 1.400 km de fronteiras com a Coréia e esta é a região onde se encontram as cidades mais pobres da China), os Estados Unidos tem na Coréia do Sul uma posição privilegiada para observar o comportamento e os exercícios militares chineses, além que qualquer conflito na região asiática esta bases tem uma grande importância estratégica.
É inegável a importância e o impacto que os Estados Unidos causam em qualquer país do mundo. E conforme já se pode provavelmente inferir que a China não se exime desta influência e ainda precisa lidar com questões delicadas, pois, sua política externa tanto para a energia como para as demais, isso porque, seu comportamento vem sendo visto pelos americanos, assim como por outros países como uma forma de oposição ou alternativa a hegemonia americana10
Como se não fossem o bastante, os eventos do 11 de Setembro reascenderam as preocupações chinesas quanto a militarização americana na região asiática, uma vez que os principais fornecedores foram colocados sob a supervisão ou invadidos pelos Estados Unidos.
Desde deste então, o governo chinês tem se preocupado sobre a expansão militar dos Estados Unidos na Ásia Central. O forte crescimento da presença dos Estados Unidos na região, acreditam os analistas de segurança chineses, facilitaria para os Estados Unidos estender seu controle sobre o petróleo do Oriente Médio para a Ásia Central, e por esta razão teria um impacto adverso no petróleo da China assim como na segurança nacional. (LEE, 2005, p.271).
A doutrina Bush teve uma extensão muito maior que o Oriente Médio. Os americanos utilizaram-se da legitimidade que a busca pelo culpado pelo 11 de Setembro lhe concedia, para ações, a saber, que antes não obtinham respaldo de nenhum país e/ou encontravam grande força contra, como por exemplo a presença de tropas americanas aos arredores do Estreito de Malacca.
A China criou instituições internacionais como a Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC), Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), Organização Mundial do Comércio, cujo o enfoque é estender sua influencia na Ásia e ainda diluir a influencia americana.
De todo modo, é necessário destacar que em todas nestas instituições e blocos os Estados unidos participam. Seja como membro (APEC e OMC), seja como escritório de representação do setor privado americano(ASEAN).
Fazendo contrapeso a todas as participações americanas nas demais instituições. A China constitui a Organização de Cooperação de Xangai que é um marco da política chinesa para o "novo conceito de segurança", pois, enfatiza a busca de cooperação entre vizinhos e membros para a segurança mutua na região. Esta organização não possui a presença americana, mas tem o Irã como seu membro mais polêmico, a inclusão deste não foi feita para afrontar os Estados Unidos, mas sim como um país chave para o combate ao terrorismo na Ásia Central (DAOJIONG, 2006). Além do Irã, o Paquistão e a Índia foram incluídos em 2005.
Ainda explicando o receio e interesse americano pela política externa chinesa, os Estados Unidos buscam um conhecimento universal de todos os parceiros comercias da China, não só pelo pais em si, mas também pelo produto e quantidade importada.
Neste momento se faz necessária uma clarificação. O constante e acelerado crescimento impeli a China á requisitar maiores quantidades de petróleo e gás natural, assim sendo, a demanda chinesa pode definir o valor de mercado petróleo e gás, eos Estados Unidos é vulnerável a flutuação de preços de recursos energéticos já que a dependência por este item é o calcanhar de Aquiles da política americana. (BROMLEY, 2005).
Diferentemente dos Estados Unidos à preocupação chinesa com assuntos de segurança energética gira em torno de questões de ameaçam sua economia e o mercado, enquanto os Estados Unidos contemplam medidas de segurança energética que concernentes à assuntos militares e políticos (DAOJIONG, 2006).
É neste ponto onde as duas políticas se chocam já que americanos questionam as relações que a China estabelece relações com governos de índole duvidosa como Irã, Sudão, Uzbequistão e Venezuela. Daojiong coloca:
Estes são países que perseguem políticas domésticas questionáveis e em muito casos políticas externas que desafiam interesses e/ou preferências americanas e européias. A situação indica para preocupações sobre a estratégia por traz da diplomacia de petróleo e gás da China. DAOJIONG, 2006, p. 48)
Quando as primeiras relações diplomáticas entre China e países do Oriente Médio começaram a serem estabelecidas, a China foi alvo de inúmeras criticas americanas que alegavam que os chineses estavam fornecendo armas em troca de petróleo e minando os esforços mundiais contra a proliferação de armas de destruição em massa na década de 80.
Mas isso se deve a diferença da natureza das políticas externas, a China ao contrário dos Estados Unidos estabelece relações meramente pragmáticas, desconsiderando as políticas domésticas de cada países, com o conceito da não ingerência nas políticas domésticas de outro país.
Pode parecer um pouco óbvio, mas as relações econômicas entre Estados Unidos e China, tornaram-se nas ultimas décadas cada vez mais desfavorável aos Estados Unidos, como podemos observar nos últimos 10 anos da balança comercial americana, o déficit com a China aumentou substancialmente. Em 2010 os americanos tiveram um déficit com a China de mais de 252 milhões de dólares. Apenas para critérios comparativos, o segundo maior déficit na Balança Americana é com a União Européia de 73,153 milhões de dólares. E nos últimos anos os Estados Unidos precisou ofertar um número muito maior de títulos de investimento, para conseguir controlar a crise financeira. A China é o maior comprados de títulos em 2009 ela tem 1,226 bilhões de dólares em títulos americanos, o equivalente á 20% do total ofertado.
Noutras palavras, os Estados Unidos dependem da China para a venda de seus títulos, para aumentar a liquidez e conseguir implementar as reformas necessárias. Por sua vez a China, necessita que os Estados Unidos desempenhem um bom papel econômico e que recupere o vigor econômico. Partindo do princípio que qualquer conflito entre ambos é economicamente dispendioso, ambos os Estados precisam passar do que Kupchan chamou de "cold peace" (uma estabilidade baseada na competição e na mutua detente) em uma "warm peace" que gera uma estabilidade baseada na cooperação e mutua tranquilização.11
Engajamento, não confronto
Cabe agora tratar de uma questão tangenciada até o momento os Estados Unidos são um ator global que busca defender seus interesses em determinado lugar (Kang, 2007). Assim para manter seu status de hegemon como diz Mearsheimer na Ásia, e evitar que a China tente expandir sua influência para o mundo todo. Segundo Mearsheimer.Os Estados Unidos buscam uma forma de cercear o comportamento chinês. Entretanto apenas militarizar os arredores da China, não surte um efeito tão grande quanto o esperado, os chineses estão cientes da rivalidade americana e buscam a todo custo não entrar em choque com os Estados Unidos, mas manter sua liberdade de ação e ter na Ásia sua área de influência.
Segundo Foot:
a cooperação entre Beijing e Washington será difícil de manter. Devido á quatro fatores: a convicção dos dois atores sobre seu "excepcionalismo", os dois países possuem diferentes sistemas políticos; problema histórico com a ascensão chinesa e candidato á espera para a transição do poder global, e uma desconfiança estratégica mutua de longa data. (FOOT, 2009, p.124)
Da descrição dada por Mearsheimer (2001) sobre os objetivos dos grandes poderes os Estados Unidos atualmente obedece três dos quatro aspectos 1) ser o único hegemon do globo; 2) Controlar uma grande porcentagem da riqueza mundial; 3)Dominar o poder terrestre na sua região. (MEARSHEIMER, 2001, p.147).
Mais interessante é observar a lógica construída por Yang (2009) fornece um aspecto interessante para se observar a questão, sendo o autor os Estados Unidos em buscar de manter sua absoluta superioridade como líder político, hegemonia militar absoluta e gigante econômico global (YANG, 2009, p. 21) E seria muito difícil para os Estados Unidos atingirem este propósito sem um inimigo externo para consolidar s posições internas. Assim a "Teoria da Ameaça Chinesa" reflete este pensamento que o Pentágono estimula para obter fundos adicionais e justificar sua importância. E curiosamente a "teoria da Ameaça Chinesa" ganha maior ênfase em momentos que á relações sino-americanas estão em bons momentos.
Vistos os debates mais gerais acerca das relações Estados Unidos-China, os Estados Unidos buscam manter a China comprometida e inserida a economia internacional ao ponto que ela seja economicamente tão dependente dos mercados ocidentais que não ouse se arriscar invadindo Taiwan, ou tomando uma ação militar contra qualquer outro país asiático com medo das sanções econômicas que possa sofrer. De muitos modos os Estados Unidos conta com a ambição chinesa por mais lucros e crescimento para mantê-la controlada e longe de posturas agressivas.
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YANG, Jian. The Rise of China in COONEY, Kevin J. SATO, Yoichiro. The Rise of China and International Security: America and Asia Repond. Routledge: Londres, 2009.
ZABOROWSKI, Marcin. Facing China's rise: Guidelines for an EU strategy. Institute for Security Studies European Union: Paris. Chailot Paper nº94, Dezembro de 2006.
ZHANG, Yongjin. China Goes Global. The Foreign Policy Centre: Londres, 2005.
Orientador: Sebastião Carlos Velasco e Cruz.
1. https://www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/ch.html#top.
2. OPEC - Annual Statistical Bulletin 2008.
3. Apenas para critérios comparativos consumiu 189.532.000 barris de petróleo por dia.
4. OPEC - Annual Statistical Bulletin 2008.
5. Energy Information Administration - http://www.eia.doe.gov/emeu/cabs/China/Oil.html.
6. Tanto que a palavra chinesa para "China" significa "Reino do Meio" o que convém e reafirma a posição da política diplomática chinesa (Brzezinski, 1997).
7. www.chinaonline.com, 8 de Outubro de 2001 apud STORY, 2004, p. 65).
8. "Protego ergo obligo" tradução livre Protejo, então obrigo. A relação entre Estados Unidos e Japão torna-se um bom exemplo, porque o Japão não possui nenhum mecanismo de defesa devido ao artigo 9 de sua constituição:" Aspirando sinceramente à paz internacional baseada na justiça e na ordem, o povo japonês renuncia para sempre a guerra como direito soberano da nação e à ameaça ou uso da força como meio de resolver disputas internacionais. A fim de cumprir o objetivo do parágrafo anterior, forças terrestres, marítima e aéreas, bem como qualquer outro potencial de guerra, nunca poderá ser mantida. O direito de beligerância do Estado não será reconhecido." Assim o Japão fica totalmente a mercê dos militares americanos, para a defesa de seu território.
9. Zaborowaski, 2006, p.86.
10. Para maiores debates e informações sobre a ascensão chinesa posar como ameaça aos Estados Unidos ver: CHRISTOFFERSEN, 1997; SHINN, 1998; ANDREWS-SPEED e VINOGRADOV, 2000; BROMLEY, 2005; DAOJIONG, 2006; LEE, 2005; BLAIR, HILLS e JANNUZI, 2007; KELLY e LELAND, 2007; ZHENG, 2009.
11. transform a cold peace "stability based on competition and mutual deterrence) into a warm peace (stability based on cooperation and mutual reassurance) FOOT, 2009, p.139.