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ISBN 2236-7381 versão impressa

3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

Transformações nas operações de paz e proteção humanitária no pós-guerra fria

 

 


RESUMO

Neste trabalho analiso o processo de progressiva intercessão entre o sistema de segura coletiva da ONU, não apenas como foi concebido originalmente, mas também seus mecanismos consuetudinários desenvolvidos no decorrer da Guerra Fria, e como, após o fim desse conflito, ele passou a ser utilizado para dar efetividade aos regimes de direitos humanos e direito humanitário. Primeiramente, traço um breve panorama do ressurgimento das operações de paz da ONU ao final da década de 1980. Em segundo lugar, demonstro a ocorrência de um processo de securitização das normas humanitárias através dos anos 1990, como nos casos de intervenção humanitária de Somália, Bósnia-Hezergovina, Ruanda, Haiti, Kosovo, Timor Leste e Afeganistão, todas elas, à exceção do Kosovo, acompanhadas por missões de paz da ONU. Finalmente, interpreto este processo à luz da teoria da Guerra Justa e das perspectivas pluralista e solidarista da Escola Inglesa, incluindo os principais pontos de inflexão decorrentes da Guerra ao Terror. A abordagem é de natureza holística e serve para fins teóricos, não objetivando adentrar em detalhes históricos dos conflitos.

Palavras-chave: Segurança - Direitos Humanos - Securitização - Guerra Justa


 

 

Introdução

As operações de paz das Nações Unidas surgiram como modo peculiar de resolução de controvérsias. No auge da Guerra Fria, poucas eram as possibilidades de se autorizar uma intervenção multilateral pelo Conselho de Segurança da ONU (CS), visto que o mundo encontrava-se dividido em duas esferas de influência ideologicamente antagônicas, lideradas por duas grandes potências com direito de veto naquele órgão. A solução encontrada para dar viabilidade ao sistema de segurança coletiva da ONU foi a criação de uma prática multilateral de natureza mista, situada entre o capítulo VI da carta das Nações Unidas, relativo às soluções pacíficas de controvérsias, e o capítulo VII, referente às medidas coercitivas. É o que o ex-secretário-geral da organização, Dag Hummarskjold, denominou de "capítulo VI e meio" da carta da ONU, que pretendia combinar consentimento e coerção nos processos de solução de controvérsias das Nações Unidas (Weiss, 2001).

Formou-se, assim, uma prática consuetudinária, consolidada através do período bipolar, que guiava as chamadas peacekeeping operations conforme os princípios de consentimento, da utilização da força apenas para auto-defesa e da interposição entre as partes em conflito (Weiss, 2001:69). Roland Paris destaca que essa modalidade de resolução de conflitos caracteriza-se também por ser implementada posteriormente ao estabelecimento de um acordo de paz (Paris, 2004). Este autor sugere uma interessante classificação dessas missões de paz ou operações de paz1, na medida em que elas foram se tornando mais complexas dentro da realidade diplomática das Nações Unidas.  Existem cinco categorias específicas dessas operações de paz, segundo Paris: diplomacia preventiva2, que visa a impedir a escalada de um conflito; a manutenção da paz3, a mais clássica de todas elas e que deu origem à doutrina tradicional na ONU, caracteriza-se por um contingente de tropas levemente armado, somente para auto-defesa, que observa o cessar-fogo posterior a um tratado de paz;  o estabelecimento da paz4, que visa à resolução de conflitos por meios diplomáticos e pacíficos; a imposição da paz5, que objetiva solução do conflito por meios coercitivos; e, por fim, a construção da paz6, que tem como finalidade reconstrução das sociedades depois de um conflito armado (Paris, 2004). Essas cinco categorias são de extrema relevância neste trabalho, visto que a principal característica dessas operações no pós-Guerra Fria foi a frequente ausência de distinção clara entre elas.

O período pós-bipolar caracterizou-se pelo descongelamento do processo decisório do Conselho de Segurança da ONU. Isso abriu uma série de novas possibilidades para o sistema de segurança coletiva da organização. Além de possibilitar o seu funcionamento da maneira como originalmente ele havia sido concebido, para uso da força mediante aprovação procedimental de seus quinze membros, em guerras interestatais, o desbloqueio deste órgão permitiu também que a força no âmbito multilateral fosse utilizada em circunstâncias diversas, como a proteção de grupos de indivíduos vitimados por agressões promovidas por seus próprios estados. As operações de paz da ONU, que haviam surgido no contexto da bipolaridade da guerra Fria, passaram, então, a serem utilizadas não apenas para assegurar a manutenção da paz entre estados membros da organização, mas também como aparato para dar efetividade às intervenções humanitárias da ONU, além de contribuírem para a reconstrução de estados falidos.

Neste trabalho analiso o processo de progressiva intercessão entre o sistema de segura coletiva da ONU, não apenas como foi concebido originalmente, mas também seus mecanismos consuetudinários desenvolvidos no decorrer da Guerra Fria, e como, após o fim desse conflito, ele passou a ser utilizado para dar efetividade aos regimes de direitos humanos e direito humanitário. Primeiramente, traço um breve panorama do ressurgimento das operações de paz da ONU ao final da década de 1980. Em segundo lugar, demonstro a ocorrência de um processo de securitização das normas humanitárias através dos anos 1990, como nos casos de intervenção humanitária de Somália, Bósnia-Hezergovina, Ruanda, Haiti, Kosovo, Timor Leste e Afeganistão, todas elas, à exceção do Kosovo, acompanhadas por missões de paz da ONU7. Finalmente, interpreto este processo à luz da teoria da Guerra Justa e das perspectivas pluralista e solidarista, incluindo os principais pontos de inflexão decorrentes da Guerra ao Terror. A abordagem é de natureza holística e serve para fins teóricos, não objetivando adentrar em detalhes dos conflitos.

 

O Ressurgimento das Operações de Paz e o Fim da Guerra Fria

Depois do período clássico das operações de paz da ONU8, entre o estabelecimento da primeira missão para gerenciar a crise do Suez, em meados da década de 1950, e a operação das Nações Unidas para o Líbano (UNIFL), a ONU deu início a um jejum de dez anos (1978-1988) sem criar novas operações de paz, em grande parte devido aos traumas do Congo que a UNIFL reviveu (Weiss, 2001: 59).

Já no clima de distensão do final da Guerra Fria, em 1988, a ONU rompe com esse jejum dando início a uma nova geração de operações de paz do pós-Guerra Fria. Apesar de alguns traços em comum com a geração anterior, como utilização da força somente para auto-defesa, elas não exerciam a tradicional tarefa de interposição entre as partes em conflito, típica do período anterior (Weiss, 2001: 69). A principal característica desta nova etapa9 foi a acumulação de diversas funções civis e militares, o que fez com que autores como Karen Mingst e Margaret Karns as denominassem de "operações complexas" (Mignst e Karns, 2000: 86).

A primeira delas foi a United Nations Good Offices Mission in Afghanistan and Pakistan (UNGOMAP) criada para observar a retirada da URSS do Afeganistão, no contexto das mudanças na política externa de Mikhail Gorbachev que levaram ao ocaso da Guerra Fria. Criou-se, posteriormente, a United Nations Iran-Iraq Military Observer Group (UNIMOG), com a finalidade de supervisionar o cessar-fogo resultante do conflito entre Irã e Iraque. Foi criada também, em 1989, a United Nations Transition Assistence Group in Namibia (UNTAG), que, além de monitorar o cumprimento de um acordo de paz que garantiu a retirada das tropas cubanas e sul-africanas da Namíbia, realizou funções típicas do que Mingst e Karns denominaram de "operações complexas". A UNTAG é um exemplo clássico deste tipo de missão, pois realizou funções consideradas de polícia civil, além de assegurar a proibição de leis discriminatórias entre seus cidadãos. Promoveu também a libertação de presos políticos e o retorno de pessoas exiladas, criando ambiente propício à emergência de direitos civis e políticos que viabilizassem a realização da democracia nacional (Mignst e Karns, 2000: 87-8). A última das operações de segunda geração, ou período transitório, foi a menos complexa ONUCA, que teve como objetivo tão-somente a observação do cumprimento dos acordos de paz celebrados para a América Central.

Essas quatro operações, embora ainda não completamente imbuídas das profundas mudanças constatadas quanto às missões de paz da década de 1990, já fornecem indicadores importantes das transformações que estavam ocorrendo no sistema de segurança internacional da ONU. Não apenas elas ganhavam força, na medida em que se reduziam os entraves no processo decisório do CS, como também os desafios que a ONU era chamada a solucionar, por intermédio delas, tornavam-se mais complexos, uma vez que se observava o desmonte das esferas de influência do conflito bipolar, frequentemente acompanhado pela falência de estados periféricos10 que perdiam interesse estratégico, dada as mudanças na estrutura do sistema internacional. À multidimensionalidade dessas novas missões de paz, junto com sua maior complexidade burocrática, viria se somar a possibilidade de utilização da força, nos casos em que houvesse agressões aos direitos humanos.

 

A Guerra do Golfo, a Securitização dos Direitos Humanos e a Emergência das Intervenções Humanitárias no Pós-Guerra Fria

O conflito no Golfo Pérsico ocorrido no ando de 1991 é importante para se entender as mudanças nas operações de paz do pós-Guerra Fria em dois sentidos: primeiro, ele representa um momento de rara harmonia no processo decisório do Conselho de Segurança, o que viabilizou a aprovação multilateral do uso da força para coibir a invasão do Iraque ao território do Kuait; segundo, porque, após a retirada das tropas de Saddam Hussein do território deste estado, o CS implementou uma série de medidas que tiveram como objetivo considerar a violação aos direitos humanos dos curdos no norte do país, promovidos pelo então governo sunita, como uma ameaça à paz e à segurança internacional.

O sistema de segurança coletiva da ONU prevê a possibilidade de uso da força em duas circunstâncias. Nos casos de legítima defesa, individual ou coletiva, quando os estados estão autorizados a fazerem uso da força para assegurar suas respectivas soberanias, segundo art. 51 da carta das Nações Unidas. A força também pode ser usada quando o CS considera, por aprovação de 3/5 de seus membros, incluindo o voto afirmativo dos cinco membros permanentes do CS (P-5), ter ocorrido uma "ameaça a paz", uma "ruptura da paz" ou um "ato de agressão" (art. 39). O CS possui, assim, poder discricionário de determinar, no caso concreto, se uma determinada circunstância pode ser enquadrada na terminologia do art. 3911. O que ocorreu no pós-Guerra Fria, desencadeado, em grande medida, pelo contexto político posterior à Guerra do Golfo, foi a progressiva vinculação de violações aos direitos humanos, ocorridas dentro do território de um estado em particular, ao problema da segurança internacional. A Resolução 688 de 1991 foi o primeiro passo no sentido desta vinculação, uma vez que ela considerou o desrespeito à minoria curda no norte do Iraque pelo governo de Saddam Hussein como um problema de segurança internacional12. A importância da Res 688 foi a de criar as "zonas de segurança" de proteção militarizada onde os refugiados curdos podiam buscar proteção das ameaças provenientes do governo sunita.

A Res 688 é, portanto, um marco na história das intervenções humanitárias do pós-Guerra Fria. A partir de então, abre-se possibilidade para se criar um vínculo entre segurança internacional e proteção humanitária13. O que se percebe após o conflito do Iraque é um verdadeiro ponto de inflexão nas práticas do CS, assim como das principais potências do "Ocidente". Considerando o marco teórico da Escola de Copenhage, pode-se dizer que passou a ocorrer um processo de securitização (Buzan, Weaver e Wilde, 1998) dos direitos humanos. Isso implica a progressiva inclusão destes direitos dentro do âmbito das medidas excepcionais de segurança, através de "atos de fala"14. Diferentes atores, neste caso, estados nacionais no âmbito do fórum multilateral em que consiste o CS, passaram a articular uma linguagem que associasse um problema originalmente tido como doméstico, violações internas aos direitos humanos, a uma ameaça à segurança internacional.

O problema da securitização para teóricos desta Escola, como Barry Buzzan e Ole Weaver, é que há uma série de inconvenientes ao se trazer, para a esfera da segurança, determinada questão de outro setor das relações internacionais. O principal deles se refere ao fato de que o âmbito da segurança é dotado importantes particularidades. Nele, o espaço para a democracia e o funcionamento transparente das instituições é mais reduzido, visto que o uso da força requer medidas, em regra, excepcionais. Não seria desejável, para esses autores, uma progressiva securitização de outras áreas da política internacional. Isso deveria ocorrer apenas em situações muito especiais, sendo mesmo desejável uma (des) securitização de algumas áreas já tratadas no campo da segurança (Weaver, 2004). Parece, contudo, que esta articulação discursiva entre segurança e direitos humanos obteve êxito no pós-Guerra Fria, em grande parte  porque as crises humanitárias ocorridas neste período eram de tamanha gravidade que justificavam, ou aparentavam justificar, seu tratamento como tema de segurança internacional.

 

Operações de Paz e Intervenções Humanitárias no Pós-Guerra Fria15

A crise humanitária resultante da falência do estado somaliano, no contexto da queda do presidente Siad Barre, e das disputas pelas diversas facções políticas pelo poder, foi interpretada pelos EUA e pelo CS no âmbito desta nascente associação entre problemas humanitários domésticos e ameaça à paz internacional. Frustradas as tentativas de resolver o conflito somaliano pela via diplomática, a ONU decidiu implementar embargo de armas à Somália, no escopo do capítulo VII de sua carta. Com os modestos resultados dessas medidas, o secretário-geral da ONU recomendou a criação de uma missão de paz para conter a crise da Somália, o que foi prontamente aceito pelo CS. A resolução 751 estabeleceu, em abril de 1992, a United Nations Operation in Somalia (UNOSOM), atuando sob os preceitos das medidas pacíficas do capítulo VI da carta das Nações Unidas (Weiss, Forsythe e Coate, 2001: 90). O agravamento da guerra civil somaliana levou ao descumprimento do "cessar fogo" aceito pelas diferentes facções do conflito, sendo que estas utilizavam como tática a obstrução da chegada de auxílio humanitário aos grupos inimigos.

O então presidente George Bush, em final de mandato e já tendo perdido à reeleição para Bill Clinton, propôs uma intervenção humanitária por intermédio das Nações Unidas para solucionar a crise somaliana. O CS estabeleceu, por intermédio da Res 794, a Unified Task Force (UNITAF), autorizada a usar a força para assegurar o provimento de ajuda humanitária à população somaliana afetada pela guerra civil (Ibid). Esta operação era conhecida entre norte-americanos pelo sugestivo nome Operation Restore Hope, o que indica o viés missionário e wilsoniano que marcava a política externa do governo Bush no contexto da Nova Ordem Mundial. Ela deu lugar à UNOSOM II, operação que também foi autorizada pelo CS a utilizar a força para assegurar o provimento de ajuda humanitária à população somaliana (Ibid).

O otimismo humanitarista do início da década de 1990, porém, não iria se sustentar por muito tempo. Dezoito soldados rangers norte-americanos foram mortos em outubro de 1993, já no governo Clinton, o que colocou em questão a capacidade dos estados nacionais de por em risco a vida de seus soldados para salvar estrangeiros, especialmente em uma democracia (Wheeler, 2000: 33). Esta é a questão central do livro de Nicholas Wheeler, Saving Strangers, que problematiza a disposição dos líderes dos estados nacionais contemporâneos de arriscarem a vida de seus cidadãos para salvar pessoas estranhas à sua nacionalidade. Embora a reposta de Wheeler a esta pergunta seja afirmativa, desde que se trate de casos excepcionais onde ocorre uma "suprema ameaça humanitária" (Wheeler, 2000: 50), o fato é que, no início da década de 1990, especialmente durante o agravamento da crise somaliana, o governo Clinton decidiu retirar apoio às UNOSOM II, o que pôs fim a qualquer possibilidade de sucesso da operação.

Um dos maiores problemas das operações de paz do pós Guerra-Fria não reside apenas em sua maior complexidade de tarefas e na necessidade crescente de se ter que cruzar a "linha de Mogadício"16, fazendo uso da força para garantir a proteção humanitária.  A profusão de conflitos domésticos acompanhados de crises humanitárias através do globo gerou o grave problema para a ONU de ter que administrar diferentes guerras civis de maneira concomitante.  O "estresse institucional"17 experimentado pela organização ao longo da década de 1990, teve como consequência não somente problemas burocráticos e orçamentários, mas também mudanças relativas às interpretações da relevância de diferentes conflitos. Isso ficou bem claro nos casos da dissolução da ex-Iugoslávia e do genocídio em Ruanda. Muito do que foi feito e, sobretudo, do que não foi feito em relação a esses conflitos é resultante de como a ONU percebia e reinterpretava seus próprios sucessos e fracassos.

Quando a Guerra Civil na antiga Iugoslávia foi desencadeada, as Nações Unidas se encontravam em meio ao problema de ter que responder às baixas sofridas no conflito somaliano. Na esteira das declarações de independência da Eslovênia e da Croácia, veio a mais problemática emancipação da Bósnia-Hezergovina, por se tratar da mais etnicamente heterogênea das províncias da ex-Iugoslávia. As dificuldades em se obter uma solução diplomática para este conflito levou o então secretário de estado norte-americano, Cyrus Vence, a recomendar ao CS a criação de uma missão de paz para gerenciar o conflito (Baher e Gordenker, 1994: 85). Foi criada, assim, a United Nations Protection Force (UNPROFOR) que recebeu inicialmente autorização do CS, conforme os princípios do capítulo VII, para assegurar o plano diplomático de redesenho das novas fronteiras das antigas províncias iugoslavas (MacInnis, 2003: 148).

A Guerra da Bósnia-Herzegovina durou de 1992 até os acordos de Dayton de 1995, que pôs fim ao conflito, redesenhando de maneira controversa o mapa da região. A principal tarefa da UNPROFOR, que representou um grande passo no sentido da securitização dos direitos humanos, algo observado nas diversas resoluções do CS sobre a crise18, foi a de prover suporte militar e logístico à operação de auxílio humanitário liderada pelo United Nations High Commissioner in Refugees (UNCHR). Houve também uma escalada nos bombardeios promovidos pela OTAN, com autorização da ONU, para reprimir abusos humanitários promovidos pelo governo sérvio aos bósnios, especialmente após as descoberta do massacre ocorrido em Srebrenica, onde 7.000 corpos de adultos e crianças foram encontrados com indícios de maus-tratos e promoção de limpeza étnica.

O genocídio de Ruanda iniciado em abril de 1994 e que resultou na morte de aproximadamente 800.000 pessoas, sem contar os refugiados, ocorreu neste contexto em que a ONU tinha que lidar com múltiplos conflitos civis e a atenção de seus principais membros encontrava-se desviada, ou pelos traumas vivenciados na Somália, ou pelos problemas ocorridos nas franjas das regiões das principais potências ocidentais, como a Bósnia-Herzegovina, no caso da Europa, e o Haiti, no caso dos EUA. A intervenção tardia em Ruanda, na prática um caso de não-intervenção, deve ser entendida neste cenário problemático e oferece indicadores interessantes para as intervenções humanitárias sobre "quando" e "onde" os Estados pretendem intervir através da ONU.

As expectativas dos estados e das Nações Unidas quanto às normas de direitos humanos e sua tensa relação com a soberania westfaliana oscilavam. Em 1992, o então secretário-geral da ONU, Boutros-Ghali, publicou relatório em que se constatava o nascer de uma época onde a soberania absoluta havia chegado ao fim19. Apesar de sua interpretação revolucionária dos eventos iniciais da década de 1990 e da relativa disposição dos estados para intervir em casos de grave crise humanitária, fato é que este cosmopolitismo não seria duradouro. Os sérios problemas burocráticos e logísticos que a ONU enfrentara em intervenções humanitárias na primeira metade dos anos 1990, somados aos altos custos políticos dessas intervenções, fariam com que as diretrizes das Nações Unidas para conter violações aos direitos humanos fossem revistas com um pouco mais de parcimônia, relativamente ao pensamento de Boutros-Ghali. Quase uma década mais tarde, o chamado Relatório Brahimi20 já não seria tão favorável a se prescindir do consentimento das partes na atuação de uma missão de paz, o que limitaria a dimensão intervencionista das operações humanitárias21. A memória da inação em Ruanda, porém, não permitiria que genocídios posteriores passassem desapercebidos pelas Nações Unidas.

Os problemas da ex-Iugoslávia não foram completamente solucionados pelos Acordos de Dayton. Quando eles ressurgiram, porém, na crise em que albaneses do Kosovo foram alvos de uma limpeza étnica nesta então província sérvia, a ONU também enfrentava o problema da reconstrução do estado do Timor Leste, em processo de emancipação da Indonésia. Emergia novamente o principal problema das operações de paz de terceira geração, presente por quase toda década de 1990. Enquanto os quinze membros do CS engajavam-se numa disputa sobre uma interpretação "restricionista" ou "ante-restritivista"22 do art. 39 da carta, no que se que se refere à crise do Kosovo de 1999, a organização tinha que lidar com uma das mais complexas operações multidimensionais de sua história. Após a realização de um referendum sobre a emancipação do Timor Leste da Indonésia, eclodiu uma onda de violências e massacres sem precedentes que devastou a sociedade timorense, sendo necessária sua reconstrução com o auxílio da ONU. A United Nations Mission in East Tiomor (UNAMET) foi responsável por esta tarefa, que envolveu até mesmo a criação de um governo provisório dirigido pela ONU. No bojo desta missão, a ONU também utilizou a força, ainda que tardiamente, para impedir as violações aos direitos humanos. Neste caso, porém, não se fala propriamente em intervenção humanitária, pois a operação tinha recebido uma espécie de "consentimento induzido" das autoridades locais (Welsh, 2004: 152). O conflito pós-referendum no Timor Leste ocorreu num momento em que as atenções das principais potências encontravam-se divididas com as repercussões do recente bombardeio no Kosovo, o que mitigou as possibilidades de uma intervenção mais incisiva por parte da ONU, ao mesmo tempo em que levantou novamente o problema de tratamentos diferenciados para problemas similares (Welsh, 2004: 170).

Em relação a este conflito na então província sérvia, os membros permanentes do CS não conseguiam esconder suas diferenças quanto ao problema da intervenção humanitária. Rússia e China não se demonstravam favoráveis às tentativas de se consolidar esta prática, ainda que de maneira consuetudinária, no Conselho. O resultado desta cisão foi que a nem o CS aprovou uma medida de segurança para o Kosovo, nem as principais potências do "Ocidente" declinaram de suas intenções de conter o massacre étnico promovido pelo governo de Slobodan Milosevic. A OTAN promoveu os bombardeios às forças sérvias sem a autorização do CS. Forças da ONU foram enviadas para região somente após o término do conflito, não ocorrendo intervenção humanitária com aquiescência das Nações Unidas.

As divergências entre os principais estados da ONU quanto os dilemas da intervenção humanitária e a regra da não-intervenção baseavam-se em duas concepções diferentes de soberania. A primeira e mais clássica de todas elas, que se encontra dentro do paradigma westfaliano, é a chamada "soberania como autoridade".  Significa que a os estados não reconhecem autoridade política acima de seus governos, não havendo bases para intervenções externas, por razões humanitárias ou não. A segunda, dentro de um paradigma pós-westfaliano, representa uma inovação, fruto dos debates nas Nações Unidas sobre a relação tensa entre direitos humanos e soberania. Ela é chamada de "soberania como responsabilidade"23 e estabelece que os estados são responsáveis pelo bem-estar de seus nacionais, sendo esta a base que legitima a soberania. Caso os mesmos não respeitem os direitos de seus povos, os demais estados do sistema internacional teriam a reponsabilidade de proteger os indivíduos vitimados por violências domésticas. Desta concepção de soberania como responsabilidade surgiu na ONU a doutrina da "responsabilidade de proteger", que determina o dever dos estados membros da organização de respeitar os direitos humanos mais básicos de seus cidadãos, ao mesmo tempo em as demais nações teriam o direito de intervir na esfera interna dos estados que não respeitassem estes direitos (Welsh, 2004). Esta nova concepção de soberania é resultante de uma demanda nas Nações Unidas no sentido de estabelecer critérios mais objetivos para a prática da intervenção humanitária. A Comissão Internacional sobre Intervenção e Soberania do Estado24 publicou um relatório ao final de 2001, conhecido como "resposibility to protect" que, após uma década de conturbadas intervenções humanitárias da ONU, tentava consolidar um critério mínio de intervenção baseado no princípio da responsabilidade de proteger (Welsh, 2004: 37).

Quando a Comissão Internacional havia chegado a um relatório final que pudesse resolver os dilemas da intervenção, o cenário internacional sofreu enorme mudança, com a reação norte-americana aos atentados terroristas às Torres Gêmeas de Nova York e ao Pentágono, em Washington, no dia 11 de setembro de 2001. As prioridades da maior potência remanescente da Guerra Fria se voltaram para a chamada Guerra ao Terror, baseada na repressão de potenciais grupos terroristas e na prevenção do surgimento de novos atentados. Logo após os atentados de 11 de setembro, o CS aprovou a Res 1368, de 12 de setembro de 2001, condenando de forma unânime as ações da Al-Qaeda e autorizando a utilização de todos os meios necessários para responder àqueles ataques terroristas (Welsh, 2004: 164). Os EUA, então com o aval da ONU, obtiveram êxito na derrubada do regime do Talibã, mas à medida que eles não foram igualmente bem sucedidos na captura de Osama Bin Laden, considerado pelos norte-americanos como mentor dos atentados, sua retórica passou a se inclinar para a tarefa de reconstruir o estado afegão posteriormente ao conflito, sob a lógica da proteção humanitária da população afegã (Ibid).

O discurso inicial da busca aos grupos terroristas teve certa legitimidade no contexto da estratégia de impedir que o território de alguns estados falidos fosse usado como base para treinamento de grupos terroristas, ao mesmo tempo em que a retórica wilsoniana da expansão da democracia, com seus direitos civis e políticos, serviu para perpetuar a permanência dos EUA no Afeganistão. Isso demostra, de certa forma, o peso que as normas humanitárias adquiriam no pós-Guerra Fria, uma vez que até mesmo uma grande potência considerou oportuno justificar uma intervenção convencional sob o signo do discurso humanitarista, o que Simon Chesterman denominou de "guerra humanitária ao terror" (Welsh, 2004: 168).

 

A Intervenção Humanitária como Guerra Justa e o Debate entre Pluralistas e Solidaristas

A tradição da Guerra Justa consiste num corpo de ideias desenvolvido por um conjunto de juristas e filósofos que defendem a normatividade jurídica e moral da guerra como atividade humana. Seu principal pensador contemporâneo, de orientação pluralista, é cientista político Michael Walzer. Este autor destaca que existem duas dimensões da guerra justa: o jus ad bellum e o jus in belo. O primeiro se refere ao "direito da guerra" e o segundo ao "direito na guerra". Este regulamenta as condições em que os agentes do estado travam as guerras entre si, as regras de como se fazer a guerra, enquanto que aquele normatiza as circunstâncias em que os estados podem ou não guerrear (Walzer, 2003). Os requisitos gerais da guerra justa são considerados os seguintes: primeiro, deve haver uma causa justa para a guerra; segundo, a força somente deve ser usada como último recurso25; terceiro, quando a força for utilizada, deve ser de forma proporcional; e, por último, deve haver grande probabilidade de que o uso da força tenha um resultado positivo (Wheeler, 2000: 34).

 Após a proliferação das intervenções humanitárias no pós-Guerra Fria, uma das questões que mais ganhou relevo foi a de se considerar a intervenção humanitária como causa justa para guerra. Para aqueles de interpretação ante-restricionista e que enxergam a possibilidade de securitização das crises humanitárias, as violações aos direitos humanos são certamente um motivo justo para se guerrear, desde que observados os demais princípios da tradição. Aqueles que adotam uma visão mais restricionista quanto ao uso da força, porém, não consideram problemas humanitários de origem doméstica como uma causa justa para a guerra. Isso porque haveria um alto preço a se pagar com a flexibilização do princípio da soberania e da regra da não-intervenção.

Nicholas Wheeler, em Saving Strangers, enfatiza a importância do conflito existente no debate sobre intervenções humanitárias entre justiça e ordem. Caso as intervenções humanitárias sejam consideradas causa justa para a guerra, a ordem do sistema internacional pode ser ameaçada. Caso não sejam, graves injustiças poderão se perpetuar. É um dilema bastante sério. Michael Walzer, porém, sugere uma proposta interessante na tentativa de solucioná-lo. Walzer adota uma visão bem próxima do pluralismo (comunitarismo), considerando que os valores morais e jurídicos de uma dada comunidade política possuem primazia sobre valores supostamente universais, estes enfatizados pelos solidaristas. Ele, no entanto, considera, como Nicholas Wheeler, que em casos de "suprema emergência humanitária" os governantes devem aceitar o sacrifício de vidas de seus nacionais para a proteção de estrangeiros (Wheeler, 2000: 30). Nicholas Wheeler se considera um solidarista por adotar esta visão, mas creio que os termos do debate nem sempre são postos de maneira tão clara.

O solidarismo caracteriza-se por uma abordagem que confere predominância dos valores universais sobre os particulares. O fato de um autor concordar com a possibilidade de intervenção humanitária em casos absolutamente excepcionais, como fazem Walzer e Wheeler não os torna, porém, solidaristas. Parece-me que o mais oportuno é perceber o debate entre pluralistas e solidaristas não como dividido em duas categorias dicotômicas e estanques, mas sim como uma espécie de espectro, no qual determinadas abordagens podem transitar entre os dois pólos extremos. Pode-se perceber, neste sentido, os posicionamentos de Walzer e Wheeler como um "solidarismo brando", o que os aproxima do pluralismo, pois eles admitem a intervenção humanitária para salvar estrangeiros apenas em casos absolutamente excepcionais. O caso da intervenção no Haiti, realizada para recolocar no poder um governo democraticamente eleito, torna-se, assim, problemático. Não apenas o conceito de democracia é incerto, mas também considerar violações a direitos políticos, não humanitários, como causa justa para a guerra é algo demasiado controverso (Hoffmann, 1996: 30). À medida que se alarga o escopo dos direitos humanos que podem ser considerados como justa causa para guerra, o princípio da não-intervenção passa a ser comprometido, nem sempre de forma justificável. Haverá sempre uma balança delicada, com um tênue equilíbrio entre ordem e justiça.

Outro ponto importante nas intervenções humanitárias do pós-Guerra Fria refere-se relação de identidade entre as nações interventoras e as populações vitimadas por crises humanitárias. A disposição dos governantes em "salvar estranhos" é extremamente variada, dependendo dos vínculos históricos e sociais entre protetores e protegidos. Martha Finnemore argumenta que a grande inovação das intervenções humanitárias da década de 1990 não está no fato de que soberanos se valem da força para proteger indivíduos, em lugar de territórios. A diferença é que, na atualidade, a concepção de quem são os indivíduos que merecem ser protegidos alargou-se consideravelmente. No século XIX, os europeus promoviam intervenções para salvar cristãos em terras não ocidentais, enquanto que no final do século XX constatou-se a disposição de zelar pela proteção de indivíduos não apenas fora de sua jurisdição, mas também pertencentes a uma outra identidade (Finnemore, 2003).

O que se observa nas intervenções do final da Guerra Fria é que, embora os estados estejam dispostos a sacrificar em alguma medida a vida de seus soldados para proteger cidadãos estrangeiros, o fato é que a ligação com determinados grupos pode variar significativamente. A Comunidade Europeia percebia as duas guerras balcânicas como algo extremamente próximo, não apenas de seus interesses geográficos, mas também de sua história. O Haiti encontra-se tradicionalmente na esfera de influência norte-americana, mas também é menos provável que crises humanitárias ocorridas numa região tão próxima ao território dos EUA passe despercebida pelo governo americano. Finnemore considera que esta maior ou menor "empatia" entre comunidades políticas pode ser de natureza geográfica ou funcional, esta sendo uma afinidade por razões puramente históricas (Finnemore, 2003: 155). Na intervenção do Haiti, teve importância a afinidade geográfica entre os EUA e Haiti, assim como nos casos da Península Balcânica com a "Europa". Afinidades geográficas e funcionais podem ser indicadores importantes para compreender o porquê de o CS não ter promovido intervenção para impedir genocídio, mesmo havendo a securitização dos diretos humanos e a consideração de graves crises humanitárias como causa justa para a guerra, no período posterior à Guerra Fria.

 

Conclusão

As operações de paz são uma prática de resolução de conflitos extremamente dinâmica, visto que elas não se encontram positivadas na carta da ONU, mas são resultado de ajustes e adaptações no sistema de segurança coletiva durante a Guerra Fria. As Nações Unidas reinventaram esta prática à medida que casos particulares geravam novas demandas para soluções controvérsias. As mudanças estruturais observadas com o fim da bipolaridade geopolítica, entretanto, ensejaram as mais significativas mudanças nas missões de paz da ONU. Quando elas ocorreram ao final da década de 1990, as mudanças normativas referentes a quatro décadas de consolidação dos direitos humanos não deixariam de exercer suas influências.

O vínculo que se estabeleceu entre operações de paz, segurança internacional e intervenção humanitária é resultante dessas transformações. As guerras civis que ocorreram em grande medida como consequência do desmonte das esferas de influência da Guerra Fria, geraram uma demanda para operações de paz mais complexas e estas, por sua vez, forneceram o suporte sobre o qual as intervenções humanitárias se realizaram. A combinação entre descongelamento do CS da ONU, junto com a inclusão de práticas genocidas na terminologia do art. 39 da carta num processo de securitização dos diretos humanos, fez com que os estados muitas vezes considerassem violências às populações domésticas como uma justa causa para a guerra. Associações como esta levaram a ONU a consolidar através da década de 1990 uma concepção inovadora de operações de paz, que reconsiderasse a questão da soberania conforme tradicionalmente tratado pela sociedade internacional. É o que Bellamy e Williams chamam de um modelo pós-westfaliano de operações de paz (Bellamy e Williams, 2004).

Isso não significa, contudo, que sempre que ocorrerem estas violações, haverá intervenções de natureza humanitária. Como o caso da negligência quanto ao genocídio em Ruanda parece demonstrar, a concomitância de diferentes crises humanitárias, combinada com a memória recente de traumas vivenciados em operações anteriores e a ausência de forte empatia geográfica entre interventores e vítimas, pode fazer com que os custos políticos de uma intervenção humanitária aumente a ponto de ela não ser realizada, mesmo que este tipo de intervenção já seja reconhecido como causa justa para guerra. Embora os estados tenham aumentado sua disposição para arriscar a vida de seus soldados para salvar estranhos, parece-me que, por razões históricas e sociais, alguns grupos serão sempre mais estranhos do que outros.

 

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1. Esses dois temos são provenientes do inglês peace missions e peace operations, respectivamente. São o mais genéricos de todos os demais, englobando as outras categorias.
2. Do inglês preventive diplomacy.
3. Do inglês peacekeeping.
4. Do inglês peacemaking.
5. Do inglês peace enforcement.
6. Do inglês peacebuilding.
7. As intervenções humanitárias deste período , em geral, foram realizadas mediante operações de paz da ONU previamente estabelecidas no conflito. Esta é uma importante mudança com relação ao período da Guerra Fria. Kosovo foi uma exceção, visto que esta intervenção não foi aprovada pela ONU e esta organização somente veio a estabelecer uma missão de paz para a província após o término dos bombardeios da OTAN.
8. Este período é chamado de "primeira geração" das operações de paz, segundo Mingst e Karns (2000).
9. Mingst e Karns denominam este período do ressurgimento das operações de paz ao final da década de 1980 de "segunda geração" das operações de paz da ONU (MIgst e Karns, 2000). Weiss e Forthy se referem a essa etapa como "período de transição", por se tratar de um momento intermediário entre as missões clássicas e as operações já consolidadas com a lógica do pós-Guerra Fria (Weiss, Forsythe e Coate, 2001).
10. João Pontes ressalta que uma das características marcantes dos conflitos do pós-Guerra Fria foi a ausência de guerras hegemônicas com a proliferação de conflitos interestatais (Nogueira, 1999: 143).
11. Ver carta das Nações Unidas.
12. Segundo Nicholas Wheeler, embora a Res 688 tenha considerado a crise humanitária do Iraque como uma ameaça à paz e à segurança internacional, ela não foi adotada sob a égide do capítulo VII da carta da ONU (Wheeler, 2005: 33).
13. O CS já havia feito esta vinculação durante a Guerra Fria no caso dos regimes racistas da Rodésia e da África do Sul (Wheeler, 2005: 34). Na oportunidade, foram adotadas mediadas sob o capítulo VII da carta, mas que incluíram apenas sanções diplomáticas e econômicas. Elas não criaram, porém, zonas de proteção humanitária como no caso do norte do Iraque.
14. Do inglês "speech act".
15. Este período é a chamado de "Terceira Geração" das operações de paz da ONU, conforme a classificação de Mingst e Karns seguida neste trabalho.
16. Expressão que ficou conhecida na literatura de operações de paz e que se refere a um ponto em que passa a ser necessário fazer uso da força, o que leva uma missão de paz a deixar ter uma atuação segundo os princípio da imparcialidade e do uso da força somente para auto-defesa, deixando de ser uma peace mission para ser uma peace enforcement (Weiss, Forsythe e Coate, 2000).
17. Ver Weiss, Forsythe e Coate, United Nations and Changing World Politics. 2000, p. 71.
18. Ver, por exemplo, S/Res/816 (1993), S/Res/819 (1993) e S/Res/836 (1993).
19. Ver An Agenda For Peace: Preventive Diplomacy, Peacemaking and Peacekeeping, parágrafo 17.
20. Ver (A/55/305-S/2000/809).
21. Nicholas Morris é quem sugere esta distinção entre "intervenção humanitária" e "operação humanitária", porque esta não se valeria do uso da força (Welsh, 2004: 98).
22. Do inglês restrictionists e counter-restritionista. Refere-se a duas posições dentro do direito internacional relativas às intervenções humanitárias.  A primeira é contrária à ideia de que a intervenção humanitária sobrepõe-se ao princípio da não-intervenção; já a segunda defende que este princípio pode ser sacrificado em casos de graves ofensas aos direitos humanos (Wheeler, 2000: 41-2).
23. Kai Michel Kenkel ressalta que a concepção de "soberania como responsabilidade" não representa uma negação à autoridade do estado, mas sim uma adaptação deste conceito de modo que os governos não fiquem totalmente isentos de responsabilidade quanto ao bem-estar de seus cidadãos (Kenkel, 2005:13).
24. International Commission on Intervention and State Sovereignty.
25. Não é difícil observar a semelhança entre estes dois primeiros requisitos e os capítulos VI e VII da carta da ONU.