3, v.3Asymmetrical conflict and the state: the neoterrorismo and new paradigms for the formulation of national defense policyParadiplomacia, desenvolvimento e integração regional de cidades amazônicas: desafios e especificidades do estado do Pará author indexsubject indexsearch form
Home Pagealphabetic event listing  




Print ISBN 2236-7381

3° Encontro Nacional ABRI 2011 2011

 

Aliança bolivariana para os povos de nossa América (ALBA): as particularidades de um projeto inovador*

 

 

William Daldegan de Freitas

Aluno do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e bolsista da CAPES

 

 


RESUMO

A história de desenvolvimento de economias periféricas, dentre essas a América Latina, enquadra desde uma tentativa de adequação das demandas internas e a conseqüente inserção subordinada à economia mundial até a conjuntura de subdesenvolvimento destes atores e a inevitável dependência com relação ao centro. Inúmeras alternativas foram postas para que tal quadro fosse superado, entretanto devido à instabilidade do sistema internacional e a difícil adequação de interesses, observa-se êxitos e fracassos. Este trabalho busca analisar uma dessas alternativas para o desenvolvimento do subcontinente, a saber, a ALBA (Alternativa Bolivariana para os Povos da América). Proposta por Venezuela, Cuba e Bolívia, este acordo vai na contramão das proposições do Consenso de Washington e da a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), cujas plataformas respondem aos objetivos liberalização econômica na América Latina. Assim, são observados o contexto em que surgiram os acordos que originaram a ALBA bem como as proposições que norteiam essa alternativa. Assim, analisamos as peculiaridades desses acordos e como eles atuam para solucionar as mazelas dos países latino-americanos.

Palavras-Chave: ALBA; Venezuela, Bolívia; Cuba; Integração; Regionalismo


 

 

INTRODUÇÃO

As demandas latino-americanas na atual conjuntura internacional de fortes debates sobre a importância das coalizões frente a problemas comuns e a necessidade de adequar interesses a objetivos regionais, caracterizam as iniciativas de inúmeros estados em consolidar blocos regionais.

A Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA) parte da conjunção de interesses comuns dos estados integrantes com vistas às demandas internas e a possibilidade de alavancar o desenvolvimento de políticas e práticas que estes consideram benéficas para seu futuro. Este acordo, porém, demonstra como a dinâmica política e econômica da região latino-americana e caribenha tem se transformado nos últimos anos. O surgimento de governos com ideologias marcadamente contrárias ao centro hegemônico, Estados Unidos, e a força de um nacionalismo intensamente arraigado exige do pesquisador uma atenção especial no entendimento dos desdobramentos das relações inter-estatais na região.

Uma importante consideração a ser feita, é que os atuais governos de Bolívia e Venezuela possuem um viés claramente terceiromundista, além do forte apelo antiimperialista que compõem os estadistas de ambos os estados. Além disso, é possível observar semelhanças entre as retóricas chavista e castrista. A forte repulsa aos Estados Unidos é sem dúvida o ponto crucial. Além disso, os três países buscam estabelecer vínculos mais estreitos com os países subdesenvolvidos, opção empreendida também pelo Brasil nas atuais diretrizes de política externa. A priorização das relações com sul denota uma característica cada vez mais comum dos rumos da política externa dos países latino-americanos: a politização da política externa. Nesse sentido, Lima (2009) argumenta que a política externa tem se tornado cada vez mais o resultado dos anseios do partido político no poder do que a conformação dos interesses nacionais de uma determinada nação.

Deste modo, e mais especificamente Chávez e Morales, têm demonstrado claramente o viés partidário (Movimento Quinta República e Movimento ao Socialismo, respectivamente) na formulação de política externa. Prova disso, é proposição da ALBA, cujo objetivo é alcançar maiores níveis de desenvolvimento através de uma integração baseada na cooperação e complementariedade das estruturas produtivas. Isso atenderia aos objetivos de reduzir a dependência que tais países apresentam para com o centro e possibilitaria o desenvolvimento autônomo dessas regiões ressaltando as vantagens comparativas de cada um dos membros.

Assim, nas próximas sessões trataremos da ALBA, esse novo projeto de integração regional, de caráter tão peculiar assim como a efetividade das ações tomadas. Por fim, serão levantadas considerações com base no andamento do processo de implementação da ALBA assim como indagando sobre o futuro deste bloco.

 

ALBA

A Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (ALBA) então proposta pelo presidente venezuelano Hugo Chávez na III Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Associação de Estados do Caribe, realizada em 2001 na Ilha de Margarida na Venezuela é firmada em Havana, Cuba, no dia 14 de dezembro de 2004. Fidel Castro e Hugo Chávez assinaram neste dia a Declaração Conjunta para a criação da ALBA1.

Já no preâmbulo da Declaração, os estados-membros anunciam como objetivo da criação do novo bloco

[...] uma integração baseada na cooperação, na solidariedade e na vontade comum de avançar todos juntos para níveis ainda mais elevados de desenvolvimento, podendo satisfazer as necessidades e anseios dos países latino-americanos e caribenhos, ao passo que, preservam sua independência, soberania e identidade2 (ALBA, 2004, p.01).

No decorrer de dois anos posteriores a assinatura dessa Declaração, Cuba e Venezuela firmam acordos que visam a plena aplicação do novo bloco. Para tanto, ainda em dezembro de 2004 os dois Estados reformulam o Convênio Integral de Cooperação entre Cuba e Venezuela, firmado em 2000, com vistas a ampliar as tratativas e adensar os projetos de cooperação já existentes. Em 2005 planos estratégicos são apresentados e adotados por ambos países nos setores econômicos, sociais, e culturais. Ainda em 2005, na cidade de Puerto La Cruz, Venezuela, são criados a PETROCARIBE3 e o Fundo ALBA - Caribe4 para o Desenvolvimento Econômico e Social. Subscreveram este acordo os representantes de Antígua e Barbuda, Bahamas, Belize, Cuba, Dominica, Granada, Guiana, Jamaica, República Dominicana, São Vicente e Granadinas, Santa Lúcia, São Cristóvão e Neves, Suriname e Venezuela. Cabe ressaltar que nem todos os países que assinaram o acordo de criação deste órgão estão sujeitos as diretrizes do bloco bolivariano, ou que intentem sua adesão, não excluindo essa possibilidade. Em 2006, Bolívia integra o bloco e dão-se início aos debates sobre a implementação do Tratado de Comércio entre os Povos (TCP) que será firmado neste mesmo ano.

Os planos da ALBA avançam no ano de 2007. Com Nicarágua já como membro do bloco, são desenhados os projetos que serão a linha de ação da Aliança Bolivariana. Educação, cultura, comércio, finanças, alimentação, saúde, telecomunicações, transporte, turismo, recursos minerais, indústria e energia são abordados. Ainda, é firmado o acordo para a criação do Banco da ALBA. Dominica e Honduras integram à ALBA em 2008. Por sua vez, Equador, São Vicente e Granadinas, Antígua e Barbuda em 2009.

Nos princípios norteadores da ALBA é importante destacar que "as propostas da ALBA para o Caribe não pretendem entrar em conflito com os acordos multilaterais e subregionais existentes, e sim que, pelo contrário devem ser assumidos como complementares"5 (BANCOEX, s.d., p. 06).

Deste modo, a ALBA não pretendia entrar em conflito com os acordos existentes no continente, como por exemplo, o Mercado Comum do Sul (Mercosul). Este, nascido na década de 1990, porém com origens ainda nos anos 1980 por meio de negociações entre Argentina e Brasil, tinha como objetivo, além de apoiar o processo de transição democrática por qual esses países passavam, e fomentar maior poder de barganha no cenário internacional, estabelece já no 1º artigo de seu tratado de constituição, o Tratado de Assunção em 23 de março de 1991, que o Mercosul teria como objetivo:

A livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países, através, entre outros, da eliminação dos direitos alfandegários e restrições as tarifas de circulação de mercadorias e de qualquer outra medida equivalente; o estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum em relação a terceiros Estados ou agrupamentos de Estados e a coordenação de posições em foros econômicos-comerciais regionais e internacionais; a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados-partes - de comércio exterior, agrícola, industrial, fiscal, monetária, cambial e de capitais, de serviços alfandegários, de transportes e comunicações e outras que se acordem - a fim de assegurar condições adequadas de concorrência entre os Estados-partes; e o compromisso dos Estados-partes de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração (BRASIL, 2010, p.01).

Nota-se a ênfase no âmbito comercial e como argumenta Prado (1997) o Mercosul "seria uma tentativa de se implementar uma integração econômica que procurasse produzir apenas o efeito de criação de comércio" (PRADO, 1997, p.290). O autor ainda afirma que seria de interesse do acordo uma aproximação das políticas fiscais e sociais, e não somente das políticas econômicas dos Estados-membros, à despeito de sua prepoderância (PRADO, 1997).

Pautada nos princípios de complementação, cooperação, solidariedade e o respeito à soberania dos países, a iniciativa bolivariana, por sua vez, intenta fomentar o desenvolvimento dos estados envolvidos numa lógica que suas potencialidades sejam sobressaltadas.

De acordo com a Declaração que inaugura o novo bloco, os seguintes princípios e bases serão observados:

1. O comércio e os investimentos serão instrumentos para alcançar um desenvolvimento justo e sustentável tendo o Estado como regulador e coordenador da atividade econômica;

2. Tratamento especial e diferenciado, tendo em vista as assimetrias de desenvolvimento entre os países-membros, com o objetivo de maximizar os benefícios do processo de integração;

3. A complementariedade econômica;

4. Cooperação e solidariedade, como forma de adequar os diferentes níveis de desenvolvimento e focado na luta contra o analfabetismo, promoção da saúde e educação;

5. Criação de um fundo emergencial;

6. Desenvolvimento como forma de integrar as comunicações e transportes;

7. Propiciar a sustentabilidade do desenvolvimento;

8. Integração energética;

9. Fomentar os investimentos de capitais latino-americanos na própria região;

10. Defesa da cultura e identidades dos povos que integram o bloco;

11. Defesa da propriedade intelectual frente aos avanços de empresas transnacionais;

12. Concertação de posições nas esferas multilaterais e defesa da democracia e transparência das instâncias internacionais.

Tendo em vista estas disposições fica clara sua contraposição aos princípios neoliberais largamente adotados quando da conformação de blocos regionais. Ressalta-se ainda que a iniciativa da criação de um bloco com tais características tinha como ponto de partida a recusa e crítica a iniciativa norte-americana de criação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) disposto também nas notas preâmbulares da citada declaração. Segundo Soler (2007) "esta proposta, a ALBA, marca um distanciamento, não só da ALCA, como também dos projetos de integração que haviam precedido e que parte, desde o início, de sua natureza eminentemente antiimperialista"6 (SOLER, 2007, p.05).

[...] finalmente, com a consolidação da Revolução Bolivariana e o fracasso indiscutível das políticas neoliberais impostas a nossos países , os povos latino-americanos e caribenhos se encontram no caminho de sua segunda independência. O surgimento da Alternativa Bolivariana para os Povos de Nossa América proposta pelo Presidente Hugo Rafael Chávez Frias é sua melhor expressão7 (ALBA, 2004, P.02).

Nascida da idéia de alternativa a proposta dos Estados Unidos de criação da ALCA, quando se dão por esgotados os esforços para implementação da área de livre comércio supracitada, e o adensamento de relações entre os países instituidores da alternativa bolivariana, se é acordado que ao entenderem por tal não mais ser um alternativa e sim realidade, no decorrer do ano de 2009 alteram o nome para Aliança Bolivariana para os povos de Nossa América (ALBA) conforme fica claro no preâmbulo da Declaração da VI Cúpula da ALBA:

Decidiram que, a partir desta VI Cúpula, a ALBA-TCP se denominará "Aliança Bolivariana para os povos de Nossa América - Tratado de Comércio entre os Povos" (ALBA-TCP) entendendo que o crescimento e fortalecimento político da ALBA-TCP a constitue em uma força real e efetiva8. (ALBA, 2009, p.01).

Haviam sido criados também três instâncias dentro do bloco que são: o Conselho Ministerial integrado por representantes diretos dos Chefes de Estado e Governo dos estados-membros com o status de instância decisória, o Conselho de Movimentos Sociais com caráter consultivo, de divulgação e supervisão dos projetos desenvolvidos através das iniciativos do bloco, e a Comissão Permanente, com sede em Caracas, Venezuela, responsável por estudar a viabilidades dos projetos apresentados e sua execução (ALBA, 2009).

 

ALBA - ATUAÇÃO E EFETIVIDADE

Para efeito de análise da atuação e efetividade da ALBA, será dada atenção especial a três países quais sejam, Bolívia, Cuba e Venezuela onde centram-se, em grande parte as declarações e acordos do bloco.

Como ressalta Oddone e Granato (2007), ao se distanciar da integração voltada apenas para a área econômica - o comércio é estimulado respeitando os conceitos de complementariedade, cooperação, solidariedade e respeito a soberania - o projeto bolivariano abriga propostas para sanar a "dívida social". Os convênios assinados entre os membros da ALBA se voltam para a saúde, educação, focados na Bolívia e Venezuela e no setor energético, direcionados à Cuba e Bolívia, principalmente (ODDONE; GRANATO, 2007, p.34). Toma-se ainda os projetos com vistas à criação do Banco da ALBA e o lançamento do Sucre - moeda e criação de uma câmara de compensação como ferramentas nas relações comercias intra-bloco - além de empresas grannacionais9, uma forma dos estados retomarem o papel de indutores do desenvolvimento. Essas empresas, dentre as quais destaca-se a PETROCARIBE, são orientadas para o comércio intra-bloco. Corroborando assim, o princípio de "fomentar as vantagens cooperativas entre as nações que permitam compensar as assimetrias existentes entre os países do hemisfério"10 (BANCOEX, s.d, p.02).

Segundo Girvan (2008) Cuba dispõe de vantagens no que se trata de recursos humanos, tanto em saúde como educação. Desta forma compromete-se a: criar centros saúde, de maneira gratuita; oferecer bolsas de estudos em seus centros universitários de ciências médicas; buscar a troca de experiências tanto no sistema técnico e educacional como forma de desenvolver a medicina e ainda intercâmbio e colaboração no processo docente-educativo como forma a superar o analfabetismo (ALBA, 2006, GIRVAN, 2008).

Isto posto, as Missões, como é chamado o programa cubano aplicado na Venezuela de apoio a educação e assistência médica, em avaliação de Oddone e Granato (2007), "tem obtido ótimos resultados" (ODDONE; GRANATO, 2007, p.34). De acordo com informes publicados pelo sítio oficial da ALBA11, as campanhas médicas cubanas já atenderam mais de um milhão (1.000.000) de cidadãos nos países integrantes do bloco. Um grupo de quinhentos (500) profissionais de saúde atuam continuamente nos centros permanentes e itinerantes. Além disso, cinco mil (5.000) bolsas de estudos tem sido destinadas para a formação, na ilha, de profissionais de saúde advindos dos países parceiros.

Quanto ao Banco da ALBA, criado em 2008, que tem logo de início capital inicial de um bilhão de dólares (U$1.000.000.000) adotando características que serão definidas por seus membros através de consenso. Segundo Bendaña (2008) o Banco "teria como foco impulsionar a produção industrial e agrícola entre seus membros, dar suporte a projetos sociais, assim como, acordos de cooperação multilaterais entre seus membros nos setores energéticos"12 (BENDAÑA, 2008, p.03).

Ademais, o adensamento das relações comerciais estimula os estudos para a criação de uma moeda, como forma a facilitar as transações financeiras entre os integrantes da iniciativa bolivariana. Segundo exposto em documento da VI Cúpula da ALBA (2009),

Se esta consolidando por parte dos técnicos uma moeda comum, uma câmara de compensação, um fundo que permita alternativas distintas do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial para sustentar e levantar nossas economias em meio aos problemas futuros (ALBA, 2009, p.01)13.

Já as empresas grannacionais fazem alusão a integração e conformação de uma grande nação latino-americana e caribenha, fundamento da visão bolivariana e expressa na VI Cúpula da ALBA de 2009. Esta iniciativa seria a chave do sucesso da ALBA, pois, permitiria um novo regionalismo baseado no provimento a partir de empresas públicas onde os diferentes interesses nacionais convergiriam e a associação para a criação das empresas e projetos grannacionais colaborariam para o avanço do desenvolvimento dos países envolvidos, já que proveriam o mercado intra-bloco (HART-LANDSBERG, 2009). Ilustra-se o fato o projeto da Grannacional de Alimentos em que a produção de soja boliviana seria incrementada e atenderia os mercados regionais facilitando a distribuição e comercialização, sem o intercâmbio de empresas transnacionais que inflariam o custo do produto. (ALBA, 2009, p.02).

Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia, Honduras e Dominica estabeleceram recentemente uma empresa de capital misto para a produção de alimentos com o objetivo de garantir segurança alimentaria aos estados-membros. A nova companhia "supranacional" permitirá uma serie de empresas "promover cooperação tecnológica e de aprendizado, investimentos em infra-estrutura regional, e integração da distribuição regional de alimentos"14 (HART-LANDSBERG, 2009, p.07).

Quanto ao setor energético, destaca-se a PETROCARIBE. Esta, já desenhada em 2005, congrega um conjunto de nações caribenhas que recebem apoio venezuelano para o desenvolvimento de atividades no setor de energia, descontos e financiamento para a compra do petróleo deste país. De acordo com o Acordo de Cooperação Energética PETROCARIBE, a nova grannacional tem o objetivo de:

[...] contribuir para a transformação das sociedades latino-americanas e caribenhas , tornando-as mais justas, cultas, participativas e solidarias e que, por isso, esta concebido como um processo integral que promove a eliminação das desigualdades sociais e fomenta a qualidade de vida e uma participação efetiva dos povos na conformação de seu próprio destino15. (ALBA, 2005, p.01).

Segundo Girvan (2008) no período de junho de 2005 a dezembro de 2007 foi transacionado um valor de cerca de 1.17 bilhão de dólares e que a previsão para 2010 chega ao incríveis 4.5 bilhão de dólares. O acordo prevê também a isenção de impostos de importação dos hidrocarbonetos advindos da Venezuela, a instalação de refinarias em Cuba e a expansão das plantas das petroleiras estatais dos países associados (GIRVAN, 2008).

O acordo de instituição desta empresa conta ainda com um Fundo

[...] destinado ao financiamento de programas sociais e econômicos, com aportes provenientes de instrumentos financeiros e não financeiros; contribuições que se podem acordar pela porção financiada da fatura petroleira e os lucros produzidos pelo comércio direto16. (ODDONE; GRANATO, 2007, p.35).

A região que compreende a ALBA é uma importante porção do território mundial onde encontram-se importantes recursos energéticos vitais para o desenvolvimento mundial e o bloco entende isso como uma oportunidade para iniciativas que integrem ainda mais a região. Segundo palavras de Bendaña (2008) seria "a decisão política de usar as massivas reservas de óleo e seus ganhos na assistência de outros estados do mundo com o claro objetivo de reduzir sua dependência da ordem internacional comercial e financeira dominante"17 (BENDAÑA, 2008, p.02). Desta maneira será observado a partir da próxima seção como e se essas iniciativas têm impactado na superação da dependência dos Estados envolvidos e se têm logrado êxito no fomento a um desenvolvimento autônomo da região.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A América Latina presenciou desde sua descoberta pelos europeus, diferentes estágios de inserção no cenário mundial e diferentes modelos de desenvolvimento. Primeiramente um modelo que visava a exploração das riquezas naturais até um rápido processo de urbanização e industrialização, no decorrer do século XX. O que se observa hoje é uma tentativa de adequação dos países da região às demandas internacionais e um esforço para garantir um posicionamento tanto econômico, político e social no cenário globalizado. Todavia, nota-se em sua história que as contradições inerentes ao sistema foram e são responsáveis pelas trajetórias de desenvolvimento engendradas.

As economias latino-americanas se inserem no âmbito internacional como subdesenvolvidas e dependentes. Essa constatação se deve ao próprio atraso quando esses países passaram a participar efetivamente do comércio mundial como também ao caráter de dependência de recursos financeiros para avançar na industrialização de suas economias. Todavia, continuam a suprir o centro sistêmico de matérias-prima e produtos de baixo valor agregado.

A regionalização e as propostas de integração surgem como alternativa a essa inserção, tendo em vista a necessidade de se apoiar nos demais países afim de garantir poder de barganha no contexto mundial. Se num primeiro momento os acordos firmados visavam, principalmente, a área econômica nota-se a partir dos anos 2000, com a falência do modelo neoliberal pregado pelo Consenso de Washington, a ascensão de alternativas focadas em outras agendas, não somente econômica e comercial como também social, política.

Podemos caracterizar como exemplo do primeiro modelo o Mercosul que vislumbrava uma união aduaneira de longo prazo na região constando assim o caráter comercial. A ALBA ilustra justamente o movimento mais recente que abriga disposições, além da área comercial, política e social com a busca pela complementariedade das economias e a solidariedade como elemento atenuante da integração. Suas linhas de ação extrapolam as tradicionais áreas econômicas e políticas, abrangendo educação, cultura, telecomunicações, transporte, turismo, energia, etc.

A ALBA guarda em seu escopo regulatório a ambição de prover o desenvolvimento dos países que a integram de forma ordenada e complementar. Para tanto se utiliza da solidariedade na adoção de medidas que envolvam todos os membros e na atenção para os diferentes níveis de desenvolvimento interno.

Sua fundação e manutenção ocorre num ambiente que apregoa o anti-imperialismo. Sua formulação vai contra iniciativas que foquem a exploração da periferia e conta como principais apoiadores Fidel Castro, Evo Morales e Hugo Chavez. A proximidade das políticas destes governantes tem sido determinante no aprofundamento das medidas propostas pelo bloco e na adesão de novos membros.

O enfoque da ALBA está justamente relacionado a busca da independência do centro na tentativa de instaurar um modelo que maximize as singularidades de cada economia envolvida no acordo e complemente as demais. Nota-se que os rumos tomados sugerem a busca por um corte com a estrutura dominante capitalista, não sendo contrária à ela, mas que possibilite o desenvolvimento da região por meio de ajustes e iniciativas desenhadas e praticadas pelos próprios países.

A criação de empresas grannacionais como provedoras do mercado interno destes países, seja pela união das capacidades produtivas, seja pelo objetivo de suprimento por valores não acrescidos da mais-valia, demonstra como a busca por um desenvolvimento autônomo é vislumbrado pelo bloco.

A criação do Banco da ALBA demonstra ainda uma via de financiamento fora das já consagradas fontes de financiamento como Banco Mundial e FMI que adotam sistemas de contra-partida e imposições. O fundo bolivariano não impõe ações aos Estados e sim que os financiamentos tenham em vista o desenvolvimento complementar da região e as ações tomadas sejam focadas na melhoria da situação econômico-político-social da região.

PETROCARIBE e PETROANDINA e demais ações tomadas no setor energético intentam em dotar a região de barganha frente aos movimentos internacionais na área e assegurar a posse e manipulação de recursos naturais tão importantes para o futuro global. O poder inerente a posse destes recursos assegura à região o bloqueio a possíveis ingerências na região e dota estes países da sustentabilidade energética de suas economias.

Todavia, surge a dúvida se a manutenção destas ações e o futuro do bloco se perpetue no caso de mudanças políticas e a solvência dos atuais governos. Muitos críticos levantam a questão de que o papel desempenhado pelos presidentes - Morales, Fidel e Chávez - seja crucial para o bom andamento das negociações no bloco e ainda o papel preponderante da Venezuela no provimento de recursos aos projetos apoiados pelo bloco, uma vez sendo dela boa parcela do capital financeiro, advindo dos petrodólares, que sustenta os acordos no âmbito do projeto bolivariano.

Não há dúvida que os acordos da ALBA tenham em vista a superação da dependência, do subdesenvolvimento, adotando um caráter antiimperialista. Além disso, as iniciativas tomadas visam o desenvolvimento autônomo da região. Porém, não há como negar que o isolamento da região não é possível devido a própria dinâmica da economia mundial, e não que isso seja objetivo dos acordos. Há sim a presença de movimentos que buscam na dinâmica latino-americana e caribenha a base para a superação do atraso das economias e dinamização dos setores produtivos e nunca perdendo de vista a melhoria dos serviços de saúde, educação atrelados ao demais setores da economia e a população como coadjuvantes dessa transformação.

A ALBA coloca-se no cenário mundial como uma via em que países periféricos contestam a atual estrutura de hegemonia norte-americana e buscam em suas dinâmicas internas, e de maneira concertada, a superação dos problemas que incorrem na situação de subverniência da região aos desígnios do centro dominante. E ainda, tem a característica de que seus governantes sejam por muitas vezes rotulados como populistas e suas ações sejam criticadas nos círculos políticos mundiais.

 

REFERÊNCIAS

ALBA (2004). Alianza Bolivariana para os povos da América. Declaración Conjunta entre el Presidente de la República Bolivariana de Venezuela y el Presidente del Consejo de Estado de la República de Cuba para la Creación del ALBA. Havana. Disponível em: http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=Content&pa=showpage&pid=2060. Acesso em: 23 de setembro de 2010.

ALBA (2005). Alianza Bolivariana para os povos da América. Declaración Final de la Primera Reunión Cuba-Venezuela para la Aplicación de la Alternativa Bolivariana para las Américas. Havana. Disponível em: http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=Content&pa=showpage&pid=231. Acesso em: 23 de setembro de 2008.

ALBA (2006). Alianza Bolivariana para os povos da América. Acuerdo para la aplicación de la Alternativa Bolivariana para los pueblos de nuestra América y el Tratado de Comercio de los pueblos. Havana. Disponível em: http://www.alternativabolivariana.org/modules.php?name=Content&pa=showpage&pid=516. Acesso em: 23 de setembro de 2008.

ALBA (2009). Alianza Bolivariana para os povos da América. Declaración de la VI Cumbre Extraordinaria del ALBA - TCP. Maracaibo. Disponível em: http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=Content&pa=showpage&pid=1984. Acesso em: 23 de setembro de 2010.

BANCOEX (2010). El ALBA en el Caribe. Ministerio de Integración y Comércio Exterior. Disponível em: http://www.alternativabolivariana.org/pdf/alba_mice_es.pdf. Acessado em 04 de julho de 2009.

BENDAÑA, Alejandro (2008). From Development Assistance to Development Solidarity: the Role of Venezuela and ALBA. The Chenging Face of Global Development Finance Conference. Canadá. Disponível em: http://www.networkideas.org/alt/feb2008/Venezuela_ALBA.pdf. Acessado em 11 de abril de 2010.

BRASIL (2010). Tratado para a Constituição de um Mercado Comum entre a República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai - Tratado de Assunção. Ministério da Relações Exteriores do Brasil. Disponível em: http://www2.mre.gov.br/dai/trassuncao.htm. Acessado em 13 de setembro de 2010.

GIRVAN, Norman (2008). ALBA, Petrocaribe and Caricom. Disponível em: http://www.normangirvan.info/wp-content/uploads/2009/03/alba-petrocaribe-and-caricom.pdf. Acessado em 17 de novembro de 2009.

HART-LANDSBERG, Martin (2009). Learning from ALBA and the Bank of the South: Challenges and Possibilities. Monthly Review. Disponível em: http://www.monthlyreview.org/090901hart-landsberg.php . Acessado em 12 de maio de 2010.

LIMA, Maria R. S. (2009) A politização da política externa e os interesses nacionais. Observatório Político Sul-Americano - IUPERJ. Estudos e Cenários, junho 2009. Rio de Janeiro. Disponível em: http://observatorio.iesp.uerj.br/pdfs/122_artigos_2009_06_11_Lima_Venezuela_CB.pdf Acesso em ago. 2010.

ODONNE, Carlos N. GRANATO, Leonardo (2007). Los nuevos proyetos de integración regional vigentes em América Latina: la alternativa bolivariana para nuestra América y la comuniidad sudamericana de naciones. Revista de Economia Heterodoxa - OIKOS. Nº 07, Ano 6. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.revistaoikos.org/seer/index.php/oikos/article/viewPDFInterstitial/17/13. Acessado em 24 de fevereiro de 2010.

PRADO, Luiz C. D (1997). Mercosul como opção estratégica de integração: notas sobre a teoria da integração e estratégias de desenvolvimento. Ensaios FEE. Vol. 18, Nº 01, p. 276-299. Porto Alegre.

 

 

* Trabalho desenvolvido em 2010 no âmbito do Grupo de Pesquisa Atlântico Sul ligado ao Departamento de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
1. Declaración Conjunta entre el Presidente de la República Bolivariana de Venezuela y el Presidente del Consejo de La República de Cuba pra la Creación del ALBA.
2. [...] una integración basada en la cooperación, la solidaridad y la voluntad común de avanzar todos de consuno hacia niveles aún más altos de desarrollo, puede satisfacer la necesidades y anhelos de los países latinoamericanos y caribeños, y a la par, preservar su independencia, soberanía e identidad (TRADUÇÃO NOSSA).
3. Órgão responsável pela coordenação e gestão das políticas, planos e estratégias dos estados-membros no setor energético conforme disposto no Acuerdo de Cooperación Energética Petrocaribe de 29 de junho de 2005.
4. Fundo criado através da PETROCARIBE com o objetivo de financiar programas sociais e culturais.
5. [...] las propuestas del Alba para el Caribe no pretende entrar en conflicto con los acuerdos multilaterales o subregionales existentes, sino que, por el contrario deben ser asumidos como complementarios (TRADUÇÃO NOSSA).
6. Esta propuesta marca un distanciamiento, no sólo del ALCA, sino también de los proyectos de integración que le han precedido y que parte, de entrada, de su naturaleza eminentemente antiimperialista (TRADUÇÃO NOSSA).
7. [...] finalmente, con la consolidación de la Revolución Bolivariana y el fracaso indiscutible de las políticas neoliberales impuestas a nuestros países, los pueblos latinoamericanos y caribeños se encuentran en el camino de su segunda y verdadera independencia. El surgimiento de la Alternativa Bolivariana para los Pueblos de Nuestra América propuesta por el Presidente Hugo Rafael Chávez Frías es su mejor expresión (TRADUÇÃO NOSSA).
8. Decidieron que, a partir de esta VI Cumbre, el ALBA - TCP se denominará "Alianza Bolivariana para los Pueblos de Nuestra América - Tratado de Comercio de los Pueblos" (ALBA - TCP) en el entendido que el crecimiento y fortalecimiento político del ALBA - TCP la constituye en una fuerza real y efectiva (TRADUÇÃO NOSSA).
9. Empresas grannacionais, conforme estabelecido no teor dos Tratados da ALBA, seriam aquelas em que sua produção seria orientada para o fomento das necessidades humanas dos países envolvidos sem a preocupação de reprodução e acumulação de capital. Teriam em vista a noção de integração produtiva e complementação econômica dos Estados-membros do bloco, possibilitando o comércio justo.
10. [...] fomentar ventajas cooperativa entre las naciones que permitan compensar las assimetrías existentes entre los países del hemisfério (TRADUÇÃO NOSSA).
11. www.alianzabolivariana.org
12. Its stated aim is to boost industrial and agricultural production among its members, support social projects as well as multilateral cooperation agreements among its members, particularly in the field of energy (TRADUÇÃO NOSSA).
13. Se está consolidando por parte de los técnicos uma moneda común, uma câmara de compensación, um fondo que permita alternativas distintas del Fondo Monetario Internaciona (FMI), del Banco Mundial (BM) para sostener y levantar nuestras economias em médio de los problemas que se avecinan (TRADUÇÃO NOSSA).
14. Venezuela,  Nicaragua, Ecuador, Bolivia, Honduras, and Dominica recently established a joint food production company with the aim of securing food sovereignty for member nations. The new "supranational" company will oversee a series of enterprises  that  "will promote technological cooperation and training, invest in rural infrastructure, and integrate regional food distribution" (TRADUÇÃO NOSSA).
15. [...] contribuir a la transformación de las sociedades latinoamericanas y caribeñas, haciéndolas más justas, cultas, participativas y solidarias y que, por ello, está concebido como um proceso integral que promueve la eliminación de las desigualdades sociales y fomenta La calidad de vida y uma participación efectiva de los pueblos em la conformácion de su propio destino (TRADUÇÃO NOSSA).
16. [...] destinado al financiamiento de programas sociales y econômicos, com aportes provenientes de instrumentos financeiros y no financieros; contribuiciones que se puedan acordar de la pórcion financiada de la factura petrolera y los ahorros producidos por el comercio directo (TRADUÇÃO NOSSA).
17. [...] a political decision to use its massive oil reserves and earnings to assist other countries in the world with the clearly states objective to lessen their dependence on the dominant trading and financial international order (TRADUÇÃO NOSSA).