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3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

Temas socioambientais, cooperação internacional e sustentabilidade: as perspectivas das relações entre território-poder no século XXI

 

 

Me. Tatiana de Souza Leite Garcia

Docente e coordenadora da graduação em Relações Internacionais e Comércio Exterior da Universidade de Ribeirão Preto - UNAERP, Pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Relações Internacionais - NEPRI / UNAERP. E-mail: tatianaslgarcia@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

As evidências da crise socioambiental contemporânea, as convenções internacionais e o aumento da percepção para a revisão dos modelos de desenvolvimento político-econômico-territorial e dos padrões de produção e consumo têm pressionado os atores internacionais a repensarem suas políticas e ações, de modo que busquem minimizar as desigualdades socioeconômicas e os impactos ambientais. Considerando-se a interdependência dos atores no sistema internacional na busca de maximização das soluções para estas questões, e que a disponibilidade de recursos ambientais e gestão do território são fontes de poder, as diretrizes da sustentabilidade são um dos novos paradigmas do século XXI. Além disso, com o fim da disputa política/territorial das ideologias capitalistas versus socialistas, abre-se um novo campo para as relações de espaço-poder e outro mecanismo de controle no desenvolvimento de certas regiões no mundo. Diante deste contexto, o objetivo deste trabalho é analisar as motivações dos atores internacionais para a tomada de decisões diante dos temas socioambientais globais, considerando a dinâmica das relações de poder no sistema internacional, o discurso e prática da cooperação internacional e a perspectiva da sustentabilidade no século XXI.

Palavras-chave: crise socioambiental, desenvolvimento sustentável, cooperação internacional


 

 

Introdução

Dentre os vários desafios que a humanidade enfrentará ao longo do século XXI, as crises socioambientais são as mais urgentes a serem minimizadas ou solucionadas, considerando que o bem-estar social e a disponibilidade de recursos ambientais são bases para o desenvolvimento de qualquer país.

Pode-se citar como crises ambientais mais latentes a disponibilidade de água potável, as mudanças climáticas, geração de resíduos, degradação da biodiversidade, dentre outras. E como crises sociais a desigual produção e distribuição de alimentos, não acesso equitativo à saúde, educação e moradia, falta de emprego e renda, dentre outras.

Poderiam ser mencionadas outras questões por estarem diretamente relacionadas, mas o que se pretende apontar é a interdependências das questões ambientais e humanas, pois não seria possível a existência da política e da economia sem os recursos naturais e as pessoas.

Neste sentido, os problemas ditos ambientais refletem diretamente questões de âmbitos sociais, políticos e econômicos. Yves Lacoste (1997) aponta que estas crises refletem a relação de dominação e exploração dos países desenvolvidos sobre os países em desenvolvimento e, acabam por gerar problemas socioambientais.

Essa crise dialética se acelera, não somente no tempo, como também no espaço. Ela não se manifesta uniformemente na superfície do globo mas, bem ao contrário, ela aí toma formas cada vez mais diferenciadas, embora cada vez mais ligadas umas às outras.[...] Mas essa diferenciação, que está ligada aos efeitos contraditórios de fenômenos relacionais cada vez mais rápidos e estreitamente ligados, se manifesta não somente em nível planetário, mas no bojo do Terceiro Mundo, como no bojo do grupo de países mais industrializados e também no quadro de cada Estado, como no quadro das diversas "regiões", que é útil distinguir para cada um deles.[...] Ela se manifesta também no plano de cada um dos diferentes grandes tipos de contradições que parece útil distinguir (por exemplo, as contradições demográficas, as contradições ecológicas, as contradições políticas...). Sua propagação, suas interações, não se efetuam somente sobre formas de organizações econômicas e sociais já bastante diferenciadas, mas também num espaço onde a diversidade das condições naturais, ecológicas, é ainda mais complexa, em razão das transformações provocadas pelos métodos de exploração que ali foram praticados. (LACOSTE, 1997, p. 169)

A constante expansão e intensificação de padrões produtivos com significativo impacto ambiental e de exploração do trabalho humano, não são compatíveis com o tempo de resiliência da natureza e nem capazes de atender as demandas sociais mundiais. Rodrigues (1998) afirma que o ritmo de produção/exploração nas últimas décadas evidencia a crise paradigmática da ciência moderna, especialmente na questão ambiental, pois estão destruindo a base territorial da vida.

O fato é que a suposta racionalidade dos sistemas político-econômicos vigentes e o alto nível científico-tecnológico, não são suficientes para resolver os problemas gerados pelos padrões de produção e consumo da sociedade contemporânea, e mesmo aqueles que são reflexos da dinâmica do Sistema Terra.

Além disso, os diferentes níveis de desenvolvimento social dos países e as diferenças nas condições de sobrevivência dos grupos humanos refletem a irracional degradação dos recursos ambientais do planeta, e a exploração/alienação da condição humana da maioria da população mundial; sendo que estes processos são conduzidos por uma minoria de indivíduos e países.

A crise socioambiental local/global é uma desconexão da compreensão humana da Terra com o Mundo. O Mundo pode ser entendido como um conjunto de valores ideológicos, políticos, econômicos, sociais, culturais e históricos construídos pela humanidade. A Terra é o conjunto de elementos físicos abióticos e bióticos presentes neste planeta, que se interagem a milhares de anos formando as dinâmicas naturais terrestres, que independem da existência humana.

Os fenômenos naturais extremos provocando catástrofes, as externalidades ambientais negativas, a escassez de recursos básicos para a sobrevivência humana, aumento das poluições, das desigualdades socioeconômicas entre as populações, a alienação do humano ao trabalho e ao consumo, a busca por um estilo de vida materialista, são situações que demonstram a insustentabilidade dos modelos de desenvolvimento da sociedade contemporânea

Historicamente foi a partir da Revolução Industrial que os padrões de produção e consumo basearam-se na ilimitada exploração dos recursos naturais e do trabalho e, além disso, instigou-se o consumismo, o individualismo e a competitividade.

Neste sentido, evidencia-se que os sistemas político-econômicos modernos - capitalismo e socialismo - foram estruturados sobre a mesma base técnico-científica e pela suposição economicista de que seriam capazes de gerar conhecimentos, técnicas e tecnologias capazes de compensar os impactos negativos causados pelos processos produtivos na natureza e na condição humana.

Quando se analisa os ciclos evolutivos da humanidade, o século XX apresenta os grandes saltos na quantidade e na velocidade da produção de mercadorias e tecnologias, refletindo diretamente na alta destruição dos ecossistemas e ampliando o abismo socioeconômico entre os indivíduos. A constante expansão e intensificação do padrão produtivo depreciador da natureza e do humano demonstra que estes sistemas não são capazes de se auto-regular e propor soluções sustentáveis.

O que torna evidente a crise paradigmática da ciência moderna é a questão ambiental. É a compreensão de que estamos destruindo, de modo irreversível, a natureza e a sociedade, pois parece que esta sociedade, para se construir, destrói a base territorial necessária para a vida, a natureza transformada. (RODRIGUES, 1998, p. 84)

A sociedade contemporânea apresenta-se como a sociedade do descartável, onde se produzem cada vez mais mercadorias que duram menos, dado que a necessidade de sustentar estes sistemas são regidos pela reprodução de modelos de produção e consumo com alta entropia no ambiente. Considerando que estas crises atingem desde pequenas localidades e perpassam fronteiras até o espaço global, pode-se apontar que.

[...] é uma crise dialética global, de dimensões planetárias, que começou a se esboçar com a revolução industrial na Europa e se ampliou na medida do desenvolvimento do sistema capitalista; ela não deixou de afetar, por contragolpe, os países socialistas que, de acréscimo, conhecem suas contradições específicas. (LACOSTE, 1997, p. 168)

Nos países em desenvolvimento a situação da degradação ambiental e humana são mais graves, pois devido aos históricos processos colonizatórios e a dependência junto ao mercado externo, no que se refere a capacidade de produção de tecnologias e desigualdade na pauta de exportação/importação, refletem as diferenças nos indicadores socioeconômicos e as possibilidades de reverter a curto e médio prazo os impactos ambientais.

O fato é que significativa parcela das populações dos países em desenvolvimento vivem em condições precárias, com baixos salários, legislações trabalhistas frouxas, insalubridade, informalidade, além das diferenças na disponibilidade de infra-estrutura e de recursos básicos para uma condição de vida digna - educação, saúde, moradia, alimentos, vestuário, segurança e lazer.

É uma dinâmica presente intra e entre países que sustenta-se na divisão social e espacial dos indivíduos e no uso irracional dos recursos ambientais. Esta 'marginalização' é econômica, tecnológica, cultural e social.

Relatórios produzidos pela Organização das Nações Unidas, Organizações Internacionais especializadas nestas temáticas e Organizações Não-Governamentais apontam que mais de 2 bilhões de humanos vivem abaixo da linha da pobreza, ou seja, não têm 1 dólar/dia para custear os requisitos míninos necessários para sua sobrevivência.

Além disso, vale mencionar que uma minoria de países e pessoas que detém os capitais produtivos, financeiros e territorial utilizam-se da ideologia do consumo, por meio da indústria cultural e a capacidade de difusão dos meios de comunicação, para reproduzirem o sistema e manter seu status quo.

O reconhecimento histórico do fracasso dos modelos de desenvolvimento, bem como a impossibilidade econômica e ecológica dos países em desenvolvimento de trilharem os mesmos caminhos dos países desenvolvidos, altamente industrializados, abala a credibilidade das políticas neoliberais, reabrindo a discussão do papel dos Estados, das empresas e da sociedade civil.

Apesar do nível tecnológico alcançado nos dias atuais e a possibilidade de integração do mundo graças ao processo de globalização, é claro que as vantagens destes sistemas não são disponibilizadas a todos, porém as externalidades negativas, como poluições e escassez de recursos, são socializadas afetando a todos, mesmo àqueles que estão à margem destes sistemas.

Neste contexto, a pauta das relações internacionais passa a abrigar assuntos classificados como de segunda geração, como as questões ambientais e os direitos humanos.

A partir dos anos de 1970 as questões ambientais ganham destaque nas Conferências e Acordos Internacionais no âmbito da ONU, questionando os modelos de desenvolvimento dos países e seus reflexos diretos na condição humana e na degradação ambiental. Para tanto, a cooperação internacional entre países, empresas e indivíduos é aclamada como importante mecanismo de desenvolvimento, por meio da transferência de recursos e investimentos, bem como a troca de experiência para a conservação ambiental e a diminuição da miséria pelo mundo.

Todavia, deve-se considerar que o sistema internacional está sujeito a balança de poder que é resultante dos diferentes interesses e ações dos atores que o compõem; em especial, relacionados as questões que envolvem a disponibilidade e conservação dos recursos ambientais.

Considerando que a definição dos territórios e das fronteiras são fundamentais para a sobrevivência dos Estados, além de que as sociedades dependem dos recursos naturais para suas sobrevivências, é conclusivo que o controle e a gestão dos territórios e dos recursos naturais são fontes de poder, que podem levar a conflitos.

Além disso, com o fim da disputa política/territorial das ideologias capitalistas versus socialistas, abre-se um novo campo para as relações de espaço-poder e outro mecanismo de controle sobre o desenvolvimento de certas regiões no mundo, conforme Becker (1995b, p. 293) aponta:

[...] a apropriação de territórios e ambientes como reserva de valor, isto é, seu uso produtivo imediato, é uma forma de controlar o capital para o futuro, sobretudo o controle de biodiversidade, na medida em que é a fonte de conhecimento dos seres vivos, o que vale dizer, fonte de poder.

A inter-relação entre degradação ambiental e exclusão social demonstra a necessidade de reavaliar os padrões de produção e consumo e as relações de poder no sistema internacional; exigindo assim, uma reinterpretação da relação homem/natureza e da relação homem/homem, que atualmente são direcionadas para a exploração e não a integração/cooperação. Neste contexto, a proposta do desenvolvimento sustentável é colocada como possibilidade de desenvolvimento dos países aliando a viabilidade econômica, conservação ambiental e justiça social e, para tal, a cooperação internacional é imprescindível.

A sociedade internacional começou a perceber a crise socioambiental a partir da década de 1970 e os acordos internacionais relacionados às questões ambientais evoluíram ao longo das últimas décadas, ampliando os temas a serem discutidos.

Em 1972, dentre os vários acontecimentos, como a crise do petróleo, o Clube de Roma tornou público o relatório "The Limits of Growth" ou "Os Limites do Crescimento", preparado pelo MIT (Massachussetts Institute of Technology) e a ONU realizou a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano (CNUMAH).

Nos anos de 1980, a International Union of Concerned Scientists (IUCS) lançou um documento chamado World Conservation Strategy: Living Resource Conservation for Sustainable Development, que criticava a sistematização da relação entre crescimento econômico insustentável e a exploração irracional dos recursos naturais e propunha um desenvolvimento sustentável. Em seguida, a ONU publicou o relatório da Comissão Brundtland, intitulado Our Common Future - Nosso Futuro Comum, que reforçou e politizou o termo desenvolvimento sustentável, definido como aquele que "[...] atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras também atenderem às suas" [...]; é um "processo de mudança no qual a exploração dos recursos, a orientação dos investimentos, os rumos do desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional estão de acordo com as necessidades atuais e futuras" [...] é uma "correção, uma retomada do crescimento, alterando a qualidade do desenvolvimento", a fim de torná-lo "menos intensivo de matéria-prima e mais eqüitativo em seu impacto" (CMMAD, 1988, p. 9-56).

Expectativas foram colocadas na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento - a ECO-92 ou Rio-92 - realizada em 1992, no Brasil, e contou com a participação de 179 delegações governamentais e produziu cinco documentos oficiais: a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Agenda 21, a Convenção sobre Diversidade Biológica, a Convenção Quadro sobre Mudanças Climáticas e a Declaração de Princípios sobre o Uso das Florestas. Além disso, estabeleceram-se as bases para futuras negociações da Convenção para o Combate da Desertificação e dos Efeitos da Seca, abriu caminho para a criação de uma comissão funcional do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC), a Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável (CDS).

A programação da Rio-92 esteve focada na procura de meios de cooperação entre as nações para administrar os problemas ambientais globais, como poluição, mudanças climáticas, destruição da camada de ozônio, uso e gestão dos recursos marinhos e de água doce, desmatamento, desertificação e degradação dos solos, resíduos perigosos, perda da biodiversidade.

Havia como proposta a tentativa do entendimento multidisciplinar das questões que envolvem a condição humana e ambiental, relacionando-as às várias dimensões da sustentabilidade - social, econômica, ecológica, espacial, cultural, ambiental, territorial, política (nacional e internacional) - para garantir as mínimas condições de sobrevivência para as gerações presentes e futuras. (SACHS, 1986, 1994, 2002).

Desde então, fica perceptível que estas questões refletem nos espaços locais e globais, sendo que a cooperação internacional deve ser acordada para uma nova parceria de alcance mundial efetivo; no entanto, os interesses e atuações dos governos, empresas, sociedade civil organizada e indivíduos são diferentes; por isso, cabe avaliar quais são as motivações que levam os atores internacionais a cooperarem. Sobre isto, Becker (1995b, p. 292) expõe:

Emergindo como proposta de cooperação internacional com base em nova relação sociedade-natureza, o desenvolvimento sustentável, tal como exposto no Relatório BRUNTLAND (1987), é uma feição específica da Geopolítica contemporânea. Ela é reveladora da revalorização da dimensão política do espaço e dos conflitos a ela inerentes em várias escalas geográficas.

Pode-se apontar que a proposta de desenvolvimento sustentável está além da harmonização entre economia/natureza ou da relação sociedade/natureza. É uma questão de interesse político mundial. Desenvolvimento sustentável seria a construção, por todos agentes sociais, de uma nova ética comportamental. Esta ética buscaria enraizar a consciência ecológica e humanitária, do indivíduo ao capital que, mesmo sendo antagônicos (dada às relações de dominação e exploração), são complementares, pois ambos são integrantes das sociedades contemporâneas e agentes nos processos de desenvolvimento. Conforme aponta Lafer (1994, p. 27):

[...] a noção de desenvolvimento sustentável é essencial para a compreensão do mundo em que vivemos, pois engloba não só a idéia de eficiência na produção de riquezas, mas também a noção de sustentabilidade ambiental, que, por usa vez, está intimamente relacionada com a superação da pobreza. Como tenho dito, a pobreza é, em sua essência, um estado de insustentabilidade.

A sensibilização sobre as questões sócio-ambientais têm influenciado a formação de uma nova geração de estudiosos, profissionais, cidadãos e consumidores. Porém, existem diferentes motivações que levam governos, empresas, Organizações Internacionais, ONGs e indivíduos a adotarem condutas em prol da sustentabilidade.

Como exemplo, pode-se citar que o setor privado tem adotado práticas de responsabilidade socioambiental, como a redução do uso de matérias-primas na produção e a diminuição de poluentes, visando reduzir custos e atender a demanda de consumidores e mercados por produtos ecologicamente corretos. Por isto, certificações estão sendo criadas e revistas constantemente, especificas para determinados tipos de produtos e indústrias, como os selos verdes e a comercialização de créditos de carbono, e que podem servir como vantagens no comércio internacional.

Para tanto, faz-se necessário analisar a dinâmica das relações internacionais no que se refere aos impactos locais e globais da crise socioambiental, o discurso e a prática do desenvolvimento sustentável, considerando que existem diferentes interesses e relações de poder que interferem na tomada de decisões sobre as questões sociais e ambientais e, conseqüentemente, para a adoção de um estilo de desenvolvimento que seja 'economicamente viável, ambientalmente correto e socialmente justo'.

As relações internacionais são resultantes das interações entre vários atores que participam do sistema mundial. Esta participação pode ser individual ou conjunta, direta ou indireta. O principal ator é o Estado, que têm diferentes interesses em suas políticas internas e externas. Outros atores também são importantes, como os indivíduos, as Organizações Internacionais, as empresas, a sociedade civil organizada e os outros níveis de governo e administração pública. Estes atores apresentam capacidades diferenciadas, por isto, acredita-se que a dinâmica nas relações internacionais é complexa e multifacetada.

O essencial para este campo do saber são os conflitos, arranjos institucionais - formais e informais - e negociações que emergem da gestão coletiva da crise ambiental. Ou seja, a crise é global no âmbito do problema da solução e da gestão. (BARROS-PLATIAU et al, 2004, p. 104)

Existem teorias que buscam entender os posicionamentos dos atores internacionais diante dos acontecimentos das relações internacionais. Estas teorias refletem os condicionantes do tempo e do espaço em que são produzidas, assim como as influências ideológicas, culturais, sociológicas, econômicas e políticas incutidas. Mingst (2009) aponta que as múltiplas realidades no sistema internacional não podem ser explicadas com métodos históricos, filosóficos ou quantitativos únicos; por isto, a diversidade de teorias serem reveladores de falhas e refinamentos do conhecimento.

As questões socioambientais, como disponibilidade de água e solos férteis, produção e consumo de energia, aumento da quantidade e diversidade de poluições, condições de moradia, saúde e alimentação das populações, são temas inter-relacionados e complementares que demonstram a interdependência entre os atores internacionais na geração dos problemas e na proposta e conduções de soluções viáveis e eficazes.

Existem conflitos de interesses diante destas e outras questões, tanto de interesses individuais e coletivos, como locais, regionais, nacionais e internacionais. Neste sentido, existem perspectivas teóricas que tentam propor reflexões sobre a gestão dos bens coletivos e da sustentabilidade.

De acordo com Barros-Platiau et al (2004) as abordagens organizacionais, regimes internacionais e governança global são as  abordagens mais comuns para analisar os problemas relacionados à gestão coletiva do meio ambiente

No entanto, muitas variáveis devem ser levadas em consideração quando se tratam de questões socioambientais, como as situações políticas e econômicas locais, nacionais e internacional que estejam acontecendo em cada época (tempo) e localidade (espaço).

Outro elemento muito importante na tomada de decisões para estas temáticas são a educação e cultura de cada sociedade, pois os valores e conceitos variam de acordo com estes elementos que compõem a base sociológica/antropológica e, consequentemente, dos comportamentos individuais e coletivos, das políticas públicas e legislações.

O quadro no qual se toma uma decisão influencia a natureza da decisão. Este quadro pode privilegiar certas variáveis mais que outras, conforme a natureza do sistema político nacional, a distribuição de poder entre os atores participantes, a natureza dos últimos, a concepção que dos dirigentes nacionais e internacionais têm de seus papéis e a natureza das questões ambientais, que suscitam diferentes jogos políticos. (LE PRESTE, 2000, p. 80)

Muitos são os conceitos e abordagens para tentar responder a crise socioambiental, mas para efeito deste trabalho, pretende-se destacar a fragilidade política e institucional dos Estados para tais questões, pois além de não conseguirem administrar todas as áreas para a promoção do bem-estar de sua população, também não priorizam os temas ambientais em suas agendas de política doméstica e externa. Também é fortemente presente o paradoxo entre o aumento do discurso em prol da sustentabilidade e o fracasso na sua implementação por meio de políticas, projetos estruturais e ações individuais/coletivas. É por isto que o setor privado, as ONGs, Instituições supranacionais e indivíduos tornam-se importantes para a promoção do desenvolvimento sustentável e da governança ambiental global.

No entanto, para cada tema/problema, em cada tempo, localidade e sociedade dependerão das formas de relação entre os atores, as variáveis econômicas, sociais/culturais, políticas e tecnologias presentes em cada contexto e que influenciarão na tomada de decisões e atitudes. Por isto, não há como definir uma fórmula e sim, propor idéias, instigar reflexões e comportamentos, buscar soluções sustentáveis que promovam qualidade de vida para as gerações atuais e futuras, com a conservação saudável, segurança e gestão dos recursos ambientais. Talvez este seja um dos paradigmas do século XXI.

 

Referências

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